Ativos virtuais e finanças tokenizadas
Banco Central vai regular o mercado de criptomoedas e outros criptoativos
Leandro Oliveira Leite
Em junho de 2023[1], o Banco Central do Brasil assumiu a competência para regular o mercado de prestação de serviço de ativos virtuais, uma decisão que reflete seu papel essencial em zelar pela estabilidade e integridade do sistema financeiro. Essa regulação tem o objetivo de garantir a prestação adequada dos serviços de ativos virtuais, promover a livre concorrência e proteger os consumidores e usuários desse mercado.
O Banco Central está em processo de formulação e apresentação de um modelo de regulação para o mercado de criptoativos, planejando realizar consultas públicas no segundo semestre deste ano para receber opiniões de empresas, especialistas, consultores e do público em geral. Essa regulamentação será baseada em diretrizes importantes para garantir a prestação adequada de serviços de criptoativos. O objetivo é alinhar o Brasil às recomendações internacionais relacionadas ao tema, reconhecendo as oportunidades de inovação que esses ativos virtuais oferecem, incluindo descentralização, redução de custos de negociação, transparência e integração entre diferentes tipos de produtos e serviços.
A evolução constante dos ativos virtuais e tecnologias subjacentes exige uma atuação transversal e coordenada entre diversos reguladores, como a Secretaria da Receita Federal e a Comissão de Valores Mobiliários. As empresas já presentes no mercado terão pelo menos seis meses para se adequarem à legislação e regulamentação vigente.
Nos últimos anos, o mercado de criptomoedas e outros criptoativos tem ganhado uma atenção notável. Esses ativos financeiros virtuais, suportados por algoritmos criptográficos e uma rede descentralizada utilizando tecnologia de ledger distribuída (DLT)[2], atraíram a curiosidade de investidores, entusiastas e até mesmo governos ao redor do mundo.
A ideia de uma moeda ou ativo financeiro digital, sem representação física, pode parecer complexa à primeira vista. Porém, com a popularização da tecnologia blockchain[3], uma base de dados descentralizada que garante a segurança e a integridade das informações, a ideia de ativos virtuais ganhou espaço e interesse entre o público.
A rede descentralizada, construída em blockchain, é composta por milhares de computadores que armazenam as informações e garantem a veracidade das transações. Esse modelo torna o sistema resistente a fraudes e elimina a necessidade de uma entidade centralizadora, como um banco ou uma autoridade reguladora, para intermediar as operações. A criptografia é a base da segurança dessa rede, garantindo que as informações estejam protegidas e invioláveis.
Dentro do conceito de criptoativos, encontramos as criptomoedas, como o Bitcoin, Ethereum, entre outras. No entanto, é importante ressaltar que os criptoativos vão além das criptomoedas. Inclua também como NFTs (Non-fungible tokens), que representam ativos únicos e indivisíveis, como obras de arte digital, colecionáveis e outros itens exclusivos.
Apesar de toda a inovação e potencial revolucionário, os criptoativos carregam desafios e riscos. A volatilidade é um dos principais pontos de preocupação para os investidores. O valor de uma criptomoeda pode variar enormemente em curtos períodos de tempo, causando perdas para alguns investidores.
A regulação do Banco Central deve partir de diretrizes que levem em consideração as peculiaridades dos criptoativos, a natureza descentralizada das operações e os envolvidos. A consulta pública sobre o tema permitirá que empresas e especialistas contribuam com suas opiniões e experiências para a criação de um ambiente regulatório mais seguro e adequado.
A regulamentação de criptoativos pelo Banco Central vai ao encontro de recomendações internacionais e visa fomentar a inovação, eficiência e inclusão financeira no Brasil. Com a competência de regulador definido em lei, o Banco Central acompanhará o desenvolvimento desse mercado, buscando sempre conciliar a inovação tecnológica com a segurança e estabilidade do sistema financeiro.
Por fim, é importante destacar que criptoativos não devem ser confundidos com a criação do CBDC (Central Bank Digital Currency), conhecido como Real Digital, outra tecnologia que também tem o potencial de promover a inclusão financeira, reduzir custos e aumentar a eficiência das transações financeiras no país. O real digital será uma moeda digital pertencente ao próprio Banco Central, com características distintas dos criptoativos. O “Boxe 9 – Real Digital: uma plataforma para as finanças” do Relatório de Economia Bancária 2022[4] destaca que essas iniciativas fazem parte de uma tendência global de digitalização do dinheiro e que o Banco Central deve atuar como regulador para garantir a plataforma de segurança e a estabilidade financeira.
Acrescenta ainda o relatório que, como mecanismo facilitador da inovação nos mercados financeiros, as plataformas das moedas digitais emitidas por bancos centrais (CBDC) permitem a incorporação de novas tecnologias e novos modelos de negócios com potencial para atender à demanda da população por meios nativamente digitais de liquidação, similares aos disponíveis no ecossistema de criptoativos. Uma tendência, favorecida pelas tecnologias que dão suporte ao ecossistema de criptoativos, é a tokenização[5] de ativos. “A disseminação da tokenização tem o potencial de gerar ganhos concretos em acessibilidade a ativos e promover maior eficiência em suas transações. Em geral, os ativos tokenizados podem ser transferidos facilmente, de forma fracionária e em segundos. Eles podem ser usados em aplicações descentralizadas e armazenados em contratos inteligentes (smart contracts), que são executados automaticamente quando condições e termos predeterminados são atendidos”.
Em resumo, a regulação dos criptoativos pelo Banco Central é um passo importante para a consolidação desse mercado no Brasil. A regulação adequada visa equilibrar a inovação tecnológica com a proteção dos consumidores e a estabilidade financeira, tornando o ambiente de negócios mais seguro e propício para o desenvolvimento dessa classe promissora de ativos financeiros virtuais. A regulamentação busca garantir que os criptoativos possam contribuir de forma positiva para a economia brasileira e o bem-estar dos cidadãos, impulsionando o país em direção a uma economia mais digital e inclusiva.
Referências:
Banco Central prepara Consultas Públicas sobre regulamentação de criptoativos:
https://www.bcb.gov.br/detalhenoticia/705/noticia
Decreto nº 11.563, de 13 de junho de 2023:
Relatório de Economia Bancária 2022:
https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/relatorioeconomiabancaria/reb2022p.pdf
[1]https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Decreto/D11563.htm?utm_source=akna&utm_medium=email&utm_campaign=Banco-Central-prepara-Consultas-Publicas-sobre-regulamentacao-de-criptoativos
[2] A tecnologia de contabilidade distribuída é usada em criptomoedas como bitcoin. DLT é usado para manter um banco de dados de todas as transações que estão acontecendo em um mercado e permitir que elas sejam vistas simultaneamente por todos os participantes.
[3] Blockchain pode ser traduzida como corrente de blocos. De uma forma simples, trata-se de uma tecnologia que agrupa um conjunto de informações que se conectam por meio de criptografia. Assim, transações financeiras e outras operações podem ser feitas de forma segura.
[4] https://www.bcb.gov.br/content/publicacoes/relatorioeconomiabancaria/reb2022p.pdf
[5] Tokenizar um bem ou serviço nada mais é do reproduzir de forma digital esse produto – seja a ação de uma empresa, um título de dívida, obra de arte etc -, conferindo benefícios, valor e características originais associados a ele, inscrito em uma determinada rede blockchain.