Artigos de opinião

Acordos de cuidados baseados em valor e modelos de cuidados colaborativos: um caminho para a saúde integrada e o compartilhamento de dados na saúde suplementar

Andrey V B Freitas

Nos últimos anos, o cenário da saúde vem passando por uma mudança de paradigma de um modelo de fee for service para um que prioriza o atendimento baseado em valor[1]. Essa transição é impulsionada pelo reconhecimento de que focar apenas na quantidade de serviços médicos prestados não necessariamente leva a melhores resultados para os pacientes ou a cuidados de saúde efetivos. Como parte dessa transformação, acordos de cuidados baseados em valor e modelos de cuidados colaborativos estão emergindo como estratégias essenciais que promovem uma maior integração entre a prestação de cuidados e o compartilhamento de dados no âmbito da saúde suplementar. Este artigo aprofunda o conceito de acordos de cuidados baseados em valor, explora os benefícios dos modelos de cuidados colaborativos e discute o papel fundamental que desempenham na garantia de serviços de saúde mais simplificados e eficazes.

A essência dos acordos de cuidados baseados em valor

Os acordos de prestação de cuidados com base no valor, muitas vezes referidos como contratos baseados no valor, representam um desvio do modelo tradicional de fee for service. Em um arranjo baseado em valor, os profissionais de saúde são remunerados com base na qualidade dos cuidados prestados e nos resultados alcançados para os pacientes, em vez do volume de serviços prestados. Esses acordos promovem um alinhamento mútuo de interesses entre operadoras de planos de saúde, prestadores de cuidados de saúde e pacientes, todos trabalhando para o objetivo comum de melhorar a saúde do paciente e gerenciar os custos.

No centro dos acordos de cuidados baseados em valor estão várias métricas de desempenho e benchmarks que medem os resultados de cuidados de saúde, a satisfação do paciente e a economia de custos. Ao enfatizar o cuidado preventivo, o gerenciamento de doenças crônicas e o bem-estar geral, esses acordos incentivam uma abordagem proativa aos cuidados de saúde que pode levar a menos hospitalizações e a menores gastos gerais com saúde.

Modelos de cuidados colaborativos: preenchendo as lacunas

Os modelos de cuidados colaborativos são componentes essenciais do ecossistema de cuidados baseado em valor. Eles se concentram em promover uma comunicação e cooperação eficazes entre vários prestadores de cuidados de saúde, incluindo médicos de cuidados primários, especialistas, hospitais e até mesmo organizações comunitárias. Esses modelos reconhecem que os pacientes muitas vezes exigem um espectro de serviços de cuidados, e uma abordagem isolada pode dificultar a prestação de cuidados de saúde abrangentes e bem coordenados.

A prestação de cuidados integrados não só melhora as experiências dos pacientes, mas também gera resultados positivos de saúde. Modelos colaborativos garantem que os pacientes recebam intervenções oportunas, medidas preventivas e cuidados de acompanhamento consistentes, reduzindo a probabilidade de complicações e readmissões hospitalares. Além disso, eles facilitam o compartilhamento de dados vitais do paciente e histórico médico entre os provedores, levando a uma tomada de decisão mais informada e a redução de redundâncias em procedimentos diagnósticos.

Benefícios de uma maior integração entre cuidados e compartilhamento de dados

1.         Resultados aprimorados para o paciente: o alinhamento dos incentivos por meio de acordos de cuidados baseados em valor incentiva os profissionais de saúde a se concentrarem em melhorar a saúde e o bem-estar do paciente. Esta abordagem coloca um prêmio em cuidados preventivos, intervenções precoces e gestão de doenças crônicas, levando a melhores resultados do paciente e melhoria da qualidade de vida.

2.         Eficiência de custos: modelos de atendimento colaborativo e acordos baseados em valor ajudam a conter os custos de saúde, reduzindo hospitalizações desnecessárias, visitas a salas de emergência e testes redundantes. Ao enfatizar tratamentos econômicos e planos de cuidados personalizados, essas estratégias levam a uma alocação mais eficiente dos recursos de saúde.

3.         Atendimento holístico ao paciente: os modelos de atendimento integrado priorizam uma abordagem centrada no paciente, considerando não apenas as necessidades médicas, mas também os determinantes sociais da saúde. Essa visão abrangente aborda os fatores subjacentes que influenciam a saúde do paciente e ajuda a adaptar as intervenções com maior probabilidade de sucesso.

4.         Diagnósticos mais precisos: a prática do compartilhamento de dados em modelos de atendimento colaborativo capacita os profissionais de saúde com insights valiosos. O acesso ao histórico médico completo do paciente, aos resultados dos testes e aos planos de tratamento permite diagnósticos mais precisos e abordagens de tratamento personalizadas.

5.         Melhoria da Saúde da População: à medida que o compartilhamento de dados se torna mais extenso e acessível, o sistema público de saúde, as operadoras de planos de saúde e os prestadores de serviços podem identificar tendências e padrões na prevalência das doenças, além de mensurar a eficácia do tratamento, associando tais informações à demografia do paciente. Esses dados de nível populacional auxiliam na concepção de campanhas e intervenções de saúde pública direcionadas.

Superando desafios e olhando para frente

Embora a adoção de acordos de cuidados baseados em valor e modelos de cuidados colaborativos apresente vantagens significativas, vários desafios devem ser enfrentados para garantir sua implementação bem-sucedida. Estes incluem a interoperabilidade dos registos de saúde eletrônicos, as preocupações com a privacidade e a segurança dos dados, o alinhamento dos incentivos entre as partes interessadas e a transição das estruturas de reembolso do modelo de fee for service para o novo paradigma.

Olhando para o futuro, os avanços na tecnologia, como blockchain para compartilhamento seguro de dados e inteligência artificial para análise preditiva, mantêm a promessa de superar esses desafios e facilitar ainda mais o compartilhamento integrado de serviços de saúde e dados. Operadoras de planos de saúde, formuladores de políticas, prestadores de cuidados de saúde e pacientes devem trabalhar coletivamente para promover um ambiente propício à inovação e colaboração, realizando assim todo o potencial de acordos de cuidados baseados em valor e modelos de cuidados colaborativos.

Conclusão

A convergência de acordos de cuidados baseados em valor e modelos de cuidados colaborativos representa uma mudança transformadora no cenário da saúde. Ao alinhar os incentivos com os resultados dos pacientes, essas estratégias geram cuidados de maior qualidade, economia de custos e melhores experiências dos pacientes. A integração do compartilhamento de dados aumenta ainda mais a eficácia desses modelos, capacitando os profissionais de saúde com as informações necessárias para tomar decisões informadas. À medida que o setor de saúde continua a evoluir, abraçar essas inovações e promover a colaboração entre operadoras de planos de saúde, prestadores de serviço e pacientes abrirá o caminho para um sistema de saúde mais integrado, eficiente e centrado no paciente.


[1] O cuidado baseado em valor é um modelo de prestação de cuidados de saúde que muda o foco do volume de serviços médicos prestados para a qualidade do atendimento e os resultados alcançados pelos pacientes. No modelo tradicional de fee for service, os prestadores de cuidados de saúde são reembolsados com base no número de serviços que prestam, o que pode levar à sobreutilização de recursos médicos e à falta de ênfase nos cuidados preventivos e nos resultados dos pacientes. O cuidado baseado em valor, por outro lado, busca alinhar os interesses dos pacientes, provedores e pagadores (como empresas de seguros de saúde) para oferecer cuidados de saúde mais eficazes, eficientes e centrados no paciente.

“O que esperar quando você está esperando” ou a regulamentação do Programa de Combate ao Assédio Sexual

Vanessa Vilela Berbel

Nas minhas sucessivas tentativas de ser mãe biológica recebi de minha irmã um livro muito agradável, com o nome “O que esperar quando você está esperando”, escrito por Heidi Murkoff, Arlene Eisenberg e Sandee Hathaway, cujo objetivo é “fornecer respostas tranquilizadoras para os futuros pais”. A espera é sempre angustiante para pessoas ansiosas como eu e, certamente, tranquilidade não foi exatamente o que tive ao lê-lo, ainda mais após cinco abortos sucessivos.

Bem, não estou aqui para falar com você sobre o tema da gestação de bebês, ainda que seja essencial no Brasil, mas sim de outra geração, muito mais demorada e que demanda articulação do interesse de mais de duas pessoas: a regulamentação de uma lei.  

Regulamentar uma lei por um único órgão já não é tarefa fácil; imagine, então, quando precisa ser feita por múltiplos responsáveis. Foi esse o desafio lançado pela Lei 14.540/2023, que instituiu o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual e à Violência Sexual no âmbito da administração pública, direta e indireta, federal, estadual, distrital e municipal.

O Programa determina, em síntese, que os órgãos públicos realizem ações voltadas (a) à prevenção e enfrentamento do assédio sexual e de todas as formas de violência sexual, (b) à capacitação dos agentes públicos para o desenvolvimento e a implementação de ações destinadas à discussão, à prevenção, à orientação e à solução do problema e (c) à implementação e disseminação de campanhas educativas sobre as condutas e os comportamentos que caracterizam o assédio sexual e demais crimes contra a dignidade sexual.

E como o Brasil precisa deste Programa implementado com esmero! Apesar de parecer irreal, em 29 de maio deste ano, pesquisa elaborada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) apurou que 84,5% dos brasileiros têm pelo menos um tipo de preconceito contra as mulheres. Destaco dois deles:

  • 31% dos brasileiros acham que homens têm mais direito a vagas de trabalho ou são melhores em cargos executivos; e
  • 39% dos entrevistados acreditam que mulheres não desempenham papel na atividade política tão bem quanto os homens.

Os preconceitos não ficam na seara íntima do preconceituoso, mas transformam-se em obstáculos sociais para as mulheres e vêm, a cada dia, reduzindo as oportunidades de gozo de seus direitos fundamentais. Daí porque, como consequência, em 59 países onde mais mulheres possuem formação do que os homens, a diferença média de renda entre gêneros permanece em 39% a favor dos homens[1].

Estamos caminhando para o quinto “mesversário” da Lei 14.540/2023. Se fosse um bebê, precisaríamos prestar bastante atenção, pois, nesta fase, já estaria se preparando para sair engatinhando por aí. Será? “Só que não”, ao menos em relação às concessionárias, permissionárias e delegatárias de serviços públicos.

No âmbito da administração pública, o Programa possui diretrizes desde antes da promulgação, como podemos ver do “Guia Lilás: orientações para prevenção e tratamento ao assédio moral e sexual e à denúncia no Governo Federal” (Guia Lilás), elaborado pela Controladoria-Geral da União (CGU) e aprovado pela Portaria Normativa SE/CGU nº 58/2023. Neste documento, pode-se encontrar conceitos e exemplos de atos, gestos, atitudes e falas que configurem assédio moral ou sexual ou, ainda, de discriminação. Também há orientações sobre o uso apropriado dos canais de denúncia.

Uma importante orientação oferecida pelo Guia Lilás é a forma adequada de abordagem da vítima no ato da denúncia. Sei, por experiência de dois anos como coordenadora do Ligue 180, o quanto é desafiador proporcional escuta ativa e respeitosa, demonstrando interesse, compreensão e valorização do que o denunciante está relatando sem externar uma postura julgadora e permeada por perguntas excessivas.

Contudo, mesmo havendo guias, orientações e formulários, “na teoria a prática é outra”. Nem sempre os atendimentos de Ouvidoria estão realmente preparados e, digo com firmeza, não há formula mágica que sirva a todos os contextos; cada situação de violência é única e possui perguntas-chave para o adequado encaminhamento da demanda. É necessário muita, mas muita pesquisa técnica para se chegar a um nível ótimo.

Portanto, só criar um canal de ouvidora, sem ter preparação prévia dos envolvidos e um estudo adequado para cada um dos meios disponíveis para a realização de denúncia (telefone, mensageria, presencial) e para cada uma das violências sofridas, em nada adianta; ao contrário, há riscos de se desencorajar as vítimas, que acabam, em alguns casos, ainda mais expostas às medidas de retaliação do agressor.

Há um Grupo de Trabalho de enfrentamento ao assédio na Administração Pública, o qual está a realizar ciclo de painéis para debater o tema, contando com representantes da Advocacia-Geral da União, da Controladoria-Geral da União, dos ministérios dos Direitos Humanos e da Cidadania, da Igualdade Racial, da Justiça e Segurança Pública, das Mulheres, da Saúde, do Trabalho e Emprego, do Ministério da Educação e da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). O ciclo de palestras do Grupo ocorrerá até setembro; os debates se propõem a oferecer um plano, a partir de metodologia desenvolvida coletivamente. Mais uma diretriz, mais uma orientação…tomara que venha seguida dos recursos públicos necessários à implementação.

Ainda que dentro da administração pública federal haja um movimento para a efetivação da lei, não vemos a mesma uniformidade em relação a outros entes da administração direta e indireta; notadamente, não se localizou qualquer protótipo, minuta ou pauta a respeito da regulamentação dos serviços públicos realizados pelas concessionárias e permissionárias, principalmente para que tudo isso se torne obrigação contratual, e não mera benevolência.

Enquanto isso, continuamos com as preocupações comuns dos traumas causados pelos insucessos anteriores, mas com a consciência de quem sabe que nada na vida se faz com completa isenção de riscos.


[1] Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento -PNUD. RELATÓRIO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO 2021/2022. Disponível em: RELATÓRIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO 2021-22 | United Nations Development Programme (undp.org). Acesso em 28.06.2023.

Alterações nas regras e procedimentos para concessão de ex-tarifário para BK e BIT

Tendo em vista a importância do Instrumento de Política Industrial de redução do Imposto de Importação para Bens de Capitais-BK e Bens de informática e Telecomunicação-BIT sem produção nacional, Governo publica nova Resolução com alterações nas regras e procedimentos para concessão de ex-tarifários.

Rogério Pitta

O regime de ex-tarifário consiste na redução temporária da alíquota do Imposto de Importação de bens de capital (BK), de informática e telecomunicação (BIT). Tal regime só pode ser solicitado quando não houver produção nacional de bem equivalente. Este regime é fundamental e tem como objetivo o aumento significativo de investimentos e redução de custos para aquisição de máquinas e equipamentos não produzidos no país, o que deve se refletir na melhoria da produtividade das indústrias nacionais, com avanço tecnológico, e, consequentemente, aumentando a competitividade do setor produtivo.

Ao longo dos anos a legislação que rege este mecanismo vem sendo modificada. As mais recentes alterações foram publicadas no Diário Oficial da União do dia 18 de agosto de 2023, por meio da Resolução GECEX no 512, de 16 de agosto de 2023.

A nova legislação é importante pois revoga a Portaria ME nº 309, de 24 de junho de 2019 e a Portaria SDIC/ME nº 324, de 29 de agosto de 2019. Estas Portarias abriram um precedente perigoso, que desvirtuava a regra básica de inexistência de produção nacional para concessão do benefício.

A Portaria ME nº 309 de 2019, em seu artigo 13, definia que para fins de apuração e análise comparativa de existência de produção nacional equivalente, somente se consideraria que há produção nacional equivalente à do bem importado considerado quando o bem nacional apresentasse:

I – desempenho ou produtividade igual ou superior ao do bem importado, desde que o parâmetro conste da sugestão de descrição de que trata o inciso II do artigo 3º;

II – prazo de entrega igual ou inferior ao do mesmo tipo de bem importado;

III – fornecimentos anteriores efetuados nos últimos cinco anos pelo fabricante; e

IV – preço do bem nacional, calculado na fábrica EXW (Ex Works), sem a incidência de tributos, não superior ao do bem importado, calculado em moeda nacional, com base no preço CIF (Cost, Insurance and Freight).

Já a Portaria SDIC/ME nº 324 de 2019 estabelecia, em seu artigo 4º, que, para fins de apuração e análise comparativa de existência de produção nacional equivalente, os critérios definidos no art. 13, da Portaria ME nº 309, de 2019, seriam observados na seguinte ordem:

I – fornecimentos anteriores efetuados;

II – desempenho ou produtividade;

III – prazo de entrega; e

IV – preço.

Ou seja, as legislações anteriores permitiam a concessão de ex-tarifários (redução do imposto de importação) para bens de capital (BK) e de informática (BIT) quando os fornecedores estrangeiros oferecessem preços e prazos de entrega menores do que os praticados no Brasil. Ou seja, mesmo havendo produção nacional, o benefício poderia ser concedido para casos nos quais os preços dos produtos importados e prazo de entrega fossem mais atrativos aos importadores, o que, na prática, desrespeitava o princípio básico de não produção nacional para concessão do benefício, inibindo investimentos nas indústrias nacionais em pesquisa e avanço tecnológico. 

Segundo a nova Resolução GECEX, em vigor desde o dia 18 de agosto de 2023, as concessões se baseiam, principalmente, na capacidade de produção nacional de bens equivalentes, investimentos em andamento para a produção nacional de bens equivalentes, isonomia com bens produzidos no Brasil, inclusive quanto ao atendimento às leis e regulamentos técnicos e de segurança e políticas públicas.

Ainda sobre as concessões de ex-tarifários para BK e BIT, importa observar que o Governo, por meio da Divisão de ex-tarifário (DIVEX) do Departamento de Desenvolvimento da Indústria de Alta-Média Complexidade Tecnológica da Secretaria de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços (SDIC) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), vem realizando ampla análise nos ex-tarifários vigentes e consultando o setor privado em relação a necessidade de manutenção do benefício, tendo em vista que estão vigentes inúmeras concessões sem a efetiva utilização por parte das empresas.

Com base nesta revisão, recentemente foram publicadas duas Resoluções GECEX, a no 500, de 21 de julho e a no 514, de 18 de agosto, revogando a concessão de cerca de 1.650 ex-tarifários, seja por inutilidade, seja por verificação de produção nacional equivalente ou ainda, pela constatação de tecnologia superada.

Atualmente, segundo dados da SDIC/MDIC, existem 20.845 ex-tarifários de BK e BIT vigentes, o que demonstra a importância do instrumento para o aumento da produtividade nacional e avanço tecnológico. Ainda assim, considera-se muito importante esta revisão das concessões, verificando a real necessidade de manutenção de determinados benefícios, podendo abrir espaço para a concessão de novos ex-tarifários, tendo em vista a constante inovação tecnológica mundial e a demanda por novos produtos no mercado nacional e global.  

Rogério Pitta

Economista da Guedes, Bernardo, Imamura & Associados Consultoria Internacional

Democracia e Regulação: a importância da participação direta para um novo pacto dos agentes sociais.

Cristina Vargas

Dentre os dois modos de produção antagônicos propugnados pelas definições das economias liberais e socialistas, a constituição de um Estado Regulacionista vem se apresentando cada vez mais como uma solução instrumental. A abordagem regulacionista parte do princípio de que a economia capitalista está sujeita a crises cíclicas, que no entanto podem ser amenizadas pelo aparato regulatório, permitindo a continuidade de reprodução do sistema. No entanto, para o funcionamento eficaz desse aparelho regulador é necessária a sua aceitação pelos diversos agentes sociais. O processo de destruição criadora envolvido na constituição desse aparato vem acontecendo de forma dinâmica, em que o novo surge antes mesmo que o velho esteja suplantado. Entre o extremo de uma sociedade produtiva totalmente estatal ou aquela na qual os meios de produção são totalmente apropriados e gerenciados pelo mercado, a regulação sobre quem pode gerir com maior eficiência os meios de produção pode tornar-se cada vez mais participativa. Os novos instrumentos tecnológicos de informação e comunicação estão cada vez mais facilmente acessíveis pela sociedade. A estrada da informação, como era chama a internet no início dos anos 1990, era anunciada como um futuro lócus de comércio e interação cultural. Embora tenha nascido como resultado de pesquisas do departamento de defesa dos EUA durante a guerra fria, isto é, fruto do conflito entre os regimes econômicos antagônicos, cada vez mais a internet oferece a possibilidade de maior participação da sociedade acerca dos processos de fiscalização da coisa pública. A exemplo disso podemos citar as consultas públicas feitas pelas agencias reguladoras, e a própria definição dos projetos nos quais serão aplicados os recursos públicos orçamentários. Sabemos que com a tecnologia atual disponível poderíamos ter um mundo completamente diferente. A participação social atuando conjuntamente `a atividade de regulação dos recursos públicos pode representar um importante avanço na resolução dos conflitos, e contribuir para conciliação social necessária para a retomada do crescimento econômico. A história da humanidade nos mostra que o amadurecimento da democracia aconteceu entre avanços e retrocessos. Robsbawn (1996) já afirmara categoricamente que “a Revolução Francesa começou como uma tentativa aristocrática de recapturar o Estado”, e no entanto o resultado foi o avanço obtido com a declaração dos direitos dos homens e cidadãos. Mais recentemente Piketty (2016:79) afirmou que estamos ainda muito longe das luzes do século, e a resposta precisa ser dada a seguinte pergunta: “que formas de governança alternativas devemos criar no século XXI para escapar da ditadura do proprietário todo-poderoso e finalmente permitir um controle democrático e participativo do capital e dos meios de produção?” Numa perspectiva inspirada nas revoluções pacíficas da história mundial, como a Marcha do Sal ou a Primavera de Praga, a pergunta pode ser estendida ao conceito de democracia cidadã: como escapar de qualquer tipo de ditadura dos meios de produção, estatal ou de mercado, e ainda conciliar os interesses individuais e coletivos em uma sociedade que promova o crescimento econômico e uma política de paz?

A Teoria da Captura preconiza a possibilidade de que as Agências Reguladoras sofram captura por parte dos agentes regulados, e que em conseqüência os interesses desses agentes sejam atendidos em detrimento dos interesses dos consumidores, ou em outras palavras, que serviços de interesse público repassados à atividade privada obtenham ganhos não por aumentos de eficiência, mas por desfrutarem de alguma situação de proteção ou beneficiamento, que por fim indicaria a perda de autoridade e de comprometimento com o interesse público por parte da Agência.

“A doutrina cunhou a expressão ‘captura’ para indicar a situação em que a agência se transforma em via de proteção e benefício para setores empresariais regulados. A captura se configura quando a agência perde a condição de autoridade comprometida com a realização do interesse coletivo e passa a produzir atos destinados a legitimar a realização dos interesses egoísticos de um, alguns ou todos os segmentos empresariais regulados. A captura da agência se configura, então, como mais uma faceta do fenômeno de distorção de finalidades dos setores burocráticos estatais.” (Justen Filho, 2002: 369).

Aparentemente, o agente que pratica a captura está bem definido, conquanto a forma como o Estado constitui-se em capturado tem sido objeto de estudos e pesquisas. Dificilmente enxergaremos os mecanismos pelo qual o Estado torna-se o agente capturado se o enxergarmos de forma mítica, isto é, uma entidade sem rostos e sem personalidade. Stigler (1971) por exemplo, aponta a importância da pressão de grupos de interesse que financiam partidos políticos cujos projetos regulacionistas são de seu interesse para auferir renda que deveria ser revertida em benefícios dos consumidores. A partir da concepção institucionalista de causação circular, em que as instituições e os

indivíduos se influenciam reciprocamente podemos tentar compreender como se constituem os valores que irão determinar quais regramentos irão reger a sociedade.

Enfatizando o poder da captura em nível de política nacional Cagé (2020) afirma que “o dinheiro compra eleições”, estimando para a França o preço do voto em 35 euros, e apontando uma influencia decisiva do investimento privado sobre os resultados das eleições. Cagé (2017) afirma que não é só no Brasil que a democracia está em crise. O fenômeno de desencanto com a política, também observado nos países avançados, provém de um sentimento de desapropriação sentido pela maioria dos eleitores. Eles têm a impressão de que suas escolhas são confiscadas por uma minoria com forte poder econômico.”

Além do sentimento de ausência de poder emanado diretamente do povo, por melhores e mais racionais que possam ser as escolhas dos indivíduos, devemos considerar também a influência do ao auto-engano nas escolhas, ainda que feitas por mecanismos de participação direta.

“ mentimos para nós mesmos o tempo todo, lembramos e esquecemos de acordo com nossas convicções. O auto-engano permeia grande parte das escolhas que fazemos. Ao nos auto iludirmos geramos implicações éticas na vida publica e pessoal.” (Giannetti: 2005)

Como então garantir que a concorrência será devidamente regulada e não influenciada pela relação por vezes perniciosa entre agentes do Estado e entidades privadas? De acordo com Aktouf (2004) o fato que está latente na atual conjuntura econômica é que a administração pública não pode ser o braço armado da captura por diferentes grupos ou pessoas na definição das políticas públicas.

Alguns exemplos de boas práticas e avanços na administração pública tem se verificado pelo uso de instrumentos que possibilitam o acesso da sociedade civil ao planejamento e à execução das políticas públicas.

A administração pública brasileira dispõe de um rol de instrumentos que podem auxiliar na elaboração de seus regulamentos por meio da participação social, tais como: audiências públicas, consultas regionais, consultas públicas, consultas para revisão de Guias, canais eletrônicos para recepção de denúncias, tomada pública de subsídios, realização pública de Webinars, consultas dirigidas, diálogos setoriais, criação de grupos de trabalho e conselhos participativos. A criação de tais instrumentos tem

contribuído para democratizar o processo de regulação, mas para ser eficaz depende de publicidade eficaz e transparência na fiscalização da gestão.

Assegurar as condições de transparência que garantam a concorrência de fato em processos de regulação, ou mesmo licitatórios, dada a conjuntura recente brasileira passa a ser pré-requisito obrigatório para a manutenção de uma estrutura social pacifica.

Em pleito eleitoral recente no Brasil, parte das campanhas apresentavam uma escolha entre democracia ou corrupção, como se ambos fossem eventos mutuamente exclusivos, quando na verdade nunca o foram. As mídias sociais eram inundadas de acusações que salientavam a idéia de polarização entre denúncias de corrupção e denuncias de autoritarismo. No entanto, o combate efetivo à corrupção depende diretamente de assegurar transparência e efetividade na participação social sobre os processos públicos. Quanto maior a participação social direta na avaliação da eficiência acerca da prestação dos serviços públicos concedidos, menores serão os incentivos para a implementação de práticas de capturas e relações público-privada permeadas por atos de corrupção. Entre 1990 e 2021 o número de indivíduos que utilizam a internet no Brasil passou de zero para 81% da população. A administração pública federal já deu passos significativos para impulsionar a digitalização da economia, buscando oferecer diversos serviços públicos por meio de plataformas digitais. No entanto, conforme Ruess et al.(2021) as pesquisas sobre participação política on line (PPO) ainda são escassas, e por vezes, limitadas a aspectos relacionados a facilidades de acesso técnico. Dois fatos já foram observados: o primeiro é que os mais jovens tendem a ter maior confiança na prática da participação política on line, e a segunda é que diferentes plataformas atraem diferentes perfis de usuários. Além disso, comportamentos adotados on line, como marcar e encaminhar postagens sobre políticas públicas por exemplo, por vezes não apresentam um equivalente direto off line. A discussão sobre a definição do que são atos políticos por via digital ainda é muito ampla, mas os conceitos embrionários parecem estar relacionadas à capacidade de engendrar uma mudança social efetiva. Embora o debate acadêmico sobre a conceituação de OPP tenha sido intenso – particularmente sobre a distinção entre comportamentos políticos passivos e ativos – pouco se sabe sobre seu impacto nas abordagens empíricas do fenômeno. O que já se vislumbra em alguns estudos é que plataformas de mídias sociais estão intrinsecamente ligadas com as manifestações de participação on line. Os resultados das eleições de 2010 e 2014 nos EUA coincidiram fortemente com as estratégias de mídia social das campanhas.

Assim parece estar claro o grande poder de alcance e influencia que a PPO pode produzir na promoção de um ambiente mais ético, tanto na esfera da regulação quanto das contratações e políticas públicas em geral. Alguns economistas acreditam que uma retomada do crescimento econômico associado a investimentos diretos públicos, bem como, o abandono das políticas neoliberais implementadas a partir da década de 1990 seriam o primeiro passo para retomada de um ambiente social mais estável. No entanto, esse caminho parece conduzir ao acirramento do processo de polarização instaurado nos últimos anos, e por si só não resolveria o problema da captura ou da corrupção. Assim, parece uma atitude sábia buscar uma solução via caminho do meio, dando continuidade aos projetos inclusivos e redistributivos, ao mesmo tempo em que a atuação de regulação e fiscalização do Estado nos casos de concessão ao setor privado deve ser aprimorada. A ampliação da participação on line sobre os destinos dos recursos públicos pode conduzir a uma transformação institucional, capaz de levar a relação entre a liderança empresarial e as lutas sociais a um novo patamar. Mesmo em economias fortemente centralizadas como a China, foi preciso encontrar um caminho do meio entre a atividade estatal e as atividades e aspirações individuais privadas no livre mercado, em que pese não tratar-se de um regime democrático. O fato é que não se pode impedir a inovação, ela faz parte do lema jurássico ‘a vida sempre encontra um meio’, então o que nos resta é avançar na atividade de regulação a fim de melhor distribuir os ganhos entre os diversos agentes sociais.


Referências:

AKTOUF, Omar. Pós-globalização, administração e racionalidade econômica. A Síndrome do Avestruz. São Paulo: Atlas, 2004.

CAGÉ, Julia. The price of democracy. How money shapes politics and what to do about it. Cambridge,Massachusetts, London, England: Harvard University Press: 2020.

CGU-Controladoria Geral da União, Revista da CGU, Brasilia/DF, out, 2007. Disponível em https://repositorio.cgu.gov.br/bitstream/1/34468/10/V2.n2_Democracia.pdf

GIANNETTI, Eduardo. Autoengano. Companhia de Bolso:2005.

HOBSBAWM, Eric. A Revolução Francesa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002.

PIKETTY, Thomas. Às urnas cidadãos. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2017.

RUESS, Christina et al. Participação política online: a evolução de um conceito

Disponível em https://www.researchgate.net/profile/Christian-Hoffmann-14/publication/357176371_Online_political_participation_the_evolution_of_a_concept/links/61dc12b93a192d2c8aee01e7/Online-political-participation-the-evolution-of-a-concept.pdf

SCHUMPETER Joseph A. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1961.

STIGLER, George J. The theory of Economic Regulation. Bell Journal of Economics and Management Science, 1971.

WORLD BANK. Individuals using the Internet (% of population). Disponível em https://data.worldbank.org/indicator/IT.NET.USER.ZS?locations=BR

A importância do contrato de vesting na retenção de colaboradores estratégicos

André Santa Cruz & Ronan Santos

Com a garantia gradual aos empregados da propriedade de ações ou quotas da sociedade empresária, o contrato de opção de compra de participação societária promove o comprometimento e a visão de sócio do colaborador.

1. Por que o Vesting é importante para as empresas inovadoras?

As dificuldades em contratar e treinar colaboradores para uma empresa são amplamente conhecidas. Os empreendedores brasileiros sofrem, há muito tempo, com a escassez de mão de obra qualificada.

No âmbito das startups, essa caça aos talentos é ainda mais difícil, dado que ideias disruptivas costumam demandar alta capacidade técnica para saírem do papel. Ao mesmo tempo, pessoas competentes costumam aceitar uma proposta de trabalho cuja remuneração pareça atrativa.

Além disso, há uma prospecção de talentos feita, inclusive, a profissionais que já estão empregados. Portanto, é necessário montar a equipe com critério. Ao detectar um profissional de extrema importância e compatível com a visão dos sócios da empresa, é possível se utilizar o contrato de vesting para manter o colaborador-chave nela.

Trata-se de uma prática antes restrita a grandes companhias, mas que agora está se difundindo por todo o ambiente empresarial. Neste artigo, explicaremos o papel do vesting na atração e retenção de colaboradores estratégicos.

2. O que é o contrato de vesting?

O vesting consiste na venda de participação societária ao colaborador ao longo de determinado prazo, condicionada ao cumprimento de determinadas metas. Confere-se ao colaborador a opção de comprar as ações ou quotas por determinado preço, sob condições de desempenho e de tempo[1]. As partes acordam que haverá uma venda das quotas/ações da sociedade empresária, de maneira gradual e progressiva, com base em critérios específicos de produtividade[2].

No contrato de vesting, o empresário oferece a perspectiva de crescimento, e o funcionário faz jus a essa confiança, com um trabalho que se torna mais estratégico, uma vez que a visão de sócio, tão desejada pelos empreendedores em seus times, já se faz presente. Trata-se de uma relação de ganhos mútuos.

A previsão legal das chamadas stock options está no art. 168, §3°, da Lei das Sociedades Anônimas, que versa sobre o “plano de opção de compra de ações”, que pode ser implementado desde que a companhia o faça dentro dos limites do capital autorizado. Apesar de o plano de stock options estar previsto na Lei das S/A, não há impedimento à sua aplicação nas sociedades limitadas, desde que se observem as peculiaridades de cada tipo societário.

Isso porque o art. 1.055, §2°, do Código Civil veda a contribuição realizada diretamente em serviços. Contudo, nada impede que os créditos decorrentes da prestação desses serviços sejam usados para integralização de capital.

Existem duas formas de vesting: o tradicional (em que a participação aumenta de acordo com o tempo e as metas) e o invertido (em que a participação começa cheia e pode ser recomprada pela startup se os objetivos não forem alcançados). O primeiro tipo costuma ser mais utilizado, já que tende a dar mais incentivo ao colaborador, cujo esforço terá de ser contínuo e crescente para a obtenção de maiores recompensas. Aqui entra a importância de um mecanismo fundamental: a cláusula Cliff.

3. Cláusula Cliff

Um dos maiores problemas do contrato de vesting diz respeito ao interesse do colaborador em atender às expectativas e prestar um serviço de qualidade satisfatória. Para garantir que os objetivos acima sejam cumpridos, a cláusula Cliff estabelece um período de carência (1 ano, em geral) depois do qual o colaborador, cumpridas as condições estipuladas no contrato, terá o direito de iniciar a aquisição das ações/quotas[3].

Se o funcionário for demitido nesse período, ele não terá direito ao pagamento das quotas/ações, uma vez que detinha apenas expectativa de direito à aquisição das quotas (como explicaremos logo mais à frente). Esse período de teste é crucial para sanar os possíveis erros de percepção dos sócios sobre o colaborador.

4. Diferença entre vesting e stock option

As stock options são opções de compra de ações ou quotas. Nesse sentido, podem ser oferecidas a qualquer um que queira se tornar sócio e, por algum motivo, não possa adquirir a participação imediatamente. A stock option, portanto, é mais ampla e tem suas condições negociadas entre as partes. Já o vesting é uma espécie de stock option. Leva esse nome por causa da aquisição gradual das quotas ou ações, que são “vestidas” pelo colaborador. Está inserido dentro de uma relação de emprego ou de trabalho, especificamente.

5. Pontos de atenção na hora de elaborar o contrato de vesting

Na elaboração e execução do vesting, alguns pontos de atenção precisam ser considerados. Trataremos, nos tópicos a seguir, de cada um deles. É importante analisá-los não apenas antes da formação do contrato de vesting, mas principalmente durante o prazo de aquisição das ações ou quotas e depois dele (haja vista a futura relação societária).

5.1. Aspecto Trabalhista

O primeiro ponto de atenção envolve a parte trabalhista. É preciso que haja a efetiva compra das quotas/ações, isto é, que se assuma efetivamente o risco da atividade econômica[4]. Caso contrário, haverá a caracterização salarial da quantia, com o pagamento dos respectivos consectários legais. O preço tem de ser mais vantajoso do que o valor de mercado, mas não deve ser ínfimo, sob risco de ser tido por fraude à lei[5].

Ainda dentro do âmbito trabalhista, a questão da extinção do contrato de trabalho ou de prestação de serviços precisa estar detalhada no vesting. É preciso determinar o que ocorre quando o colaborador é demitido ou pede para sair antes de obter as primeiras ações/quotas.

O Tribunal Superior do Trabalho entende que, se ainda não houve a aquisição, não será devida indenização. Ou seja, a cláusula que prevê a perda do direito de adquirir as quotas ou ações pelo empregado demitido antes do fim do prazo de carência é lícita[6]. Isso porque ainda se trata de mera expectativa de direito.

É importante atentar também para os fundamentos da demissão quando o fim do período de carência está próximo. Isso porque os tribunais podem interpretar que houve má-fé do empresário. Em outras palavras: pode-se entender que o empreendedor estaria burlando o vesting, frustrando o implemento da condição para que o colaborador adquira as quotas ou ações[7].

O empregador ou contratante deve fundamentar, mesmo que de forma mínima, a dispensa do colaborador. Primeiro, tem-se que deixar claro no contrato de vesting os deveres daquele que vai adquirir as quotas ou ações e estabelecer penalidades pelo descumprimento – a demissão pode ser uma delas. Por fim, cabe documentar as razões para o desligamento daquele funcionário.

Convém prever, ainda, a dissolução parcial da sociedade em caso de demissão do colaborador após o período de carência. Deve-se computar, no cálculo dos haveres, os valores a título de rescisão ou de indenização, a depender do que motivou a saída[8].

Por fim, a determinação das metas também precisa de cuidado, para que não se atribua natureza trabalhista à opção de compra. As metas devem vincular-se não ao desempenho individual do colaborador, mas ao faturamento, expansão da carteira de clientes, captação de investimentos etc.

5.2. Aspecto Tributário

Outro ponto de atenção está no campo tributário. Caso a quota/ação seja adquirida a custo zero, sua natureza será remuneratória e incidirão as alíquotas do IRPF, até 27,5%. Caso sua natureza seja mercantil, a opção de compra será tributada nas alíquotas entre 15% e 22,5%. Ademais, uma vez que a sua natureza seja mercantil, não haverá a incidência de contribuição previdenciária. Esse é o entendimento do Judiciário[9] e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais[10].

5.3. Aspecto societário

Por último, mas não menos importante, o aspecto societário. É preciso saber o quanto do percentual será destinado para o vesting, de forma que não haja uma diluição prejudicial aos sócios fundadores. Também se deve analisar o perfil da pessoa que será beneficiada pelo vesting, a fim de evitar problemas.

A redação de um bom acordo de sócios, com a previsão de cláusulas para resolução de conflitos societários, proibição de venda a terceiros e opção de compra (call option) no caso de demissão. Nesse caso, você também pode variar os critérios, conforme a dispensa tenha sido com justa causa ou sem justa causa.

Aliás, é importante que o contrato de vesting contenha cláusula que vincule o colaborador ao acordo existente ou futuro. Desse modo, as expectativas de todos os envolvidos estarão alinhadas. Por exemplo, caso seja estabelecida uma cláusula de não concorrência, será necessário estabelecer a sua abrangência em termos de segmento de mercado, duração, territórios (em negócios que dependam de uma base geográfica). Caso contrário, há um grande risco de esse dispositivo ser afastado pelo Poder Judiciário[11].

6. Conclusão

Reter talentos é fundamental. Num contexto de ascensão das startups, cujas soluções disruptivas exigem alta competência técnica, o empresário não pode se dar ao luxo de perder uma peça-chave. Por isso, o contrato de vesting se torna um mecanismo imprescindível para atrair e reter talentos para todas as sociedades empresárias. Atendidas as peculiaridades que envolvem essa modalidade contratual, ambas as partes só têm a ganhar.


[1] OLIVEIRA, Fabricio Vasconcelos de; RAMALHO, Amanda Maia. O Contrato de Vesting. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n. 69, pp. 183  200, Jul/Dec. 2016

[2] OLIVEIRA, Fabricio Vasconcelos de; RAMALHO, Amanda Maia. O Contrato de Vesting. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n. 69, pp. 183  200, Jul/Dec. 2016, p.184.

[3] POLLI, Marina. Vesting: Inovação Contratual Popularizada pelas Startups. In: MORETTI, Eduardo; OLIVEIRA, Leandro Antônio Godoy. Startups: aspectos jurídicos relevantes. 2. Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2019, p. 130

[4] CLT, Art. 2º – Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

[5] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da validade – 22. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019 p.108 e seguintes.

[6] ARR-2843-80.2011.5.02.0030, 8ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 20/11/2015

[7] Código Civil, Art. 129. Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.

[8] OLIVEIRA, Fabricio Vasconcelos de; RAMALHO, Amanda Maia. O Contrato de Vesting. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n. 69, pp. 183  200, Jul/Dec. 2016, p.194.

[9] Processo: ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL / SP 5009539-20.2017.4.03.6100, Relator(a) Desembargador Federal OTÁVIO PEIXOTO JÚNIOR, Órgão Julgador: 2ª Turma, Data do Julgamento: 10/01/2023, Data da Publicação/Fonte Intimação via sistema DATA: 17/01/2023

[10] Acórdão nº 2402-011.012  –  2ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 2ª Turma Ordinária.

[11] TJSP;  Apelação Cível 1005903-92.2020.8.26.0100; Relator (a): Maurício Pessoa; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro Central Cível – 2ª VARA EMPRESARIAL E CONFLITOS DE ARBITRAGEM; Data do Julgamento: 16/06/2021; Data de Registro: 16/06/2021


André Santa Cruz é advogado inscrito na OAB/DF, sócio do escritório Agi e Santa Cruz Advocacia, doutor em Direito Comercial pela PUC-SP, professor de Direito Empresarial do Centro Universitário IESB, em Brasília, e ex-diretor do DREI – Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração.

Ronan Santos é advogado inscrito na OAB/DF, sócio do escritório Agi e Santa Cruz Advocacia, graduado em Direito pelo Centro Universitário IESB, em Brasília, e pós-graduando em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.


Onde reside o conhecimento do Cade? 

Maxwell de Alencar Meneses

No tempo da sociedade do conhecimento, com busca incessante por informação, essa pergunta se faz imperiosa. Ao invés de responde-la diretamente a intenção é perscrutar o tema e estimular o pensamento crítico a respeito de questões conexas. De antemão ressalvando que considerações aqui expressadas não constituem opinião de nenhuma instituição em particular, nem tampouco daquele que as escreve.  

Trata-se apenas de cogitações e testes de cenários a fim de compreender e explorar realidades complexas, como as associadas ao tema “conhecimento”. Mais do que nunca, o “tudo que sei é que nada sei” de Sócrates se faz mister. 

Para que seja possível minimamente tentar endereçar a pergunta que intitula o artigo, que faz menção a uma busca por algo, no caso o conhecimento do Cade, é necessário tecer um retrato falado de quem se busca, para que seja então possível seu reconhecimento, sendo assim, cabe aqui uma pequena digressão com disposições preliminares, no sentido de conceituar alguns elementos essenciais associados ao termo “conhecimento” no âmbito desse escrito.  

Começando pelo elemento básico do conhecimento, que aqui se chamará “dado”.  Define-se como partícula elementar capaz de carregar atributo único acerca de algo ou de si mesmo. Informação, por sua vez, seria um objeto composto construído cumulativamente pela agregação organizada de um conjunto de dados, até o limite de sua transmutação à condição de um ente portador de valor utilizável.  

De maneira semelhante, o conhecimento advém do agregado de informações sistematizadas a respeito de um determinado tema, que envolve necessariamente o processo de interação íntima com essas informações por uma pessoa humana ou, de modo emulado por um robô, até o ponto de constituírem parte indissociável dessa pessoa natural ou artificial. 

Em uma escala bem mais elevada, seria definida a “sabedoria” como a absorção, por meio de um contato experimental, de conhecimentos múltiplos em um período abrangente o suficiente para habilitar a capacidade de produzir outros conhecimentos inéditos e de desfazer conhecimentos errôneos. 

O que justificaria o quão arriscado são as nomeações de pessoas sem a sabedoria necessária. Talvez isso tenha ocorrido com Lina Khan, que, depois de assumir o FTC, sofreu internamente uma queda da satisfação geral de um terço do seu próprio pessoal. Em pesquisa realizada na agência americana, que antes apontava que 83% dos seus colaboradores detinham elevado nível de respeito pelos líderes seniores, após a chegada de Lina, esse índice caiu para 49%i.  

Em outras palavras, “it’s all about people” (é tudo a respeito de gente), o que traz à lembrança de que não é nada segura a comida de restaurantes em que os funcionários estão insatisfeitos. Além disso, explica a menção a muitas pessoas feita aqui, a começar por Sócrates, oferecendo sugestões antecipadas para os possíveis rumos da resposta à discussão central do artigo. 

Em relação ao Cade, que foi eleito em 2022 como um dos melhores lugares para trabalhar, sendo o único na Administração Pública, é possível notar um verdadeiro progresso nos conceitos estilizados de conhecimento aqui experimentados, especialmente considerando a contínua maturação institucional à qual o Conselho está submetido, oferecendo uma infinidade de oportunidades para a construção de novos conhecimentos.  

Nesse contexto, o que efetivamente estimulou a abordagem desse tema foi uma dessas experiências inefáveis de geração de conhecimento enfrentadas pelo Cade. Tudo se iniciou pelo fim, quando recentemente foi concluído o caso Nestlé Garoto, fruto de belíssimo trabalho da atual Procuradora Geral do Cade, Dra. Juliana Domingues, colunista do WebAdvocacy. Tema rico merecedor de muitos estudos, mas que foi apenas o gatilho para algumas reflexões visitadas nesse texto.  

Na sessão de julgamento em que foi apresentada a proposta de acordo para encerramento do caso iniciado em 2002, pretérito à atual lei de defesa da concorrência, algo da história do caso foi lembrado tanto pelo Cade quanto por representantes das partes. De modo emotivo e, para além da sessão, foi inevitável pensar em quantos advogados, economistas, autoridades, técnicos, procuradores, profissionais de variadas áreas e composições do conselho vieram e partiram, deixando alguma parcela de contribuição durante esse tempo. 

Despertando aos nascidos no século passado, que mais conscientemente vivenciaram esse período, divagações a respeito de quanto conhecimento foi empregado, gerado e para onde teria ido esse conhecimento. As fotos de ex-autoridades do Cade hoje existentes na sede do órgão apontam também nesse sentido.  

Mesmo quem não tem sua foto na parede, mas passou pelo Cade, lembra com saudosismo e alguma dose de nostalgia pelas experiências, contribuições e aprendizado. Ainda assim, se essas fotos falassem e pudessem compartilhar seus conhecimentos acumulados, se pudessem ser entrevistadas e responder a dúvidas de quem chegou por agora, talvez muitas rodas não precisariam ser reinventadas. 

De fato, já seria possível fazê-lo. A exemplo de museus que se utilizam de realidade aumentada para propiciar interatividade, ou pela aplicação da ubiquidade da internet das coisas, que habilita que objetos sejam emissores de sinais digitais. Tecnologias perfeitamente capazes de tornar possível essa entrevista com os “pais” do antitruste.  

A quantidade de informação hoje disponível é notadamente muito grande e de certo modo suficiente para suprir de assunto esse diálogo. Até pelo contrário, essa magnitude de informação pode ser na realidade um obstáculo para seu real aproveitamento. 

Esse volume estupendo torna-se uma benção e uma maldição. O malogro está na condição de que muito conteúdo é um modo de não se ter nenhum. O overload de informações é bem conhecido como forma de atrapalhar investigações, por intermédio do fornecimento de uma quantidade massiva de documentos.  

As máquinas também sofrem, visto que o flooding, o Distributed Denial of Service (DDoS) são técnicas clássicas de causar indisponibilidade de serviços ou servidores, por intermédio da sobrecarga das interfaces com acessos distribuídos, ou com uma grande quantidade de dados. 

O Rei Salomão, renomado como o mais sábio e abastado, possivelmente um dos raros estudiosos a combinar esses dois elementos – conhecimento e riqueza – antecipou algo semelhante há milhares de anos, quando aconselhou: “Meu filho, cuidado, pois não há limite para a quantidade de livros que se produz; o estudo excessivo sobrecarrega o corpo”.  

Os livros são exemplos de documentos contenedores de informações, das quais especula-se aqui, e também são um meio de comunicação com as pessoas de outrora e da atualidade. No entanto, quando em uma quantidade e finalidade não adequadamente sistematizada, são um método de sobrecarga de informação, à semelhança dos ataques cibernéticos citados, mas que também significam outras sobrecargas preocupantes, como peso e espaço, que até explicaria em parte o sucesso do Kindle da Amazon.  

Dentro desse contexto, é compreensível que o Cade tenha implementado um sistema de gestão de biblioteca moderno, utilizando a tecnologia de RFID (identificação por radiofrequência), que pode ser associada à mencionada internet das coisas. Fruto do belíssimo trabalho da Bibliotecária Deborah Lins, que também contribuiu para a criação da própria Biblioteca Agamenon Magalhães, que possui o nome do pai do Antitruste no Brasil, alguém outrora tão combatido pelo consórcio de mídia de seu próprio tempo.  

Delineando a esse ponto de modo mais direto onde está o conhecimento do Cade, destaca-se do acervo da Biblioteca, livro de Ednei Silva, Coordenador-Geral de Análise Antitruste, que versa sobre controle de concentrações envolvendo fundo de investimento no Brasil, que como diz Vinicius de Carvalho, ex-presidente do Cade, trata-se de um dos temas mais polêmicos e difíceis da política de defesa da concorrência. 

A questão a respeito de onde está o conhecimento aponta também para a relevância da organização da informação e da habilidade de localizar o conhecimento necessário tempestivamente. Com a recente pane no sistema elétrico, torna-se interessante reforçar esse conceito em contextos como o do ONS, o Operador Nacional do Sistema Elétrico.  

Apesar de toda a tecnologia à disposição em seu centro de controle sito no SIA, em Brasília, semelhante aos centros de controle retratados em filmes sobre a NASA, o ONS ainda recorre a manuais de procedimentos de rede, volumes de considerável tamanho, que precisam ser mantidos constantemente atualizados e são de vital importância em situações de instabilidade. De tal forma que, esses manuais seriam inúteis se não estivessem impressos e acessíveis em momentos de crise. 

Ainda acerca do acesso ao conhecimento, é interessante notar ser possível hoje alimentar algumas ferramentas na nuvem com arquivos pdf e fazer perguntas a respeito do conteúdo, como na entrevista imaginada. No entanto, essa facilidade de nada adianta se não for possível localizar o livro ou o arquivo. Tal é a importância dessa questão, que levou a criação do Google Search Appliance, que foi um investimento da gigante de buscas no sentido de fornecer para as organizações uma forma de indexar automaticamente seus documentos.  

Tratava-se de um servidor com tecnologia Google embarcada, que era montado no Data Center do interessado e passava a indexar milhões de documentos corporativos. O problema passou a ser achar até o que não devia. Provavelmente, o motivo do produto vir a ser descontinuado brevemente, um indicativo da necessidade da intervenção humana na produção de conhecimento. 

Nesse sentido, O Departamento de Estudos Econômicos do Cade, proativo como de costume, produziu em 2020 o documento de trabalho nº 006/2020 com o subtítulo “Passado, Presente e Futuro”. Em síntese, trata-se de uma apresentação da história do Departamento, compilando em forma de conhecimento os anos de produção de estudos, pesquisas e pareceres de alto nível.  

Conhecimento responsável por definir rumos do antitruste no Brasil, dos quais destacam-se a Resolução nº 24/2019 do Cade, que trata do Gun Jumping, e o desenvolvimento de filtros econômicos para a detecção de cartéis já aplicados no mercado de venda de combustíveis. Com destaque a atuação do Economista-Chefe Luiz Esteves, colunista da Webadvocay, bastante profícuo na produção de notas técnicas durante sua gestão (2014-2016). 

Outra fonte de conhecimento para o Cade é a atuação dos advogados das partes, como bem ilustrado no recente artigo do ex-conselheiro do Cade, Mauro Grinberg, publicado no WebAdvocacy. Nesse artigo, ele destaca a significativa relevância da participação dos advogados perante o Cade, visto que desempenham um papel fundamental no processo de elaboração das decisões administrativas, cumprindo um compromisso público de contribuir para a construção dessas resoluções. 

As decisões que ao longo do tempo vêm moldando a jurisprudência do Cade, contribuindo para a formação de um conhecimento coletivo sobre diversos mercados, estavam, até recentemente, disponíveis em volumes intermináveis em papel. Como discutido anteriormente, devido às características inerentes desse formato, tais volumes apresentavam barreiras naturais de acesso, como as dificuldades e custos associados ao compartilhamento.  

No entanto, essa questão foi solucionada por meio da bem-sucedida iniciativa do Cade sem papel, que foi liderada por Mariana Rosa. Esse avanço se mostrou crucial durante a recente pandemia e, quando comparado com instituições governamentais de países como os EUA, coloca-nos em uma posição vantajosa, já que tais instituições não possuem a digitalização presente no caso do Cade. 

Além disso, à semelhança da natureza cumulativa do conhecimento mencionada no início, durante a gestão do ex-presidente Alexandre Barreto, o Cade implementou um sistema moderno de consulta de jurisprudência. Esse sistema é de importância fundamental para abordar as questões de acesso e garantir a previsibilidade das decisões da autarquia, um compromisso atentamente perseguido pelo corpo técnico do Conselho. 

A transparência e a participatividade que caracterizam a formação do conhecimento do Cade foram bem representadas durante a época da abertura de um inquérito administrativo para investigar possíveis práticas anticompetitivas no mercado financeiro e nos meios de pagamento eletrônico. Especificamente, o enfoque estava nos efeitos resultantes da verticalização dentro desse setor. Uma audiência pública, organizada pelo Cade e intitulada “Estrutura do Setor Financeiro Nacional: Impacto da Verticalização sobre a Concorrência”, proporcionou uma plataforma para uma ampla gama de perspectivas sobre as razões subjacentes ao custo elevado da intermediação financeira e dos serviços bancários e de pagamento no país. 

Nessa audiência pública, variadas visões foram apresentadas, abordando as possíveis causas da onerosidade associada aos serviços financeiros. Isso destacou a importância de analisar profundamente os efeitos da verticalização sobre a concorrência no setor financeiro, considerando a diversidade de opiniões e contribuições. Através desse processo participativo, o Cade demonstrou seu comprometimento com a transparência e a inclusão, permitindo que múltiplos pontos de vista fossem considerados na análise das práticas anticompetitivas e de suas implicações para os consumidores e para a economia em geral. 

A diversidade de pensamento e conhecimento, está presente em projeto de Elvino Mendonça, ex-conselheiro do Cade, pai da Webadvocacy, esta plataforma online que se destaca por produzir e disseminar conteúdo de excelente qualidade relacionado às áreas de direito e economia. Essa iniciativa representa de maneira notável outro âmbito de conhecimento do Cade: as comunidades online dedicadas à difusão de cursos, estudos e discussões. Muitos colunistas que fazem ou fizeram parte do Cade participam ativamente dessas comunidades, contribuindo para a manutenção de um ambiente de troca de conhecimentos. 

A presença de ex-membros do Cade nesses fóruns oferece uma oportunidade única para a comunidade antitruste. Ao compartilharem suas perspectivas e experiências, essas autoridades continuam a enriquecer o conjunto de conhecimentos disponíveis. Isso não apenas sustenta o nível atual de entendimento, mas também expande as perspectivas para abranger outras realidades e contextos. 

Dr. Elvino, como um ex-conselheiro do Cade, exemplifica a importância de indivíduos que, após ocuparem posições relevantes no campo antitruste, continuam a contribuir ativamente para a educação e o diálogo construtivo. A Webadvocacy e outras iniciativas semelhantes desempenham um papel vital na disseminação do conhecimento, na promoção do debate e na capacitação contínua de profissionais e estudantes interessados em direito e economia, proporcionando um ambiente de aprendizado rico e dinâmico, demonstrando o caráter de um ecossistema de defesa da concorrência que o Cade construiu ao logo dos anos. 

Em fechamento, nesse ponto, percebe-se claramente que o Cade, mesmo sofrendo com o turnover de pessoal como qualquer organização moderna, conseguiu elaborar uma série de instâncias e repositórios distribuídos e autogerenciáveis. Esses repositórios se retroalimentam de conhecimento antitruste, ventilando e engrandecendo o próprio conhecimento do Órgão. Esse conhecimento não se dissipa facilmente. Ao contrário das estruturas feudais de conhecimento acadêmico em que os nobres, detentores de títulos, se encastelam, como ocorria nos mosteiros do século XIV, o Cade empoderou cada servidor, colaborador, autoridade e a sociedade a ser um produtor de conteúdo. Esse conteúdo, ao ser continuamente produzido, não se permite ser esquecido. O conhecimento do Cade está hoje em toda parte. 


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Código Aduaneiro do Mercosul – Noções

Fabio Luiz Gomes

Objetiva-se com a instituição de um Código Aduaneiro do Mercosul conferir maior segurança jurídica e uniformizar procedimentos de modo em que facilite as transações intracomunitárias de bens e serviços aos contribuintes e empresas.

A utilização da tecnologia deve ser cada vez mais implementada pelas administrações aduaneiras, não só para tornar mais célere os procedimentos e com isso facilitar os deslocamentos dentro do território dos Estados partes do Mercosul, com isso ao uniformizar os procedimentos será conferida a maior transparência na prestação de serviços.

A aplicação do princípio da eficiência mostra-se entrelaçado com o trinômio: simplificação-tecnologia-qualificação, portanto, a qualificação dos funcionários aduaneiros completa a prestação de serviços de forma eficiente.

Objetiva-se, portanto, estabelecer procedimentos comuns, bem como a utilização dos mesmos códigos aduaneiros, a cooperação administrativa entre as autoridades aduaneiras dos Estados partes do Mercosul.

No aspecto territorial o CAM é aplicado nos territórios dos Estados partes do Mercosul, e utilizados nas relações dos Estados partes com Estados terceiros, ou nas relações do Bloco Mercosul com terceiros.[1]

Portanto, o território aduaneiro dos Estados partes do Mercosul compreendem todo território de cada Estado parte, inclusive o mar territorial, as águas territoriais e o espaço aéreo dos quatro Estados partes, isto é, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

Compreendendo a atribuição da atuação das autoridades aduaneiras de acordo com a legislação de cada Estado parte.

Deve-se destacar que a cooperação e comunicação entre as autoridades aduaneiras[2] é imprescindível para o bom funcionamento do setor aduaneiros entre os Estados partes.

Constata-se os portos ou aeroportos onde serão processados o controle e a conversão monetária, especificar as disposições processuais para fixar o valor aduaneiro das mercadorias.

Dessa forma, o legislador do CAM estabeleceu três zonas aduaneiras: zona primária aduaneira[3], zona secundária aduaneira[4] e zona de vigilância aduaneira especial[5].

Destaca-se, a zona primária, a atribuição da autoridade aduaneira a área terrestre ou aquática, contínua ou descontínua, nos portos alfandegados; a área terrestre, nos aeroportos alfandegados; e a área terrestre, que compreende os pontos de fronteira alfandegados.

Em conclusão, o Estado parte demarca através da autoridade aduaneira local os pontos com soberania para passagem de fronteira.

Destaca-se, na zona secundária, uma natureza residual, isto é, o primeiro critério para delimitar o que é zona secundária é o restante do território que não for zona primária, portanto, não tiver sido demarcado como zona primária, aqui incluindo residualmente a área do território nacional, as águas e espaço aéreo.

Observa-se que no Brasil o seu desenvolvimento partiu das faixas costeiras, portanto, os portos marítimos são os mais comuns, portanto, as importações e exportações passam em grande parte por esses portos.

Tem-se como os principais portos do Mercosul: a) Porto de Santos – Brasil; b) Porto de Buenos Aires – Argentina; c) Porto de Assunção – Paraguai e d) Porto de Montevidéu – Uruguai.

Em 2021, segundo a Comisión Económica para América Latina y el CaribeCEPAL, o Mercosul aumentaram suas exportações em 35,6%, impulsionada pelos saltos dos preços das matérias-primas. Assim como as importações, impulsionado pela recuperação da atividade econômica dos Estados partes do Mercosul.[6]

Por último, também em 2021, o Mercosul manteve uma posição superavitária de 56,8 bilhões de dólares.[7]

Portanto, o desenvolvimento aduaneiro mostrou-se oportuno e que exige um desenvolvimento constante.

Consubstanciando também com grande relevância os portos fluviais que se desenvolveram ao longo dos rios do Brasil e os Estados partes do Mercosul.

Posto isto, os Rios Tietê, Paraná, Paraguai, Uruguai e seus afluentes podem representar brevemente o sistema hidroviário do Mercosul.

Com esse desenvolvimento, o setor hidroviário do Mercosul abrange 309 Municípios somente no Brasil.

Conclusão

Observa-se que a codificação aduaneira é essencial para o prosseguimento da instituição de um Mercado Interno no Mercosul, portanto, não só os procedimentos, mas as necessidades de circulação de bens e serviços impõe uma reformulação administrativa, adaptada aos desafios da fraude e evasão fiscal.

O desenvolvimento do comércio eletrônico exige das administração fiscal dos Estados dos do mundo contemporâneo.

Constata-se a necessidade da adoção de um código aduaneiro para permitir a evolução do processo de integração do Mercosul.


[1] Art. 1º, 4 do CAM.

[2] Art. 12 do CAM.

[3] Art. 4º do CAM.

[4] Art. 5º do CAM.

[5] Art. 6º do CAM.

[6]https://www.cepal.org/pt-br/noticias/exportacoes-mercosul-cresceram-2021-mas-os-volumes-permaneceram-fracos-pouca-diversificacao

[7]https://www.cepal.org/pt-br/noticias/exportacoes-mercosul-cresceram-2021-mas-os-volumes-permaneceram-fracos-pouca-diversificacao


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Remuneração de Capital no Setor de Distribuição de Energia Elétrica

Prorrogação das Concessões e Investigação de Excedentes Econômicos

Katia Rocha

Recentemente, o Ministério de Minas e Energia lançou a Consulta Pública 152 (CP) sobre diretrizes para prorrogação (e/ou licitação) das concessões de distribuição de energia elétrica com vencimentos entre 2025 a 2031. Correspondem a vinte concessões que juntas atendem 62% do mercado de distribuição do país.

A CP acontece em um momento crítico para o setor, com desafios estruturais diversos no contexto de modernização do setor elétrico, objeto de amplo debate desde 2017, cujo objetivo consiste no fornecimento de energia ao menor custo, considerando a abertura de mercado (possibilidade do consumidor regulado poder escolher seu fornecedor), sustentabilidade da expansão e eficiência na alocação de custos e riscos.

Atualmente, encontram-se em análise no Legislativo o PL 414 de 2021 e PL 1917 de 2015, com possibilidades do Governo apresentar um novo projeto para modernização do setor elétrico ainda esse ano. Será necessário endereçar os diversos temas elencados no último GT Modernização do Setor Elétrico , como a racionalização de encargos e subsídios, descontos de fontes incentivadas, expansão da confiabilidade do sistema, garantia do suprimento que onera sobremaneira o consumidor regulado, sinais econômicos inadequados que distorcem decisões de migração para o mercado livre, inserção de novas tecnologias, separação de lastro/energia e fio/energia, sustentabilidade dos serviços de distribuição, mecanismos de formação de preço, entre outros.

A abertura gradativa de mercado, com cronograma previsto para 2024, 2026 e 2028 a depender no nível de consumo e tensão, aliada às possibilidades de serviços ofertados a partir do surgimento de novas tecnologias de geração e armazenamento, como os REDs[1], impactam diretamente os serviços e equilíbrio econômico-financeiro das distribuidoras. Com efeito, temos toda uma transição do sistema elétrico, predominantemente centralizado-unidirecional, para um sistema híbrido-bidirecional, com aumentos significativos na complexidade do setor, e adaptações necessárias no planejamento e arcabouço regulatório, como destacado no próprio Plano Nacional de Energia – 2050.

A Nota Técnica nº 14/2023/SAER/SE que apresenta as diretrizes da CP, caminha na direção da prorrogação das concessões que atendam a requisitos mínimos de qualidade na prestação do serviço (indicadores de frequência e duração média das interrupções), e na boa gestão econômico-financeira da concessão (índice de endividamento amparado na geração de caixa operacional). Mantém o modelo de regulação por incentivos, que impulsiona às distribuidoras na busca constante por maior eficiência na operação e investimentos, com ganhos de qualidade recompensados, como recomendado pelo Utility for the Future[2].

A opção pela prorrogação apresenta alguns condicionantes. O mais debatido no âmbito da CP trata sobre investigação acerca de eventual excedente econômico, objeto deste artigo. O racional recai na possibilidade de a prorrogação ensejar ganhos potenciais excedentes aos concessionários, ao contrário das licitações, onde tal ganho seria devidamente extraído via leilões competitivos. Sugere incorporação dos ganhos excedentes na modicidade tarifária ou em contrapartidas sociais.

Observou-se, nas contribuições à CP, argumentos contrários a essa lógica, uma vez que, o modelo regulatório vigente, nos moldes de regulação por incentivo (Price Cap), já capturaria os eventuais excedentes econômicos no próprio processo de revisão periódica, com o reposicionamento tarifário e estabelecimento do Fator X (eficiência/produtividade).

No entanto, a proposta da CP nos motiva a analisar a evolução temporal da rentabilidade desse segmento no Brasil, bem como sua comparação com os mercados globais. Tal procedimento é essencial para qualquer atividade econômica, em especial, para o segmento regulado de distribuição de energia, setor estratégico que passará por profundas mudanças estruturais nos próximos anos.

Essa análise justifica-se, não apenas no sentido de mensurar potencias ganhos excedentes, mas como instrumento de avaliação do alinhamento da taxa regulatória de remuneração do capital com a remuneração real obtida pelo setor. Tal inferência se ampara no próprio contexto de modernização do setor elétrico, onde o processo de abertura de mercado e as novas tecnologias digitais e descentralizadas terminam por conduzir o segmento da distribuição a um novo desenho regulatório[3], com a necessária separação entre fio-energia (unbundling) e diversos aperfeiçoamentos na atividade do comercializador varejista, com necessidade crescente de investimentos, que dependem de adequada remuneração de capital.

A Remuneração do Capital Investido e o spread de Valor Agregado (ROIC – WACC)

O custo de capital de uma empresa regulada equivale à taxa de retorno adequada ao risco do setor em que se insere a empresa e respectivos serviços, de forma a promover a atratividade requerida aos investidores, assegurando a necessária qualidade e expansão do serviço. Essa taxa é responsável por remunerar todo o capital da empresa, incluindo o capital próprio (acionistas) e o capital de terceiros (credores)[4].

A ANEEL, em suas competências sobre regulação de tarifas, é o ente responsável pela definição e estimação da taxa regulatória de remuneração de capital no decorrer dos processos de revisão tarifária periódica. Para tal, utiliza modelos fundamentados de custo médio ponderado capital – WACC e de precificação de risco e retorno – CAPM.

Uma forma de se avaliar a rentabilidade econômica de uma empresa, ou seu lucro econômico excedente, consiste na comparação do seu custo de capital com a métrica de Retorno sobre Capital Investido – ROIC.

O ROIC é um indicador, calculado a partir de dados contábeis, muito utilizado em avaliação de empresas. Investiga a eficiência na alocação do capital em investimentos rentáveis. Representa métrica padrão, do tipo quanto maior, melhor, e relaciona o resultado operacional após impostos (numerador) à média anual do capital investido (denominador). Caracteriza, portanto, o lucro operacional sobre todo o capital da empresa, independentemente de sua estrutura de financiamento, facilitando eventuais comparações[5].

A comparação do ROIC de uma empresa com seu custo de capital (WACC nominal após impostos) revela se o capital investido está sendo empregado de maneira eficaz. Caso o ROIC seja, sistematicamente, superior ao custo de capital, a empresa está adicionando valor econômico. Caso contrário, não há remuneração adequada do capital e sim destruição de valor. A regra de bolso, adotada pelo mercado, considera desvios (spreads) superiores a 2% para concluir na direção de valor econômico adicionado.

Supondo que a taxa de remuneração regulatória estipulada pelo regulador (ajustada para taxa nominal) é boa proxy do custo de capital das distribuidoras, podemos investigar a rentabilidade do segmento e a respectiva aderência regulatória.

A Tabela 1 apresenta esse exercício para um universo não exaustivo de empresas concessionárias, disponível na base de dados Bloomberg. Para efeitos de comparação, os spreads de valor agregado para diferentes mercados globais são apresentados na Tabela 2.

Os resultados para Brasil sinalizam evidente desalinhamento do indicador médio de ROIC no período – média de 11.29%, com o custo de capital regulatório – média de 13.37% em termos nominais[6]. Um spread negativo de cerca de 2%, que se traduz nummodelo de negócio sem remuneração adequada, e tampouco estímulos para maiores e melhores investimentos[7].

Na comparação com mercados emergentes e globais, o setor apresenta certo grau de consolidação, com spreads de valor agregado próximo a zero (usual em setores maduros e regulados cuja remuneração se alinha ao custo de capital). É visível os impactos na Europa em 2022 decorrente dos altos preços de energia e gás, e em menor grau nos Estados Unidos. A tendência de spreads positivos acima de 2% para empresas americanas pode decorrer da grande liquidez global após a crise de 2008, de regimes regulatórios distintos (cost-plus), entre outras questões especificas ao país. 

Finalizo sublinhando a importância de estudos sobre rentabilidade econômica de setores regulados, em especial, do segmento distribuição, elo final de remuneração de toda cadeia. Tais avaliações são fundamentais no contexto de análise de impactos regulatórios, formulação de políticas públicas, que inclui revisão de subsídios ineficientes ou encargos crescentes, e liberalização de mercado. Ressalto que a liberação de mercado é a realidade em todos os países membros da OCDE, inclusive com separação vertical – legal, operacional e contábil, entre o setor de distribuição e de varejo. A agenda de modernização do setor elétrico tem de avançar.

Tabela 1: A Remuneração do Capital Investido no Setor de Distribuição Elétrica (ROIC)

Fonte: Bloomberg, * Despacho ANEEL Nº 829/2023 Memória de Cálculo, ** Estimado implicitamente via taxas referencias de swaps DI x PRE e DI x IPCA para quatro anos na B3.

Tabela 2 – Spread de valor Agregado (ROIC – WACC): Brasil x Mercado Global

Fonte: Bloomberg e Damodaran Online Data – EVA: https://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/New_Home_Page/dataarchived.html

Referências

Brealey, R.A., Myers, S.C. and Allen, F. (2011) Principles of Corporate Finance. 10th Edition, McGraw-Hill/Irwin, New York

Damodaran (2012). Investment Valuation: Tools and Techniques for Determining the Value of Any Asset. Willey Finance Book.

Dutra, J. (2023a). #Unbundling, a separação de fio e energia. IBRE.

Dutra, J. (2023b). Open Energy e a abertura do mercado de eletricidade. IBRE

Dutra, J. (2023c). Como desenvolver resiliência financeira nos mercados de eletricidade. IBRE.

GESEL (2021). Reflexões sobre impactos da Geração Distribuída no Mercado de Energia Elétrica do Brasil. TDSE 105 GESEL.

GESEL (2023a). Excedentes Econômicos e Sustentabilidade Econômico-Financeiro das Distribuidoras. Contribuição a CP 152/2023. GESEL.

GESEL (2023b). Experiências na União Europeia em relação às concessões de distribuição no setor elétrico”. TDSE 115 GESEL.

GESEL (2023c). Prorrogação das Concessões: Análise de indicadores de qualidade de atendimento das Distribuidoras de energia elétrica. TDSE 117 GESEL.

Utility for the Future. An MIT Energy Initiative response to an industry in transition. Massachusetts Institute of Technology. 2016.


[1] Os Recursos Energéticos Distribuídos – RED contemplam tecnologias como geração distribuída – GD, armazenamento de energia, veículos elétricos e estruturas de recarga, eficiência energética e gerenciamento pelo lado da demanda, permitindo papel mais ativo do consumidor tanto na geração, quanto na gestão do consumo da sua própria energia (fluxos bidirecionais), entre outros.

[2] O estudo do MIT avalia os impactos das novas tecnologias e modelos de negócio que estão moldando a evolução e transformação da indústria de eletricidade, com recomendações de regulação e planejamento.

[3] Ver Gesel (2021, 2023a, 2023b, 2023c) e Dutra (2023a, 2023b, 2023c).

[4] Brealey, R.A., Myers, S.C. and Allen, F. (2011) Principles of Corporate Finance. 10th Edition, McGraw-Hill/Irwin, New York.

[5] Ver Damodaran (2012).

[6] Ajustou-se o WACC regulatório real estipulado pela ANEEL para termos nominais via IPCA futuro implícito através das taxas referenciais de swaps DIXPRE e DIXIPCA na B3 para 4 anos à frente.

[7] Ressalto as devidas cautelas em eventuais comparações, seja entre empresas ou países, uma vez que a amostra apresenta elevado grau de dispersão e heterogeneidade, com agregações de países de diversos regimes regulatórios, composição da matriz elétrica e crises globais no período. Recomenda-se a análise da tendência, que possibilita suavizar fatores conjunturais – crises globais, fatores de liquidez e risco global – focando nos fatores estruturais de mercado – regulação, renda, desenho de mercado, matriz elétrica, etc.

* KATIA ROCHA. Técnica de Planejamento e Pesquisa IPEA. E-mail: katia.rocha@ipea.gov.br. As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Ipea.

Principais aspectos jurídicos do mútuo conversível em participação societária

Conheça um dos principais contratos utilizados no financiamento de startups, que se revela uma excelente opção para negócios em estágio inicial ou intermediário de crescimento.

André Santa Cruz, Ronan Santos & Matheus Ferraz

1.    Introdução

O tema do financiamento é um dos mais sensíveis para qualquer sociedade empresária. No começo, quando as despesas superam em muito as receitas, a palavra de ordem é sobrevivência. Nesse cenário, até que se atinja o ponto de equilíbrio (também chamado de breakeven[1]), o capital de terceiros garante a entrada e a manutenção de muitos novos empreendimentos no mercado.

Para a busca desse capital existem, basicamente, duas modalidades de captação de investimento: debt (dívida) ou equity (participação societária). Pensemos no processo de montagem de uma cafeteria, por exemplo. Para fazê-la funcionar, é preciso investir dinheiro. Pode-se tomar um empréstimo no banco (debt) ou convidar uma pessoa para ser sócia (equity).

Cada uma dessas formas tem um risco: se a escolha recair sobre a tomada de empréstimos, os obstáculos serão os juros altos e o risco das dívidas bancárias, sem contar os problemas com possíveis garantias, que em estágios iniciais de qualquer empresa costumam ser raras. Por outro lado, a entrada de um sócio logo no começo pode ocasionar dificuldades na tomada de decisões.

Com base na experiência estrangeira, entretanto, outras formas de obter capital para a estruturação de um negócio surgiram. A dívida conversível em participação é a principal delas.

As debêntures conversíveis em ações representam o exemplo mais emblemático. Ocorre que as sociedades limitadas (maioria esmagadora das sociedades empresárias constituídas no Brasil) não podem emiti-las. Diante disso, outra modalidade de contrato se popularizou: o mútuo conversível, um tipo de empréstimo que, cumpridas certas condições, faz do credor sócio.

2.            O que é o mútuo conversível?

A autonomia privada, princípio basilar do direito empresarial, permite que os agentes econômicos possam agir dentro da esfera que a lei não lhes proíbe. Nesse universo estão contidos os contratos atípicos, autorizados pelo art.425 do Código Civil[2]. Em geral, esses negócios jurídicos são misturas de outros negócios típicos, a exemplo do leasing, que combina locação com promessa de venda[3].

O mútuo conversível, na prática, é a junção de dois contratos em um só: o empréstimo de capital com a aquisição de participação societária. O credor empresta o dinheiro, com juros, do mesmo modo que uma instituição bancária faria, porém sob condições mais favoráveis, seja pelo fato de não exigir garantias, seja pelo objetivo principal de que a empresa dê certo. 

3.            Como funciona o mútuo conversível?

O mútuo conversível funciona da seguinte maneira: transfere-se o dinheiro a juros com determinado prazo, ao fim do qual o credor pode optar ou por receber o dinheiro de volta (corrigido e com juros) ou por se tornar sócio, transformando o valor do empréstimo em parte do capital social da sociedade empresária.

Trata-se de uma solução boa não só para as startups, que se beneficiam de um aporte associado a expertise (smart money), mas também para os investidores, cujo patrimônio fica a salvo em caso de insucesso. Embora atenda aos interesses das duas partes, a solução não é isenta de problemas.

4.            Pontos de atenção durante a execução do contrato de mútuo conversível

4.1 Fiscalização no mútuo conversível

O primeiro e mais óbvio problema do mútuo conversível é o seguinte: como garantir a correta aplicação dos recursos sem o risco de ser caracterizado como sócio? Enquanto credor, aquele que investe não tem direito de voto, reservado aos sócios. Enquanto investidor, deseja que o seu dinheiro não sirva só como capital de giro ou fique no bolso de algum mal-intencionado.

Para evitar esse problema, o contrato deve prever o chamado voto afirmativo. Ele será restrito àquelas matérias que estejam previstas no contrato de mútuo conversível.  Dessa forma, somente com o consentimento do mutuante aquela matéria será aprovada. Porém, deve-se levar em conta o risco da caracterização de sociedade em comum[4].

Um exemplo disso envolve a transação com partes relacionadas, fato que a jurisprudência já reconheceu como apto a provocar a resolução do mútuo conversível, se houver tal previsão no contrato[5]. O não fornecimento dos balanços solicitados para o acompanhamento da evolução da sociedade empresária também pode ensejar a resolução do negócio jurídico, conforme a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[6].

4.2 Cálculo das participações antes e depois da conversão do mútuo em participação (cap table)

Outro ponto de extrema atenção no mútuo conversível é o cálculo do cap table (tabela com os percentuais de cada sócio, antes e depois da conversão). A elaboração dessa tabela permite calcular a diluição de cada fundador ou mesmo do mutuante, caso haja novas rodadas de investimento. É possível, inclusive, pactuar que o investidor pague um valor para que não seja diluído, sob pena de perder determinados privilégios. De qualquer modo, é importante realizar esses cálculos para evitar surpresas desagradáveis.

4.3 Auditoria da empresa que vai receber o mútuo conversível

A due diligence exerce um papel de destaque dentro da relação de mútuo conversível. Quem coloca o seu dinheiro num negócio quer estar por dentro de todos os riscos, até para decidir se vai ou não prosseguir com o investimento. Para os sócios, é importante estar com todas as informações reunidas, de modo que as respostas sejam precisas e rápidas.

O não fornecimento de balanços solicitados, por exemplo, pode frustrar a realização do contrato, porque o elemento de confiança não estará presente. Ou, se houver alguma contradição entre as informações apresentadas e os dados reais da empresa, é possível a resolução do contrato, inclusive com o pagamento de indenização por parte da empresa mutuária[7].

4.4 “Declarações e garantias” e covenants

À auditoria se seguem as declarações e garantias[8], com as quais os fundadores dão sua palavra de que prestaram informações verdadeiras ao credor e sócio em potencial. Para além do caráter moral (afinal, sem honestidade, a relação societária é impossível), as implicações jurídicas podem pesar no bolso (pagamento de indenização).

É importante haver cláusula expressa de covenant[9], por meio da qual o investidor terá acesso às informações e documentos que julgar necessários e poderá dar diretrizes para contratação de serviços pela sociedade. A clareza precisa presidir a relação desde o princípio.

4.5 Fixação do destino dos valores do mútuo conversível

O emprego dos valores emprestados ocupa posição importante dentro do mútuo conversível. Como dito antes, eles não podem se converter em capital de giro ou cash out. Devem servir para aperfeiçoar o produto ou serviço, isto é, melhorar o empreendimento. Por essa razão, utiliza-se a cláusula use of proceeds[10], que pune a destinação incorreta com o vencimento antecipado do mútuo.

4.6 Aspectos societários da relação pós-mútuo conversível

O objetivo de quem investe quase nunca é permanecer sócio. A meta é comprar as ações ou quotas a um valor baixo e depois revendê-las quando estiverem na alta. Desse modo, a previsão de eventos de liquidez permite que o investidor realize mais rápido o objetivo dele. Alguns exemplos dessas ocasiões são a venda da empresa, a incorporação, a oferta de ações na bolsa etc.

Contudo, uma vez que esse credor passe a compor a sociedade, é necessário redigir um bom acordo de sócios, para que as relações corram com segurança. O voto afirmativo, a eleição em separado de membros do conselho de administração ou a previsão de mecanismos anti-diluição são itens bastante comuns nesses acordos. A cláusula de lock up, vedando por certo período a saída de um sócio, também é usual. Do mesmo modo, merece menção a cláusula de non compete, vedando a concorrência por determinado tempo.

4.5 Aspectos tributários

Normalmente, a emissão de novas ações ou quotas é feita por um valor maior que o nominal (valor total do capital social/n° de quotas). Esse sobrevalor recebe o nome de ágio. Nas sociedades limitadas, essa quantia sofre tributação de 34%, somados IRPJ e CSLL. Considerando o possível custo, tornou-se comum a cláusula de transformação em sociedade anônima no mútuo conversível, já que nas companhias optantes pelo lucro real o ágio está isento de tributação[11].

5.    Conclusão

A busca por fontes de financiamento é fundamental para qualquer negócio, mas sobretudo para aqueles que oferecem produtos ou serviços inovadores, nos quais o mercado tradicional põe pouca confiança. O mútuo conversível foi uma solução para esse problema.

Apesar de trazer enormes vantagens, é necessário atentar-se para os riscos que esse contrato traz consigo, sobretudo no tocante à possibilidade da caracterização da sociedade de fato. Por isso, o instrumento contratual deve amoldar-se às circunstâncias do caso concreto. Dessa forma, a startup alcança a expansão, e os investidores lucram com a venda das participações que adquiriram. Uma mão lava a outra.


[1] https://www.insper.edu.br/noticias/o-que-e-break-even-point-e-como-ele-e-calculado/

[2] Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.

[3] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência – 22. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2019 p.256

[4] ZIRPOLI, Rodrigo Domingos. Contrato de mútuo conversível em participação societária. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022, p.93-94).

[5] (TJSP;  Apelação Cível 1113983-92.2016.8.26.0100; Relator (a): Cesar Ciampolini; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro Central Cível – 36ª Vara Cível; Data do Julgamento: 11/05/2022; Data de Registro: 01/06/2022)

[6] (TJSP;  Apelação Cível 1012467-48.2018.8.26.0071; Relator (a): Sérgio Shimura; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Bauru – 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/08/2021; Data de Registro: 25/08/2021)

[7] ZIRPOLI, Rodrigo Domingos. Contrato de mútuo conversível em participação societária. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022, p.90

[8] ZIRPOLI, Rodrigo Domingos. Contrato de mútuo conversível em participação societária. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022, p.89-90.

[9] Por meio dos covenants, a parte investida assume o dever de realizar determinadas obrigações de prestação de informações, de exibição de papéis e documentos da sociedade e de seus negócios, de contratar conforme o use of proceeds, bem como de não contratar senão de acordo com as autorizações dadas pela sociedade investidora/mutuante (ZIRPOLI, Rodrigo Domingos. Contrato de mútuo conversível em participação societária. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022, p.87).

[10] É por meio da cláusula de vinculação do “uso das receitas”, que o mutuante, em acordo de vontades com a mutuária/investida, contrata a destinação do aporte para determinado(s) fim(ns) do planejamento estratégico da sociedade (ZIRPOLI, Rodrigo Domingos. Contrato de mútuo conversível em participação societária. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022, p.82).

[11]ZIRPOLI, Rodrigo Domingos. Contrato de mútuo conversível em participação societária. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022, p.67-68.


André Santa Cruz é advogado inscrito na OAB/DF, sócio do escritório Agi e Santa Cruz Advocacia, doutor em Direito Comercial pela PUC-SP, professor de Direito Empresarial do Centro Universitário IESB, em Brasília, e ex-diretor do DREI – Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração.

Ronan Santos é advogado inscrito na OAB/DF, sócio do escritório Agi e Santa Cruz Advocacia, graduado em Direito pelo Centro Universitário IESB, em Brasília, e pós-graduando em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.

Matheus Ferraz é advogado inscrito na OAB/PE, graduado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, e pós-graduando em Direito Empresarial.


Ativos virtuais e finanças tokenizadas

Banco Central vai regular o mercado de criptomoedas e outros criptoativos

Leandro Oliveira Leite

Em junho de 2023[1], o Banco Central do Brasil assumiu a competência para regular o mercado de prestação de serviço de ativos virtuais, uma decisão que reflete seu papel essencial em zelar pela estabilidade e integridade do sistema financeiro. Essa regulação tem o objetivo de garantir a prestação adequada dos serviços de ativos virtuais, promover a livre concorrência e proteger os consumidores e usuários desse mercado.

O Banco Central está em processo de formulação e apresentação de um modelo de regulação para o mercado de criptoativos, planejando realizar consultas públicas no segundo semestre deste ano para receber opiniões de empresas, especialistas, consultores e do público em geral. Essa regulamentação será baseada em diretrizes importantes para garantir a prestação adequada de serviços de criptoativos. O objetivo é alinhar o Brasil às recomendações internacionais relacionadas ao tema, reconhecendo as oportunidades de inovação que esses ativos virtuais oferecem, incluindo descentralização, redução de custos de negociação, transparência e integração entre diferentes tipos de produtos e serviços.

A evolução constante dos ativos virtuais e tecnologias subjacentes exige uma atuação transversal e coordenada entre diversos reguladores, como a Secretaria da Receita Federal e a Comissão de Valores Mobiliários. As empresas já presentes no mercado terão pelo menos seis meses para se adequarem à legislação e regulamentação vigente.

Nos últimos anos, o mercado de criptomoedas e outros criptoativos tem ganhado uma atenção notável. Esses ativos financeiros virtuais, suportados por algoritmos criptográficos e uma rede descentralizada utilizando tecnologia de ledger distribuída (DLT)[2], atraíram a curiosidade de investidores, entusiastas e até mesmo governos ao redor do mundo.

A ideia de uma moeda ou ativo financeiro digital, sem representação física, pode parecer complexa à primeira vista. Porém, com a popularização da tecnologia blockchain[3], uma base de dados descentralizada que garante a segurança e a integridade das informações, a ideia de ativos virtuais ganhou espaço e interesse entre o público.

A rede descentralizada, construída em blockchain, é composta por milhares de computadores que armazenam as informações e garantem a veracidade das transações. Esse modelo torna o sistema resistente a fraudes e elimina a necessidade de uma entidade centralizadora, como um banco ou uma autoridade reguladora, para intermediar as operações. A criptografia é a base da segurança dessa rede, garantindo que as informações estejam protegidas e invioláveis.

Dentro do conceito de criptoativos, encontramos as criptomoedas, como o Bitcoin, Ethereum, entre outras. No entanto, é importante ressaltar que os criptoativos vão além das criptomoedas. Inclua também como NFTs (Non-fungible tokens), que representam ativos únicos e indivisíveis, como obras de arte digital, colecionáveis ​​e outros itens exclusivos.

Apesar de toda a inovação e potencial revolucionário, os criptoativos carregam desafios e riscos. A volatilidade é um dos principais pontos de preocupação para os investidores. O valor de uma criptomoeda pode variar enormemente em curtos períodos de tempo, causando perdas para alguns investidores.

A regulação do Banco Central deve partir de diretrizes que levem em consideração as peculiaridades dos criptoativos, a natureza descentralizada das operações e os envolvidos. A consulta pública sobre o tema permitirá que empresas e especialistas contribuam com suas opiniões e experiências para a criação de um ambiente regulatório mais seguro e adequado.

A regulamentação de criptoativos pelo Banco Central vai ao encontro de recomendações internacionais e visa fomentar a inovação, eficiência e inclusão financeira no Brasil. Com a competência de regulador definido em lei, o Banco Central acompanhará o desenvolvimento desse mercado, buscando sempre conciliar a inovação tecnológica com a segurança e estabilidade do sistema financeiro.

Por fim, é importante destacar que criptoativos não devem ser confundidos com a criação do CBDC (Central Bank Digital Currency), conhecido como Real Digital, outra tecnologia que também tem o potencial de promover a inclusão financeira, reduzir custos e aumentar a eficiência das transações financeiras no país. O real digital será uma moeda digital pertencente ao próprio Banco Central, com características distintas dos criptoativos. O “Boxe 9 – Real Digital: uma plataforma para as finanças” do Relatório de Economia Bancária 2022[4] destaca que essas iniciativas fazem parte de uma tendência global de digitalização do dinheiro e que o Banco Central deve atuar como regulador para garantir a plataforma de segurança e a estabilidade financeira.

Acrescenta ainda o relatório que, como mecanismo facilitador da inovação nos mercados financeiros, as plataformas das moedas digitais emitidas por bancos centrais (CBDC) permitem a incorporação de novas tecnologias e novos modelos de negócios com potencial para atender à demanda da população por meios nativamente digitais de liquidação, similares aos disponíveis no ecossistema de criptoativos. Uma tendência, favorecida pelas tecnologias que dão suporte ao ecossistema de criptoativos, é a tokenização[5] de ativos. “A disseminação da tokenização tem o potencial de gerar ganhos concretos em acessibilidade a ativos e promover maior eficiência em suas transações. Em geral, os ativos tokenizados podem ser transferidos facilmente, de forma fracionária e em segundos. Eles podem ser usados em aplicações descentralizadas e armazenados em contratos inteligentes (smart contracts), que são executados automaticamente quando condições e termos predeterminados são atendidos”.

Em resumo, a regulação dos criptoativos pelo Banco Central é um passo importante para a consolidação desse mercado no Brasil. A regulação adequada visa equilibrar a inovação tecnológica com a proteção dos consumidores e a estabilidade financeira, tornando o ambiente de negócios mais seguro e propício para o desenvolvimento dessa classe promissora de ativos financeiros virtuais. A regulamentação busca garantir que os criptoativos possam contribuir de forma positiva para a economia brasileira e o bem-estar dos cidadãos, impulsionando o país em direção a uma economia mais digital e inclusiva.

Referências:

Banco Central prepara Consultas Públicas sobre regulamentação de criptoativos:

https://www.bcb.gov.br/detalhenoticia/705/noticia

Decreto nº 11.563, de 13 de junho de 2023:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Decreto/D11563.htm?utm_source=akna&utm_medium=email&utm_campaign=Banco-Central-prepara-Consultas-Publicas-sobre-regulamentacao-de-criptoativos

Relatório de Economia Bancária 2022:

https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/relatorioeconomiabancaria/reb2022p.pdf


[1]https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Decreto/D11563.htm?utm_source=akna&utm_medium=email&utm_campaign=Banco-Central-prepara-Consultas-Publicas-sobre-regulamentacao-de-criptoativos

[2] A tecnologia de contabilidade distribuída é usada em criptomoedas como bitcoin. DLT é usado para manter um banco de dados de todas as transações que estão acontecendo em um mercado e permitir que elas sejam vistas simultaneamente por todos os participantes.

[3] Blockchain pode ser traduzida como corrente de blocos. De uma forma simples, trata-se de uma tecnologia que agrupa um conjunto de informações que se conectam por meio de criptografia. Assim, transações financeiras e outras operações podem ser feitas de forma segura.

[4] https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/relatorioeconomiabancaria/reb2022p.pdf

[5] Tokenizar um bem ou serviço nada mais é do reproduzir de forma digital esse produto – seja a ação de uma empresa, um título de dívida, obra de arte etc -, conferindo benefícios, valor e características originais associados a ele, inscrito em uma determinada rede blockchain.