Adriana da Costa Fernandes

O Brasil arde em mais de 60% de seu território.

Não se sabe, ao certo, o motivo de tamanha inclemência desse fogo.
Em especial quando, quimicamente, é conhecido que as chamas são produzidas a partir de um determinado ponto da reação, de combustão, chamado de “ponto de ignição”. Mas que apesar das secas vivenciadas, em várias partes do território, especialistas já indicaram que esta reação não se dá automaticamente.

A emergência climática vivenciada se tornou latente, em muito pouco tempo.
O relógio global tocou e a natureza grita um impositivo “Chega, homem!”.

Não somente o Brasil, mas diversas partes do Mundo vivenciam severos dramas inerentes a este quadro, neglicenciado minimamente desde as ações pactuadas desde na ECO 1992, no Rio de Janeiro até as demais conferências posteriores das ONU sobre o tema.
Os alarmes soam cada vez mais graves, até mesmo pelo desiludido não atendimento se quem luta, ao definido no Acordo de Paris e no Protocolo de Kyoto e da pouquíssima efetivade dos governos mundiais sobre a matéria.

2024 chegou apresentando a alta conta ao homem.

A começar pela forte inundação dos Estados do Sul do País, onde passado o maior impacto, ao menos para quem se encontra fora dos Estados, o que restará à maioria será uma gradual e lenta recuperação de vida e história.
Logo a seguir, sobreveio a inclemente seca nacional, registrando ausências de chuva em torno de 150 (cento e cinquenta) dias e impingindo aos territórios lidar com os consequentes incêndios de grandes proporções nas Regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste, seja por uma causa raramente natural, seja, principalmente, pela ação descarada da mão criminosa de quem não se preocupa e não entende do que, de fato faz.

Lavouras, plantações expressivas como as de cana-de-açúcar, café e o gado vêm sendo fortemente afetados.
Um cenário que, ao certo, logo ali à frente causará um novo forte impacto na economia nacional, afetando severamente, até mesmo, o custo de vida dos brasileiros. O PIB nacional e as exportações inquestionavelmente serão influenciados e a taxa básica de juros será novamente elevada em alguns dias.

Mas o Brasil segue inconsciente vivendo imerso na forte polarização política contínua, cada vez mais arraigada em uma parcela da população que parece encontrar em si alguma justificativa para seus atos eivados de insanidade, sem considerar o que quer que esteja sendo tentado e efetivado pelas Instituições em prol da melhoraria da qualidade da vida urbana e rural da sociedade nacional nos últimos anos.

Do que se fala é, acima de tudo, de mitologia sim, mas de uma que se sustenta pela absoluta desinformação, acarretando o agravamento frontal da emergência climática não somente no país, mas no globo.
Sem compreender, na base, que tudo ao redor é um ecossistema cada vez mais interligado.
Esta crueldade e a insanidade causam a extinção de vidas humanas, animais e até vegetais. Enfim, da vida essencial e orquestrada pelo divino que dicotômicamente se defende e cultua.

Tudo ocasionado por pseudas utopias estreitas e por crenças desvinculasas da efetiva realidade.
A maldade, a ganância e a falta de cultura limpam campos por meio de altas chamas, mas, em muitos casos, apenas agindo por agir, por ordem, de forma coordenada, sem dimensão exata das consequências ou quiçá, sem nem se preocupar com isto realmente.

Caos instalado.

Mas quem é esse que vive hoje ao seu lado?
Em que ele acredita e como age?
Quais as razões reais conjugadas para a adoção de ações tão irresponsáveis identificadas e mapeadas?
Limpeza de territórios para quê atividade posterior exatamente?
Quais são as áreas que se beneficiarão futuramente com os biomas altamente degenerados, completamente devastados e em demorado processo de recuperação e até passíveis a não recuperação efetiva?

A cena: uma caixa de fósforo, um pedaço de estopa ou um trapo qualquer, galões de álcool e muita má fé ardendo dentro de nacionais, que carregam em si a visão estreita de que o futuro ainda se encontra na próxima curva. Grave ilusão.
E não parecendo compreender nada, de fato, acerca de posturas básicas interentes a conceitos tão relevantes como soberania, justiça, segurança e democracia.

No meio da devastação dos incêndios, a Amazônia já conta com mais de 460 mil pessoas vivendo com extrema dificuldade. A capital da República e diversos Estados como Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro também lidam com os fortes estragos.

Mais da metade das Unidades de Conservação, fundamentais para a conversão da biodeversidade mais pura, já se encontra atingida, indicando um aumento de 173% (cento e setenta e três por cento) de ocorrências em relação ao ano passado.

Pará, Tocantins, Mato Grosso do Sul divisa com Paraná, Bahia, Brasília e tantos outros pontos de riqueza absoluta, incomensurável, de um país continente, maculados sem que ainda se tenha a dimensão do tamanho dos efeitos e do prazo e possibilidade de recuperação.
O raríssimo Araguaia, bioma único e unificador de outros como Amazônia, Cerrado e Pantanal, tendo sido altamente afetado.
O Pantanal praticamente se foi, onde espécies nativas sofreram carbonizadas e já se fala da possibilidade de não reversão.

Pessoas morrem lutando em diversas áreas, por casas, bens e comunidades. Idosos e crianças são muito afetados em sua saúde.
Se tornou difícil dormir e agressivo viver mediante a ampliação da ansiedade e da depressão coletivas.

Outras partes do mundo simultaneamente sofrem, e não somente o Brasil vivencia os impactos da inconsciência, seja decisória prévia, seja no relativo às ações individuais e atitudes coordenadas criminosas e irresponsáveis.
Da mesma forma, países da Europa e os Estados Unidos, vem lidando com os impactos causados pelo homem.
Portugal, em sua região central, especialmente em Aveiro, padaece e grita por apoio do resto da União Européia. Itália, Espanha e Grécia já enviaram socorro aéreo.

Igualmente nos Estados Unidos, especialmente, a California, que já aprendeu com episódios devastadores anteriores, já vem utilizando satélites, drones e a inteligência artificial, de forma conjugada, para uma atuação imediata e com vistas à minimização de seus impactos.

Em outra linha, a Europa Central sofre com uma das maiores tempestades e enchentes em 27 anos, inundando cidades da Hungria, República Tcheca, Polônia e se deslocando para a Itália, deixando rastros de inúmeros desabrigados e vários mortos.

A urgência se instalou, ao largo e claramente. 
A emergência climática idem.
E o mundo caminha para a configuração de um inquestionável Estado de Exceção climático de grandes proporções, onde os países unidos ou por meio dos blocos de nações, precisarão, de forma inconteste, abrir mão de uma parcela fundamental da sua soberania, na tentativa de agir com pragmática agilidade e eficácia.

Carl Schmidtt afirmava em sua obra Teologia Política que pouco importa, do ponto de vista teórico ou prático, se o que se estabelece como a  definição de soberania é aceito ou não, até mesmo por definí-la como o poder supremo e original de comandar.
Schmidtt compreende que, na história da soberania, não há disputa sobre um conceito como tal. O que há é, em verdade, uma controvérsia sobre a sua aplicação, sobre quem efetivamente deve decidir em caso de conflito, bem como, qual é o interesse a ser tutelado, em ordem pública pública ou estatal, a segurança e a ordem pública, a saúde pública, etc.
Defende que o caso excepcional, que não está previsto no ordenamento jurídico vigente, pode, no máximo, ser classificado como caso de extrema necessidade, de perigo à existência do Estado ou de outra forma análoga, mas não pode ser delimitado com rigor. Daí ele parte apresentando suas conclusões e justificaticas sobre o motivo, que aponta logo nas primeiras linhas, de que que soberno é quem realmente decide acerca do Estado de Exceção, ainda que seja o povo.

Mas a resposta mais clara, talvez, acerca do Estado de Exceção que se vivenciará globalmente em breve, se nada for efetivamente feito, está presente no entendimento de Giorgio Agamben, ao dispor que falta uma teoria do estado de exceção no direito público, e que tanto juristas quanto especialistas em direito público parecem considerar o problema muito mais como uma questão de fato do que como um genuíno problema jurídico.

Vamos todos acordar guando?

Portanto, uma vez que os governos do mundo todo vem sendo demandados acerca da adoção de posicionamentos mais ágeis e efetivos, e que a parcela afetada da população com os episódios climáticos já segue endereçando aos orgãos jurisdicionados suas demandas, será, de fato, em muito pouco tempo, a hora de serem definidas políticas e leis comuns às nações, envolvendo tribunais multifacetados, correlacionados, que seja a novos tribunal de ordem constitucional mundial ou de blocos, mas focados na matéria.

Do que se fala, portanto, são dos Direitos Humanos e Sociais Climáticos, talvez até mesmo da ampliação de escopo dos tribunais internacionais de direitos humanos já existentes, enquanto solução, ao menos, a priori, para a problemática legal em agravamento que também se inicia.

O fato é que se trata da hora de agir, de forma urgente e integrada, em prol do futuro deste globinho ainda azul e de cada um de seus destinos cidadãos.


Adriana da Costa Fernandes. Advogada com atuação em 3 eixos: Direito Público; Infraestrutura e Tecnologia (em especial Telecom, TI, Digital, Energia Elétrica e Ferrovias) e Cível Estratégico (foco em Consumidor e Contratos). Mestranda em Direito Constitucional pela UNINTER PR sob a tutela da Profa. Dra. Estefânia Barboza e com tese sobre PRAGMATISMO CONSTISTUCIONAL HUMANISTA na Era Digital, unindo Direito Constitucional, Digital, Filosofia e Ciência Política. Pesquisadora vinculada ao NEC CEUB DF sob a mentoria da Profa. Dra. Christine Peter da Silva e ao IDP – Observatório Constitucional do Professor André Rufino do Vale. Aluna da Escola de Magistratura do Distrito Federal – ESMA DF. Pós-graduada (MBA) em Marketing pela FGV RJ, especializada em Relações Governamentais e Institucionais (RELGOV) pela CNI / Instituto Euvaldo Lodi (IEL), com Extensão em Energia Elétrica pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e detentora de diversas titulações em instituições de renome Nacional e Internacional. Consultora e Parecerista. Com experiência em empresas renomadas, de portes expressivos e atuação em mercados relevantes e agências governamentais. Atualmente com escritório próprio e atuação voltada para Tribunais Superiores, Tribunal de Contas da União e CARF.


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