Editorial
Com uma dívida de mais de R$ 40 bilhões junto aos credores, as exigências para implementar a recuperação judicial do grupo passa pela venda de importantes empresas do grupo comandado por Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles. O primeiro plano de restruturação apresentado prevê a alienação de alguns ativos com posição relevante nos seus respectivos mercados, dentre os quais pode-se destacar a rede Hortifruti Natura da Terra (Hortifruti).
O Hortifruti é uma rede de comércio atacadista de frutas, verduras, raízes, tubérculos, hortaliças e legumes frescos, que atua predominantemente no estado do Rio de Janeiro (57 lojas)[1], muito embora também possua lojas nos estados do Espírito Santo, São Paulo e Minas Gerais. Foi adquirido pelas Americanas S/A em setembro de 2021 [2] por meio da aprovação pelo CADE do ato de concentração 08700.004481/2021-80[3][4] em sede de rito sumário.
Conquanto a operação tenha sido aprovada sem dor, importante alerta foi dado pela manifestação da então Conselheira Paula Farani no Despacho de avocação, chamando a atenção para o fato de que a autoridade de defesa da concorrência brasileira deveria aproveitar este caso para se debruçar sobre os setores envolvidos e refinar a jurisprudência sobre varejo online, ecossistemas digitais, plataformas de marketplace e concentrações conglomeradas.
O mencionado alerta teve por base a posição de liderança que o grupo Americanas S/A (empresa BW2 Digital) apresentava no mercado de varejo online e do argumento de que essa posição de liderança poderia gerar incentivos para fechamento de mercado e de discriminação onde as lojas do Hortifruti atuavam com posição dominante.
Embora o alerta trazido pela Conselheira tenha sido rechaçado pelo Plenário do CADE na ocasião, o fato é que argumentos importantes expostos no documento terão agora que ser enfrentados, principalmente porque há uma grande probabilidade de que os interessados pelos ativos do Hortifruti sejam outras varejistas com participação relevante no e-commerce.
As coisas começam a se desenhar para o deslinde do caso Americanas S/A e a “joia da coroa” não está nos tomates e nas batatas vendidas, mas sim na relação existente entre a expertise do comércio varejista de alimentos desenvolvida pelo Hortifruti e os ecossistemas digitais, plataformas de marketplace e concentrações conglomeradas.
[1] HF LP | Nossas Lojas – Hortifruti
[2] A Superintendência-Geral do CADE identificou sobreposição horizontal no mercado de (supermercados, hipermercados, etc) e integração vertical nos mercados de Atividades da Hortifruti no segmento de varejo de autosserviço (supermercados, hipermercados e atacarejos), e atividades do Grupo LASA no segmento de serviços de entrega de pedidos de mercado (aplicativos); e Atividades da LASA em soluções de pagamentos, e atividades da Hortifruti como varejista de autosserviço.
[3] :: SEI – Pesquisa Processual :: (cade.gov.br)
[4] Apesar de ter sido aprovado sem restrições pelo CADE, o caso foi avocado pela Conselheira Paula Farani por meio do DESPACHO DECISÓRIO Nº 12/2021/GAB4/CADE (SEI/CADE – 0966743 – Despacho Decisório).