José Américo Azevedo

Impeachment de Ministro: o jogo deve ser jogado!

José Américo Azevedo

O artigo que ora se apresenta, não irá agradar grande parcela dos gregos, nem, tampouco, grande parte dos troianos. Ainda assim, vale o risco.

As opiniões e posicionamentos devem ser apresentados para permitir reflexões e, por que não?, colocar a “cara a tapa” para as bem vindas críticas que, seguramente, nascerão. O posicionamento centralizado (não confundir com centrão…), está em desuso atualmente. A polarização reina, dificultando discussões mais amenas.

Então, vamos ao tema!

O cerne da questão é o modelo adotado pela Constituição Federal para escolha, manutenção e até impedimento dos ministros dos tribunais superiores, focando, em especial, no Excelso Pretório, Supremo Tribunal Federal.

Sem desnecessários didatismos, vale lembrar que a composição das Constituições brasileiras – excetuando-se a de 1824, que previa um Poder Moderador, exercido pelo Imperador –, segue a lógica montesquiana da divisão tripartite de Poderes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

O necessário equilíbrio, para que não haja despotismos, vem dos freios e contrapesos (check and balance na anglicana tradição da common law). Esse é o diferencial! Não existe, em relação aos procedimentos de Estado, nenhuma ação em que não haja a fiscalização – pelo menos, em tese – de um Poder em relação aos outros!

Avancemos!

A indicação de um ministro do STF (Poder Judiciário) é realizada pelo Presidente da República (Poder Executivo), sendo submetida ao referendum do Senado Federal (Poder Legislativo). É dizer, todos os Poderes participam da escolha de um ministro do Supremo, e de todos os Tribunais Superiores. Dessa forma, a priori, todos os Poderes foram unânimes ao aceitarem determinado cidadão para determinada função. Altamente democrático.

Então, qual é a discussão?

O ponto nevrálgico é a prática de comportamentos questionáveis, por algum dos Poderes, sem a intenção de demonizar qualquer deles. A eventual falta de procedimentos republicanos, caso haja, não significa a necessidade de alteração na Constituição, para corrigir erros momentâneos e circunstanciais.

Faz-se necessário um pacto político, em que forças antagônicas estabeleçam um compromisso em relação ao país, de forma a afastar a polarização, estabelecendo um ambiente minimamente factível de salutar convivência. Nesse momento de histeria coletiva, parece difícil imaginar algo neste sentido. Seria o “mundo de Alice” se transformando em realidade. Porém, o reverso da medalha pode custar caro ao país. E isso deve ser olhado pelos cidadãos, pessoas que querem a verdadeira construção de um ambiente mais saudável.

Abstraindo-se da divagação de um “mundo melhor”, o fato é que temos um ordenamento constitucional e legal extremamente robusto, e, que se quisermos o caminho do Estado Democrático de Direito, devemos segui-lo.

O inciso II do artigo 52 da Constituição Federal define que compete privativamente ao Senado Federal, processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade. Este dispositivo encontra-se secundado pelos artigos 39 e 39-A da Lei 1.079/1950, que foi recepcionada pela atual Carta Magna, e define quais são os crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Não obstante, deve-se cumprir todo o rito formal para uma decisão de impedimento de um ministro, sendo inadmissível uma decisão que se amolde a uma espécie de tribunal de exceção. Assim, faz-se necessária a apresentação da denúncia, seguida pela formação, pelo Senado Federal, de uma comissão especial que apresentará, em até 10 dias, um parecer para a apreciação do plenário da Casa.

Caso a decisão seja pela continuidade do procedimento, abre-se a constitucional garantia de contraditório e ampla defesa para o denunciado, voltando o processo, após esta etapa, para a comissão especial e, novamente, para o plenário.

Julgada procedente a denúncia, e após comunicados o STF, o Presidente da República, o denunciante e o denunciado, fica este suspenso até o julgamento final que ocorrerá no Senado com a presença dos ministros do Supremo.

Somente então, com a votação nominal e a aprovação de 2/3 dos senadores é que ocorrerá o impeachment do denunciado.

Há que se observar que o processo, embora possa parecer deveras moroso, tem como objetivo a garantia da lei e da ordem, além de permitir a possibilidade sagrada de defesa do acusado. É por isso que, entre outros motivos, nossa Constituição preconiza, em seu primeiro artigo que “a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito”.

Caso respeitada a Carta da República, não existirão ministros de tribunais, diretores e presidentes de autarquias, ministros do Tribunal de Contas da União, presidente e diretores do Banco Central, Procurador Geral da República, embaixadores, e mais uma gama de autoridades, inaptas ao exercício de suas funções, pelo simples fato de que, para a assunção aos seus cargos, devem passar pelo crivo de outro Poder. Caso haja responsabilidade nessas aprovações, o risco de existirem incompetentes atuando tende a diminuir exponencialmente.

Além disso, na remota possibilidade de se cometer um erro de escolha – imaginando-se um processo transparente e legítimo –, estão previstos mecanismos de correção, até o terminativo impedimento da autoridade, conforme descrito alhures.

Por mais que atualmente esteja aflorada a sanha persecutória dos mais radicais, deve se ter como baliza que o país não pode ficar à mercê de posições e comportamentos extremados, necessitando que a parcimônia e a temperança norteiem os rumos da nação.

Nesta linha, resta a reflexão acerca da necessidade de respeito às instituições e ao ordenamento jurídico vigente ou, com a devida contextualização – inclusive e especialmente histórica –, a evolução dos dispositivos legais, não bastando somente alvoroçados gritos de guerra que conturbam a pacificação social e prejudicam inexoravelmente nossa Democracia!


José Américo Azevedo. Engenheiro Civil pela Universidade de Uberaba e Advogado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa IDP, em Brasília. Consultor independente e ex colaborador na Defensoria Pública do Distrito Federal. Colunista na plataforma WebAdvocacy. Atualmente presta consultoria para o Instituto Unidos Brasil. Experiência em gerenciamento e coordenação de contratos, licitações, contratos e concessões públicas atuando por empresas privadas e pelo Governo. Ex-membro de Comissões de Licitações. Relações institucionais e governamentais. Credenciado como perito técnico judicial junto ao TRF 1 Região. Membro da Comissão de Infraestrutura da OAB/DF.


Contratos administrativos: a ilusão do Pacta Sunt Servanda (ou como o Estado asfixia o setor privado)

José Américo Azevedo

O brocardo latino pacta sunt servanda, cuja origem remonta à Idade Média, por intermédio do Direito Canônico, pode ser compreendido, em tradução literal, como “os pactos devem ser observados” (Missouri Housing Development v. Brice, 1988), ou “os pactos devem ser respeitados” (Nike Intern. Ltd. v. Athletic Sales, Inc., 1988), ou, ainda, “os pactos devem ser obedecidos” (United States v. Verdugo-Urquidez, 1991)[1].

De toda forma, independentemente do nível de imperatividade do cumprimento do pacto, observa-se que o referido princípio é o ápice da concepção jurídica da autonomia da vontade entre as partes. Nas relações sociais onde são acordadas obrigações mútuas, o instrumento de regulação da intenção das partes é o contrato. Clovis Bevilaqua, no final do século XIX, trouxe importante lição:

Pode-se, portanto, considerar o contracto como um conciliador dos interesses collidentes, como um pacificador dos egoismos em lucta. É certamente esta a primeira e mais elevada funcção social do contracto. E, para avaliar-se de sua importancia, basta dizer que, debaixo deste poncto de vista, o contracto corresponde ao direito, substitue a lei no campo restricto do negocio por elIe regulado.[2]

Mister perceber a importância da função do contrato no trato social. Nesta perspectiva, necessário trazer à lume o conceito de relação sinalagmática. É dizer, o contrato é, em todo o tempo, uma relação bilateral ou plurilateral. E na medida em que se configura na expressão da vontade das partes, pressupõe a existência de direitos e deveres para os seus signatários, simultaneamente e de forma recíproca. Neste sentido, Giselda Hironaka apresenta:

A relação obrigacional é uma relação jurídica que existe sempre entre pessoas determinadas (duas ou mais), da qual pelo menos uma é devedora e a outra credora. Há na relação uma prestação delimitada. Outros deveres de conduta – que estão delimitados e são, de certo modo, secundários – também podem ser exigidos. O dever primário e decisivo, que dá conteúdo e significado à relação obrigacional e determina o caráter típico da mesma é a prestação determinada. A obrigação está dirigida a esta prestação determinada ao devedor, ou à prestação de ambas as partes, o que corresponde, neste caso, ao próprio sinalagma. Quando a prestação é cumprida, ter-se-á alcançado a finalidade da obrigação, restando esta, geralmente, extinta.[3]

Assim, depreende-se que, à medida em que a relação contratual é bilateral – supondo-se entre duas partes –, faz-se necessário o cumprimento obrigacional por ambos os lados. Neste ângulo, se torna inevitável mirar os contratos administrativos, nos quais, em um polo se encontra o cidadão ou a empresa, integrante da sociedade e, em outro, o Estado, tendo como agente a Administração Pública.

Nessa visada, passa-se a observar a desconformidade do poder de negociação e controle contratual entre os dois pactuantes. À Administração cabe definir as regras para a contratação pública, estabelecendo condições desde o procedimento licitatório – se o há –, até a execução do instrumento contratual, em todos os aspectos, restando à outra parte somente acatar as prescrições impostas, sob pena, em caso de recusa, de tombar alijada do processo, portanto, sem a possibilidade de prestar um serviço ao Estado.

Não há, geralmente, qualquer margem para negociação dos termos contratuais, traduzindo-se, na realidade, em contratos de adesão, onde não existe espaço para modificações ou necessários ajustes em benefício da mais adequada prestação dos serviços.

Longe de qualquer intenção polêmica, ilustra-se o enfoque apresentado.

Começa-se explanando acerca do “fato do príncipe” em contratos administrativos. A teoria do fait du prince surgiu na França, em finais do século XIX e início do século XX, pela mão da jurisprudência do Conseil d’Etat, como reconhecimento de uma prerrogativa exorbitante da Administração Pública de alterar as prestações devidas pelo contraente privado.[4]

Segundo Gabriel Brocchi, “é uma referência à notável obra de Maquiavel, ‘O Príncipe’, escrita na Itália renascentista do século XVI, em que se aborda a presença de um Estado forte, sugerindo que as atitudes do governante nos seus domínios são legítimas, para manter-se como autoridade”[5].

Pode-se observar que se apresenta latente o poderio do Governo nas relações contratuais, além de remeter a um período pouco democrático, onde a autoridade estatal era resguardada com a utilização de todos os meios disponíveis, legítimos ou não.

Carvalho Filho traz importante reflexão:

A supremacia do Estado no contrato enseja desde logo uma inevitável consequência. Se o dogma da igualdade das partes impõe a igualdade de condição dos sujeitos do contrato, bem como a inexistência de vantagens em favor de qualquer deles, a predominância estatal provoca o nascimento de uma série de prerrogativas conferidas à Administração. Estas, como é óbvio, refogem ao âmbito do direito privado, ou seja, exorbitam dos limites deste campo. Por isso, a doutrina as tem denominado de cláusulas exorbitantes ou de privilégio.

(…)

O dado fundamental que caracteriza o fato do príncipe reside na sua proveniência: origina-se sempre do próprio Estado, no exercício de atividade lícita. Esse fato oriundo da Administração Pública não se pré-ordena diretamente ao particular contratado. Ao contrário, tem cunho de generalidade, embora reflexamente incida sobre o contrato, ocasionando oneração excessiva ao particular independentemente da vontade deste.[6]

Embora lícito, significativo repisar que o fato do príncipe que “origina-se sempre do próprio Estado” ocasiona “oneração excessiva ao particular independentemente da vontade deste”, desequilibrando a relação contratual.

Outro aspecto de inteira importância é a imposição de previsões sancionatórias unilaterais, em total desacordo com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Assume-se que a única parte passível de incidir em inadimplência contratual seja o particular, sem que estejam previstas punições para as faltas cometidas pela Administração no deslinde da relação avençada.

Nesta ótica, o agente público utiliza-se da disparidade de poder da relação para submeter o contratado aos rigores máximos, em caso de alguma falta na execução do contrato, sem que sua própria responsabilidade seja aferida e apenada.

Para não navegar somente no campo das teorias e suposições, dá-se um exemplo real, abstendo-se, por óbvio, de nominar os protagonistas, vez que totalmente prescindível.

Em uma autarquia federal, foi contratada a elaboração de um projeto, consistindo nas etapas de projeto básico e projeto executivo. A empresa contratada cometeu atrasos nas entregas dos produtos para análise por parte da contratante. Esta, no entanto, incorreu, quando da avaliação do projeto entregue, em atraso relativamente de igual monta. Ocorre que o contrato ficou paralisado durante sua execução, por quase três anos, por decisão unilateral da Administração, alegando ausência de recursos orçamentários para pagamento dos serviços contratados. Durante este período a empresa continuou trabalhando, entregando a versão final do projeto básico que foi devidamente aprovado pela contratante.

No entanto, a empresa foi multada por mora, no montante de 120% do valor da etapa referente ao projeto básico – note-se, projeto este aprovado –, sem que seus recursos no processo administrativo fossem deferidos. Ou seja, a empresa prestou o serviço, apresentou o projeto que acabou aprovado e foi multada em valor 20% superior ao que deveria receber. É dizer, a empresa está pagando à contratante 120% do valor do projeto aprovado que elaborou, promovendo o enriquecimento ilícito do Estado.

Em relação à contratante, não houve, no processo de apuração de responsabilidade, qualquer menção acerca dos atrasos promovidos pela Administração – categoricamente ignorados –, remanescendo somente a punição à empresa contratada.

Resta claro que tal disparate não encontrará guarida na esfera judicial, devendo, no entanto, serem observados, no âmbito administrativo, os excessos cometidos pelos agentes públicos, para que haja uma efetiva correição, buscando a legitimidade das relações entre o público e o privado. Não obstante, estará, no caso de judicialização da contenda, se abarrotando, desnecessariamente, os escaninhos forenses por ações de responsabilidade absoluta da Administração.

Há que se enfatizar que, ao fim e ao cabo, a maior prejudicada pelas distorções nas relações decorrentes dos contratos administrativos mal geridos, é a própria sociedade, que não somente arca com os custos financeiros e temporais dessa desvantajosa gestão, como, por conseguinte, deixa de receber o objeto contratado. Indubitável o desacato à Constituição Federal que define, em seu artigo 37 que a Administração Pública deve obedecer, em suas ações, ao Princípio da Eficiência.

Diversos outros exemplos podem ser trazidos, convertendo o despretensioso artigo em um corolário de ocorrências que o tornaria assustadoramente enfadonho. O que se pretende é demonstrar a desigualdade das partes nas relações contratuais entre a Administração Pública e o ente privado.

Para minimizar os impactos deletérios deste relacionamento, faz-se necessário o incremento das fiscalizações, correições e auditorias internas e externas, além da responsabilização pessoal do agente público que incorrer em ações de caráter culposo ou doloso, prejudiciais à contratada, para que a impunidade não seja a práxis na Administração Pública.


[1] HYLAND, Richard. Pacta sunt servanda: a meditation. Virginia-USA: Virginia Law of International Law, 1994. p. 407.

[2] BEVILAQUA, Clovis. Direito das obrigações. Bahia-Brazil: Livraria Magalhães, 1896. p. 166.

[3] HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. A chamada causa dos contratos: relações contratuais de fato. Revista de Direito do Consumidor: vol. 93, Mai – Jun / 2014, p. 210.

[4] COSTA, Andreia Duarte da. Modificações objetivas do contrato de concessão de serviços públicos num cenário de crise. Dissertação de Mestrado. Lisboa-Portugal: Universidade de Lisboa, 2016. p. 102.

[5] BROCCHI, Gabriel Gallo. A teoria do fato do príncipe. 2020.

Disponível em:

Acesso em: 23.07.2024.

[6] CARVALHO FILHO, José dos Santos. O fato do príncipe nos contratos administrativos. In: Revista de Direito da Procuradoria-Geral de Justiça, Rio de Janeiro, nº 23, p.73-79, jan./jun. 1986. pp. 74, 76.


José Américo Azevedo. Engenheiro Civil pela Universidade de Uberaba e Advogado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa IDP, em Brasília. Consultor independente e ex-colaborador na Defensoria Pública do Distrito Federal. Colunista na plataforma WebAdvocacy. Atualmente presta consultoria para o Instituto Unidos Brasil. Experiência em gerenciamento e coordenação de contratos, licitações, contratos e concessões públicas atuando por empresas privadas e pelo Governo. Ex-membro de Comissões de Licitações. Relações institucionais e governamentais. Credenciado como perito técnico judicial junto ao TRF 1 Região. Membro da Comissão de Infraestrutura da OAB/DF.

Imposto Seletivo: as idiossincrasias de um conceito contemporâneo

José Américo Azevedo

Benjamin Franklin afirmou que “nada é mais certo neste mundo do que a morte e os impostos”. Apesar de ter empregado a expressão em uma carta datada de 1789, Franklin não a criou, apenas ajudou a popularizá-la. Ela já estava em circulação alguns anos antes!

O Brasil, após 50 anos utilizando um mesmo modelo de arrecadação de impostos, está engendrando uma Reforma Tributária que, após aprovada a Emenda Constitucional nº 132, está em fase de regulamentação. Dentro deste delineamento está prevista a instituição do chamado “Imposto Seletivo”.

A ideia do imposto seletivo é taxar comportamentos – e, por conseguinte, produtos e serviços –, que possam, de alguma forma, trazer mal à sociedade, entendidos como um amplo espectro uniforme e visivelmente direcionado a um só fim.

À primeira vista, merecem ser feitas duas reflexões: (i) qual é a sociedade e o que ela quer?; e (ii) cabe ao Estado estabelecer essa definição?

A sociedade, múltipla e plural, merece o respeito à sua autonomia para definir, de fato, quais são suas prioridades. Sem “senso comum” e sem “obviedades”. Dito isso, entramos em um campo altamente minado por ideologias antagônicas que confundem, mais do que explicam, o real papel do Governo nesse imbróglio. Avancemos!

No Brasil, o imposto seletivo passou a estar previsto na Constituição Federal quando, em sua Emenda nº 132, de dezembro de 2023, inseriu o inciso VIII em seu artigo 153, determinando que “[c]ompete à União instituir impostos sobre (…) produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, nos termos de lei complementar”. É o chamado – impropriamente – de “imposto do pecado”.

A partir desse arcabouço constitucional – frise-se, derivado –, há que se taxar bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Excelente iniciativa! A teleologia da legislação tem consistência, na medida em que não se quer, para o exercício pleno da cidadania, atitudes prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Porém, a questão é outra!

A gênese do imposto seletivo é coibir atitudes socialmente inapropriadas, e, em momento algum, servir de ferramenta arrecadatória. Até porque a legislação impede! Assim, faz-se mister, existir uma política pública que respalde a cobrança do tributo, de forma a se almejar, e, objetivamente, alcançar, uma meta prestabelecida.

Cabe ao Governo, como política de Estado, desenhar uma estrutura onde a aplicação do imposto seletivo irá, a partir de mensurações específicas, atingir a meta almejada pela política pública vinculada, sob pena de o tributo estar sendo somente uma fonte de arrecadação, e não uma forma de direcionar a sociedade para um fim desejado.

Em sua justificativa, a proposta da Emenda Constitucional argumenta que “[a] PEC prevê a criação de ‘impostos seletivos, com finalidade extrafiscal, destinados a desestimular o consumo de determinados bens, serviços ou direitos’, ao fundamento de que deveriam sofrer tributação adicional os itens ‘geradores de externalidades negativas’, a exemplo de ‘cigarros e bebidas alcoólicas’”.

Não obstante o caráter social – e quiçá altruísta – da proposta, a operacionalização no mundo político, jurídico, tributário – enfim, dos fatos –, deve ser analisada com a parcimônia necessária. O conceito de prejuízo à saúde e ao meio ambiente é bastante elástico e impreciso, singrando pelos mares das vontades políticas dos governos de plantão.

Há que se considerar, por exemplo, que a sobretaxação de produto “nocivos à saúde”, por exemplo, fomentará o contrabando entre países vizinhos, como acontece com a maior parte do tabaco consumido no estado do Paraná, só para exemplificar.

Em um ambiente democrático deve prevalecer a autonomia da vontade. Evidentemente, essa limitação está constrita ao respeito à liberdade do próximo, sem que um cidadão tenha a possibilidade legal de prejudicar outro. Porém, a escolha – e não está a se falar em extremo liberalismo – tem que ser respeitada e desenvolvida. Imputar comprometimentos tributários à essa escolha soa como tangimento à individualidade pessoal. Deve ser encontrado o caminho do meio!

Voltando à essência do tema, o imposto seletivo deve ser usado de tal forma que permita à sociedade direcionar seus rumos, sem mudanças abruptas, para um mundo mais equalizado e ambientalmente mais protegido. Penalizar, tributariamente, setores produtivos essenciais à economia do país não trará, em primeiro lugar, o resultado econômico-financeiro desejado, e após, não beneficiará a economia do país, levando-o a situações que terão que ser justificadas com subterfúgios midiáticos.

Se, acaso, de toda forma, for o caminho político escolhido, não se pode cair na armadilha de achar que uma política governamental irá mudar, significativamente, o modo de vida dos cidadãos. O entranhamento e a inerência das práticas costumeiras são naturais à sociedade. Faz-se necessária a moderação da ação do Estado em relação às opções dos cidadãos.

Em contraponto a este aspecto, cabe uma reflexão. A responsabilidade das empresas do setor produtivo deve ser equilibrada e, caso necessário, imputada uma obrigação compensatória, sob forma de tributo ou iniciativas sociais e/ou ambientais, mas sempre à luz da proporcionalidade e razoabilidade, de tal forma que não haja a demonização da atividade produtiva, sempre tão cara à fomentação de empregos e de ganhos à sociedade.

No PLP 68/2024, de origem do Poder Executivo, a justificativa para a implantação do imposto seletivo, traz:

De acordo com o comando constitucional, o imposto incidirá sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens ou serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Nesse sentido, o art. 393 prevê a incidência do Imposto Seletivo sobre os seguintes bens: (i) veículos; (ii) embarcações e aeronaves; (iii) produtos fumígenos; (iv) bebidas alcoólicas; (v) bebidas açucaradas; e (vi) bens minerais extraídos.

Ora, é indiscutível que o uso excessivo de produtos fumígenos e de bebidas alcoólicas é nocivo à saúde, mas o que dizer dos demais itens? Como colocar como prejudicial à saúde a bebida açucarada ao mesmo tempo em que coloca como integrante da cesta básica de alimentos o “açúcar classificado nos códigos 1701.14.00 e 1701.99.00 da NCM/SH”? Ademais, ao passo que o imposto seletivo sobretaxa o produto, os alimentos destinados ao consumo humano preveem uma redução em 60% das alíquotas padrão. Nada mais contraditório!

Em relação aos veículos de todas as espécies, qual a comprovação científica do grau de nocividade ao meio ambiente? Estudos apontam que o metano expelido pela flatulência de rebanhos bovinos causa mais efeito estufa que o CO2 dos automóveis. E não se trata de chiste, mas de rigorosa análise técnica.

Avançando, no que diz respeito aos bens minerais extraídos, o projeto apresentado é uma violência ao mercado produtivo nacional. Como conceito, o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA), no novo modelo representado pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), deve ser cobrado no destino ao contrário do modelo atual, cujos bens e serviços são taxados na origem. A partir deste enfoque, há que se arguir, como exemplo, qual a nocividade do alumínio para o meio ambiente? Não há! No entanto, a extração da bauxita, matéria prima para a fabricação do alumínio, deve ser sobretaxada. Mas, em que caso a bauxita é utilizada como destino final, para manter respeitado o momento da taxação? Não há! É de se levar em conta, ainda, que essa tributação faz com que o fabricante de alumínio, para manter o exemplo, se sinta incentivado a importar a bauxita, que ficaria mais barata que a nacional. Ora, se o dano ao meio ambiente ocorre na extração do minério, como pode o Brasil aventar a possibilidade de cobrar tributos nas atividades de outro país? Assim, existe um claro disparate entre os conceitos utilizados no projeto de lei, maculando, na origem, sua aplicabilidade.

E mesmo quanto aos produtos fumígenos e às bebidas alcoólicas. Qual o objetivo de sobretaxá-los? Diminuir o consumo? Diminuir os gastos públicos relacionados aos problemas de saúde advindos do consumo de álcool e tabaco? Conscientizar a população dos malefícios trazidos pela utilização desses produtos? É preciso deixar claro o objetivo a ser alcançado e não somente amplificar a carga tributária, visando ao aumento de arrecadação.

Por fim, mas não menos importante, é atentar para o fato de que se o objetivo é taxar a produção, extração, comercialização ou importação de bens ou serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, essa tributação deve estar, necessariamente, atrelada a uma política pública que vise a mitigar ou compensar os supostos danos causados à saúde ou ao meio ambiente. O projeto de lei do Governo não condiciona a existência dessa política à cobrança do imposto.

O PLP 29/2024, de autoria do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança e outros, elaborado em conjunto com a sociedade civil organizada, por intermédio de uma coalizão formada por 26 Frentes Parlamentares, dispõe sobre a instituição do imposto seletivo. Porém, além de deixar claro que o imposto tem como finalidade “desestimular o consumo de bens e serviços comprovadamente prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente”, define que as hipóteses de incidência do imposto serão estabelecidas em Lei Complementar Específica, que “deverão, obrigatoriamente, prever as metas programáticas e objetivos para a definição e incidência do Imposto Seletivo, sendo necessário estabelecer a evolução na mitigação dos impactos inerentes às atividades, bens ou serviços e operações prejudiciais à saúde e ao meio ambiente”.

Ou seja, o tributo deve ter claramente expresso, para sua existência, uma finalidade tangível, consubstanciada por meio de uma política pública mensurável e aferível, de forma a ser possível constatar a eficácia da tributação, que por seu caráter extrafiscal, como já dito, não pode ter natureza arrecadatória, mas intimidatória e educativa.

Assim, necessário se faz permanecermos vigilantes com o que está sendo concebido nos gabinetes parlamentares, para não sermos presenteados com um verdadeiro cavalo de Troia.


José Américo Azevedo.

Engenheiro Civil pela Universidade de Uberaba e Advogado pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa IDP, em Brasília. Consultor independente e ex-colaborador na Defensoria Pública do Distrito Federal. Colunista na plataforma WebAdvocacy. Atualmente presta consultoria para o Instituto Unidos Brasil. Experiência em gerenciamento e coordenação de contratos, licitações, contratos e concessões públicas atuando por empresas privadas e pelo Governo. Ex-membro de Comissões de Licitações. Relações institucionais e governamentais. Credenciado como perito técnico judicial junto ao TRF 1 Região. Membro da Comissão de Infraestrutura da OAB/DF.


Gerúndio: a pedra no sapato da Administração Pública brasileira

José Américo Azevedo

O Brasil enfrenta uma série de problemas estruturais que, se sob a ótica do comodismo pode ser considerado um traço da cultura, na prática apresenta efeitos pernósticos para o desenvolvimento do país.

Desde que se nasce, ouve-se o chavão de que o Brasil é o país do futuro. Como a chegada do futuro é incerta e imprevisível, a solução é continuar esperando por anos, décadas ou séculos para ver concretizadas algumas ações específicas.

Várias análises são usadas para definir o fenômeno, como a existência do “apagão da caneta”, quando o agente público se omite ao precisar tomar uma iniciativa de sua responsabilidade, com receio de ser penalizado por um órgão de controle policialesco. Outra expressão bastante utilizada é a que se refere ao “jeitinho brasileiro”, na qual a “esperteza” do cidadão tupiniquim – vocábulo evidentemente usado em sentido pejorativo – encontra caminhos heterodoxos, por vezes carentes de licitude, para resolver suas agruras.

No presente artigo, numa tentativa de estar respaldado pelo manto da elegância, optou-se por imputar ao gerúndio todo a heresia da morosidade nas ações administrativas no âmbito de todos os Poderes.

O gerúndio é usado para indicar que uma ação ainda está em curso ou que é prolongada no tempo. Transmite uma noção de duração e continuidade de ação verbal. É dizer, algo inacabado, seja por motivos legítimos, por força de cronogramas ou atrasos justificados, seja por indolência nas necessárias ações que competem ao Poder Público.

Parece exagero, mas é possível ilustrar a assertiva com exemplos reais. Em 2020, foi definitivamente encerrada uma ação judicial (RE 1.250.467) que foi apresentada por Isabel de Orleans e Bragança, nossa Princesa Isabel, em 1895 (!), ou seja, chegou a termo após 124 anos de litígio. O Supremo Tribunal Federal decidiu que o Palácio Guanabara, a sede do governo do estado do Rio de Janeiro, pertence à União, e não aos descendentes da família real brasileira.

Para não se fiar somente em casos emblemáticos a fim de alicerçar o argumento, pode-se utilizar situações mais digeríveis, como no caso da justiça trabalhista. Segundo estatística do Conselho Nacional de Justiça[i], em 2022, existiam mais de 220 mil processos trabalhistas com mais de 15 anos desde seu ajuizamento, ainda não solucionados. Mais de duzentos mil trabalhadores esperando o desfecho de uma ação que, sendo ou não favorável aos seus propósitos, consiste, até o momento, na expressão de Carnelutti, em um “conflito de interesses qualificado pela pretensão de um dos interessados e pela resistência do outro”, ou seja, uma legítima aspiração de consecução da Justiça, aperfeiçoando seu direito.

No entanto, a morosidade – com a temível aplicação do gerúndio – não é monopólio do Poder Judiciário. No Executivo, tomando-se apenas um exemplo, a Empresa de Planejamento e Logística, ligada ao Ministério da Infraestrutura, editou para consulta pública, em 2023, Plano Nacional de Logística – PNL 2035, de onde se extrai um perceptível excerto:

Em 1869, o engenheiro militar Eduardo José de Moraes desenvolveu um plano focado na navegação fluvial, buscando a exploração deste recurso junto às poucas ferrovias já implantadas. A preocupação (…) era o estabelecimento de vias de comunicação associadas às vias de transporte, assim com garantir uma redução de custos para escoamento de produções localizadas no interior.[ii]

Há que se notar que passados mais de 150 anos, o planejamento é ainda citado, porém, nunca saiu do papel. O Governo está planejando, estudando e pensando, e, assim, reforçando a mais aprimorada forma de utilização do gerúndio.

Para não esquecer o Poder Legislativo, deve-se lembrar que a tão propalada Reforma Tributária aprovada este ano, mas ainda sendo – desculpem a repetição do tempo verbal – regulamentada, teve seu nascedouro há, pelo menos 40 anos, sendo o sistema atualmente em vigência no país, da longínqua década de 1960.

Impossível não saltar aos olhos, a morosidade da Administração Pública ao longo de todo este período, desde os tempos do Brasil Império. Diversos governos, sob diferentes sistemas políticos, com os mais variados matizes ideológicos, comandam o país a passos de cágado, sendo o Brasil um sobrevivente do descaso e da letargia dos dirigentes.

Voltando ao nosso tema – o gerúndio –, interessante observar, buscando nos versos de Caetano Veloso, em sua música Língua, cuja frase nada mais é que uma paródia do pensamento do filósofo alemão Martin Heidegger, que “está provado que só é possível filosofar em alemão”. Coincidência ou não, o idioma alemão não possui gerúndio!

Na língua germânica, o verbo é conjugado no presente, que pode indicar algo que está sendo feito, que irá se fazer ou que se faz habitualmente. Cabe refletir se, metaforicamente, essa não seria uma importante lição a ser aprendida pelos agentes públicos, especialmente os alçados à condição de dirigentes.

Há que se pensar no presente, sem a continuidade que o gerúndio proporciona e, por vezes, turva o horizonte de conclusão das ações necessárias ao desenvolvimento e bem-estar da sociedade. Há que se pensar no presente – repete-se – para que as iniciativas ocorram de forma imediata, desde o planejamento, evidentemente, mas, essencialmente na sólida execução do que foi idealizado.

Talvez assim, o Brasil deixe de ser somente o país do futuro e possa vislumbrar o presente coroado de excelentes realizações.


[i] https://painel-estatistica.stg.cloud.cnj.jus.br/estatisticas.html. Consultado em 29.01.2024.

[ii] Plano Nacional de Logística – PNL 2035. Relatório Executivo. Brasília: Ministério da Infraestrutura. Empresa de Planejamento e Logística, 2023. p. 13.

Arbitragem em contratos internacionais de mineração: salvação ou armadilha?

Luciano Ramos de Oliveira & José Américo Azevedo

Há muito já se debate no âmbito doutrinário e jurisprudencial acerca da constitucionalidade de adoção obrigatória de procedimento arbitral em litígios empresariais e se tal adoção violaria os preceitos do acesso à justiça previstos na carta constitucional. A temática pouco discutida ainda diz respeito aos custos e despesas do procedimento arbitral enquanto óbice ao ingresso no Judiciário.

Um dos fatores relevantes para a ineficiência da prestação jurisdicional do Brasil é a grande quantidade de processos que tramitam pelo país, em especial na primeira instância, que concentra 94% do acervo processual conforme levantamento do CNJ. A situação é mais alarmante diante do fato de que, no processo civil brasileiro, a fase de execução é a mais demorada, sendo necessários, em média, 5 anos e 11 meses para se chegar ao final do processo[1].

A autocomposição entre as partes (mediação e conciliação) e heterocomposição do litígio por arbitragem entabulam o debate doutrinário acerca dos limites e do objeto desta espécie de compromisso. Surge, a partir de tais compromissos, a indagação sobre o alcance da composição atinentes aos ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, sobretudo no conflito com direitos fundamentais aplicáveis ao processo em nosso ordenamento, nesse ponto é importante indagar: as partes podem transacionar sobre o exercício, previamente à existência do processo, de direitos fundamentais como o do acesso à justiça e do devido processo? Nesse cenário, não se ignora que há muito já se estabeleceu que o Estado Constitucional repudia a autotutela como sinônimo de “justiça com as próprias mãos” ou “vingança privada”.

Vale destacar que o debate sobre o cerceamento de acesso à justiça proveniente de cláusula arbitral, argumento já afastado pelo Supremo Tribunal Federal[2], demonstra que o ingresso não é alcançado apenas por meio da tutela jurisdicional, mas, também, por meio do procedimento arbitral, o qual formata sentença equiparada às sentenças judiciais.

No processo SE 5206 analisado pelo Supremo Tribunal Federal, percebe-se que o Ministro Sepúlveda Pertence enfatiza a peculiaridade do fato de que o “laudo arbitral estrangeiro decidiu conflito entre duas sociedades comerciais” e que se trata de “direitos inquestionavelmente disponíveis”. Tal afirmação no voto conduz à conclusão de que as relações comerciais, em regra, tratam de direitos disponíveis e o estabelecimento, em contrato, de compromisso arbitral compõe o acervo acessível à atividade empresarial.

De fato, a atividade empresarial, tanto sob à ótica da autonomia da vontade, quanto sob os direitos e deveres envolvidos, em sua grande maioria são disponíveis ante à natureza jurídica do Direito Mercantil. Como bem apontado por Barreto Filho, a atividade empresarial ostenta princípios próprios impostos pelas exigências econômicas como, por exemplo, a elaboração de leis uniformes para regular operações de comércio internacional, assentando, ainda, que “[i]sso tudo mostra que a atividade mercantil se reveste de contornos próprios e de um sentido institucional específico, que a distingue da atividade civil comum [3].

A atração do setor mercantil à arbitragem se justifica por algumas razões. A primeira, apontada por Rechsteiner, é a conservação das relações comerciais em razão da solução da controvérsia de forma célere, discreta e “levando em conta critérios e valores próprios das partes que estão envolvidas[4]. A celeridade tem previsão na Lei n.º 9.307 de 1996, especificamente no art. 23, que dispõe que caso as partes não tenham convencionado, “o prazo para a apresentação da sentença é de seis meses”.

Outro fator considerado como atrativo ao sistema arbitral é indicado por Inês Campolina. A autora expõe que o “sigilo é um importante instrumento negocial” e que é forçoso reconhecer as “implicações advindas da simples divulgação de ações judiciais envolvendo o nome da empresa[5]. O sigilo é peça central dos contratos comerciais em que as partes necessitam da confidencialidade para o sucesso da operação, especialmente aqueles contratos em que se verifica a presença de cláusula Non-Disclusure Agreement (NDA), a qual possui a função de proteger informações sensíveis e estratégicas para a empresa, evitando que estas sejam tornadas públicas e possam ser utilizadas por concorrentes[6].

Além disso, a autora destaca a vantagem da economia financeira, visto que “o procedimento arbitral geralmente é bem mais econômico que as custas e taxas que são pagas no Judiciário”. Por fim, acentua que a sentença arbitral é uma decisão técnica, na medida em que “é proferida por quem realmente conhece do objeto em litígio[7]. Embora a economicidade do procedimento arbitral seja discutível, como será deslindado adiante, em relação à tecnicidade, vale o realce da especialização das varas e câmaras arbitrais.

Conforme anotam Débora Chaves Martinez Fernandes e João Vicente Fernandez Pereira, por mais que o procedimento arbitral tenha algumas características vantajosas, a “cultura da arbitragem como substituto do Judiciário pode causar distorções no sistema brasileiro de resolução de conflitos empresariais”. Quanto a isso, os autores expõem a inovação do Tribunal de Justiça paulista em matéria empresarial:

Conquanto o TJSP já esteja dotado de Câmaras Reservadas à matéria empresarial, a coordenação do trabalho entre as duas instâncias facilita e agiliza o desenvolvimento, pelo Tribunal paulista, de jurisprudência coerente e de uma maior clareza do regramento comercial brasileiro – diminuindo os riscos e custos de transação, negociação, produtos e serviços, atraindo investidores e impactando positivamente empresários e consumidores.

O Brasil já tem excelentes provas dos benefícios da concentração temática desde a primeira instância. A jurisprudência do TJSP sobre a Lei nº 11.101/2005 se tornou referência consultiva e contenciosa para empresas em crises e seus credores durante o boom de recuperações judiciais dos últimos anos – e ousamos dizer que o trabalho conjunto das Varas de Falência e Recuperação Judicial de São Paulo e das Câmaras Reservadas do TJSP potencializou os efeitos da uniformização rápida da boa jurisprudência.[8]

Sobre a mesma temática, Manoel de Queiroz Pereira Calças e Marcelo Guedes Nunes dissertam acerca do sucesso da criação de varas especializadas em direito empresarial e sublinham o aumento — significativo — de distribuições de demandas empresariais no TJSP, assinalando que “o ano de 2018 fechou com um total de 2.079 processos, um aumento de 84% na quantidade de disputas distribuídas quando comparado aos três anos anteriores”, e ressalta que “[s]e antes muitos empresários desistiam de recorrer ao Poder Judiciário por conta da excessiva demora e da insegurança sobre o resultado dos processos, hoje com a especialização o Poder Judiciário paulista passou a ser visto pela comunidade empresarialista como uma alternativa viável e competitiva para a resolução dessas disputas [9].

Contudo, apesar da alteração do cenário paulista quanto à eleição de foro judicial para solução de litígios em contratos nacionais, o mesmo parece não se confirmar na formatação de contratos internacionais entre empresas brasileiras e estrangeiras, pelo menos no mercado de mineração.

Indaga-se se a imposição do foro arbitral às pequenas empresas de mineração mitiga o atributo da autonomia da vontade empresarial, vez que a eleição de foro judicial é fator de risco para companhias estrangeiras, para se firmar contratos para exportação de minério com grandes players de outros países.

Há muito é consolidada na doutrina que, no âmbito dos contratos empresariais, vigora uma relação jurídica pautada na presunção de que ambas as partes são dotadas de conhecimentos específicos e que lhes dão autonomia para negociar cláusulas contratuais de acordo com seus interesses.

As teorias contratuais, em que pese serem de base civilista, explicam o fenômeno da autonomia da vontade na formatação de contratos. A teoria clássica expõe que a liberdade contratual independente produz certa autonomia para pactuar acordo conforme com os interesses, ao passo que a teoria contemporânea vem abordando a autonomia da vontade como “algo inadequado à realidade política, econômica e social atual[10], permitindo certo dirigismo contratual por meio do Estado-Juiz.

Na perspectiva judicial, o STJ já inclinou para a linha do dirigismo contratual em demandas que a relação jurídica empresarial era tipicamente empresarial. No bojo do REsp 1881149/DF, discutia-se a nulidade de contrato de franquia e a intervenção judicial, aplicando-se o princípio da boa-fé contratual como pedra de toque para solução do litígio. Assentou a Ministra Relatora Nancy Andrighi da 3ª Turma do STJ que “[n]esse contexto, a boa-fé objetiva, expressamente prevista no art. 422 do CC/02, assume especial relevo, à medida em que impõe aos sujeitos da relação jurídica o dever de agir com probidade, honestidade, lealdade e de modo a não frustrar as legítimas expectativas da contraparte”, e concluiu afirmando que“a execução do contrato pela recorrente por tempo considerável configura verdadeiro comportamento concludente, por exprimir sua aceitação com as condições previamente acordadas com a recorrida” [11].

Em outra oportunidade, a mesma 3ª Turma do STJ, em voto do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva no REsp 1867551/RJ, optou por manter incólume o acordo de vontade estabelecido pelas empresas em contrato, afirmando que “a cláusula penal está inserida em contrato empresarial firmado entre empresas de grande porte, tendo como objeto valores milionários, inexistindo assimetria entre os contratantes que justifique a intervenção em seus termos, devendo prevalecer a autonomia da vontade e a força obrigatória dos contratos”.

Não se ignora que as empresas de mineração nacionais, ao firmarem contratos de fornecimento ou investimento com empresas estrangeiras, está a tratar de relação jurídica estritamente empresarial, a despeito do objeto social da empresa nacional estar vinculado às regras esposadas no codex minerário, e que, por tal razão, também estão sujeitas à legislação vigente. Portanto, as reflexões próprias do direito mercantil são aplicáveis aos contratos firmados entre empresas no ramo minerário, incluindo-se as posições jurisprudenciais quanto à análise de contratos empresariais.

A lógica do setor de mineração é pautada pela exclusividade do direito minerário, com isso se preserva a “regra da descoberta” de quem realizou a pesquisa e solicita a outorga para lavra do recurso mineral existente em dada área. Conforme ilustra Adriano Drummond Cançado Trindade:

A prioridade permite, assim, que a pequena mineração tenha acesso a áreas de pesquisa e, se for o caso, lavra mineral da mesma forma que a mineração de grande porte. Em última instância, as políticas empresariais de uma e de outra naturalmente depuração as preferências e buscas por jazidas[12].

Assim, pequenos empreendedores do setor mineral, ao fazerem pedido à Agência Nacional de Mineração para exploração de dadas áreas, podem fazer frente ao poder econômico de grandes empresas.

Dada a lógica do mercado minerário, no Brasil hoje, conforme apuração da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais de 2019[13], observa-se mais de 7 mil empresas de mineração em atuação.

No ano de 2017, segundo dados da Agência Nacional de Mineração, as micro e pequenas empresas mineradoras compõem quase 90% do setor mineral do Brasil, sendo assim disposto:

Fonte: ANM 2017. Valores relativos a ROM*, não sendo contabilizados aqui as lavras garimpeiras, licenciamentos e complexos de águas minerais.

A exportação de minério no Brasil tem sido grande vetor para o crescimento da economia. Em 2018, o setor exportou cerca de 410 milhões de toneladas, sendo a China a principal destinatária com aproximadamente 57% deste total. Em 2019, o setor exportou cerca de 360 milhões de toneladas, sendo 65% para a China[14].

Apesar do expressivo número de micro, pequenas e médias empresas no Brasil, tais empresas ainda sofrem dificuldades de atuação no mercado, seja pelo poder econômico, seja pela fragilidade nas áreas de tecnologia e acesso a novos mercados[15].

Constata-se, então, que em um cenário econômico no qual o maior comprador de minério brasileiro é um grande agente econômico mundial, permanece a indagação: micro e pequenas empresas do setor minerário nacional ostentam relação paritária frente aos compradores/investidores internacionais a ponto de eleger foro judicial para situações de litígio ao invés de estabelecer compromisso arbitral?

A resposta é negativa. A posição dominante das empresas estrangeiras influencia o comportamento das micro e pequenas empresas nacionais de mineração, na medida em que elas, em regra, não possuem estrutura econômica, jurídica e nem tecnológica para recusar qualquer disposição contratual advindas desses players estrangeiros.

Assim, eventual violação contratual por parte do contratante estrangeiro (ou investidor) deverá ser discutida em foro arbitral e nas câmaras arbitrais eleitas em contrato para tanto. De acordo com a realidade das micro e pequenas empresas nacionais, a princípio, os custos de instauração das câmaras de arbitragem e remuneração de árbitros é fator que inviabiliza o acesso à justiça.

O poder econômico da maioria das empresas que operam o setor minerário, demonstra a inviabilidade de instauração de procedimento arbitral para solução de litígios oriundos de contratos internacionais. É de se questionar se tal condição imposta pelas grandes empresas estrangeiras viola o corolário nacional de acesso à justiça.

Quanto ao conceito de custos e despesa com arbitragem, Thiago Marinho Nunes e Mariana Gofferjé Pereira expõem que os custos e despesas com a arbitragem são os gastos indispensáveis, relativos à administração do procedimento, como, por exemplo: honorários dos árbitros, despesas de viagem dos árbitros e do secretário do tribunal arbitral, honorários de eventuais peritos, despesas com a realização de audiências, incluindo custos de serviços de estenotipia, intérpretes, etc., e, finalmente, custos administrativos da instituição administradora do procedimento[16].

Além disso, outro fator que encarece o procedimento é o custo de instauração da câmara arbitral, o qual, geralmente, é calculado a partir do valor da causa que será objeto de análise pelos árbitros constantes daquela câmara. Ao pesquisar as despesas oriundas dos procedimentos arbitrais nas principais câmaras nacionais e internacionais, verifica-se que o importe, na maioria das vezes supera a casa de centenas de milhares de dólares, podendo-se chegar ao montante equivalente a quase 70% do valor da causa[17].

Não obstante a matéria de alto valor das custas judiciais já ter sido enfrentada pelo Poder Judiciário — concluindo pela ofensa à garantia de acesso à jurisdição —, o que culminou na edição da Súmula n.º 667 do Supremo Tribunal Federal[18], a questão relativa à arbitragem ainda pende de apreciação pelo Poder Judiciário do Brasil. Marcos Luiz de Melo denomina como “custo proibitivo” da arbitragem e conclui que restaria o socorro à jurisdição estatal para a solução da disputa, visto que a “jurisdição arbitral coloca obstáculo praticamente intransponível para seu acesso”, e justifica:

Ao impor óbices exorbitantes, desarrazoados, desproporcionais ao pleno exercício do direito de ação, estamos diante de impedimento do princípio da inafastabilidade da jurisdição, ante a impossibilidade material de levar à jurisdição arbitral ou estatal lesão de direito e excluindo a garantia da tutela jurisdicional efetiva. […]

A via de acesso à “Justiça”, […], deve caminhar pela via do Poder Judiciário, já que impossibilitada a própria instauração do processo arbitral, em face da abusividade das custas arbitrais, não sendo possível nem mesmo invocar o princípio Kompetenz-Kompetenz. Nesse caso, a via da jurisdição arbitral está obstaculizada, óbice já de início colocado pela exorbitância de custas arbitrais, que desafiam a razoabilidade e a proporcionalidade, e que impedem a própria abertura da porta de acesso arbitral para discutir o que quer que seja. [19]

Percebe-se que o autor conclui pela possibilidade de acesso à jurisdição estatal ante a abusividade dos custos e despesas de procedimento arbitral, sendo inclusive inviável invocar o princípio Kompetenz-Kompetenz para tanto. Conforme apontado, o STJ já excepcionou o aludido princípio em cláusulas compromissórias tidas por patológicas ou compromissos vazios (Resp 1082498/MT).

Ocorre que, sob à ótica analisada, o setor minerário ainda possui uma singularidade que teria o condão de despertar a análise pelo Poder Judiciário acerca da impugnação de cláusula compromissória: o direito minerário[20] como questão de ordem pública e imperativo de soberania nacional.

Para Flavia Muller David Araújo “[s]e o regime militar protegia a mineração de forma a garantir suas estratégias de defesa e de segurança nacional, a Constituição de 1988, além de pensar nisso, tratou também de tentar disciplinar a questão sob o viés econômico, como forma de exploração e de aumento do patrimônio nacional [21].

Embora a Constituição de 1988 autorize a exploração econômica por particular brasileiro ou empresas constituídas sob as leis nacionais – aqui não importando a composição de estrangeiros como sócios –, o exercício do direito minerário é regulado pela Agência Nacional de Mineração e precisa seguir um catálogo de regras para que possa exercer lavra de mineral em solo brasileiro.

A título de exemplo, a atividade de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerais na Faixa de Fronteira, bem como o exercício de atividade de mineração em terras indígenas possuem alguns fatores limitantes para aqueles que pretendem explorar tais áreas.

Constata-se, portanto, que tais matérias são dotadas de interesse nacional e de imperativo de ordem pública e, assim, caso algum compromisso arbitral ou laudo arbitral estrangeiro tenha se debruçado em tais matérias, permitirá ao Poder Judiciário julgar pela invalidade ou não homologação de laudos arbitrais por tais razões. Isso porque, não se trata, em alguns casos, de direito disponível, dependendo, por vezes, de autorização do Congresso Nacional, sob pena de ofender a ordem pública nacional.

Portanto, as demais matérias como abuso de poder econômico (violação à autonomia da vontade empresarial) e alto custo de instauração de procedimento arbitral não são razões suficientes para intervenção do Poder Judiciário, devendo as empresas nacionais de mineração demonstrar vício de vontade ou patologia no compromisso arbitral.

Já no que toca às matérias de interesse nacional em sede minerária, percebe-se que a intervenção judicial é factível, o que permite concluir pelo acesso franco à justiça, sem que viole os preceitos do princípio Kompetenz-Kompetenz do foro arbitral.

Como conclusão, pode-se constatar que o foro arbitral se demonstrou mais vantajoso ante à tecnicidade dos árbitros e sigilo do procedimento para resolução de controvérsias empresariais. No entanto, a institucionalização de varas e câmaras empresariais pelo Poder Judiciário brasileiro tem se mostrado otimista e com maior adesão nos últimos anos, fato que demonstra certa tendência de opção para eleição do foro jurisdicional, em oposição à escolha pela arbitragem.

Contudo, somente em casos excepcionais é que o órgão judicante tem afastado os compromissos firmados na relação mercantil. Com base nisso, a disparidade de poder econômico nem sempre será fundamento para análise de contratos comerciais com eleição de foro arbitral, isso porque a demonstração de abusividade de poder econômico deverá ser mais bem comprovada e admitida pelo Poder Judiciário.

Quanto às custas e despesas do procedimento arbitral, com a busca da legislação como fonte de previsibilidade para as decisões judiciais, é temerário estabelecer tal opção sem uma análise detida da questão. Assim, o mero custo da arbitragem, isoladamente considerado, não pode ser único fundamento para afastar o princípio Kompetenz-Kompetenz do foro arbitral no setor de mineração. Uma vez demonstrado que o direito minerário no Brasil guarda estreita relação com imperativos de interesse nacional e ordem pública, a modulação de tal princípio se mostra factível, principalmente em questões que envolvem operação de mineração em áreas sensíveis como, por exemplo, faixas de fronteira ou terras indígenas, onde a legislação nacional é mais restritiva e impositiva.

Portanto, a sensibilidade da temática “mineração” guarda singularidade e impende reflexão quanto ao compromisso arbitral e laudos arbitrais estrangeiros que envolvem tal matéria, haja vista a possibilidade de análise pelo Poder Judiciário em razão de eventual violação à ordem pública e ao interesse nacional.


[1] BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2019. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/pesquisas-judiciarias/justica-em-numeros/

[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AgRg da Sentença Estrangeira 5.206-7, Reino da Espanha, Tribunal Pleno, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 30.04.2004.

[3] BARRETO FILHO, Oscar. A dignidade do direito mercantil. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, v. 68, n. 2, pp. 17-18.

[4] RECHSTEINER, Beat Walter. Arbritagem privada internacional no Brasil, teoria e prática. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 28.

[5] CAMPOLINA, Inês Maria de Carvalho. op.cit. p. 69.

[6] REIS, Edgar Vidigal de Andrade. Startups: análise de estruturas societárias e de investimento no Brasil. São Paulo: Almedina, 2018, p. 125.

[7] CAMPOLINA, Inês Maria de Carvalho. op.cit. pp. 69-70.

[8] FERNANDES, Débora Chaves Martinez; PEREIRA, João Vicente Fernandez. Varas empresariais do TJSP: uma boa notícia. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/varas-empresariais-tj-sp-uma-boa-noticia-15022017

[9] CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira; NUNES, Marcelo Guedes. Um ano e meio das varas empresariais de São Paulo: um iniciativa de sucesso. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/varas-empresariais-sucesso-05082019

[10] VASCONCELOS, João Paulo Angelo; HUNGARO, Ana Paula do Carmo Galiciani; DOS SANTOS, Khetlen Eduarda Ferreira Marinho. Os contratos empresariais frente à pandemia da covid-19: excepcional abertura à solução judicial de conflitos parametrizada no princípio da preservação da empresa. In: Colloquium Socialis. ISSN: 2526-7035. 2020. p. 6.

[11] REsp 1881149/DF, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 01/06/2021, DJe 10/06/2021

[12] TRINDADE, Adriano Drummond Cançado. A obtenção de direitos minerários segundo o regime de prioridade. In: FERRARA, Marina [et al]. Estudos de Direito Minerário. Belo Horizonte: Fórum, 2012. pp. 23-25.

[13] Disponível em: https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2021/02/Economia-Mineral-Brasileira-IBRAM-2020.pdf

[14] Disponível em: https://ibram.org.br/noticia/micros-e-pequenas-empresas-mineradoras-representam-quase-90-do-setor-mineral-do-brasil/

[15] VALE, Eduardo. Análise econômica das pequenas e médias empresas de mineração: relatório final. Brasília: CPRM, 2000, p. 77.

[16] Disponível em : https://www.migalhas.com.br/coluna/arbitragem-legal/317140/breves-notas-sobre-custos-e-despesas-na-arbitragem-interna

[17] Disponível em: https://www.camaradearbitragemsp.com.br/pt/arbitragem/tabela-custas.html

Disponível em: https://www.camesbrasil.com.br/resolucao-de-disputas/arbitragem/tabela-arbitragem/

Disponível em: https://www.international-arbitration-attorney.com/pt/icc-arbitration-cost-calculator/

[18] Súmula 667, STF : «Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa».

[19] MELO, Marcos Luiz. Custo proibitivo da arbitragem como óbice à jurisdição. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-nov-05/marcos-melo-custo-proibitivo-arbitragem

[20] PESSOA, Thiago Thomaz Siuves. A natureza jurídica do direito decorrente do título de concessão de lavra minerária. In: FERRARA, Marina [et al]. Estudos de Direito Minerário. Belo Horizonte: Fórum, 2012. pp 187-188.

[21] ARAUJO, Flavia Muller David. O licenciamento ambiental no direito minerário. 1ª ed. São Paulo: Editora Verbatim, 2015, p. 78.


Luciano Ramos de Oliveira. Licenciatura em História. Bacharel em Direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa – IDP. LLM em Direito dos Negócios e Governança Corporativa pelo IDP-Brasília. Mestre e Doutorando em Direito pela Universidade de Brasília. Advogado. Professor no curso de MBA do IDP-Online e na disciplina de Direito Comercial da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília – UnB.

José Américo Azevedo. Engenheiro Civil pela Universidade de Uberaba e Bacharel em Direito pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa – IDP. Consultor independente e colaborador na Defensoria Pública do Distrito Federal. Advogado. Experiência em gerenciamento e coordenação de contratos, licitações, contratos e concessões públicas atuando por empresas privadas e pelo Governo. Ex-membro de Comissões de Licitações. Relações institucionais e governamentais. Colunista na plataforma WebAdvocacy.

Compliance: fazer a coisa certa ou se submeter à caça às bruxas?

José Américo Azevedo

Encabeça-se este breve artigo subvertendo os cânones acadêmicos ao citar uma frase extraída de um artigo publicado sem indicar sua fonte, mesmo porque seu conteúdo demonstra um conceito muito comum entre aqueles que se dispõem a singrar os recônditos mares do Compliance. O contexto e o motivo desse estreitado deslize será compreendido – e perdoado, espera-se – com a leitura do texto.

Eis a aludida máxima: “O conceito e o próprio surgimento do Compliance encontram-se entrelaçados aos atos de corrupção identificados e desvendados em todo o mundo”.

A ideia pré-concebida de que a implantação de um programa de Compliance tem como objetivo combater a corrupção intrínseca, assemelha-se à metáfora de uma pessoa que somente vai ao médico porque, necessariamente, está doente.

É preferível a ideia de ir ao médico para fazer um checkup, ou seja, de maneira preventiva, de forma que se possa adotar os melhores comportamentos a fim de não atrair uma verdadeira doença.

Sem embargo à modesta digressão, comecemos nossa exposição.

*   *   *

Não há dúvida que a utilização exacerbada da expressão Compliance nos dias atuais deveu-se, em grande medida, à demonstração do desmonte das estruturas de governança corporativa nas grandes empresas do país, especialmente do setor de construção pesada, nas duas primeiras décadas deste século.

A importação do anglicismo Compliance, no entanto, aportou em terras nacionais de forma exagerada, e porque não dizer, deturpada. Do inglês to comply, cuja tradução mais precisa se aproxima da ideia de “conformação”, traz o conceito de ajustar, moldar, os procedimentos empresariais para atendimento àquilo que está pactuado, contratado, dentro das melhores práticas. Por outro lado, paradoxalmente, Compliance, no Brasil, passou a ter uma concepção de rigidez, de inflexibilidade perante as regras estabelecidas em abstrato, ou seja, de forma genérica e ampliada, sem levar em consideração as particularidades de cada caso. Neste sentido, Robert Alexy, sabiamente, baliza que “a realidade não é parte da norma jurídica, apesar de condicionar sua compreensão[1].

Por sua vez, a legislação pátria optou por utilizar a expressão “integridade” para se referir às obrigações que a Administração Pública e as empresas têm que cumprir para o alcance de um ambiente corporativo saudável, deixando de lado, o termo “conformidade”, talvez mais apropriado aos objetivos ambicionados.

Não se trata de uma questão etimológica ou semântica, mas antes, porém, da exegese de cada palavra, uma vez que a lei, per se, depende da extração de seu significado. Para Inocêncio Mártires Coelho, “a interpretação das normas é um conjunto de métodos e princípios, desenvolvidos pela doutrina e pela jurisprudência com base em critérios e premissas – filosóficas, metodológicas, epistemológicas – diferentes mas, em geral, reciprocamente complementares, a confirmar o assinalado caráter unitário da atividade interpretativa[2].

Condensa-se, da análise proposta, que para uma interpretação mais assertiva do texto normativo, importante se faz a correta opção vernacular, de forma a se sugar o verdadeiro sentido pretendido.

Partindo-se dessa premissa, é possível buscar sutis diferenças entre as expressões, na maior parte das vezes utilizadas como sinônimas, obnubilando a real compreensão dos propósitos almejados.

Assim, para Bruna Pfaffenzeller, por Compliance compreende-se o conjunto de práticas e disciplinas adotadas pelas pessoas jurídicas no intuito de alinhar o seu comportamento coorporativo à observância das normas legais e das políticas governamentais aplicáveis ao setor de atuação, prevenindo e detectando ilícitos, a partir da criação de estruturas internas e procedimentos de integridade, auditoria e incentivos à comunicação de irregularidades, que forneçam um diagnóstico e elaborem um prognóstico das condutas e de seus colaboradores, com a aplicação efetiva de códigos de ética no respectivo âmbito interno[3]. Ou seja, possui uma abordagem mais abrangente – um gênero – do universo de governança corporativa.

A expressão escolhida pelos legisladores (basta observar as Leis 12.846/2013, 13.303/2016 e 14.133/2021, dentre outras) foi “integridade”, quer na elaboração de programas, na criação de códigos, ou mesmo na verificação de procedimentos que atinjam essa finalidade. No dicionário Oxford da Língua Portuguesa, pode ser obtida a definição de integridade como a “característica ou estado daquilo que se apresenta ileso, intato, que não foi atingido ou agredido”. É possível observar que a busca pela integridade pressupõe um ambiente não íntegro, ou seja, atingido, agredido, corrompido. Parte-se para uma ideia de intervenção corretiva, uma vez que, de acordo com o termo, empenha-se em corrigir aquilo que está, de alguma forma, inadequado.

E, ainda, pode-se optar pelo vocábulo “conformidade”, que na acepção do mesmo dicionário significa “ato ou efeito de se conformar, de aceitar, de se pôr de acordo; conformação, concordância”, é dizer, não há, ainda, qualquer mácula aos procedimentos em curso.

Nesse viés analítico, traz o Ministro do STJ Benedito Gonçalves em parceria com Renato Grilo, importantes reflexões, como se observa:

“Conformar-se” é um estado de sujeição ou de movimentação entre balizas ou limites: um organismo passa a agir heteronormativamente, ou seja, abandona sua autonormatividade.

(…)

a liberdade do Administrador Público encontra-se submetida ao princípio da juridicidade.

(…)

Ao agente econômico privado não se permite mais um campo de liberdade tão amplo quanto o vazio da legalidade estrita, ou seja, não mais se concebe a liberdade de agir do organismo privado limitada apenas pelas disposições legais expressas.

(…)

a instituição de um sistema interno de gestão de controle ou de conformidade, portanto, não deve se apegar apenas ao cumprimento das regras e disposições legais, mas também à aplicabilidade da força normativa constitucional, seja dentro de uma empresa privada ou pública, seja no ambiente interno da Administração Pública. [4]

Importante constatar que, embora aludam à implantação da gestão interna de conformidade, em qualquer momento os autores deixam de visar à necessária atenção aos preceitos normativos, constitucionais e legais. O que impende destacar, é que este ambiente será criado de maneira preventiva, fazendo com que as sanções previstas para condutas antiéticas sejam aplicadas em caso de necessidade, porém sem que haja uma circunstância que autorize um olhar previamente repressor para as organizações públicas e privadas.

Cabe repisar que não se trata de perfeccionismo etimológico ou semântico, mas da adequação das ações impingidas aos agentes privados em relação à execução das práticas corporativas desejáveis, especialmente nas relações com a Administração Pública, onde a máxima do pacta sunt servanda é mitigada pelas questões obrigacionais impostas ao setor público.

Importante alerta é feito por Rafael Oliveira e Jéssica Acocella, em relação às contratações pela Administração Pública:

Todavia, o sentido da Lei 8.666/1993 [cujo texto foi repetido na Lei 14.133/2021] adquiriu novos e ampliados contornos com a inclusão expressa, pela referida lei, da promoção do desenvolvimento nacional sustentável como um dos objetivos da licitação. Consequentemente, a proposta mais vantajosa para a Administração Pública deixaria de ser aquela que demonstrasse ter a melhor relação direta “custo-benefício” pelo aspecto estritamente financeiro, passando a ser a que também possa propiciar, mesmo que a longo prazo, benefícios sociais, ambientais e econômicos duradouros para o pais.

Assim, na instauração dos processos de contratação pública, cabe ao gestor público sempre avaliar a possibilidade de adoção de critérios social, ambiental e economicamente sustentáveis, reflexão fundamental quando se considera a escala das aquisições governamentais, o poder de compra do poder público e o efeito cascata que uma licitação produz sobre o mercado envolvido, multiplicando investimentos e criando um ambiente socialmente favorável na direção desejada.

Os procedimentos licitatórios no âmbito da Administração Pública têm, portanto, representado crescentemente um terreno fértil, e ainda não integralmente explorado, para novas vertentes regulatórias, as quais, ao integrarem considerações extraeconômicas em todos os estágios da contratação administrativa, visam à cooperação voluntária dos agentes econômicos envolvidos, relegando-se à coerção papel secundário.

(…)

Salomão Filho esclarece que o aparecimento ou não da cooperação é função direta da existência de condições (e instituições) que permitam seu desenvolvimento. Acrescenta que as instituições requeridas pela cooperação devem ser as estritamente necessárias para criar as condições de seu aparecimento. E, uma vez criadas tais condições, o cumprimento das decisões públicas vai se fazer de forma natural e não coercitiva.

(…)

A maior vantagem revelar-se-á quando a Administração assumir o dever de realizar a prestação menos onerosa e o particular se obrigar a realizar a melhor e mais completa prestação. [5]

(grifos nossos)

O ponto nevrálgico da questão reside no paradigma da relação público-privada nas contratações de serviços. Parte-se, atualmente, da premissa da ilicitude, do descumprimento contratual, da obtenção de vantagens não devidas. Por este motivo, o Compliance adquiriu feições inquisitórias, de verdadeira “caça às bruxas”, colocando o ente privado na berlinda das relações interpartes.

Há que se compreender que o Compliance é gênero, ou seja, abarca todas as ações de prevenção, detecção e resposta a violações de conformidade, bem como a promoção de uma cultura ética e de conformidade dentro da organização, além de incluir outros aspectos, como, por exemplo, a prevenção de corrupção e de fraudes.

A gestão de conformidade, por sua vez, é espécie, se limitando a harmonizar a relação corporativa aos princípios estabelecidos. Dessa forma, sendo bem realizada esta etapa, não existirá risco à integridade, tampouco necessidades sancionatórias, uma vez que a relação estará regida pelas boas práticas contratuais e comerciais.

Os papeis do Estado e dos particulares nas relações sinalagmáticas, são objeto de consideração não só entre as partes, mas, ainda, ao fim e ao cabo dos legisladores, como pode ser observado em diversos projetos de lei sobre o assunto. Sublinhando o PL 46/2022[6], que institui uma lei de defesa do empreendedor, com normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício da atividade econômica, podem ser extraídos excertos apropriados ao tema, como se nota:

Artigo 3º- São princípios que norteiam o disposto nesta Lei:

(…)

II – a presunção de boa-fé do empreendedor perante o poder público;

(…)

Artigo 4º- São deveres da Administração Pública nas três esferas de Poder, Federal, Estadual e Municipal para garantia da livre iniciativa:

(…)

XI – exercer a fiscalização punitiva somente após o descumprimento da fiscalização orientadora, qualquer que seja o órgão fiscalizador, salvo no caso de situações de iminente dano público, dolo, má-fé e em situações devidamente fundamentadas pela Administração Pública;

(…)

Artigo 5º- São direitos dos empreendedores:

I – ter o Poder Público como um facilitador da atividade econômica;

Há que se observar a busca por um ambiente colaborativo entre contratante e contratado, pautado no princípio da boa-fé, e fundamentada nos objetivos comuns de obtenção da melhor prestação de serviços para a Administração Pública.

É preciso ficar atento para que novas exigências visando ao alcance da integridade não se tornem mero formalismo, a ser cumprido pelos entes privados somente para se desincumbir da obrigação. Uma das causas para isso, segundo Fernanda Schramm, se deve ao fato de que “a ampla discricionariedade dos agentes públicos no curso da execução dos contratos, aliada à falta de penalização efetiva nos casos de inadimplemento do Poder Público, contribui para consolidar uma sistemática em que os contratados acabam muitas vezes cedendo, inclusive por falta de opção, às exigências que lhe são impostas[7].

Para Thiago Marrara, “falar de integridade estatal é essencial, na medida em que, pelo exemplo ético, a conduta do Estado pode influenciar os agentes econômicos a se moverem em direção a boas práticas[8]. Na mesma linha, porém em sentido inverso, Flávio Cabral define o conceito de ativismo de contas para os Tribunais de Contas, porém o conceito deve ser ampliado para todo agente público, como pode se perceber:

Ativismo de contas pode ser conceituado como o comportamento dos Tribunais de Contas que, a pretexto de se mostrarem proativos ou de serem encarados como concretizadores de direitos fundamentais ou controladores de políticas públicas, acabam por exercer suas atribuições em desconformidade com o que permite o texto constitucional e infraconstitucional, demonstrando a subjetividade na tomada de decisões por seus membros. [9]

Como consequência, é possível observar, especialmente no âmbito federal, o crescente número de processos de apuração de responsabilidade instaurados pela Administração, tornando desequilibrada a relação público-privada, em prejuízo, evidentemente, do elo mais fraco, ou seja, os entes privados.

Mesmo em relações firmadas entre particulares reguladas pelo Estado como, por exemplo, na área concorrencial, é possível observar uma contundente interferência estatal na dinâmica de mercado. Nessa perspectiva, importam as práticas adotadas nas relações comerciais estabelecidas com outras entidades privadas, mas que devem, por força de lei, serem submetidas à regulação estatal. Entende-se que é necessário existir uma visada aos interesses públicos por parte do agente regulador, mas a força regulatória deve ser extremamente bem dimensionada, de forma a não impactar negativamente nas relações comerciais de particulares.

Por fim, entende-se necessária uma mudança paradigmática, privilegiando, nas relações comerciais, a primazia da boa-fé entre as partes e garantindo segurança jurídica, de maneira que, primeiramente, possa se executar a gestão de conformidade contratual. Caso observado riscos ou ações comprometedoras à integridade da relação, deve se migrar para o Compliance na concepção de averiguação de atividades ilícitas, respeitando-se o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, ensejando, inclusive, se necessário, atitudes sancionatórias para o inadimplente, seja público ou privado.


[1] ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad.: Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. ps. 80-84.

[2] COELHO, Inocêncio Mártires. A hermenêutica constitucional como teoria do conhecimento do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2019. p. 41.

[3] PFAFFENZELLER, Bruna. No rastro da corrupção praticada por pessoas jurídicas: da lei 12.846/2013 ao projeto de novo código penal. In: VITORELLI, Edilson (Org.). Temas atuais do Ministério Público Federal. Salvador: Juspodivm, 2015. p. 897.

[4] GONÇALVES, Benedito; GRILO, Renato Cesar Guedes. A utilização dos instrumentos de compliance para a realização do princípio da moralidade administrativa. In: DAL POZZO, Augusto Neves; MARTINS, Ricardo Marcondes (Coord.). Compliance no direito administrativo. São Paulo: Thomson Reuters, 2020. ps. 41-53.

[5] OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende; ACOCELLA, Jéssica. A exigência de compliance e programa de integridade nas contratações públicas: os estados-membros na vanguarda. In: DAL POZZO, Augusto Neves; MARTINS, Ricardo Marcondes (Coord.). Compliance no direito administrativo. São Paulo: Thomson Reuters, 2020. p. 133.

[6] Disponível em https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2313835. Consultado em 24.04.2023.

[7] SCHRAMM, Fernanda Santos. Compliance nas contratações públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2019. p. 76.

[8] MARRARA, Thiago. Quem precisa de programas de integridade (Compliance)? In: CUEVA, Ricardo Villas Bôas; FRAZÃO, Ana (Coord.). Compliance: perspectivas e desafios dos programas de conformidade. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 293.

[9] CABRAL, Flávio Garcia. O ativismo de contas no Tribunal de Contas da União – TCU. Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Programa de Pós-Graduação em Direito, Curitiba/PR, 2019. p. 95.