Os perigos das propostas que estão na mesa.

Editorial

Nas últimas duas semanas foi aventada a proposta de transformar o aeroporto do Galeão em um hub doméstico, de maneira a resgatar por conexões domésticas o mercado internacional de outrora, atualmente deslocado para o aeroporto internacional de Guarulhos.

A transformação de um aeroporto internacional em hub doméstico é o caminho para o resgate da vocação do aeroporto do Galeão. Como fazer esta transformação?

Nos últimos dias, pelo menos duas propostas têm sido aventadas pelos gestores do Estado e do Município do Rio de Janeiro: limitar o número anual de passageiros no aeroporto Santos Dumont e adotar uma estratégia multiaeroportos.

Na primeira proposta, a estratégia seria unilateral, acreditando-se que o excedente de passageiros gerados pela restrição migraria inexoravelmente para o Galeão e, na segunda proposta, a estratégia seria coordenada e os dois aeroportos fariam a alocação dos voos domésticos segundo um critério de benevolência entre dois administradores, de um lado, a Infraero (empresa estatal) e, de outro, a empresa privada detentora da concessão do aeroporto.

Com relação a primeira proposta, alega-se que o aeroporto de Santos Dumont opera acima da sua capacidade e que o seu número anual ótimo de passageiros seria de 6 milhões e não os quase 11 milhões de passageiros que utilizaram o terminal no ano de 2022. A crença da proposta é a de que estes mais de 4 milhões se deslocariam para o aeroporto internacional Antônio Carlos Jobim. Será?

Bom, este é o primeiro perigo de se impor uma restrição em algo que está funcionado pelas leis de mercado. E se as empresas aéreas acharem mais interessante fazerem as suas conexões em outros aeroportos que não o Galeão? É preciso lembrar que o mercado é otimizador por excelência e ele não vai fazer operação ineficiente simplesmente porque dois gestores assim desejam. O desarranjo de mercado é uma consequência possível dessa atitude!!

Vamos a segunda proposta: coordenar os aeroportos de Santos Dumont e Galeão para distribuir os voos domésticos segundo algum critério de benevolência, seja lá o que significa esta bondade.

Veja, o equilíbrio ótimo para esta solução exige muito mais do que “vontade”, é preciso haver incentivos gerados pelo próprio mercado e não incentivos exógenos ao sistema, como é o caso de imposição de restrições estatais ou coisa que o valha, a menos que se queira transformar a gestão dos dois aeroportos em uma espécie de “ditadura benevolente”, em que o Estado seria novamente o prestador de serviços e a concessão do aeroporto do Galeão deixaria de existir. Será que é isso que está nas entrelinhas? Podemos pensar em uma política orquestrada pela Infraero para atrair os voos domésticos para o Santos Dumont, visando retomar o controle do Galeão?

Pois é!! Haja criatividade!! Já falamos neste espaço que o problema do aeroporto do Galeão é resultado da crise da economia do Rio de Janeiro, da violência nas vias que ligam o aeroporto Galeão as demais localidades do Rio de Janeiro e o fato de que a vocação de internacional do aeroporto a muito se perdeu para o seu concorrente direto, o aeroporto internacional de Guarulhos, em razão de não ter uma rede doméstica de conexões.

Se não tivermos juízo e se não entendermos que a solução do aeroporto do Galeão passa por um conjunto de medidas para além do mercado de transporte aéreo, o soneto com certeza ficará pior que a emenda. Restringir voos em um aeroporto para deslocar demanda para outro é um risco nada desprezível e coordenar os aeroportos é retirar do mercado o principal elemento de eficiência, a concorrência.

As propostas de intervenção no domínio econômico no mercado de aeroportos que estão na mesa são demasiadamente perigosas!

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