Editorial
O evento das joias sauditas é um exemplo de como o público deve ser tratado como público e o privado como privado. Não é preciso citar os nomes dos envolvidos, pois a confusão entre público e privado é, infelizmente, uma rotina no dia a dia da Terra de Santa Cruz.
Quem fez ou é acusado de ter feito tem pouca importância e se não tem é porque há algo de errado e é ai que está o cerne do problema. O tratamento diferenciado a indivíduos por qualquer que seja a razão fere de morte o que diz o art. 5º da Constituição Federal de 1988 que [t]odos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade….
A celeuma em torno das joias sauditas tem razão de ser. O ex mandatário, assim como eu, você, o médico, o advogado etc é um cidadão que possui CPF como qualquer outro e, como tal, está sujeito a todos os regramentos da lei como cidadão e, enquanto servidor público, está sujeito ao que prevê a legislação específica, ou seja, o presente deve ter caráter personalíssimo[1] e seu valor ser aferido por critérios objetivos previstos em lei.
Mas o que é pior nisso tudo? É a leitura equivocada de caráter personalíssimo do presente ou é a “leitura” equivocada da separação entre público e privado?
Bom, não estamos aqui para adentrar no direito personalíssimo, principalmente porque o valor dos “regalos” é por demais grandioso, o que por si só já justifica a polêmica. No entanto, não podemos deixar de ressaltar que, no regime presidencialista, o Presidente da República, além de ser o chefe de governo, é também o chefe de Estado e, como tal, a sua atuação nas relações internacionais não é sua, mas sim da nação que lhe outorgou o poder da representação nas urnas.
Missão oficial é missão oficial!!! Quem está a serviço é o Estado brasileiro e não o cidadão!!! Não é por outro motivo que os representantes das nações mundo afora ingressam nos países em missão oficial com o passaporte oficial.
Neste sentido, conforme dito anteriormente, qualquer “regalo” que não seja de caráter personalíssimo e que não atenda os critérios objetivos do valor patrimonial do presente é um presente para o Estado brasileiro e não para o CPF do mandatário.
O que estamos a verificar com o caso das joias sauditas é muito mais do que o pagar imposto pelo bem, é simplesmente se apropriar da representação PÚBLICA para obter benefícios PRIVADOS, ou, de uma maneira já conhecida por todos nós, não se pode fazer na vida pública o que se faz na privada!!!
[1] De acordo com Romano (2019), o [d]ireito personalíssimo é aquele direito que, relativo à pessoa de modo intransferível, só por ela pode ser exercido.
ROMANO, Rogério Tadeu. Direitos Personalíssimos. Disponível em: DIREITOS PERSONALÍSSIMOS – Jus.com.br | Jus Navigandi. Acesso em: 18 de março de 2023.