Filipe Janson Lima Milhomem

A Reforma Tributária e o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)

Apresentação

Os Textos para Discussão da WebAdvocacy é uma série de textos técnico-científicos nas áreas de direito e economia, que visa a ampliar a discussão acadêmica em torno dos temas de defesa da concorrência, regulação econômica, comércio internacional, direito econômico, direito tributário, entre outros.

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Editor:

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Ficha catalográfica

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A Reforma Tributária e o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)

Filipe Janson Lima Milhomem[1] e Fernando de Magalhães Furlan[2]

Resumo:

O presente artigo tem como objetivo geral analisar os impactos da criação do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)[3], inovação trazida pela Reforma Tributária, no federalismo fiscal brasileiro. Entre os objetivos específicos, busca-se apresentar a conformação tributária brasileira pré-reforma; entender a repartição das competências tributárias e sua importância para a persecução do interesse público; analisar as principais mudanças deflagradas pela alteração legislativa advinda da Emenda Constitucional n° 132/2023, com enfoque na constituição do Comitê Gestor do IBS. Além disso, o artigo se propõe a discutir se a transferência, pelos entes federativos, de atribuições decorrentes do poder de tributar, especialmente em relação às competências tributárias, ao referido Comitê, pode representar uma proposta tendente a abolir a forma federativa de Estado. A metodologia empregada é de caráter qualitativo, consistindo em uma pesquisa bibliográfica que abrange a análise de obras acadêmicas, artigos científicos, legislações e documentos oficiais. Concluímos que a atuação do Comitê Gestor do IBS mitiga a autonomia dos Estados, do Distrito Federal e dos Munícipios, sem que isso, porém, signifique, por si só e a priori, uma afronta ao pacto federativo.

Palavras-chave: Reforma Tributária; Comitê Gestor do IBS; Pacto Federativo.

Abstract:

The general objective of this paper is to analyze the impacts of the creation of the IBS (Levy on Goods and Services) Steering Committee, an innovation brought about by the Tax Reform to the Brazilian fiscal federalism. The specific objectives include presenting the pre-reform Brazilian tax system, understanding the distribution of tax powers and its importance for pursuing the public interest, analyzing the main changes triggered by the legislative amendment brought about by Constitutional Amendment 132/2023, with a focus on the creation of the IBS Steering Committee and discussing whether the transfer by the federal entities of powers deriving from the right to tax to the aforementioned Committee may represent a proposal to abolish the federal form of State. The methodology employed is qualitative in nature, consisting of bibliographical research that includes the analysis of academic works, scientific articles, legislation and official documents. In the end, it was found that the actions of the IBS Steering Committee mitigate the autonomy of the states, the Federal District and the municipalities, but this does not in itself mean an affront to the federative pact.

Keywords: Tax Reform; IBS Management Committee; Federative Pact.

  1. INTRODUÇÃO

Para que um Estado federado exista, é necessário que os estados membros tenham a capacidade de determinar a sua própria estrutura institucional, permitindo a descentralização do poder e a viabilização da persecução do interesse público. Tal noção se estende ao âmbito fiscal, devendo os entes possuírem autonomia tributária, em homenagem ao federalismo fiscal.

Autonomia, segundo leciona Carvalho Filho (2022, p.05), “significa ter a entidade integrante da federação capacidade de auto-organização, autogoverno e autoadministração.” No caso desta última, para o seu exercício pleno, é imprescindível que o ente possa realizar o recolhimento e gerenciamento dos seus próprios recursos, especialmente no que toca a receita advinda dos tributos.

Contudo, a criação do Conselho Federativo, inovação trazida pela Emenda Constitucional n° 132/2023, parece ameaçar a referida autonomia, visto que há uma tendência à concentração da receita tributária, a qual está consubstanciada, por exemplo, na norma constante do inciso III do art. 156-B da proposta, cujos termos apontam que ao Conselho Federativo caberá “efetuar as compensações e distribuir o produto da arrecadação entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios” (Brasil, 2023, p.1).

Da análise de tal previsão, assim como de outras que integram a proposta, verifica-se que há uma mitigação do poder dos entes federados de administrar os seus próprios recursos, vez que a competência que antes era por eles exercida, é transferida ao Conselho. Esta medida, pode representar um grave abalo para a autonomia dos entes federados e para o equilíbrio da federação, o que atenta diretamente contra a forma federativa de Estado, cláusula pétrea (art. 60, §4°, I, da Constituição Federal).

Ademais, um conselho com competências que são primariamente dos entes federados, enfraquecem os corpos legislativos competentes, os quais são as instâncias apropriadas para a proposição, análise, debate e resolução de assuntos tributários, sob jurisdição estadual e municipal. Tais entes legislativos (assembleias legislativas e câmaras de vereadores) são compostos por representantes eleitos pelo povo, legalmente autorizados a lidar com tais questões, ao contrário de um conselho composto por burocratas selecionados por critérios técnicos e distantes do escrutínio público.

Lado outro, é forçoso reconhecer que o atual sistema tributário nacional é demasiadamente complexo e defasado. Há uma infinidade de normas tributárias e constates disputas entre os entes federados (e.g. “guerra fiscal”). Nesse cenário, um conselho composto por representantes das pessoas políticas, responsável por coordenar a arrecadação, fiscalização, cobrança e distribuição das receitas dos tributos, pode significar um nível mais aprofundado de integração entre as entidades federativas, fortalecendo a busca por um federalismo fiscal cooperativo e equilibrado.

Assim, o presente artigo analisará, por meio de pesquisa bibliográfica, se o modelo proposto poderá acarretar a sujeição dos entes subnacionais ao ente central; situação que resultaria em perda de autonomia, estando, assim, viciada por inconstitucionalidade material à Emenda Constitucional n° 132/2023. Ou se, em sentido oposto, será um passo positivo na mitigação dos imbróglios presentes na atual conjuntura do tributarismo brasileiro, com os consequentes efeitos benéficos, tanto para os sujeitos passivos da relação jurídico-tributária (contribuintes), quanto para o federalismo.

  • BREVE RESTROPECTO HISTÓRICO DOS TRIBUTOS NO BRASIL

Para os fins do presente artigo, é essencial que façamos um análise histórico-evolutiva do Direito Tributário no Brasil, a fim de entendermos a conformação que este ramo teve ao longo dos séculos, e como ganhou os contornos atuais.

Nos primeiros 30 anos posteriores ao descobrimento do Brasil, com os portugueses com os olhos voltados para as Índias, a atividade predominante desenvolvida em solo nacional era a extração de pau-brasil. Sobre tal atividade, conforme Balthazar (2005), já incidia tributo, o qual era chamado de “Quinto do pau-brasil”.

O quinto era cobrado pela Coroa Portuguesa, detentora suprema das riquezas da, então, Ilha de Vera Cruz, de todos os particulares que exploravam a aludida madeira. Por não haver moeda corrente, explica Oliveira et al (2023), o tributo era pago “in natura”, isto é, com o próprio produto.

No período de 1530 a 1550, são editados dois importantes documentos por Portugal, a saber, a Carta de Doação e a Carta Foral. O primeiro, esclarece Balthazar (2005), disciplinava as doações de porções de terras aos representantes do Rei de Portugal na Colônia, os denominados donatários. Tem-se, portanto, a instituição das Capitanias Hereditárias, no total de 14. Já o segundo, tratava, sobretudo, das espécies de tributos a serem pagos pelos colonos e suas respectivas alíquotas.

Em 1560, com a comércio aquecido pela necessidade de mão de obra, e a instituição do pernicioso sistema escravocrata, iniciou-se a cobrança de tributos sobre as operações que envolviam exportação e alienação de escravos, que possuíam o status de res (coisa). Mudança significativa no sistema exposto, aduz Oliveira et al (2023), se deu quando o General Gomes Freire de Andrade, foi nomeado Vice-Rei, momento em que passaram a incidir tributos sobre outras mercadorias produzidas ou extraídas na colônia, tais como: algodão, açúcar, ouro e aguardente.

Neste período, ante a crise do mercado de açúcar, tem-se a inauguração do Ciclo do Ouro, em que milhares de colonos se dirigiam a Minas Gerais em busca de jazidas de metais e pedras preciosas. Sobre essa nova atividade econômica, aclara Mesgravis (2015), recaíam dois tipos principais de cobranças tributárias, quais sejam, o Quinto do ouro e a polêmica “Derrama. O quinto correspondia a 20% do ouro[4] extraído e registrado nas Casa de Fundição, o qual deveria ser pago para a Coroa. A Derrama, por sua vez, era uma espécie de constrição patrimonial forçada, motivada pelo inadimplemento do quinto devido.

Tal constrição, passou a ser usada massivamente durante a decadência da economia mineradora[5], ocasião em os colonos, aponta Balthazar (2005), acumularam diversas dívidas com o governo, vez que não tinham mais condições de pagar os tributos. Assim, a pesada carga tributária provocou inúmeros conflitos entre os colonos e Portugal, sendo a Inconfidência Mineira o mais conhecido deles.

A vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808, que fugia da sanha imperialista de Napoleão, modificou profundamente a estrutura e o governo do Brasil da época. Com a abertura dos portos marítimos às nações amigas, Balthazar (2005) instrui que sobre os produtos importados passaram a incidir tributos cuja alíquota padrão era de 24% para os países aliados, com exceção da Inglaterra, cuja alíquota era de 15% e de Portugal, que era de 16%. Fato curioso é que, nessa época, já havia uma espécie de imunidade tributária para os livros, podendo ser essa a origem da imunidade de imprensa (livros, jornais, periódicos e papel), presente na Constituição de 1988.

Ademais, foram instituídos tributos sobre os prédios urbanos, no valor de 10% sobre o valor de lucro dos prédios, bem como nas transmissões imobiliárias e causa mortis. Em virtude da precária administração tributária, Oliveira et al (2023) afirma que era comum a ocorrência do fenômeno da bitributação, isto é, quando há incidência tributária mais de uma vez sobre o mesmo fato gerador.

Diante disso, a fim de dar mais eficiência ao sistema de cobranças e fiscalização tributária, destaca Oliveira et al (2023), são criados os Conselho da Fazenda, o Conselho Ultramarino e a Alfândega. A partir de tais estruturas, aumentou-se o escrutínio dos tributos devidos e sua arrecadação.

Em que pese o aumento das hipóteses de incidência e o fortalecimento do Fisco, leciona Linck (2009, p.89) que “a doutrina entende que esses tributos cobrados na época do Brasil Colonial não faziam parte de um conjunto harmônico de normas, de princípios, e de institutos, devidamente sistematizados, capazes e caracterizar um Direito Tributário brasileiro”.

Após o retorno da família real à Portugal e a Declaração da Independência, em 1822, com o país independente, assinala Oliveira et al (2023), surge a necessidade de erigir uma estrutura administrativa firme, funcional e efetiva, especialmente na seara tributária. Nesse diapasão, a Constituição de 1824, também conhecida como “Constituição da Mandioca[6], previa em seu art. 36 que era da Câmara o dever de criar tributos, além disso aduzia o art. 175, inciso XV, que “ninguém será isento de contribuir para as despesas do Estado em proporção dos seus deveres” (Brasil, 1824, p.1).

Nesse período, Dom Pedro I implementa uma minirreforma fiscal. Dentre as mudanças, conforme Ferreira (2012), houve a eliminação de certos tributos, como o Quinto do ouro (Decreto de 30 de agosto de 1828), e concessão de isenção a outros, como o de jornais e revistas. Além disso, minorou-se a alíquota sobre produtos como o charque, o sal, o trigo e o algodão.

Com o intuito de descentralizar o controle financeiro, Oliveira et al (2023) afirma que foram instituídas as chamadas tesourarias provinciais, órgãos incumbidos de gerir e estruturar a atividade financeira das regiões. Em virtude disso, as províncias puderam estabelecer os seus tributos e destinar o produto de sua arrecadação, como bem lhes aprouvesse.

Em 1834, por meio do Ato Adicional foram criadas as chamadas “Rendas Gerais”, “que definiu diversos tributos sobre diversos serviços e produtos, como: importação, exportação, compra de embarcações estrangeiras, estabelecimentos comerciais, mineração de ouro, entre outros” (Oliveira et al, 2023, p.1). 

A Constituição de 1891, promulgada após a Proclamação da República, também conhecida como Golpe Republicano, foi um importante passo na conformação do sistema tributário que conhecemos hoje. Com a adoção da forma federativa de Estado, leciona Linck (2009), os entes federados passaram a ter autonomia administrativa, política e financeira, passando a existir a possibilidade de a União e os estados instituírem e cobrarem os seus próprios tributos.

É sobre o manto daquela Magna Carta que surge o Imposto de Renda. Instituído pela Lei Orçamentária 4.625, seu art. 31 versava que “Fica instituído o imposto geral sobre a renda, que será devido, anualmente, por toda a pessoa física ou jurídica, residente no território do país, e incidirá, em cada caso, sobre o conjunto líquido dos rendimentos de qualquer origem” (Brasil, 1922, p.1).

Inaugurada a Era Vargas, promulga-se a Constituição de 1934. Essa, consoante Oliveira et al (2023), trouxe a vedação à bitributação de forma expressa e delimitou os tributos de competência da União e dos estados. Além disso, conferiu aos municípios competência tributária e criou as contribuições de melhoria.

As inovações daquela Lei Maior pavimentaram o caminho para a sistematização do Direito Tributário. Balthazar (2005, p.90) advoga que “se ainda não foi o texto que sistematizou a legislação tributária, firmou princípios antes ausentes das Cartas anteriores ou presentes de forma implícita ou ilimitada, como é o caso do princípio da imunidade recíproca“.

Sob o Estado Novo, fase ditatorial da Era Vargas, foi outorgada a Constituição de 1937. Salienta Balthazar (2005), que essa não albergou mudanças significativas, apenas pontuais, como, por exemplo, o imposto sobre indústria e profissões, anteriormente de competência privativa dos estados, foi transferida para os municípios (metade da arrecadação desse imposto já lhes pertencia). Superada a Ditadura Vargas, em 1946, mais uma Carta Magna é promulgada e que, quanto à matéria tributária, possibilitou:

[…] a cobrança de tributos extraordinários, para além daqueles definidos na Constituição em situações específicas. Acrescentou o princípio de capacidade contributiva, isto é, definiu como regra a necessidade de a União, Estados e Município considerarem quanto cada cidadão pode contribuir para uma cobrança mais justa de tributos e instituiu o princípio da anualidade, no qual as rendas e despesas eram avaliadas com a frequência anual (Oliveira et al, 2023, p.1).

 Primando pela clareza, a Lei Maior de 1946 discriminou as competências de cada ente federado, prevendo, a título de ilustração, em seu art. 15, que competia à União decretar impostos sobre a (I) importação de mercadorias de procedência estrangeira; (II) consumo de mercadorias; (III) produção, comércio, distribuição e consumo, e bem assim importação e exportação de lubrificantes e de combustíveis líquidos ou gasosos de qualquer origem ou natureza, estendendo-se esse regime, no que for aplicável, aos minerais do País e à energia elétrica; (IV) renda e proventos de qualquer natureza; (V) transferência de fundos para o exterior; (VI) negócios de sua economia, atos e instrumentos regulados por lei federal; e (VII)  propriedade territorial rural, (Brasil, 1946).

No que diz respeito aos impostos estaduais, o art. 19 definiu que os impostos que recaíam sobre a (I) transmissão de propriedade causa mortis; (II) vendas e consignações efetuadas por comerciantes e produtores, inclusive industriais, isenta, porém, a primeira operação do pequeno produtor; (III) exportação de mercadorias de sua produção para o estrangeiro, até o máximo de 5% (cinco por cento) ad valorem, vedados quaisquer adicionais; (IV) os atos regulados por lei estadual, os do serviço de sua Justiça e os negócios de sua economia, competiam aos estados (Brasil, 1946).

Desse modo, a Constituição, defende Linck (2009, p.91), “estabeleceu com maior clareza os repasses da União e dos estados das rendas obtidas através da tributação aos municípios e outorgou ao Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas, a fiscalização da administração financeira.”

Em 1964, após o golpe de Estado, instaura-se no Brasil a ferrenha Ditadura Militar. Com o fim de atender a uma política econômica arrojada, em 1965, é iniciada uma reforma tributária. Essa reforma, em conjunto com outras medidas adotadas, proporcionou o chamado Milagre Econômico, vez que estabeleceu:

[…] normas que determinavam a aquisição de recursos adicionais não-inflacionários para cobrir o déficit da União e que buscavam o equilíbrio das finanças com a economia mundial. Houve também a edição de leis que estabeleciam meios que facilitassem e que aperfeiçoassem a arrecadação fiscal, como, por exemplo, a Lei 4.506/64 que alterou a legislação do imposto sobre a renda; ainda, a criação de uma comissão especial formada por juristas e por técnicos do Ministério da Fazenda com a finalidade de elaborar um anteprojeto de emenda constitucional (Linck, 2009, p.92).

Nesse cenário, é aprovada a Emenda à Constituição n° 18/65, que, finalmente, deu os contornos normativos finais para o sistema tributário nacional. Essa, foi recepcionada pela Constituição de 1967, que passava a ter a previsão expressa de três espécies de tributos, a saber, impostos, taxas e contribuições de melhoria. Antes da Emenda, leciona Scaff (2014, p.1):

[…] a divisão da competência tributária se pautava por um critério meramente político, sem nenhuma correspondência econômica. A legislação de estados e municípios não possuía nenhum vínculo com as incidências federais, se constituindo em sistemas autônomos. Estados e municípios criavam incidências amparados no que atualmente se chama de “competência residual”, que antes era ampla em todos os entes federados e tornou-se centrada na União, onde remanesce até os dias atuais (embora hoje a amplitude da arrecadação federal ocorra no âmbito das contribuições, e não no dos impostos).

Diante disso, Linck (2009, p.92) assevera que tal emenda “surgiu para terminar de desenhar o sistema tributário brasileiro, uma vez que organizou de forma ordenada a cobrança dos tributos, ao limitar as competências e ao estabelecer os princípios que deveriam ser seguidos pelas administrações”.

No ano seguinte à publicação da referida emenda, foi instituído o Código Tributário Nacional (CTN), estabelecendo assim uma separação definitiva entre o Direito Tributário e o Direito Financeiro. A tributação, pelo espírito do CTN, para Linck (2009), deixou de ser apenas um meio para a manutenção do Estado, passando a assumir uma função mais ampla de política econômica.

O CTN apresentou ainda, em seu art. 3°, o conceito de tributo que é “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (Brasil, 1966, p.1).

Vale pontuar que, apesar da criação de um sistema tributário nacional, fundamentado em princípios e normas de competência, estabelecidos pela Constituição Federal, os anos subsequentes à sua promulgação foram marcados por uma fase obscura na história do Brasil. A Carta Magna e as legislações ordinárias, segundo Linck (2009), possuíam pouco valor diante dos Atos Institucionais[7], que emprestavam um verniz de legitimidade para o Estado autoritário e repressivo que o Governo Militar erigiu.

Contudo, ares democráticos passaram a soprar no Brasil. Em 1985 se encerra o Regime Ditatorial, sendo promulgada a atual Constituição Federal de 1988. Estribada em valores como a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais, a Lei Maior, defende Linck (2009), passa a privilegiar a isonomia tributária e a capacidade contributiva dos sujeitos passivos.

Nessa toada, para Linck (2009), com o advento da “Constituição Cidadã” (1988), o tributo perde seu caráter meramente arrecadatório, destinado apenas à preservação e funcionamento das pesadas engrenagens do Estado. Passa, então, a ser um valioso meio de garantia e patrocínio das políticas públicas e outras ações e diretrizes voltadas para a efetivação dos direitos e garantias fundamentais. Assim, o estudo do Direito Tributário passou a ter como foco a busca pela harmonia entre o poder de tributar do Estado e os direitos fundamentais do contribuinte.

Ademais, buscando se adequar aos princípios, direitos e garantias constitucionais, o conceito de tributo é ampliado, passando a ser entendido como:

[…] uma fonte de recursos financeiros destinados ao custeio de despesas públicas gerais (art. 167, IV) ou especiais (arts. 149, 149-A e 195); (b) é instituído e cobrado pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios (arts. 148, 149, 149-A, 153-156); (c) no exercício de um poder de tributar limitado (Seção II); (d) exigido de pessoas jurídicas ou físicas enquanto sujeitos passivos de relações obrigacionais (art. 150, § 7º); (e) em função de “fatos geradores” definidos em lei (arts. 146, III, “a”, e 150, III, “a”), que, por sua vez, podem ser atos administrativos ou dele decorrentes (art. 146, II e III), direitos ou negócios jurídicos de direito privado sem vinculação com uma ação estatal (arts. 153-156), tais como a propriedade de bens móveis (art. 155, III) e imóveis (arts. 153, VI, e 156, I), a importação de produtos (art. 153, I), operações de crédito, câmbio e seguro (art. 153, V), a transmissão causa mortis e doação de bens ou direitos (art. 155, I), a circulação de mercadorias (art. 155, II), a prestação de serviços (art. 156, III), entre outros mais (Sehn, p. 44, 2024).

No entanto, nem tudo são flores. Há ainda muitas fragilidades e desigualdades no sistema tributário vigente, especialmente no que diz respeito à efetivação da capacidade contributiva. A maior carga fiscal, advoga Balthazar (2005), está encerrada nos impostos indiretos, isto é, aqueles incidentes sobre o consumo. Em razão disso, uma pessoa de baixa renda tem, proporcionalmente, maior comprometimento de sua renda do que uma pessoa que dispõe de alto poder aquisitivo, o que contribui para o aprofundamento das desigualdades sociais.

  • COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

Um Estado federado é, por definição, um conjunto de entes livres. Tais entes possuem parcelas de poder, cuja distribuição é conferida, em regra, por lei. Uma das ramificações desse poder, ensina Carvalho Filho (2023), é a autonomia, caracterizada pela autoadministração, autogoverno e auto-organização.

Um fator de especial importância para a plenitude e manutenção da autonomia do ente federado, é a sua capacidade financeira, isto é, a disponibilidade de recursos capazes de viabilizar a consecução dos objetivos sociais, políticos e econômicos da entidade estatal. No cenário brasileiro, a arrecadação tributária é grande fonte de recursos públicos.  A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, em prestígio ao federalismo fiscal[8], possuem a capacidade de instituir e cobrar os seus próprios tributos, a fim de arrecadarem haveres para financiar o interesse público (Sehn, 2024).

Desse modo, para a existência de um federalismo saudável e equilibrado, é necessário que haja regras claras no que concerne à delimitação das competências tributárias e da repartição de receitas provenientes dos tributos. Competência tributária, leciona Mazza (2024), é a aptidão para criar, modificar, reduzir e extinguir tributos, por meio de lei, em observância ao princípio da legalidade. Como se depreende do próprio conceito, pode-se afirmar que a aludida competência é uma espécie de competência legislativa, cabendo ser exercida pelo Parlamento.

Por ser um tipo de competência legislativa, explica Mazza (2024), é a Constituição Federal que define as competências tributárias, isto é, ela que atribuirá ao ente os poderes inerentes à sua competência. Tendo isso em vista, a atual Carta Magna conferiu aos entes federados, ou seja, às pessoas jurídicas de direito público integrantes da Administração direta (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), a titularidade da competência tributária, a qual é indelegável. Desse modo, podemos asseverar que a Lei Maior não cria tributos, apenas atribui poder para que a entidade federativa competente o faça.

Ademais, cabe fazermos uma relevante distinção entre competência tributária e capacidade tributária ativa. A primeira, de viés legislativo e abstrato, leciona Mazza (2024), diz respeito à habilitação para criar tributos. Já, a segunda, de caráter administrativo e concreto, se refere ao exercício da aptidão para cobrar e arrecadar tributos, o que não deve ser feito, necessariamente, pela pessoa jurídica que o institui.

 Assim, de acordo Sabbag (2021), um ente pode criar tributo, mas outro o cobrar, sem que isso implique em delegação ou usurpação de competência. A esse fenômeno, damos o nome de parafiscalidade (art. 7°, do CTN)[9].

Faz-se, ainda, pertinente esclarecer que a Magna Carta, conforme expõe Mazza (2024), se valeu de diferentes métodos para repartir competências tributárias entre a União e os entes subnacionais, trazendo em seu bojo 5 (cinco) espécies de competência, a saber, competência privativa, comum, cumulativa, especial e residual.

Na privativa, afirma Sabbag (2021), determinado imposto é atribuído a um ente tributante, sendo que a Constituição prevê quais são os impostos e a quem lhes cabe. Assim, o Imposto sobre a Circulação de Bens e Serviços (ICMS) é conferido aos estados e ao Distrito Federal (no exercício de sua competência estadual) e o Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN) é atribuído aos municípios e ao Distrito Federal (no exercício de sua competência municipal).

Por sua vez, segundo Mazza (2024), a competência comum é concedida concomitantemente a todas as pessoas políticas, podendo ser usada quando essas realizarem o fato gerador[10] do tributo, o qual é vinculado a uma prestação do ente federativo (por exemplo, taxas devidas em razão do exercício do poder de polícia). Lado outro, expõe Sehn (2024), a competência cumulativa (art. 147, da CF) é aquela que habilita uma entidade federativa a cobrar e fiscalizar os seus tributos, além de tributos cuja competência caberia, originalmente, a outro ente federado. É o que ocorre com a União em relação aos territórios federais, por exemplo. A União passa a acumular a competência tributária estadual e, caso o território não seja divido municípios, também a competência tributária municipal. A título de exemplo e melhor visualização, tínhamos a competência cumulativa da União sobre o então território federal de Fernando de Noronha (hoje distrito estadual de Pernambuco), que, dada a exiguidade de seu território, não estava (e ainda não está) dividido em municípios.

Já a competência especial, aduz Sabbag (2021, p.50), pode ser entendida como sendo “o poder de instituir empréstimos compulsórios (art. 148 da CF) e contribuições especiais (art. 149 da CF)”.

 É válido mencionar, aclara Sabbag (2021), que tal tributo só pode ser usado em situações fáticas específicas, quais sejam: (I) calamidade pública, (II) guerra externa ou sua iminência e (III) investimento público de caráter urgente e relevante interesse nacional (art. 148, I e II, da CF c/c art. 15, I e II, do CTN).

Por fim, a competência residual (art. 154, I, e art. 195, § 4.º) diz respeito à possiblidade de a União instituir impostos que não estejam contemplados na Lei Maior, assim como outras fontes de contribuição para o financiamento da Seguridade Social[11], por meio de lei complementar. Ao tratar do assunto, Sabbag (2021, p.50) ensina que:

[…] No que tange aos impostos, a competência residual indica que o imposto novo deverá ser instituído, por lei complementar, pela União, obedecendo-se a duas limitações: (I) respeito ao princípio da não cumulatividade; e (II) proibição de coincidência entre o seu fato gerador ou a sua base de cálculo com o fato gerador ou a base de cálculo de outros impostos;

[…] Quanto às contribuições para a seguridade social, o raciocínio é parcialmente idêntico, tendo em vista o atrelamento textual do art. 195, § 4.º, da CF ao art. 154, I, da CF. Nessa medida, as contribuições residuais para a seguridade social devem respeitar os seguintes parâmetros: (I) instituição, por lei complementar, pela União; (II) respeito ao princípio da não cumulatividade; (III) proibição de coincidência entre o seu fato gerador ou a sua base de cálculo com o fato gerador ou a base de cálculo de outras contribuições.

Do exposto, não é temerário declarar que a competência tributária é um dos mais significativos instrumentos de descentralização política e financeira, que permite que cada um dos entes federados, em suas respectivas esferas de atuação, busquem a implementação do interesse público. Neste contexto, a distribuição de competências tributárias é uma afirmação da Federação brasileira. A despeito disso, o modelo vigente vem sofrendo críticas. Conforme entendem Marcus Abraham e João Ricardo Catarino (2018), o federalismo fiscal à brasileira é assimétrico, vez que a União, em comparação com as outras pessoas jurídicas da administração direta, concentra um número consideravelmente maior de competências, o que a coloca em um patamar de superioridade[12].

Assim, mostrava-se imperioso mudar a conformação tributária vigente, a fim de resolver mazelas como a da concentração de competências pela União, já aludida, assim como outras tão prementes quanto. Em vista disso e com o intuito de corrigir distorções e perniciosidades do sistema tributário nacional, foi proposta e promulgada a Emenda à Constituição n° 132/2023, a qual estudaremos mais detidamente a seguir.

  •  EMENDA CONSTITUCIONAL n°132/2023 E AS MAZELAS DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

O Sistema Tributário Brasileiro é, sem dúvida, um dos mais ultrapassados e problemáticos do mundo. A maioria dos países desenvolvidos ou em desenvolvimento, de acordo com Eduardo Maneira (2022), quanto à tributação do consumo, adotou, há décadas, o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que possui uma alíquota padrão. No Brasil, há 5 (cinco) impostos que incidem sobre o consumo, com diferentes entes competentes para cobrá-los. Tal fato faz com que tenhamos um desenho tributário complexo e confuso, em sentido totalmente antagônico ao de outras nações mais desenvolvidas, o que nos coloca em uma posição de atraso e isolamento.

São inúmeros os entraves e distorções gerados pelo atual modelo tributário brasileiro. Porém, a fim de não sermos exaustivos, vamos nos ater aos pontos mais sensíveis, de acordo com Brasil (2023), quais sejam: base de cálculo fragmentada, cumulatividade, complexidade, guerra fiscal, opacidade e litigância exacerbada.

De início, é relevante pontuar que a incidência de alguns impostos sobre o consumo é determinada pela identificação de seus respectivos fatos geradores (fatos tributários imponíveis), isto é, a circulação de uma mercadoria ou a prestação de um serviço. Essa distinção, segundo Brasil (2023), nem sempre é simples, especialmente em um mercado cada vez mais permeado por produtos digitais, os quais, muitas vezes, ficam em uma zona cinzenta. Isso acaba por gerar insegurança para o contribuinte e conflitos de competência entre os entes tributantes.

 Outro embaraço, para Brasil (2023), é a cumulatividade, que impede o creditamento do sujeito passivo em relação aos tributos já recolhidos e assoberba a produção nacional, deixando o país em desvantagem competitiva em comparação com outros países. Tal cumulatividade, se dá tanto em razão dos “tributos cumulativos, como o ISS e a PIS/COFINS, no regime cumulativo; como também em razão das inúmeras restrições ao creditamento nos tributos não cumulativos, como o ICMS, a PIS/COFINS e o IPI não cumulativos” (Brasil, 2023, p.03).

Em continuação, temos a elevada complexidade do sistema tributário. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (2021)[13], desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, já foram editadas 466 mil normas que versam sobre matéria tributária, o que equivale a 37 normas tributárias por dia útil. Além disso, conforme estimativa do mesmo instituto, no Brasil, as empresas desembolsam, por ano, cerca de R$ 181 bilhões de reais, com o intuito de acompanharem as constantes mudanças legislativas. Desse modo, fica claro que esse emaranhado de normas contribui para a defasagem e evasão de investimentos no mercado interno e para desestimular a iniciativa privada.

Além disso, uma pesquisa realizada pela Doing Business (2021) com a PWC[14], revelou que no Brasil gasta-se, em média, 1.500 horas nos cálculos e adimplemento de tributos, um número que é consideravelmente maior do que o de outros países, conforme a figura 1:

Figura 1 – Ranking de complexidade tributária geral

             Fonte: IBS sistemas (2020) apud Doing Business Subnacional Brasil 2021

Acrescente-se a esse cenário, já demasiadamente caótico, a guerra fiscal travada entre as entidades federativas, sobretudo os estados. Muitos dos impostos são pagos no estado de origem (por exemplo, o Imposto sobre a Circulação de Bens e Serviços – ICMS). Em virtude disso, sustenta Brasil (2023) que, com o objetivo de atrair empresas para os seus territórios, as unidades federativas travam uma batalha ferrenha, se valendo, para vencê-la, de armas como a concessão de benefícios tributários, especialmente. Em decorrência disso, temos o estabelecimento de um entrave que só serve para aumentar as desigualdades regionais e desmantelar a harmonia federativa.

Outrossim, no que tange à opacidade do sistema, pode-se afirmar que:

[…] atualmente é praticamente impossível se saber a carga tributária efetivamente cobrada, dada a profusão de alíquotas, reduções de base de cálculo, benefícios fiscais e regimes especiais de tributação, além de haver incidência de tributos sobre tributos, cálculo por dentro, restrições à não cumulatividade e existência de créditos presumidos na cadeia (Brasil, 2023, p. 03).

Assim sendo, ante a ausência de transparência, mostra-se patente o predomínio da insegurança jurídica para o contribuinte. Por fim, o elevado grau de litigiosidade é outro fruto amargo que deriva do caos fiscal. A alta litigância fica demonstrada, de acordo o relatório “Justiça em Números”, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (2021)[15], no exorbitante número de execuções fiscais em curso nos tribunais nacionais[16], as quais já somavam 28,8 milhões, representando uma taxa de 89,7% de congestionamento. É o que se pode ver na representação gráfica retratada na figura 2:

Figura 2 – Série histórica do impacto da execução fiscal na taxa de congestionamento

  Fonte: Conselho Nacional de Justiça (2021)

Considerando esse quadro alarmante, em 2019, pontua Eduardo Maneira (2022), foi apresentada a Proposta de Emenda à Constituição n° 45, a qual, após longos debates e alterações nas duas Casas Legislativas, foi promulgada em 20/12/2023, redundando na Emenda Constitucional nº132/2023 (Reforma Tributária). Com foco na simplificação, na segurança jurídica, na alteração do modo de repartição de receitas e na eliminação da regressividade tributária, a Reforma Tributária buscou eliminar ou, ao menos, minorar as dificuldades supra referidas.

A Reforma tributária trouxe diversas mudanças para o sistema tributário nacional, sendo a criação do IVA dual, indubitavelmente, a mais significativa delas. O IVA, Imposto sobre Valor Agregado, representa a conjugação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e com o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), por isso a terminologia dual. E terá alíquota estimada em 27,27% (Mello, 2024).

A CBS, de competência da União, foi instituída para substituir o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), principais contribuições incidentes sobre o consumo (Spina, 2024). O IBS, por sua vez, foi criado em substituição ao Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias (ICMS), de competência dos estados e do Distrito Federal, e ao Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN), o qual é de competência dos municípios e do Distrito Federal (no exercício de sua atribuição municipal), segundo se vê na figura 3:

Figura 3– Nova configuração tributária  

Fonte: Agência Senado, 2023.

Para os fins do presente artigo, passaremos a destrinchar os aspectos relativos ao IBS.

Após a promulgação da Emenda Constitucional n°132, a Constituição Federal, em seu artigo 156-A, passou a prever a criação do IBS, uma espécie de imposto com gestão compartilhada entre os estados, o Distrito Federal e os municípios, e que será regulamentado por meio de lei complementar nacional (Brasil, 1988). Tal imposto tem por preceito a neutralidade, que nada mais é do que a tentativa de repelir distorções relativas ao consumo, e a padronização em todo o Brasil, o que produz simplificação e segurança jurídica, tanto para entes tributantes quanto para os contribuintes (Brasil, 2024).

Com a finalidade de atingir esses objetivos, o novo imposto em comento (i) terá tratamento legislativo uniforme em todo território nacional; (ii) não admitirá exceções relativas a benefícios e incentivos fiscais, salvo as previstas na Carta Magna; (iii) terá suas alíquotas-referência fixadas pelo Senado Federal e as alíquotas específicas definidas por cada ente competente, sendo que tais alíquotas devem ser as mesmas para todas as operações com bens materiais, imateriais, direitos ou serviços, com exceção das hipóteses previstas na Constituição[17] (Brasil, 1988).

Ademais, a instituição do IBS pretende acabar com a perniciosa dinâmica do imposto em cascata, em que o imposto incide em várias etapas do processo de circulação de mercadorias e impede o creditamento do contribuinte, deixando a operação complexa e custosa. Por isso, o IBS será (i) não cumulativo, isto é, haverá a compensação do imposto devido com o total arrecadado em todas as operações; (ii) não integrará a sua própria base de cálculo; (iii) será exigido pelo valor da soma das alíquotas do estado e do município final do negócio jurídico[18] (Brasil, 1988).

No que concerne à estrutura legislativa do IBS, a Lei Maior definiu que (i) é a própria Constituição que atribui competência para a regulamentação do IBS; (ii) tal regulamentação se dará por lei complementar que, no momento, está em fase de tramitação na casa revisora (Senado Federal), sob o nome Projeto de Lei Complementar n° 68/2024; (si) terá alíquota-referência estabelecida pelo Senado Federal; (iv) lei específica, editada pelos entes subnacionais, quais sejam, estados, Distrito Federal, e municípios, fixará alíquotas incidentes sobre as operações onerosas com bens ou serviços deflagradas nas zonas de sua competência, desde que sejam o destino (Brasil, 1988).

Em relação às imunidades dos IBS, isto é, situações em que não incidirá o imposto, mesmo que implementado o seu fato gerador, definiu o Projeto de Lei Complementar n° 68/2024, que são imunes (i) as exportações de bens e serviços para o estrangeiro; (ii) as transações deflagradas pelos entes políticos; (iii) as operações onerosas realizadas por entidades religiosas e templos de qualquer crença, incluindo suas organizações de assistência e beneficência; (iv) as operações desenvolvidas por partidos políticos, abrangendo também suas fundações, entidades sindicais representativas dos trabalhadores e instituições privadas sem fins lucrativos dedicadas à educação e assistência social; (v) as operações com livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão; (vi) prestações de serviços de comunicação, nas bandas de radiofrequência, nas modalidades de radiodifusão sonora e televisiva, destinadas à recepção livre e gratuita pelo público, dentre outras (Brasil, 2024).

Da análise das diretrizes, pode-se notar que, com a união das competências, somada à troca da incidência do tributo da origem para o destino, haverá uma maior uniformidade no tratamento do imposto pelos entes federados, o que, potencialmente, poderá conter as “guerras fiscais” entre eles, promovendo uma distribuição de renda mais equilibrada, além de mitigar as desigualdades regionais e aumentar a competitividade na iniciativa privada. Lado outro, conforme ensina Florêncio (2021, p. 116), a eliminação da competência exclusiva, pode extenuar “a possibilidade de os entes federados concederem benefícios fiscais, uma vez que estes não mais detêm a competência legislativa para outorga de isenções, nem a capacidade tributária ativa exclusiva para exigência do crédito tributário”.

Ao lado da uniformização, com o advento do IBS, temos também a simplificação do atual modelo praticado, vez que haverá maior clareza sobre a natureza da operação, a incidência do fato gerador e a atribuição de cobrança e arrecadação do ente, abolindo outro problema crônico do sistema tributário nacional que é o conflito de competências. Nesse sentido, ensina Albano (2024, p. 75) que:

[…] o IBS promete encerrar discussões outrora travadas a título de   conflito   de   competência decorrentes da dubiedade da natureza jurídica das operações sob   a   incidência   do   ISS, ICMS   ou   que   se encontravam no limbo. Situação esta que enseja   não   apenas   insegurança   jurídica   ao sujeito passivo   da   relação   tributária, como também aumenta exponencialmente o “custo Brasil”.

Vale mencionar que a Reforma Tributária estabeleceu um cronograma de substituição para a implementação dos novos tributos e a extinção dos antigos, o qual terá início em 2026. Ao longo deste período, o sistema tributário nacional se encontrará imerso em um regime de transição, no qual os novos tributos serão arrecadados simultaneamente aos antigos, os quais estão destinados ao aniquilamento gradual. A substituição total dos tributos mencionados se dará, somente, ao término do prazo previamente estipulado, qual seja, 2033 (Brasil, 2024). Vejamos na figura 4, abaixo, o esboço das modificações:

Figura 4– Transição Fiscal  

Fonte: Agência Câmara dos Deputados, 2024.

Por fim, a administração do IBS ficará a cargo do chamado Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços, o qual foi introduzido no Sistema Tributário Nacional pela Reforma Tributária e cuja atuação será regida por lei complementar, atualmente em tramitação no Congresso Nacional (Brasil, 2023).

  • COMITÊ GESTOR DO IBS

O Comitê Gestor do Imposto Sobre Bens e Serviços (CG-IBS)[19], ainda em fase de apreciação e deliberação legislativa, no âmbito do Projeto de Lei Complementar n° 108/2024, possuirá, conforme o art. 156, §1°, da CF, natureza jurídica de “entidade pública sob regime especial[20], gozando de autonomia técnica, administrativa, orçamentária e financeira”. É por meio dele que os entes federados exercerão as competências administrativas relacionadas ao IBS, a saber, “I-editar regulamento único e uniformizar a interpretação e a aplicação da legislação do imposto; II-arrecadar o imposto, efetuar as compensações e distribuir o produto da arrecadação entre Estados, Distrito Federal e Municípios; III-decidir contencioso administrativo” (Brasil, 1988).

O desenho constitucional e institucional do Comitê buscou privilegiar a integração dos entes federativos e uma representatividade paritária, de modo que a entidade pública será composta por dois grupos, cada um com 27 membros, sendo um responsável por defender os interesses de cada estado e do Distrito Federal, e outro por representar o agrupamento de municípios e o Distrito Federal. Neste último caso, 14 (quatorze) dos 27 (vinte e sete) membros serão eleitos, por meio de votos com peso igual de cada Município, já os outros 13 (treze) serão escolhidos levando em consideração os votos de cada Município, ponderados pela população correspondente (Brasil, 1988).

Ademais, no tocante às deliberações no CG-IBS, temos que estas serão aprovadas, atendendo a um critério cumulativo, pela maioria absoluta dos representantes, isto é, 8 (oito membros) e “de representantes dos estados e do Distrito Federal que correspondam a mais de 50% (cinquenta por cento) da população do País” (Brasil, 1988, seção V-A, art. 156-B, §4°, inciso I, al “b”). Já em relação ao bloco municipal, faz-se necessária a maioria absoluta de seus membros participantes do Comitê para aprovação das resoluções. Ao comentar a estrutura de representação e os critérios de voto adotados, Albano (2024, p. 76) observa que:

O critério meramente quantitativo é aliado ao qualitativo de representação populacional em nível nacional. A exigência qualitativa cria um obstáculo à possibilidade de regionalização das   decisões.   É   dizer:   as   regiões   norte   e nordeste que representam 16 dos 27 componentes do bloco estadual de tal forma que, em conjunto, asseguraria a maioria em quórum, não representam o quantitativo populacional necessário à aprovação

A instauração do CG-IBS será, em um primeiro momento, custeada pela União no período de 2025 a 2028. Após o referido período, com a efetiva operacionalização do IBS, o financiamento da entidade será feito por meio de uma parcela do produto da arrecadação do imposto. Cabe mencionar que os valores despendidos pela União serão ressarcidos (Brasil, 2024).

Do ponto de vista de comando organizacional, é válido aduzir que o comitê será presidido por alguém com notório saber no campo da administração pública, sendo nomeado após deliberação e aprovação do Senado Federal, por sua maioria absoluta. Além disso, o presidente do comitê gestor, à semelhança dos ministros de Estado, poderá ser convocado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, assim como por suas respectivas comissões, para apresentar informações, sob sanção de incorrer em crime de responsabilidade (Brasil, 1988).

Por sua vez, o controle externo, ou seja, a fiscalização contábil, operacional, e patrimonial do CG-IBS, segundo art. 40 do PLP n° 108/24, ficará a cargo dos tribunais de contas estaduais ou municipais (Brasil, 2024).

É possível afirmar que algumas alterações deflagradas pela Reforma Tributária indicam a possibilidade de desmantelo da organização federativa do Estado, o que significaria malferir cláusula pétrea (art. 60, inciso IV, da CF). Nesse sentido, a primeira problemática que pode ser aventada, está relacionada à criação de um imposto, como é o caso do IBS, de gestão compartilhada, disciplinado por lei complementar federal (Brasil, 1988). Os impostos substituídos pelo IBS, quais sejam, ICMS e ISS, eram instituídos e tinham as suas alíquotas definidas, por lei, pelo ente competente para editá-la, no exercício de sua competência exclusiva, a qual é conferida pela Lei Maior.

Agora, é uma lei complementar, de caráter nacional, que ditará as regras que os entes federados deverão observar no tratamento do novo imposto. Destarte, aclara Albano (2024, p. 81) que “o ente não mais   terá   autonomia   para   definir   os elementos básicos do tributo, tais como o seu fato gerador, a sua base de cálculo, o sujeito passivo tributário e as penalidades. Diante disso, é forçoso reconhecer o incremento do poder federal e o consequente achatamento da autonomia dos entes federativos”.

Por outro lado, não se pode ignorar o fato de que uma harmonização legislativa teria o condão de arrefecer as guerras fiscais e mitigar as desigualdades regionais. A possibilidade de edições de leis autônomas pelos estados e municípios, muitas vezes, produz um cenário de insegurança jurídica e abala o equilíbrio federativo, vez que cada ente almeja atrair para si a receita advinda dos tributos. Assim, ensina Merheb (2024, p.1) que “[…] o prejuízo não é à autonomia e, sim, à predação fiscal, que expande distorções alocativas e incentiva a rivalidade”.

Outro ponto nevrálgico, e que merece atenção, diz respeito às competências do CG-IBS. Nota-se que a entidade passará a exercer as competências tributárias que atualmente cabem aos entes subnacionais. Atribuições como arrecadar o imposto, efetuar compensações, conceder benefícios, distribuir a receita da arrecadação, e decidir o contencioso administrativo não serão mais realizadas pelos próprios entes, mas sim pelo comitê gestor, o que pode produzir uma assimetria federativa (Brasil, 1988).

Dessa maneira, a atuação dos estados, do Distrito Federal e dos municípios se restringirá a definir as alíquotas específicas do imposto quando forem destino da circulação de serviços ou mercadorias e a votarem no colegiado do CG-IBS, cujas regras de deliberação e aprovação foram retromencionadas. Acerca disso, Martins (2023, p.1) entende que:

A criação de uma entidade com competências próprias de ente federativo, esvazia a competência dos órgãos legislativos competentes, instâncias apropriadas para proposição, discussão, deliberação e decisão acerca de matérias tributárias de competência de estados e municípios. Órgãos legislativos estes compostos por representantes eleitos pelo povo, legitimados, portanto, para tratarem de tais assuntos, diferentemente de um conselho que será formado por burocratas escolhidos por critérios técnicos e longe dos olhos da população.

Contudo, em que pese a perda de parcela de autonomia pelos entes tributantes, o que se transferirá à entidade pública será, tão somente, o exercício da atividade em favor de uma integração e cooperação tributárias, preservando-se a titularidade desta, o que não implica, necessariamente, em uma proposta tendente a abolir a forma federativa de Estado. Tanto é assim, que as entidades subnacionais manterão sua ingerência sobre outras figuras tributárias que lhes competem, o que desnatura a ideia de elisão federativa (Albano, 2024, p.82).  

Ademais, a vedação à concessão de incentivos e benefícios fiscais, com exceção daqueles previstos na Constituição Federal, é mais uma questão sensível na conformação tributária dada pela Reforma. Com a instituição do IBS, as entidades políticas regionais e locais não mais poderão conferir benefícios fiscais em sua zona de competência. Tal medida se justifica pela necessidade de atingir o propósito da uniformização tributária pretendido pela Reforma, a fim de alcançar as benesses ligadas a essa harmonização, como segurança jurídica, correção das distorções fiscais, disparidades regionais e locais, dentre outras (Brasil, 1988).

Porém, é imperioso reconhecer que a aludida vedação retira parte da autonomia do ente tributante, o que por si só, não fere de morte a organização do Estado. Ainda subsistirão outras formas de gerar atratividade fiscal e estimular investimento, sem que isso represente discrepâncias e prélios aviltantes (Meherb, 2024, p.1).

É válido, ainda, aduzir que as entidades federativas perderam. em prol do CG-IBS, a legitimidade para resolver o contencioso administrativo em relação ao imposto. Caberá aos entes apenas lavrar os autos de infração, não possuindo mais poder para processá-los e julgá-los. Essa característica, combinada com outras já supramencionadas, torna o IBS uma espécie tributária sui generis, vez que a “[…] União institui o imposto; estados e municípios, instituem as alíquotas e fiscalizam o imposto; e o Comitê Gestor promove a arrecadação, a partilha do imposto e julga os processos administrativos tributários oriundos de autos de infração lavrados por estados e municípios” (Harada,2024, p.1).

Uma solução para a manutenção da autonomia e para fazer frente à ameaça de afronta à cláusula pétrea da forma federativa do Estado, é redesenhar a estrutura e as atribuições do CG-IBS, de modo a devolver aos entes subnacionais as competências que lhes são típicas e que decorrem do seu poder de tributar. Dessa maneira, manter-se-ia sua capacidade de autoadministração, o que permite maior efetividade na busca da realização do bem comum e do fortalecimento da estrutura financeira das entidades federadas (Martins, 2023, p.1).

Lado outro, manter o atual sistema é, indubitavelmente, conservar as anomalias que ele possui hoje. Vale dizer que mitigação de autonomia, não implica, em si mesma, em abolição do arcabouço federativo. Nessa toada, Albano (2024, p.82) assevera que:

[…] a criação de uma entidade pública composta   por representantes   dos entes federativos não denota, por si só, intuito de abolir a forma   federativa.   Na verdade, remodela os contornos federativos ao passo que substitui a multiplicidade legislativa, a ausência de uniformidade e o mau uso das políticas de incentivo por uma atuação integrada, concentrada em    uma entidade pública composta por representantes dos níveis federativos, em sua totalidade quanto estadual e majoritário quanto ao municipal. Pode-se, por assim dizer que em matéria de tributação sobre o consumo observa-se uma faceta do federalismo que pode ser denominada de integrativo-representativo já que:  integra os entes -em contraposição às autonomias estanques, isoladas e conflituosas -e o faz mediante a estruturação de uma entidade   representativa que deliberará os temas afetos ao tributo de competência compartilhada.

Teme-se que essa retirada de autonomia dos entes subnacionais, estribada no fundamento de aumento da cooperação federativa e na correção de problemas que há tempos afligem os contribuintes, seja apenas um subterfúgio para justificar uma centralização autoritária e cerceadora. Assim, corre-se o risco de que a idílica troca de benefícios mútuos, transforme-se, ao fim e ao cabo, na preponderância de um ente sobre outro, o que promoveria uma falência do federalismo fiscal (Conti; Mascarenhas, 2023, p. 125).

Entretanto, é irrefragável que a criação do IBS e do comitê responsável por gerí-lo, a priori, pode significar um passo importante para a reestruturação do nosso teratológico sistema tributário. A alteração do exercício direto, para uma atuação colegiada e representativa por parte dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, aliada a uma harmonização tributária, parece ser um caminho viável para a edificação de um sistema caracterizado pela simplicidade, transparência, justiça tributária, e cooperação. Assim, se bem implementada, pode ser uma inovação capaz de robustecer o pacto federativo, elevando a integração entre os entes pactuantes, além de fazer florescer esperanças de recuperação de uma máquina fiscal que há muito tempo respira por aparelhos.

  • CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com uma proposta arrojada e ambiciosa, a Reforma Tributária pretende, por meio do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), produzir uma profunda e bem-vinda reestruturação do sistema tributário brasileiro. Ao conjuminar o ICMS e o ISS, transformando-os em IBS, a alteração legislativa almeja simplificar o sistema, eliminar a perniciosa e contraproducente cumulatividade, além de propiciar maior transparência às operações tributárias. Tais mudanças são significativos avanços para o combate e eliminação dos vermes que corroem, há bastante tempo, o federalismo fiscal. A guerra fiscal entre os estados e a complexidade da legislação tributária estão entre eles.

Além disso, com uma reformulação da tributação sobre o consumo, que tanto aflige os contribuintes, especialmente os mais pobres, associada a uma mitigação das desigualdades regionais e locais, a Reforma Tributária busca promover a justiça tributária, privilegiando a capacidade contributiva e a criação de um ambiente saudável e atrativo para os negócios. Ao vedar as concessões de incentivos e benefícios fiscais e uniformizar a legislação, a receita do IBS pode ser redistribuída de modo mais igualitário, vez que se eliminam as distorções geradas pelas inúmeras leis autônomas, editadas pelos entes políticos, e a sanha competitiva entre eles. No entanto, este propósito somente poderá ser atingido se os entes subnacionais tiverem a liberdade de fixar as alíquotas do novo tributo, de forma a atender às necessidades regionais e locais.

É relevante pontuar que a substituição da antiga dinâmica tributária pela nova, a qual findará em 2033, exigirá articulação e colaboração entre diferentes níveis de governo. Nesse interregno, em que haverá a coexistência dos antigos e do novo imposto, será importante, para não dizer indispensável, a adoção de mecanismos que permitam uma transição suave e que minimizem os impactos negativos sobre a arrecadação. Desse modo, o aprimoramento da comunicação e educação fiscal para preparar os contribuintes e as administração tributária são peças-chave para o sucesso das alterações. 

A centralização, em um Comitê Gestor, das competências que antes eram exercidas pelos entes federados, representa uma transformação de paradigma na administração tributário-fiscal brasileira. Em que pese essa abordagem estar estribada na promessa de maior uniformidade e eficiência, é incontendível que ela suscita receios em relação à preservação da autonomia dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, corolário de uma federação. Dessa maneira, haverá a inarredável necessidade de equilibrar a integração e a cooperação entre os entes políticos, com a preservação de sua independência, com vistas a não se ultrapassar a linha tênue entre mitigação de autonomia e abolição do federalismo, o que tornaria parte da Reforma Tributária inconstitucional.

Assim, face ao exposto, aprioristicamente, não se pode afirmar taxativamente que a criação do IBS e do Comitê responsável por geri-lo sejam propostas tendentes a abolir a forma federativa de Estado. É fato, contudo, que os entes subnacionais terão um achatamento em sua autonomia, porém isso não leva necessariamente a uma corrosão do federalismo. A partir da implementação do novo modelo tributário, poderemos ter, na verdade, a celebração de uma repactuação federativa, marcada pela integração, cooperativismo e representatividade. Caberá, assim, em grande medida, ao Conselho Federativo e ao Comitê Gestor delinear o futuro de nosso sistema tributário pátrio.

REFERÊNCIAS

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2. BALTHAZAR, U C. História do Direito Tributário no Brasil: 01. ed. Florianópolis: Fundação Boiteux,2005.Disponível em: https://pt.slideshare.net/slideshow/histria-do-tributo-no-brasil-ubaldo-cesar-balthazar/25075566#20. Acesso em 15 jun. 2024.

3. BANCO MUNDIAL. Doing Business Subnacional Brasil 2021. Washington, DC: Banco Mundial, 2021. Disponível em: https://subnational.doingbusiness.org/pt/reports/subnational-reports/brazil. Acesso em: 26 ago.2024.

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5. BRASIL. [Constituição (1891)]. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1891. Disponível em https://www.planalto.gov.br/cciviL_03/Constituicao/Constituicao91. Acesso em: 14 jun. 2024.

6. BRASIL. [Constituição (1934)]. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1934. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm. Acesso em: 16 jun. 2022.

7. BRASIL. [Constituição (1937)]. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1937. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1937. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao37.htm. Acesso em: 17 jun. 2022.

8. BRASIL. [Constituição (1946)]. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1946. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/cciviL_03////Constituicao/Constituicao46.htm. Acesso em: 17 jun. 2022.

9. BRASIL. [Constituição (1967)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Brasília: Presidência da República,1967. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao67.htm. Acesso em: 18 jun. 2024.

10. BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Presidência da República,1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 19 jun. 2024.

11. BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei Complementar n° 68/2024. Institui o Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, a Contribuição Social sobre Bens e Serviços – CBS e o Imposto Seletivo – IS e dá outras providências. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2024. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2414157&filename=PLP%2068/2024. Acesso em: 22 out.2024.

12. BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei Complementar n° 108/2024. Institui o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços – CG-IBS, dispõe sobre o processo administrativo tributário relativo ao lançamento de ofício do Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, sobre a distribuição para os entes federativos do produto da arrecadação do IBS, e sobre o Imposto sobre Transmissão Causa mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, e dá outras providências. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 2024. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2433204&filename=PLP%20108/2024. Acesso em: 22 out.2024.

13. BRASIL. Lei n° 5172, de 25 de outubro de 1966 [Código Tributário Nacional]. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Brasília: Presidência da República, 1966. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm. Acesso em: 11 ago. 2024

14. BRASIL. Emenda Constitucional n° 132 de 20 de dezembro de 2023.Altera o Sistema Tributário Nacional. Brasília: Presidência da República, 2023. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc132.htm. Acesso em: 28 mar. 2024.

15. BRASIL. Ministério da Fazenda. Assessoria Especial de Comunicação Social. Reforma Tributária-Perguntas e Respostas. Brasília: Ministério da Fazenda, 2023. Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/reforma-tributaria/arquivos/perguntas-e-respostas-reforma-tributaria_.pdf. Acesso em: 26 ago.2024.

16. BRASIL. Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Brasília: Presidência da República,1991. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm. Acesso em: 27 ago. 2024.

17. CARVALHO FILHO, J.S. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 9786559774265. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559774265/.Acesso em: 05 mai. 2024.

18. CATARINO, J. R., e ABRAHAM, M. O Federalismo Fiscal no Brasil e na União Europeia.Rei – Revista Estudos Institucionais, 4(1), 186–210. Disponível em: https://doi.org/10.21783/rei.v4i1.26. Acesso em: 25 ago. 2024.

19. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Justiça em números 2022.Brasília: CNJ, 2022. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022-1.pdf. Acesso em: 28 ago.2024.

20. CONTI, José Maurício e MASCARENHAS, Caio Gama. O debate da reforma tributária leva o direito financeiro a sério? Migalhas. Publicado em 24 de janeiro de 2024. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/400788/o-debate-da-reforma-tributaria-leva-o-direito-financeiro-a-serio. Acesso em: 02/12/2024.

21. FERREIRA, L.C. Evolução histórica da tributação no Brasil e algumas sugestões para a reforma tributária. Dissertação (Mestrado em Ciências Cont. Atuariais) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, p. 131. 2012. Disponível em: https://repositorio.pucsp.br/jspui/handle/handle/1503. Acesso em: 10 ago. 2024.

22. FLORÊNCIO, Paulo Henrique Procópio. O novo IBS como alternativa à guerra fiscal do ICMS: um estudo das soluções e do risco de violação ao pacto federativo. São Paulo – SP. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. 2021, p. 111-126. Disponível em: https://revistas.pge.sp.gov.br/index.php/revistapegesp/article/view/740/1441. Acesso em: 02/12/2024.

23. GOMES, Fabio L. Reforma Tributária: tributação, desenvolvimento e economia digital. São Paulo: Grupo Almedina, 2022. E-book. ISBN 9786556274409. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786556274409/. Acesso em: 15 ago. 2024.

24. IBS SISTEMAS. Complexidade Tributária: 1500 horas só pagando impostos.s.l.Disponível em:https://ibssistemas.com.br/complexidade-tributaria-1500-horas-so-pagando-impostos/. Acesso em: 25 ago. 2024.

25. INSTITUTO BRASILEIRO DE PLANEJAMENTO E TRIBUTAÇÃO. Estudo Quantidade de Normas 35 Anos CF – 2023. Disponível: https://ibpt.com.br/estudo-quantidade-de-normas-35-anos-cf-2023/. Acesso em: 14 ago. 2024.

26. LINCK, J.C. A evolução histórica do direito tributário e do pensamento tributário. Revista da FESDT n.4, 2009. Disponível em: https://www.fesdt.org.br/docs/revistas/4/artigos/12.pdf. Acesso: 16 jun.2024.

27. MANEIRA, Eduardo. IVA à brasileira. Folha de São Paulo. Coluna Opinião. https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2023/12/iva-a-brasileira-em-2033.shtml. Acesso em 02/12/2024.

28. MARTINS, Alberto André Barreto. Reforma tributária: a inconstitucionalidade do conselho federativo. JOTA. Publicado em 23/11/2023. Disponível em: https://www.jota.info/artigos/reforma-tributaria-a-inconstitucionalidade-do-conselho-federativo. Acesso em: 02/12/2024.

29. MAZZA, Alexandre. Curso de Direito Tributário. São Paulo: SaraivaJur, 2024, 10ª ed.

30. MELLO, E. R. Direito fundamental a uma tributação justa. São Paulo:Atlas,2013.

31. MERHEB, Pedro. O futuro legislativo da regulamentação da reforma tributária. Consultor Jurídico. Publicado em 2 de março de 2024. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-mar-02/o-futuro-legislativo-da-regulamentacao-da-reforma-tributaria/. Acesso em: 02/12/2024.

32. MESGRAVIS, L. História do Brasil colônia. São Paulo: Editora Contexto, 2015. E-book. ISBN 9786555414165. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786555414165/. Acesso em: 15 jun. 2024.

33. OLIVEIRA, B. S. et al. O tributo ao longo da história no Brasil. Tributos e Desigualdades, online, p. 1, 4 abr. 2023. Disponível em: https://www.politize.com.br/tributos-e-desigualdade/o-tributo-ao-longo-da-historia-no-brasil/. Acesso em: 18 jun. 2024.

34. SABBAG, E. Direito Tributário Essencial. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. E-book. ISBN 9786559640317. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559640317/. Acesso em: 29 ago. 2024.

35. SCAFF, F.F. 50 anos de tributação e finanças como um desafio ao país. 2014.Disponível: https://www.conjur.com.br/2014-mar-25/contas-vista-50-anos-tributacao-quem-pensando-pais/. Acesso: 13 jun. 2024.

36. SEHN, S. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Grupo GEN, 2024. E-book. ISBN 9786559648634. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559648634/. Acesso em: 19 jun. 2024.

37. SPINA, Vanessa Damasceno Rosa. Reforma tributária: o IBS, a CBS e o processo judicial. Consultor Jurídico. Publicado em 24 de março de 2024. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-mar-24/o-ibs-a-cbs-e-o-processo-judicial/. Acesso em: 02/12/2024.


[1]Graduando do Curso de Direito, do Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos – Uniceplac. E-mail: filijanson@gmail.com.

[2] Professor do Curso de Direito, do Centro Universitário do Planalto Central Apparecido dos Santos – Uniceplac. Doutor pela Universidade de Paris 1 (Panthéon-Sorbonne). E-mail: fernandomfurlan@gmail.com.

[3] De acordo com a Reforma Tributária, o IBS substituirá, gradativamente, o ICMS e o ISSQN.

[4] Balthazar (2005, p. 58) leciona que “Além do ouro, havia também o diamante, riqueza intensamente explorada e objeto da ação feroz do fisco lusitano. Os mesmos mecanismos de arrecadação utilizados nas regiões auríferas chegaram às áreas de diamante (Distrito Diamantino), só que de modo mais severo. Houve uma novidade, o Quinto foi substituído pelos contratos de monopólio”.

[5] A diminuição da produção aurífera também se refletiu nos rendimentos dos impostos de Entradas. Tratava-se da cobrança de uma taxa significativa sobre todos os artigos importados e exportados que era feita de acordo com o peso da mercadoria. Essa forma, um tanto estranha de cobrança, tinha grandes inconvenientes para o desenvolvimento da economia em geral e da atividade mineradora: produtos como ferramentas, ferro bruto e outros artigos necessários para desenvolver qualquer trabalho saíam muito caros, enquanto bens de luxo, como tecidos, joias, sapatos, saíam muito baratos, o que encorajava o consumo de ostentação (Mesgravis, 2015, p. 51).

[6] A Constituição de 1824 ficou conhecida como a “Constituição da Mandioca” porque estabelecia que somente brasileiros com renda anual similar a 150 alqueires de mandioca poderiam votar. 

[7] Os Atos Institucionais foram normas jurídicas excepcionais que suplantavam quaisquer outras, inclusive a Constituição, e foram editadas pelos comandantes das Forças Armadas ou pelo presidente da República durante o Regime Militar (1964-1985).

[8]    Segundo Elizabete Mello (2013. p.27): O    Federalismo    Fiscal    consubstancia    na divisão do poder de tributar entre os entes Federativos (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios).  Esse poder de    tributar    não    se    refere    apenas    à competência tributária de criar/instituir e legislar    sobre    os    tributos    descritos    na Constituição    Federal    de    1988 (artigos 145/149-A), mas    também    se    refere    à capacidade    tributária    para    fiscalizar    e arrecadar os tributos.

[9] Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do art. 18 da Constituição”.

[10] Conforme disposição do art. 114 do Código Tributário Nacional, fato gerador é “a situação definida em lei como necessária e suficiente para a ocorrência da obrigação tributária”.

[11] Consoante o art. 1° da Lei 8.212/91, a Seguridade pode ser definida como sendo um “conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social”.

[12] Acerca disso, Marcus Abraham e João Ricardo Catarino (2018, p.199) lecionam que há uma […] preocupação quanto ao desequilíbrio do poder fi­scal entre os três entes federativos, uma vez que a indesejada concentração do poder no federalismo fi­scal brasileiro em favor da União, em detrimento dos Estados e Municípios, propicia negativas consequências, tais como: a) o enfraquecimento do processo democrático decorrente da luta entre as forças políticas regionais e a central; b) uma indesejada competição ­fiscal – vertical e horizontal – entre os entes federativos, conhecida como “guerra fi­scal”; c) a incapacidade de o governo central exercer satisfatoriamente sua função coordenadora em todo o território, gerando práticas autônomas dos governos regionais e locais incompatíveis com o interesse nacional; d) a minimização dos processos de redução das desigualdades regionais e do estímulo ao desenvolvimento social e econômico local.

[13] Disponível em: https://ibpt.org.br/em-media-legislacao-brasileira-edita-quase-40-normas-tributarias-por-dia-desde-1988-revela-estudo-do-ibpt/. Acesso em: 27/11/2024.

 

[15]Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/11/relatorio-justica-em-numeros2021-221121.pdf. Acesso em: 27/11/2024.

[16] Ainda segundo o relatório o maior impacto das execuções fiscais está na Justiça Estadual, que concentra 86% dos processos. A Justiça Federal responde por 14%; a Justiça do Trabalho por 0,2%; e a Justiça Eleitoral por apenas 0,01% (CNJ, 2021, p. 06).

[17] Art.156-A, §1º, VI, daConstituiçãoFederalde1988, incluído pela Emenda Constitucional nº132/2023.

[18] Art.156-A, §1º, VII, VIII, IX, da Constituição Federal de1988, incluído pela Emenda Constitucional nº132/2023.

[19] A instância máxima de decisões do CG-IBS será o Conselho Superior, a ser criado 120 dias após a sanção da lei complementar. O Conselho terá 54 membros remunerados: 27 indicados pelos governos dos estados e do Distrito Federal e outros 27 eleitos para representar os municípios e o DF. Também haverá número igual de suplentes. Além do Conselho Superior, outros órgãos do Comitê Gestor do IBS são: diretoria executiva, com ao menos nove diretorias; secretaria geral; assessoria de relações institucionais e federativas; corregedoria e auditoria interna. Fonte: Agência Senado.

[20] Uma entidade pública sob regime especial é, em regra, uma autarquia que possui características próprias que a diferenciam das autarquias comuns, como maior autonomia administrativa, técnica ou financeira. Essas prerrogativas devem estar previstas na lei de criação da autarquia. A Agência Senado informa que o Comitê Gestor não terá vinculação a nenhum órgão público. Contudo, de acordo com o Decreto-Lei 200/1967, artigo 4º, inciso II, que dispõe sobre a organização da Administração Federal: “[a] Administração Federal compreende: I – A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios e II – A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; b) Empresas Públicas; c) Sociedades de Economia Mista e d) fundações públicas”. E no artigo 19 prevê que: “[t]odo e qualquer órgão da Administração Federal, direta ou indireta, está sujeito à supervisão do Ministro de Estado competente”.