Fabio Luiz Gomes

Imposto sobre valor agregado – algumas delimitações conceituais tributárias e do direito privado

Corpo editorial

Editor:

Elvino de Carvalho Mendonça

Conselho editorial:

Amanda Flávio de Oliveira – Doutora em direito

Eduardo Molan Gaban – Doutor em direito

Elvino de Carvalho Mendonça – Doutor em economia

Fernanda Manzano Sayer – Doutora em direito

Fernando de Magalhães Furlan – Doutor em direito

Katia Rocha – Doutora em Engenharia de Produção/Finanças

Luiz Alberto Esteves – Doutor em economia

Márcio de Oliveira Júnior – Doutor em economia

Marco Aurélio Bittencourt – Doutor em economia

Marcos André Mattos de Lima – Mestre em economia 

Rachel Pinheiro de Andrade Mendonça – Doutoranda em direito pelo IDP/DF e mestre em direito pela UNB

Vanessa Vilela Berbel – Doutora em Direito

Ficha catalográfica

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Imposto sobre valor agregado – algumas delimitações conceituais tributárias e do direito privado

Fabio Luiz Gomes

Resumo

O Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) é um tributo utilizado em grande parte dos sistemas jurídicos dos Estados do mundo, e por essa razão se faz necessário que mais países venham a implementá-lo nos seus sistemas jurídicos. O problema da interpretação dos conceitos de direito tributário com normas de direito privado assume proporções globais, sobretudo para conferir maior segurança jurídica aos contribuintes e minimizar a fraude e evasão fiscal, por essa razão uma forçosa criação de normas internacionais nesse sentido. Um grande desafio será compatibilizar as normas privadas e tributárias dos países de origem anglo-saxônica e romano-germânica, common law e civil law. Portanto, este trabalho irá desenvolver de forma resumida o desafio conceitual de “entrega de bens” e “prestação de serviços”.

Palavras-chave

Imposto sobre Valor Agregado. Tributos indiretos. Comércio internacional. Conceitos decommon law e civil law. Normas internacionais de tributos indiretos e conceitos de direito privado.

Abstract

The Value Added Tax (VAT) is a tax used in a large part of the legal systems of States around the world, for this reason it is necessary for more countries to implement it in their legal systems. The problem of interpreting the concepts of tax law with private law norms assumes global proportions, especially to provide greater legal certainty to taxpayers and minimize tax fraud and evasion, which is why there is a mandatory creation of international standards in this regard. A major challenge will be to make private and tax rules from countries of Anglo-Saxon and Roman-Germanic origin, common law and civil law, compatible. Therefore, this work will briefly develop the conceptual challenge of “delivery of goods” and “provision of services”.

Keywords

Value Added Tax. Indirect taxes. International trade. Common law and civil law concepts. International rules on indirect taxes and concepts of private law.

Introdução

No Brasil, de tempos em tempos se volta à discussão sobre a adoção de um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA).Nos idos da década de 1960, após a reforma tributária, já se falava em uma nova reforma tributária para adoção de um IVA, que, diga-se, poderia ter sido implementado no Brasil ainda nesse período.Enquanto isso, aproximadamente 170 países já possuem em seus ordenamentos jurídicos o IVA.

Os trabalhos desenvolvidos tanto nos Estados individualmente considerados quanto nos blocos regionais e no âmbito internacional procuram estudar os impactos dos tributos indiretos no cidadão, bem como buscam diminuir a evasão fiscal e a fraude fiscal.

Nesse diapasão, o aspecto conceitual desse tributo passa a ser o elemento principal de qualquer discussão nos três níveis espaciais do IVA.

Cumpre destacar que o IVA possui basicamente dois elementos materiais: “entrega de bens” e “prestação de serviços” e que os Estados que possuem esse tributo procuram no direito privado a resposta conceitual para uma interpretação genérica, de outro lado estabelecem, contudo, normas de exceção e neste alteram os conceitos do direito privado.

Observa-se que esses conceitos não possuem somente uma dimensão interna dos países, mas também asdimensões regional e internacional.

Apesar da complexidade que envolve o estudo dos conceitos do IVA nas três dimensões, é verdade que esse estudo só é possível em razão do número grande de países que adotam o IVA em seus sistemas jurídicos e, além disso, de os conceitos elementares do direito privado possuírem uma origem em comum no direito romano.

1. Elementos conceituais do Imposto sobre Valor Agregado – Tangenciamento necessário na delimitação conceitual

a) Elemento territorial

Estabelece-se um vértice tangencial entre as três dimensões conceituais do direito privado, esse vértice será o elemento de conexão, dessa forma entende-se que será possível entender melhor os conceitos do IVA e com isso servir de elemento de propulsãonas transações de bens e serviços no cenário internacional, com maior participação das pessoas internacionais.

No aspecto conceitual os signos estabelecem diversos significados, sobretudo, os oriundos dos contratos de compra e venda de bens e serviços, e aos destinatários da norma (sejam empresas ou pessoas naturais) em três dimensões, sem qualquer parâmetro conceitual, isso pode denotar inúmeras distorções decorrentes de inúmeras variáveis.

b) Conceito de “entrega de bens” e “prestação de serviços”

Obviamente dentro dos conceitos de “entrega de bens” e “prestação de serviços, sejam em transações B2B (entre empresas), ou B2C(entre empresa e consumidor), ou mesmo B2G (entre empresa e governo), há de se esperar que a aproximação conceitual entre os envolvidos permita uma maior concretude e segurança jurídica aos personagens dessas transações, podendoesses agentes econômicos alcançar um ambiente denegócio com maior confiança nos sistemas jurídicos.

O conceito de “entrega de bens” possui diversas acepções que envolvem o verbo “entregar”: esse signo poderia direcionar a muitos significados, p. ex., dar, oferecer, alienar, consignar, doar, transferir, vender etc., mas é fato que possui uma relação obrigacional de “dar”.

Observa-se que cada sinônimo descrito poderá também identificar uma obrigação, um contrato: contrato de compra e venda, contrato de doação, contrato de alienação, contrato de consignação etc.

Em todos esses contratos encontramos o seu sentido significante no direito privado; de modo geral, os Estados reconhecem genericamente o seu significado, afinal são contratos antigos com fundação no direito romano.

Na União Europeia, o conceito atribuído à entrega de bens fixa mais um elemento, a título oneroso[1], portanto incide o IVA em contratos onerosos[2].

De modo geral, os contratos de compra e venda são os mais utilizados na prática e também os mais tributados por IVA, seja nas transações internas no território dos Estados, seja nas transações intracomunitárias.

Já no conceito de “prestação de serviços”, o verbo é “prestar”: portanto, uma obrigação de fazer, que também pode se relacionar a inúmeros tipos contratuais, p. ex., contrato por tempo determinado, contrato por tempo indeterminado, contrato de trabalho home office, contrato de prestação de serviços advocatícios etc.

Novamente, aqui, as normas comunitárias da União Europeia colocaram a onerosidade como requisito; portanto, as prestações de serviços devem ser onerosas.

c) Conceito de “entrega de bens” e “prestação de serviços” no âmbito internacional

Em que pese o grande avanço nos sistemas jurídicos dos Estados, seria inócua sem um tratamento internacional estabelecendo conceitos do direito privado e ainda deveriam estabelecer conexão direta com os tributos indiretos, sobretudo o IVA, de modo a buscar nos conceitos do direito tributário o alicerce para conceituar “entrega de bens” e “prestação de serviços”.

Constata-se, assim, o entrave em termos reais por não haver uma harmonização dos conceitos do direito privado e mais ainda a sua utilização pelos Estados para os seus conceitos nas suas normas tributárias.

Essa harmonização deve partir de uma variedade de dimensão zero, onde se buscaria o tangencialmente tridimensional e harmônico; dessa forma, estar-se-ia diminuindo as variáveis possíveis em relação a diversos princípios, dentre eles: a neutralidade fiscal, a segurança jurídica, a confiança e a isonomia.

Um próximo passo seria desenvolver normas que viessem a garantir os contribuintes nas três dimensões, o que só seria possível caso fosse desenvolvida efetivamente uma harmonização conceitual tridimensional.

Atualmente os trabalhos realizados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) seguem essa linha de forma muito tímida, dando maior ênfase ao desenvolvimento do comércio internacional e à aplicação dos princípios da neutralidade e do Estado de destino (OCDE, 2010; Arendonk; Jansen; Paardt, 2011).

De outro lado, as Nações Unidas buscam harmonizar os contratos de compra e venda, isto é, normas do direito privado, através da CISG (United NationsConventiononInternationalSaleofGoods).

Como dito acima, os contratos de compra e venda representam grande parte das transações que envolvem bens.

Infelizmente constata-se que o desenvolvimento do direito privado e do direito fiscal vem ocorrendo de forma separada, como se isso fosse possível, gerando um complexo normativo assistemático, dificultando as transações internacionais e o desenvolvimento do comércio internacional.

Fenômeno similar vem ocorrendo na União Europeia – sem mencionar o Mercosul (pois neste nem se discute, está anestesiado na própria origem) –, onde se desenvolvem grandes grupos de estudo para harmonizar o direito privado europeu[3] e o prosseguimento da harmonização do IVA.

Em que pese serem trabalhos muito bem elaborados, constantemente o Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia e os Tribunais internos de cada Estado são instados a se pronunciar sobre a aplicação ou não de uma norma conceitual do direito privado interno.

d) Interpretação econômica das normas conceituais tributárias

Observa-se que a aplicação da teoria econômica das normas conceituais tributárias (como será desenvolvido) leva ao casuísmo, uma opção a favor do fisco, e, no âmbito internacional, onde há muitas soberanias fiscais envolvidas, acaba por inviabilizar a tributação internacional ou intracomunitáriadessas transações ou inviabilizaria a atuação das pequenas e médias empresas a atuarem no cenário internacional ou dentro de um bloco integracional.

2. Sistemas da common law e civil law e os conceitos de direito privado e tributário

Numa perspectiva ampla, dois grandes sistemas se sobressaem, os sistemas de common law e civil law, representantes anglo-saxônico e romano-germânico, trabalhando com conceitos estabelecidos com formas interpretativas distintas (Séroussi, 2006).

A tradição dacivil law foi desenvolvida na Europa continental e ao mesmo tempo influenciou, assim como acommon law, as suas colônias.

O sistema da civil law, nos séculos XIX e XX, também foi adotado por países que possuíam tradições jurídicas distintas, como Rússia e Japão, que reformularam os seus sistemas jurídicos com o objetivo de desenvolver um poder econômico e político.

2.1. Sistema common law

O sistema common law surgiu na Inglaterra durante a Idade Média e, obviamente, influenciou suas colônias em todos os continentes.Observa-se que há distinções profundas entre os dois sistemas jurídicos, pois a sua tradição jurídica foi desenvolvida de forma diferente, por uma série de razões históricas[4].

O sistema common law geralmente não é codificado, isto é, não há nenhuma compilação legal abrangente de normas jurídicas.Ao contrário, estas se baseiam em algumas leis esparsas, e o que de fato fundamenta o seu direito são os precedentes (Séroussi, 2006, p. 25), ou seja, decisões judiciais que já foram realizadas em situações semelhantes.

Esses precedentes a serem aplicados em decisões de cada caso novo são determinados pelo juiz que preside a causa. Como resultado, os juízes têm um papel fundamental na formação do sistema jurídico em países com essa tradição.

Na União Europeia, o Reino Unido[5]– exceto a Escócia (Séroussi, 2006, p. 19) – configura o representante do sistema common law.O direito de common law possui como base a formação de decisões judiciais (case law) e busca decisões anteriores parecidas ou conexas com o caso em litígio, a legal rule.

O direito inglês é, antes de tudo, um direito erigido sobre a jurisprudência (decisionsoftheCourts) elaborada nos tribunais Westminster (common law) pelo tribunal da chancelaria (equity) (Séroussi, 2006, p. 27).

No aspecto econômico, o Reino Unido exporta principalmente para a Alemanha, os EUA e os Países Baixos. Por sua vez, as suas importações provêm em grande parte da Alemanha, da China e dos Países Baixos.

O sistema da common law é baseado em precedentes; tanto a entrega de bens quanto a prestação de serviços envolvem obrigações.

2.2. Distinções contratuais – conceituais entre os sistemas jurídicos da common law e civil law[6]

Esses sistemas jurídicos apresentam distinções substanciais no aspecto contratual e, portanto, na própria essência conceitual objeto desse contrato.

Dentre elas, destacam-se no sistema common law: a) a doutrina da consideration; b)adoctrineofprivatyofcontract; e c)a interpretação literal do contrato.

No sistema civil law, institutos que não possuem correspondentes no sistema da common law: a)boa-fé; b)o poder de adaptação ou revisão de um contrato; e c)a execução específica da obrigação.

Para os fins do nosso tema, faremos algumas considerações.

2.3. Doutrina daconsideration

No sistema da common law, a contraprestação (consideration) é essencial para a existência do contrato.

Nesse sentido, diversos contratos no sistema da civil law não são considerados para o sistema da common law, como, p. ex., a doação pura, uma vez que não tem contraprestação do donatário.

Essa diferença repercute no aspecto prático no que concerne à execução, pois, de fato, no sistema dacommon law não seria um contrato.

Na prática, diversas doações realizadas nos EUA acabam por firmar contraprestações irrisórias/fictícias para que se dê azo à execução contratual[7].

Para esses casos, os tribunais nos EUA firmaram, contudo, o entendimento de que essa doutrina da consideration deve ser adequada, isto é, para ser considerada contraprestação, deve ser analisado no caso concreto se é ou não adequada essa cláusula contratual.

2.4. Formação de um quadro-comum para formação de uma harmonização do direito contratual internacional

Conforme acima analisado, os problemas concernentes às distinções entre os sistemas da common law e dacivil law no âmbito internacional, nomeadamente nos contratos, limitam o pleno desenvolvimento das transações de bens e serviços internacionais.

Observa-se que a doutrina da consideration aplicada nos países da common law acaba por gerar grandes problemas de aplicação prática; para garantir a possibilidade de execução dos contratos, as pessoas burlam o sistema estabelecendo meios fictícios para configuração de um contrato.

A formação de um quadro-comum contratual no âmbito internacional acabaria com essa insegurança na celebração contratual entre pessoas localizadas em países da common law e da civil law.

Conclusão

Observa-se que são inúmeros os desafios a serem superados para se estabelecer maior segurança jurídica nas transações de bens e serviços nas três dimensões (interna, regional e internacional).

No âmbito dos tributos indiretos,o aspecto estrutural e conceitual configura o maior desafio.O estrutural pressupõe que os Estados já tenham em seus ordenamentos jurídicos internos um IVA – tipo consumo.

Portanto, o núcleo conceitual fundacional do IVA – “entrega de bens” e “prestação de serviços” – compõe o elemento material desse imposto, e o receptor da norma – contribuinte – deve compreender quais são as transações que integram esse tributo.

Dessa forma, o direito privado apresenta o alicerce necessário para que a tributação através do IVA seja compreendida, e, portanto, confere a ela maior segurança jurídica.

Esses conceitos do direito privado poderiam ser alterados somente em hipóteses excepcionais.

Mesmo assim, ainda que de forma singela, as diferenças entre os sistemas da common law e dacivil lawestabelecem desafios conceituais.

O desenvolvimento dos sistemas jurídicos dos Estados pode partir de normas internacionais que permitam estabelecer elementos de conexão entre o direito tributário e o direito privado.

Desse modo, serviriam como norte para os sistemas jurídicos internos de cada Estado, o que permitiria o desenvolvimento do comércio internacional, sobretudo com o desenvolvimento tecnológico digital, realidade atual que não se pode ignorar.Assim, permitir-se-ia às administrações fazendárias a adaptação aos desafios atuais, principalmente quantoàs evasões e às fraudes fiscais.

Referências

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CAMPOS, Diogo Leite de; RODRIGUES, Benjamim Silva; SOUSA, Jorge Lopes. Lei Geral Tributária – Anotada e comentada.Lisboa: Encontro da Escrita, 2012.

GOMES, Fabio Luiz(coord.). Reforma tributária – Tributação, desenvolvimento e economia digital.São Paulo: Almedina, 2023.

GOMES, Fabio Luiz. Direito internacional – Perspectiva contemporânea.São Paulo: Saraiva, 2010.

GOMES, Fabio Luiz. Manual do IVA nas Comunidades Europeias e os impostos sobre o consumo no Mercosul. Curitiba: Juruá, 2006.

GOMES, Fabio Luiz;ALMEIDA, Daniel Freire e;ALMEIDA, Verônica Scriptore Freire e. Panorama do direito no terceiro milênio. São Paulo: Almedina, 2013.

GOMES, Fabio Luiz; ALMEIDA, Daniel Freire e; CATARINO, João Ricardo (org.). Garantias dos contribuintes no sistema tributário. Homenagem a Diogo Leite de Campos.São Paulo: Saraiva, 2013.

OCDE – ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. VAT/GST relief for foreign businesses: the state of play. A Business and Government survey. Paris: OCDE, 2010.

SCHENK, Alan; OLDMAN, Oliver. Value added tax: a comparative approach.Cambridge; New York:Cambridge University Press, 2007. (Cambridge Tax Law Series).

SÉROUSSI, Roland. Introdução ao direito inglês e norte-americano.Tradução de Renata Maria Parreira Cordeiro.São Paulo: Landy Editora, 2006.

TIPKE, Klaus; LANG, Joachim. Direito tributário. Tradução de Luiz Dória Furquim.Porto Alegre:Sérgio Antonio Fabris Editor, 2008. v. I.


[1] Artigo 2º da Diretiva n. 2006/112/CE do Conselho da União Europeia, de 28 de novembro de 2006.

[2] Em Portugal, o Código do IVA dispõe:

“Artigo 2.º 1 –

[…]

a) As pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões livres, e, bem assim, as que do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos da incidência real de IRS e de IRC. As pessoas singulares ou colectivas referidas nesta alínea são também sujeitos passivos do imposto pela aquisição de qualquer dos serviços indicados no n.º 8 do artigo 6.º, nas condições nele previstas; […].” (grifos nossos).

Observa-se que o legislador português quis deixar claro que habitualidade compõe o elemento material do IVA, mas também o agir de modo independente.

[3] São trabalhosacadêmicos: Principles of European Contract Law, Pavia Group on a European Civil Code, Study Group on Tort Law, Acquis Group. No âmbito das instituições comunitárias, desenvolve-se o Quadro Comum de Referência, com escopo de harmonizar a legislação europeia e as decisões dos tribunais, bem como servir de base para produção legislativa, doutrinária e jurisprudencial. Tudo no sentido de tornar os direitos nacionais menos díspares entre si, facilitando dessa maneira as transações transfronteiriças de modo a incrementar o mercado interno.

[4] Para analisar historicamente o sistema da common law, vide: BAKER, J. H. An introduction to english legal history. London: Butterworths LexisNexis, 2002;BELLOMO,Manlio.The common legal past of Europe 1000-1800. Washington, DC: Catholic University of America Press, 1995;CROMARTIE,Alan.The Constitutionalist Revolution: an essay on the history of England, 1450-1642. Cambridge: Cambridge University Press, 2006; DAINOW, Joseph. The civil law and the common law: some points of comparison. American Journal of Comparative Law, Oxford, v. 15, n. 3, p. 419-435, 1966-1967;MILSOM, S.F.C. Historical foundations of the common law. Oxford: Oxford University Press, 1981;STEIN,Peter.Roman Law in European History. Cambridge: Cambridge University Press, 1999; eVAN CAENEGEM, R.C. The birth of the English Common Law. Cambridge: Cambridge University Press, 1988.

[5]Ainda que o Reino Unido tenha votado através de plebiscito sua saída da União Europeia, ainda haverá um prazo de transição para esse ato; e, após sua saída, manterá relações estreitas com a União Europeia.

[6]Vide: MORAIS, Fabíola.Aproximação do direito contratual dos Estados-Membros da União Europeia.São Paulo:Renovar, 2007. (Biblioteca de Teses).

[7]No exemplo, a doação de imóvel tendo como contraprestação um dólar. Obviamente, esse valor irrisório seria somente para dar uma conotação contratual a essa doação.


Fabio Luiz Gomes. Doutor em Administración, Hacienda y Justicia en el Estado Social pela Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca, com qualificação “Sobresaliente” cum laude. Mestre em Direito Público pela Universidade de Coimbra. Professor Convidado no Doutorado na Universidade Autônoma de Lisboa. Professor de Direito Tributário nos Cursos de MBA/LLM do IBMEC e da FGV. Autor, coautor, coordenador e prefaciador de diversos livros. Membro alumni do Instituto Max Planck. Conferencista, parecerista e árbitro internacional. Parecerista da Revista da Escola Superior do Ministério Público da União e da Revista da Fundação Getulio Vargas– FGV São Paulo. Membro do Conselho Editorial da Editora Fabbris.


Signos linguísticos – o direito conceitual e direito comparado

Fabio Luiz Gomes

1.Signo Linguístico

O significado das palavras é um fato linguístico[1], ou seja, um fato semiótico, dessa forma não há significado sem signo, portanto, o signo é pressuposto de algum significado.

O significado de um signo não é mais que sua tradução para outro signo que lhe pode ser substituída e o torne inteligível.

 Segundo Santo Agostinho: “…que o nome significa a si mesmo junto com os outros nomes que significa..”[2], e conclui:

“Chegamos, portanto, àqueles sinais que significam a si mesmos e, com inteira reciprocidade, um significa o outro, ou seja, os seus significados reciprocamente se significam, de forma que o que este significa também aquele significa e vice-versa, diferenciando-se entre si apenas pelo som…”

Esse signo representa uma proposição de uma situação possível, uma representação de um pensamento, uma relação projetiva com o mundo.[3] Assim, essa proposição é articulada, exprimem fatos, uma expressão[4], deve estabelecer de forma lógica a realidade.

Observa-se que a semiótica estabelece o estudo de teias de significados,  uma análise profunda da compreensão de diversos fenômenos comunicativos e das diversas formas de linguagem.

Portanto, a semiótica serve de orientação científica ao estudar a noção de signo, análise das relações sociais, tipos de discurso (epistemologia, antropologia etc), poética, estética nas artes, imagens naturais ou imaginárias.

Quando o destinatário do signo for um ser humano vai solicitar uma atividade interpretativa deste.[5]

Todo esse processo exige a existência de um código, consistindo o mesmo em um sistema de significação[6], neste sentido estabelece-se um nexo de causalidade entre o que representa e o representado.

A comunicação entre seres humanos, seja biológica ou artificial sempre terá como pressuposto uma significação própria pré-determinada, portanto, os signos como marco de uma vida social.

Uma investigação crítica dos processos de criação dos signos e seus significados estabelecem o elemento constitutivo nuclear da criação humana no mundo, atribuindo dinamismo a estruturar as experiências humanas e interação destes com o seu ambiente em cadeias neurais subjacentes entre si, ou em processo criativo transcendente.

Esse processo de transformação e interação comunicativa se rearticula constantemente a percepção conceitual do discurso, da ética, da ideologia, o humano ou não humano, o natural ou criado pelo homem.

Desde as formas mais rudimentares da relação do homem com o objeto e do homem com o homem, a formação dos signos somente se desenvolveu na medida em que essa interação foi transmitida para si mesmo ou compartilhada com os outros.

Um aperfeiçoamento progressivo dos signos, se preservada toda cadeia,  expansivo e sujeito a outros significados na medida em que essa cadeia cria outros braços, seja interno (dentro de si mesmo) ou compartilhado com outras pessoas.

O corte histórico no desenvolvimento humano expõe isso: a idade da pedra lascada, essa pedra poderia ser usada como meio de abrir frutos, ou cortar carnes, ou mesmo como arma, mas esse conhecimento fora transmitido e assim foi se desenvolvendo uma cultura.

Destarte, poderíamos analisar a descoberta do fogo, a idade do bronze, ou mais recentemente as descobertas espaciais.

Os conhecimentos de significados vão se agregando e esquadrinhado suas associações e composições racionais.

Obviamente não poderia se dissociar a forma com que se desenvolveu essa cultura dos fatores externos, como o clima, a geografia etc.[7]

As relações do homem-ambiente compõe comportamentos e aprimoramentos de signos decorrentes dessa interação, p. ex., noção do que seja frio ou calor de acordo com o lugar em análise.

Uma vez extraído o objeto, este deve ser analisado tanto no nível social, mas também no nível funcional, desempenhando uma função significante.[8]

Vale também constatar que o estudo da semiótica poderá esbarrar no princípio da indeterminação, afinal, estabelecer significados e comunicar-se são funções sociais, contudo, o enfoque semiótico do intérprete de estabelecer o limite, isto é, focar no que a situação permite, portanto, a busca investigativa de ser uma interpretação crítica daquele objeto.

Observa-se, portanto, que a amplitude da comunicação busca intrinsecamente sua base em um sistema de significação.

2. Semiótica e as normas jurídicas

Numa interpretação semiótica[9] deve ser levada em consideração a figura do leitor por constituir a busca da “intentio operis”, isto é, daquele destinatário da norma.

As normas jurídicas estabelecem padrões de comportamento atribuindo-lhes valor, onde esses comportamentos são qualificados como obrigatórios ou permitidos. Dessa forma, aos destinatários da norma são exigidos observância, pois a linguagem inclui-se entre as instituições humanas resultantes da vida em sociedade.

Observa-se, portanto, que os sistemas jurídicos utilizam uma linguagem constitutiva ou mesmo declaratória comportamental.

Além disso, esses comportamentos intersubjetivos estabelecidos nessas normas aqui consideradas não podem prescindir da ética nem da moral.[10]

Neste sentido, os estudos da semiótica estabelecida em normas jurídicas permitem a adequação dessas normas ao princípio da confiança para os destinatários desta norma jurídica.

3. Semiótica dos conceitos jurídicos, direito comparado e a dignidade da pessoa humana

Os conceitos estabelecidos em normas jurídicas devem ter como fundamento o princípio da adequação à realidade[11] – o caráter dimensional dessa norma, e, ainda, estar de acordo (familiarizado) com a sociedade a que se destina.

Dessa forma, a interpretação de qualquer norma jurídica encontra muitas dificuldades na definição dos conceitos jurídicos.

Agrava-se a situação se considerarmos que o intérprete produz decisões individuais.

Os conceitos de signo utilizados pelo direito privado podem servir como diretriz de aproximação das normas jurídicas, pois além da tradição – origem romana, estar-se-ia mais próximo da realidade do intérprete e, portanto, mais adequado.

Esses conceitos podem ser, portanto, um ponto de partida de um interprete que pretenda analisar sistemas jurídicos.

Afinal, se assim não o fizer, as variáveis restariam indetermináveis quanto mais distantes daquele a quem se destina essa norma, isto é, o receptor dessa norma.

Por essa razão, o interprete deve estabelecer um limite cognitivo interpretativo, com isso esse parâmetro fixaria um campo de gravitacional que permitiria a interpretação racional.

Os conceitos jurídicos, sejam eles mais abstratos ou concretos, devem ser fixados o nexo causal entre a emissão e a recepção, de modo a identificar na cartela de significados qual a interpretação deve ser utilizada.

Ressaltando que o trabalho do intérprete torna-se quanto mais difícil se a norma for mais abstrata, portanto, os fatores externos a própria norma irá permitir a sua interpretação, isto é, as delimitações sociais (cultural, religiosa, política etc).

Nos países ocidentais, a cultura espelhada pelo Império Romano veio a consolidar diversos conceitos consubstanciados no direito privado, esses conceitos formaram signos perfeitamente inteligíveis pelo receptor da norma, p. ex., contratos de compra e venda.

Esses conceitos muitas vezes chegam a integrar o plano constitucional, que por vezes fala em propriedade, liberdade etc.

Portanto, se os signos em análise fizerem parte de Estados ocidentais esses conceitos herdados do Império Romano acabam por permitir um estudo com maior precisão.

Contudo, ainda que se considerem diversos princípios universais, a mesma norma poderá espelhar perspectivas com maior ou menor amplitude, dependendo dos fatores externos às normas, os signos possuíram significados diferentes.

Diante disso, o direito internacional poderá exercer um papel primordial no desenvolvimento humano, na medida em que puder aproximar esses conceitos entre os povos, e, na medida do possível aproximar ou harmonizar.

 Lembrando que por mais próximos que estejam, os aspectos culturais sempre influenciarão na forma que se interpretam as normas, por conseguinte os signos.

Portanto, o estudo dos conceitos jurídicos entre os povos envolve sempre o direito comparado e a interpretação semiótica torna-se um elemento essencial para uma comparação mais precisa.

Observa-se que uma comparação meramente formal das normas entre os povos perde o elemento essencial substantivo que subjaz qualquer comparação.

O resultado interpretativo semiológico pode servir de substância primordial para uma maior precisão normativa.

Dentro dessa perspectiva, as normas jurídicas devem buscar com justificativa e fundamento o próprio homem como resultado indissociável de formatação do conhecimento jurídico.

Portanto, a integração entre os povos deve ser através de normas jurídicas que tangenciam fronteiras, que não seja somente através de uma realidade formal, mas antes voltado para o ser humano destinatário daquelas normas.

Deve-se retirar qualquer véu interpretativo dos conceitos jurídicos, não excluindo a tradição, mas revisitando a possibilidade de mudança de paradigmas, os horizontes cognitivos não devem excluir o sol, mas antes buscar nessa linha descobertas, que possam significar conquistas ao ser humano.

O compromisso histórico compõe um componente primordial para a compreensão daquele signo, portanto, o significante e significado busca inicialmente como foi desenvolvido determinado conceito jurídico, seja por uma tradição no direito romano, ou anglo-saxónica, ou mesmo em países com tradições orientais.

Observa-se que o diálogo conceitual entre os povos acerca de determinada norma jurídica deve lançar um olhar que permita a dogmática jurídica estar preparada para os desafios do século XXI.

A interdisciplinaridade também compõe uma marca interpretativa da semiótica, contudo o caminho para o resultado pode ser reforçado com outros elementos científicos, mas o seu delineamento deve ser a dignidade da pessoa humana, dessa forma não seria o signo somente um elemento de apoio científico, mas o protagonista para o resultado humano normativo.

Dessa forma, a semiótica transcende um significado formal normativo, mas acrescenta a compreensão de mundo, tanto no ambiente natural, como também, o ser humano na sua vida social e de que forma subjetiva se desenvolveram essas normas em análise comparativa, de tal maneira que os direitos humanos possam ser o discurso legislativo a ser seguido.

O aspecto humano do direito torna o interprete mais autoconsciente dessa delimitação, envolve, portanto, não só a cultura formativa do direito, mas um liame entre a norma e o homem, verdadeiro titular desse direito, com essa função integrativa cognitiva.

A humanização do direito permite que seja ultrapassado o conteúdo vernacular da norma, mas também impõe limites à interdisciplinaridade que desconsidere o ser humano com titular desse direito, portanto, se estabelece o verdadeiro significado normativo.

Portanto, a superação do positivismo, que não esteja enraizada a insegurança jurídica, deve conceber o mundo cosmopolita com uma visão humana do direito e a entre comparação do direito, o melhor aproveitamento exige uma visão conscienciosa humana do acúmulo do conhecimento entre os povos e o melhor aproveitamento em benefício de todos.

Com essa compreensão humana do direito, os processos globais de integração entre as pessoas permitirá o desenvolvimento e a aproximação conceitual dos limites do significado jurídico, a identidade de desafios comuns entre os povos, portanto, a construção de elementos de conexão comuns como grande desafio delimitador das fronteiras dialogais com os conhecimentos normativos produzidos pelo homem.


[1] Termo utilizado por Roman Jakobson, Linguística e Comunicação.  Cultrix, São Paulo, 1970, p. 63.

[2] Santo Agostinho. “De Magistro”. RM, 11, 4ª Edição, pp. 305 e ss.

[3] Cf. Ludwig Wittgenstein.  Tractatus Lógico-Philosophicus. Biblioteca Universitária – Série – Filosofia, Vl. 10. Tradução e Apresentação de José Arthur Giannotti. Companhia Editora Nacional – Editora da Universidade de São Paulo: São Paulo, 1961, p. 62.

[4] Wittgenstein esclarece:“A expressão é tudo que, sendo essencial para o sentido da proposição podem ter em comum entre si.” Tractatus…, p. 65.

[5] Vide Umberto Eco, Los limites de La Interpretación…., pp. 24/25.

[6] Cf. Umberto Eco, Los limites de La Interpretación…, p. 25.

[7] A cultura não é só comunicação e significação, mas em uma análise mais ampla poderia entendê-la melhor através da semiótica.

[8] Cf. Umberto Eco. Los limites de La Interpretación….p. 52.

[9] Umberto Eco distingue a interpretação semântica ou semiósica e interpretação semiótica:

“La interpretación semântica o semiósicaeselresutadodel processo por elcual destinatário, ante lamanifesción lineal del texto, lallena de significado.  La interpretacióncrítica o simiótica es, en cambio, aquella por la que se intenta explicar por quérazonesestructuralesel texto puedeproducir essas (u otras, alternativas) interpretaciones semânticas.”

Los limites de laInterpretacion. Umberto Eco. GruppoEditorialeFalbi, Bompiciani: Milán, 1990.

[10] TIPKE, Klaus. Moral. Mora Tributaria del Estado y de loscontribuyentes (BesteuerungsmoralundSteuermoral).  Tradução Pedro M. Herrera Molina.  Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales, S. A.: Madri e Barcelona: 2002, pp. 25 e ss.

[11] TIPKE, Klaus.  Moral Tributaria do Estado….., p. 30.


Fabio Luiz Gomes. Doutor em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca. Mestre em  Ciências Jurídica-Comparatísticas pela Faculdade de Direito pela Universidade de Coimbra.

Breves Linhas sobre o Direito Comparado

Fabio Luiz Gomes

I – Metodologia interpretativa comparatística

Verifica-se que o estudo do direito comparado permite uma visão cosmopolita do direito, afinal o estudo do direito fixa no direito interno do seu país.

Dessa forma, quando o jurista estuda direitos de outros países precisa de método e o direito comparado permite a aprender e pensar comparativamente.

A análise do direito estrangeiro deve verificar o contexto do direito doméstico, que se desdobra no tripé lei-doutrina-jurisprudência, avançando na história jurídica comum, ou não, a margem interpretativa com os possíveis avanços ou transformações.

Acrescenta-se que a leitura de uma norma jurídica impõe uma interpretação, uma fundamentação, por essa razão a completude comparativamente estabelece a utilização da jurisprudência (se houver), ou mesmo, a doutrina pode justificar como fator do direito vivo fatores extralegais que possam levar a um resultado.

Neste sentido, examinar a dignidade da pessoa humana nos diversos fatores, o sistema socioeconômico, a fim de buscar fatores de comparação tendo como ponto de partida o ser humano.

Portanto, no seu Estado de origem A, as normas jurídicas origem, quando comparadas ao Estado de destino comparado, as diferenças jurídicas devem refletir as diferenças entre as sociedades.

O método comparativo permeia como primeira reflexão, o Estado A poderia seguir o caminho percorrido no Estado B? Se positivo, de que forma poderia ser feito? Poderia haver uma construção jurisprudencial para aplicação comparada? Poderia haver propostas legislativas para acomodar essa interpretação comparada?

A base dessas questões deve buscar delimitar o objeto do direito comparado.

Essa construção deve perquirir o conhecimento e a compreensão do direito do Estado de destino comparado.

Pode ser necessário algum elemento de motivação ou pressão para prosseguir na modificação do direito interno (Estado A), ao exemplo do desenvolvimento dos direitos humanos, ou desenvolvimento econômico através de modernização das normas jurídicas no Estado de origem.

Deve-se considerar que o transplante dos modelos estrangeiros impõe limites, portanto, devem ser discutidos nos meios jurídicos e sociais através de exposições públicas e publicações.

Não é incomum que essa análise comparada venha a se desenvolver diretamente do Poder Judiciário, ao fazer uso das normas estrangeiras ou da construção interpretativa dessas normas.

Observa-se que o direito judicial comparado pode participar ativamente dessa construção do seu direito interno, embora possa gerar preocupações, dado que seria voltado à solução de um caso concreto, portanto a delimitação do contexto da norma estrangeira tem que estar muito bem delimitada, pois a situação fática pode ser diferente.

Constata-se também que a formação dessa decisão judicial pode ser provocada por Advogados, membros Ministério Público, Pareceres externos, Perícias etc.

Além disso, o reconhecimento conceitual dessas normas jurídicas comparadas, o conhecimento das diferentes abordagens leva ao resultado adequado.

Não há como realizar uma análise comparatística do direito sem que se realize o aprofundamento no aspecto cultural, do conhecimento linguístico, o conhecimento normativo para que possam averiguar as semelhanças e diferenças entre as legislações em análise (no aspecto histórico, sistemático e teleológico), as decisões judiciais (precedentes) e a doutrina. Com esses resultados poder-se-á determinar o que se pode extrair de aprendizagem do sistema jurídico estrangeiro e de que forma poderá refletir no próprio sistema jurídico.

Verifica-se, portanto, que a mera comparação entre as normas jurídicas não é o suficiente para ser considerada uma análise comparada, é preciso ir ao fundo na cultura, no direito vivo, portanto, a influência cultural do país de origem. É preciso constatar a estrutura subjacente do direito, como a norma funciona dentro da sociedade, além das formações subestruturais, isto é, a história, a geografia, a moral, dentre outras forças motrizes de interpretação.

Faz-se necessária uma análise orientada com a maior imparcialidade possível, com alguma liberdade cognitiva, de modo que se permita visualizar o direito de origem interpretativa de forma clara, de modo que se possa identificar os derivativos da interpretação em análise, isto é, os institutos jurídicos através dos seus conceitos, assim seria facilitada e sistematizada a forma de comparar esses sistemas jurídicos.

Observa-se que o sistema jurídico do Estado de destino é de conhecimento de quem realiza a comparação, contudo, não se pode fixar nele de forma isolada, afinal poder-se-ia causar distorção, dito de outra forma, não é incomum que esse sistema jurídico possa ser aperfeiçoado.

Portanto, o direito comparado assume a relevância para aperfeiçoar o sistema jurídico do destino, e poderá ainda influenciar o próprio sistema jurídico da origem.

Apreciar a diferença das culturas jurídicas, os padrões de comportamento, formará o arquétipo dos princípios jurídicos em comum que servirá de ponte de comparação entre essas culturas jurídicas na construção de compreensão e cooperação mútuas.

A metodologia para realizar essa comparação entre os sistemas jurídicos estabelece-se a partir de alguns critérios para a interpretação comparativa:

1. O sistema jurídico do Estado de destino deve ser interpretado inicialmente identificando os princípios comuns.

2. Uma avaliação normativa deverá buscar de que forma ela se expressa concretamente, através da pesquisa empírica, doutrinária e jurisprudencial. Dessa forma será espelhado como forma de compreensão de como essa norma realmente é aplicada, os padrões normativos, de modo que se possa estabelecer uma interpretação crítica, portanto, neste ponto, o critério interpretativo busca no sistema jurídico o arcabouço interpretativo.

3. A metodologia deve avaliar também a cultura jurídica do Estado de destino, afinal, mesmo que haja normas próximas o resultado poderá ser diferente, portanto, os elementos estruturais fundacionais impulsionam a interpretação normativa.

4. O estudo cognitivo deve se libertar das vestes originárias para que se possa explorar e explicar as estruturas normativas em comparação. Para que isso ocorra, é necessário fazer uma imersão na realidade política, histórica e linguística. Assim, estudar de que forma os sistemas jurídicos se moldaram, portanto, a avaliação do intérprete impõe conhecer as externalidades normativas que subjaz a mera leitura da norma.

5. O estudo da filosofia do direito do Estado de origem pode ajudar ao intérprete a fundamentar suas conclusões, assim estruturar um critério de comparação.

6. O sistema jurídico de todos os Estados possui natureza interna e internacional (por mais que o Estado seja fechado politicamente), assim não se pode olvidar e considerar esse critério caso se faça necessária uma interpretação mais ampla do direito do Estado de origem.

II – Direito comparado e o direito internacional

Toda norma jurídica possui uma natureza multidimensional como desdobramento da análise doméstica (interna) e internacional (externa), nesta última pode ser originária de tratados internacionais nas relações entre Estados no espaço internacional, mas também pode ser oriunda de blocos regionais, ou mesmo nas relações entre os blocos/blocos e blocos/Estados.

Todas essas normas em suas múltiplas acepções podem ser objeto de direito comparado, portanto, não se comparam apenas direitos domésticos, mas também os direitos externos.

A interconexão entre os Estados em nível global exige cada vez mais o estudo do direito comparado e demonstra a sua importância.

O desenvolvimento tecnológico diminuiu os espaços e alterou a geografia do mundo, suas fronteiras ficaram mais fluidas, o desenvolvimento das transações de bens e serviços no cenário internacional vem pressionando cada vez mais os Estados a se adaptarem a essa nova realidade.

Portanto, é mister avaliar o direito comparado e estabelecer metodologias sólidas para compreender a era digital e suas influências que impulsionam os sistemas jurídicos.

Assim, no direito busca-se cada vez mais a harmonização dos institutos jurídicos, ou ao menos uma aproximação deles, como via de um entendimento comum ou próximo entre os povos.

Isso só será possível através de uma compreensão profunda entre os diversos sistemas jurídicos de modo a estabelecer elementos de conexão entre eles.

Constata-se que o direito possui uma relação espacial (território interno e internacional) que tem como norte a geografia, afinal, ao longo da história da humanidade sempre houve um nexo de causalidade entre o direito e a geografia através de estudos interdisciplinares.


FABIO LUIZ GOMES. Doutor em Direito Tributário pela Universidade de Salamanca. Mestre em Ciências Jurídicas-Comparatisticas pela Universidade de Coimbra. Professor de MBA’s e LLM em Direito. Advogado com atuação nos Tribunais Superiores.


Código Aduaneiro do Mercosul – Noções

Fabio Luiz Gomes

Objetiva-se com a instituição de um Código Aduaneiro do Mercosul conferir maior segurança jurídica e uniformizar procedimentos de modo em que facilite as transações intracomunitárias de bens e serviços aos contribuintes e empresas.

A utilização da tecnologia deve ser cada vez mais implementada pelas administrações aduaneiras, não só para tornar mais célere os procedimentos e com isso facilitar os deslocamentos dentro do território dos Estados partes do Mercosul, com isso ao uniformizar os procedimentos será conferida a maior transparência na prestação de serviços.

A aplicação do princípio da eficiência mostra-se entrelaçado com o trinômio: simplificação-tecnologia-qualificação, portanto, a qualificação dos funcionários aduaneiros completa a prestação de serviços de forma eficiente.

Objetiva-se, portanto, estabelecer procedimentos comuns, bem como a utilização dos mesmos códigos aduaneiros, a cooperação administrativa entre as autoridades aduaneiras dos Estados partes do Mercosul.

No aspecto territorial o CAM é aplicado nos territórios dos Estados partes do Mercosul, e utilizados nas relações dos Estados partes com Estados terceiros, ou nas relações do Bloco Mercosul com terceiros.[1]

Portanto, o território aduaneiro dos Estados partes do Mercosul compreendem todo território de cada Estado parte, inclusive o mar territorial, as águas territoriais e o espaço aéreo dos quatro Estados partes, isto é, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

Compreendendo a atribuição da atuação das autoridades aduaneiras de acordo com a legislação de cada Estado parte.

Deve-se destacar que a cooperação e comunicação entre as autoridades aduaneiras[2] é imprescindível para o bom funcionamento do setor aduaneiros entre os Estados partes.

Constata-se os portos ou aeroportos onde serão processados o controle e a conversão monetária, especificar as disposições processuais para fixar o valor aduaneiro das mercadorias.

Dessa forma, o legislador do CAM estabeleceu três zonas aduaneiras: zona primária aduaneira[3], zona secundária aduaneira[4] e zona de vigilância aduaneira especial[5].

Destaca-se, a zona primária, a atribuição da autoridade aduaneira a área terrestre ou aquática, contínua ou descontínua, nos portos alfandegados; a área terrestre, nos aeroportos alfandegados; e a área terrestre, que compreende os pontos de fronteira alfandegados.

Em conclusão, o Estado parte demarca através da autoridade aduaneira local os pontos com soberania para passagem de fronteira.

Destaca-se, na zona secundária, uma natureza residual, isto é, o primeiro critério para delimitar o que é zona secundária é o restante do território que não for zona primária, portanto, não tiver sido demarcado como zona primária, aqui incluindo residualmente a área do território nacional, as águas e espaço aéreo.

Observa-se que no Brasil o seu desenvolvimento partiu das faixas costeiras, portanto, os portos marítimos são os mais comuns, portanto, as importações e exportações passam em grande parte por esses portos.

Tem-se como os principais portos do Mercosul: a) Porto de Santos – Brasil; b) Porto de Buenos Aires – Argentina; c) Porto de Assunção – Paraguai e d) Porto de Montevidéu – Uruguai.

Em 2021, segundo a Comisión Económica para América Latina y el CaribeCEPAL, o Mercosul aumentaram suas exportações em 35,6%, impulsionada pelos saltos dos preços das matérias-primas. Assim como as importações, impulsionado pela recuperação da atividade econômica dos Estados partes do Mercosul.[6]

Por último, também em 2021, o Mercosul manteve uma posição superavitária de 56,8 bilhões de dólares.[7]

Portanto, o desenvolvimento aduaneiro mostrou-se oportuno e que exige um desenvolvimento constante.

Consubstanciando também com grande relevância os portos fluviais que se desenvolveram ao longo dos rios do Brasil e os Estados partes do Mercosul.

Posto isto, os Rios Tietê, Paraná, Paraguai, Uruguai e seus afluentes podem representar brevemente o sistema hidroviário do Mercosul.

Com esse desenvolvimento, o setor hidroviário do Mercosul abrange 309 Municípios somente no Brasil.

Conclusão

Observa-se que a codificação aduaneira é essencial para o prosseguimento da instituição de um Mercado Interno no Mercosul, portanto, não só os procedimentos, mas as necessidades de circulação de bens e serviços impõe uma reformulação administrativa, adaptada aos desafios da fraude e evasão fiscal.

O desenvolvimento do comércio eletrônico exige das administração fiscal dos Estados dos do mundo contemporâneo.

Constata-se a necessidade da adoção de um código aduaneiro para permitir a evolução do processo de integração do Mercosul.


[1] Art. 1º, 4 do CAM.

[2] Art. 12 do CAM.

[3] Art. 4º do CAM.

[4] Art. 5º do CAM.

[5] Art. 6º do CAM.

[6]https://www.cepal.org/pt-br/noticias/exportacoes-mercosul-cresceram-2021-mas-os-volumes-permaneceram-fracos-pouca-diversificacao

[7]https://www.cepal.org/pt-br/noticias/exportacoes-mercosul-cresceram-2021-mas-os-volumes-permaneceram-fracos-pouca-diversificacao


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