Leandro Oliveira Leite

O Relatório de Economia Bancária (REB)[1] trouxe uma série de pontos cruciais que refletem o desempenho e a evolução do Sistema Financeiro Nacional (SFN) ao longo do ano. Os principais destaques abordam a maior concorrência, a desaceleração do crescimento do crédito, a evolução da portabilidade, as inovações no setor financeiro e a incorporação do risco climático na análise do SFN.

O REB, publicação anual do Banco Central (BC), analisa diversos aspectos do SFN e as relações entre instituições financeiras e seus clientes. A última edição do REB, publicado em 06 de junho de 2024, vem adotando uma forma de comunicação mais moderna e direta, resumindo o conteúdo principal de cada parágrafo nas primeiras frases, seguido de detalhes subsequentes.

O relatório é composto por cinco capítulos principais, além de boxes temáticos que abordam questões específicas do SFN. Veja os principais capítulos abordados no REB neste ano:

  • Concorrência no SFN: Evolução dos indicadores de concentração e concorrência no SFN, inovações no setor e a atuação do Banco Central para fomentar um ambiente financeiro mais competitivo e inovador.
  • Evolução do Crédito no SFN: Análise do comportamento dos agregados de crédito, características das operações e dos tomadores, portabilidade de crédito e crédito para financiamento de importação e exportação.
  • Captações do Sistema Financeiro: Exame da composição e evolução das captações do sistema financeiro, detalhando os diferentes instrumentos e seus desempenhos ao longo do ano.
  • ICC e Spread: Decomposição do Índice de Custo de Crédito (ICC) e seu spread, analisando fatores como custo de captação, inadimplência, despesas administrativas, tributos e Fundo Garantidor de Créditos (FGC), além da margem financeira.
  • Rentabilidade das Instituições Financeiras: Análise da rentabilidade das instituições financeiras, abordando a performance financeira e os desafios enfrentados no ano.

Em 2023, observou-se uma desaceleração no crescimento do crédito no Sistema Financeiro Nacional, em grande parte devido à política monetária restritiva adotada pelo Banco Central. Esse contexto desafiador foi agravado pelo aumento da inadimplência, refletindo um ambiente econômico mais difícil para tomadores de crédito. O relatório detalha como essas condições impactaram os diferentes tipos de crédito, desde o crédito para consumo até o crédito para empresas, e analisa as características dos tomadores de crédito nesse período.

A evolução da portabilidade de crédito foi outro ponto de destaque. Essa funcionalidade permite aos consumidores transferirem suas dívidas entre instituições financeiras em busca de melhores condições, como taxas de juros mais baixas ou prazos mais vantajosos. O relatório sublinha o crescimento significativo dessa prática, que se tornou uma ferramenta importante para aumentar a competitividade no mercado de crédito, beneficiando os consumidores e incentivando as instituições financeiras a oferecerem condições mais atrativas.

O Banco Central do Brasil tem promovido várias inovações no setor financeiro, buscando modernizar e otimizar as operações financeiras no país. Entre as iniciativas destacadas no REB, estão o projeto Drex e as “Finanças Programáveis”.

  • Projeto Drex: Visa a modernização do sistema financeiro por meio de novas tecnologias, como o uso de blockchain e contratos inteligentes, que prometem tornar as transações mais seguras, rápidas e transparentes.
  • Finanças Programáveis: Envolvem a automatização de processos financeiros, permitindo a criação de produtos financeiros mais personalizados e eficientes. Essas inovações têm o potencial de transformar profundamente a forma como os serviços financeiros são oferecidos e consumidos no Brasil.

Já os boxes temáticos do Relatório são seções especiais dedicadas a estudos e pesquisas específicas sobre diversos aspectos do SFN. Esses boxes oferecem uma análise detalhada de temas emergentes e relevantes, proporcionando uma compreensão mais profunda das dinâmicas e dos desafios enfrentados pelo setor financeiro. A seguir, destacam-se alguns dos principais boxes temáticos abordados.

O primeiro dos boxes temáticos do REB examina a eficiência do sistema financeiro brasileiro. Esse estudo avalia a performance das instituições financeiras em termos de custos operacionais, produtividade e qualidade dos serviços oferecidos. O objetivo é identificar áreas onde há potencial para melhorias, bem como reconhecer as melhores práticas que podem ser replicadas para aumentar a eficiência do sistema como um todo. A análise inclui comparações internacionais, proporcionando um contexto mais amplo para entender como o Brasil se posiciona em relação a outros mercados.

A concentração nos mercados de cartões de pagamento é outro tema explorado em um dos boxes do REB. Esse estudo avalia a estrutura do mercado de cartões de crédito e débito no Brasil, avaliando o grau de concentração e suas implicações para a concorrência e os consumidores. O relatório examina as barreiras à entrada para novos competidores e as estratégias das instituições financeiras estabelecidas para manter sua participação de mercado. As conclusões destacam a necessidade de políticas que incentivem a concorrência e reduzam os custos para os consumidores.

Outro boxe temático relevante trata dos custos das remessas internacionais. As transferências de dinheiro entre países são cruciais para muitas famílias e pequenos negócios, especialmente aqueles que dependem de remessas enviadas por trabalhadores no exterior. O relatório analisa os custos associados a essas transferências, destacando as iniciativas que têm sido implementadas para reduzir essas despesas e tornar as remessas mais acessíveis e eficientes.

A expansão dos serviços financeiros é um tópico crucial abordado em um dos boxes temáticos. Este estudo foca na inclusão financeira e nas estratégias para ampliar o acesso aos serviços bancários e financeiros em regiões menos atendidas. O relatório analisa iniciativas como a digitalização dos serviços financeiros, a expansão das cooperativas de crédito e o papel das fintechs na promoção de um maior acesso ao crédito e a outros serviços financeiros. Essas iniciativas são fundamentais para promover a inclusão financeira e garantir que mais brasileiros tenham acesso às ferramentas necessárias para melhorar sua condição econômica.

Os programas educação financeira, também boxe temático, é vital para capacitar os consumidores a tomar decisões informadas sobre suas finanças pessoais. O relatório avalia a eficácia dos programas existentes, destacando as melhores práticas e identificando áreas onde há necessidade de aprimoramento. Os resultados mostram que uma maior educação financeira está correlacionada com uma melhor gestão do crédito e maior resiliência financeira, sublinhando a importância de continuar a investir nesses programas.

Finalmente, um dos mais inovadores, aborda o risco climático e sua relação com o Sistema Financeiro Nacional. Este estudo propõe a introdução de indicadores para avaliar e mitigar os impactos ambientais no setor financeiro. O relatório discute como as mudanças climáticas podem afetar a estabilidade financeira e a importância de integrar considerações ambientais na gestão de riscos das instituições financeiras. A proposta é que o SFN adote práticas sustentáveis e se prepare para os desafios futuros impostos pelas mudanças climáticas.

Ressalta-se que as impressões do mercado financeiro em relação ao REB foram, em geral, positivas e otimistas. Vários pontos específicos foram destacados pelos analistas e participantes do mercado:

  1. Aumento da Concorrência no Mercado de Crédito: O mercado financeiro viu com bons olhos o aumento da concorrência no mercado de crédito, especialmente nos segmentos bancário e cooperativo. O Indicador de Lerner, utilizado para medir a concorrência, mostrou uma redução significativa, indicando um aumento na competitividade. Este aumento foi atribuído ao maior custo marginal em relação ao aumento dos preços, refletindo uma pressão competitiva saudável.
  2. Estabilidade na Concorrência de Serviços Financeiros: A concorrência no mercado de serviços financeiros permaneceu relativamente estável. O indicador de Lerner para os serviços financeiros do segmento bancário manteve-se em níveis semelhantes desde a pandemia, com pequenas oscilações, o que foi interpretado como um sinal de estabilidade e maturidade do mercado.
  3. Redução da Concentração no SFN: A redução do nível de concentração no Sistema Financeiro Nacional (SFN) foi destacada como um avanço significativo. A diminuição da concentração ocorreu em vários agregados contábeis, incluindo ativos totais, depósitos totais e operações de crédito. Esta redução foi vista como um reflexo positivo das iniciativas do BCB para aumentar a diversidade e a competitividade no setor financeiro.
  4. Inovações Financeiras: As inovações financeiras e a atuação proativa do BCB foram amplamente elogiadas. Resoluções como a BCB 308[2], que disciplina o registro e o depósito centralizado de recebíveis imobiliários, foram vistas como medidas que conferem maior segurança às operações de financiamento, beneficiando especialmente construtores e incorporadores de menor porte.
  5. Desafios Contínuos: Apesar dos avanços, o mercado também reconhece os desafios contínuos na implementação de políticas que promovam uma concorrência ainda maior e a necessidade de adaptação às novas regulações. As expectativas são de que o BCB continue a atuar de maneira eficaz para manter a estabilidade e incentivar a inovação no sistema financeiro.

Assim, o REB joga luz a um cenário de crescente concorrência no mercado de crédito e uma estabilização na concorrência de serviços financeiros, com uma redução geral da concentração no SFN. As ações do Banco Central têm sido fundamentais para promover um ambiente financeiro mais competitivo e seguro, refletindo sua dedicação em melhorar a eficiência e a equidade no mercado financeiro brasileiro.

Em suma, o Relatório de Economia Bancária – REB foi recebido como um relatório que sinaliza avanços importantes na regulação e na promoção da concorrência, com medidas que contribuem para um ambiente financeiro mais competitivo e seguro.


[1] https://www.bcb.gov.br/publicacoes/relatorioeconomiabancaria

[2] https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/exibenormativo?tipo=Resolu%C3%A7%C3%A3o%20BCB&numero=308


LEANDRO OLIVEIRA LEITE. Servidor público federal, analista do Banco Central do Brasil (BCB), atualmente trabalhando no CADE na área de condutas unilaterais, possui graduações em Administração, Segurança Pública e Gestão do Agronegócio e especialização em Contabilidade Pública. Tem experiência na parte de supervisão do sistema financeiro e cooperativismo pelo BCB, bem como, já atuou com assessor técnico na Casa Civil.


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