Linguagem é ação: tenhamos calma com o ChatGPT

Adriana da Costa Fernandes

“Scrivimi, quando il vento avrà spogliato gli alberi

Gli Altri sono andati al cinema, ma tu vuoi restare sola

Poca voglia di parlare allora scrivimi

Servirá a sentirti meno fragile, quando nella gente troverai

Solamente indifferenza, tu non ti dimenticare mai di me

E se non avrai da dire niente di particolare

Non ti devi preoccupare, io saprò capire (…)”

Tu Scrivimi

Scrivimi

Renato Russo

Com o raiar da 4ª Revolução Digital às portas do Mundo Contemporâneo Global, não importando aqui o grau exato por Nação, para efeitos do que vamos abordar, é perceptível que o Direito passou a andar de mãos atadas com as demais Ciências Sociais e a sentir ainda mais frontalmente seus efeitos.

Esse fato se observa em razão do impacto massivo da computação e da inteligência artificial em todos os ramos da vida, ao se cruzar, de forma matricial, cotidianamente todos os ramos e ciências através dos efeitos algorítmicos, não havendo mais como negar a interferência dos efeitos da Psicologia, da Sociologia, da Antropologia e da Filosofia, por exemplo, nas decisões judiciais emanadas.

Isto significa que o efeito esperado da computação, ainda que não pareça a olhos leigos, está sendo atingido. O homem vem voltando a si mesmo, à sua essência, mesmo que seja longo o percurso. Esse foi e é o objetivo. Que a tecnologia propicie ao homem mais tempo, mais agilidade, mais coerência, mais questionamento, mais competência e mais especialização em alguns campos. Ainda que em alguns destes aspectos haja muito trabalho a ser feito.

Ocorre, que justamente com a chegada de IA na “ponta da lança” das transformações tecnológicas, resta claro que não há mais como se prescindir da Linguística e de maior efetividade na Comunicação Humana em tudo o que se pretende, especialmente no Direito.

Uma situação seria por meio da adoção de Teorias Linguísticas, como a de Implicaturas Conversacionais aliada aos melhores conceitos Jurídicos, como os Hermenêuticos, devidamente programados via Machine Learning, adaptando-os ao caso segundo uma estrutura seletiva com vistas à aplicação em situações mais fáceis ou difíceis, e ajustando-se a isto ao perfil de equipe, de acordo com a experiência e trajetória individual.

O melhor dos mundos para os adeptos de Kant, segundo quem, a mente não pode conhecer o que está fora do tempo e do espaço, senão dentro da experiência.

Francamente, meu olhar é outro, mas que assim ora seja.

Do que aqui abordo e considero hoje é acerca da Linguística no Direito.

E neste artigo, considero fundamental destacar como os Operadores do Direito estão redigindo, bem como alertar a urgência na elaboração de um novo estudo da qualidade das decisões judiciais, tanto em estrutura, quanto em eficácia e compreensão social dos julgados.

Assim, delegar ao ChatGPT a grande saída para questões de sobrecarga ou despreparo de equipe é tecnologicamente naif, tanto quanto imaginar andar de bicicleta sem sequer saber andar. Além de irresponsável diante das funções essenciais da Justiça.

É essencial que se compreenda em definitivo que quem maneja a tecnologia é o homem, e não ao contrário, por mais que alguns imaginem que isto possa ser revertido no futuro.

A inteligência humana é ampla e desconhecida, capaz do inimaginável, portanto, cabe a este novo homem que surge, diante do volume exponencial de informações provenientes da Revolução Digital, utilizá-la sabiamente.

Já se tem notícias de estudos sérios de possível disrupção em ótica cambriana deste homem em face de tamanho impacto. O que há de vir, aguardemos.

Portanto, o ChapGPT nada mais é do que mais um recurso de aceleração como outrora surgiu o incrível Office, respeitadas as tecnologias das épocas.

Desta forma, cumpre separar adequadamente os papéis institucionais e  operacionais.

Decisões judiciais não podem e não devem ser fundamentadas com base em ChatGPT, lembrando o que está por trás enquanto programação humana, o Machine Learning em desenvolvimento e o input de dados incompleto em seara legal, posto que o Direito ainda se encontra em caminhada rumo a este promissor encontro com a tecnologia e buscando o seu próprio meio Linguístico de interface com esta ciência.

Nesta abordagem, observe-se que, em 1897, no campo da Linguística, Michel Bréal em seu “Essai de Sémantique”, desenvolvendo suas investigações acerca das palavras, abordou do “grau de precisão que temos necessidade para compreendê-las bem”, ou seja, do como exatamente, se pretende atingir um alvo e alcançar um dado índice de efetividade nas decisões e julgados, especialmente quando uma vida, até mesmo frágil, está em jogo e, em especial, em se tratando de Garantias Individuais e Direitos Fundamentais.

Lembre-se que o Brasileiro pouco lê e do contexto deficiente da Educação Nacional. Preocupar-se em ser bem entendido há de ser premissa.

Após a “Virada Linguística” e com o surgimento da “Filosofia Analítica”, capitaneada por Bertrand Russell e Ludwig Wittgenstein buscando enquadrar a linguagem em padrões matemáticos, foi, de fato, com Ferdinand Saussure, post mortem, e a divulgação de seus estudos focados em Desempenho, na década de 1920, que a Linguística assumiu status de Ciência. Outras escolas vieram posteriormente, como a de Praga e o Estruturalismo Europeu, a Norte-Americana, com Noam Chomsky e o Funcionalismo. E se debruçaram sobre o tema, dentre outros, Richard Rorty e Jünger Habermas.

Por que a adoção de Padrões Linguísticos no Direito?

Por absoluta necessidade, sob o ponto de vista de que a linguagem constitui realidade, se tornando ação em concreto. Tudo o que pensamos é mera convenção de nomes e características materializado para o mundo físico e refletido nos pareceres, peças e decisões.

Assim, como um dia muitos aprendemos a datilografia e digitar, hoje outros aprendem coding para programar e lidar com robôs, havendo a necessidade inconteste de ajustes de linguagem do Direito face a tecnologia, uma vez que os computadores se utilizam de padrões matemáticos e lógicos. O Direito precisa de simplificação, já tendo deixado há muito de ser uma ciência isolada e hoje se mostrando vinculado à Economia, às Engenharias e às diversas Ciências.

Primeiramente, se os Tribunais pretendem se utilizar de recursos tecnológicos aprimorados, em último grau,  precisam: (1) dispor de um centro coordenado, e não mais falar linguagens diferenciadas; (2) estabelecer critérios iguais para que os Operadores de Direito compreendam a necessidade de rever suas linguagens – cartilhas e tamanho de peças.

O que esperamos socialmente? Até quando não verificar o efeito das decisões? Com IA, volume não pode e não deve mais ser álibi. Por que a preocupação apenas com a causa e não com eficácia? E quanto a mitigar suposto desvio?

Em segundo ponto, para a boa extração de Relatórios, os textos produzidos hão de ser curtos, práticos e focados, com número máximo definido de páginas e distribuídas em torno de 5 partes: (1) contexto; (2) fundamentação doutrinária global e regional; (3) argumentação técnica prática; (4) decisão detalhada – o agir; (5) decisão resumida com prazos e cronograma para acompanhamento.

Um excelente modelo corporativo que poderá ser utilizado por IA vem a ser 5W1H – WHAT (O quê), WHO (Quem), WHEN (Quando), WHOW (Como), WHY (Porque), HOW (Como), basilar na vida das organizações privadas.

Que o objetivo seja a elaboração de decisões em uma linguagem liberta de ambiguidades, sem dificuldade de entendimento ao público leigo, aproximando os Tribunais da população e ampliando o cumprimento das decisões judiciais.

Que Eficácia Decisional seja meta.

Afinal, escreveu J. L. Austin, “Quando dizer é fazer”.


Adriana da Costa Fernandes . Advogada com atuação em 3 eixos: Direito Público; Infraestrutura e Tecnologia (em especial Telecom, TI, Digital, Energia Elétrica e Ferrovias) e Cível Estratégico (foco em Consumidor e Contratos). Mestranda em Direito Constitucional pela UNINTER PR sob a tutela da Profa. Dra. Estefânia Barboza e com tese sobre PRAGMATISMO CONSTISTUCIONAL HUMANISTA na Era Digital, unindo Direito Constitucional, Digital, Filosofia e Ciência Política. Pesquisadora vinculada ao NEC CEUB DF sob a mentoria da Profa. Dra. Christine Peter da Silva e ao IDP – Observatório Constitucional do Professor André Rufino do Vale. Aluna da Escola de Magistratura do Distrito Federal – ESMA DF. Pós-graduada (MBA) em Marketing pela FGV RJ, especializada em Relações Governamentais e Institucionais (RELGOV) pela CNI / Instituto Euvaldo Lodi (IEL), com Extensão em Energia Elétrica pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e detentora de diversas titulações em instituições de renome Nacional e Internacional. Consultora e Parecerista. Com experiência em empresas renomadas, de portes expressivos e atuação em mercados relevantes e agências governamentais. Atualmente com escritório próprio e atuação voltada para Tribunais Superiores, Tribunal de Contas da União e CARF.