Quem não tem cão, caça com gato!!
Editorial
Não é de hoje que a Europa está atenta a todas as transformações concorrenciais resultantes dos avanços da economia digital. No editorial “A geopolítica na economia digital. EUA e China posicionados. Por onde anda a Europa? ” trouxemos para a discussão a vulnerabilidade da Europa nas questões digitais em relação, principalmente, aos Estados Unidos da América e China, uma vez que são estes os proprietários das principais big techs no mundo.
A coisa não anda fácil pelas bandas europeias!! Já que não detém nem a tecnologia nem as empresas, a solução é se ater a uma regulação forte e eficaz para evitar que o paradigma digital não coloque a economia do continente europeu em situação desvantajosa em relação aos principais players mundiais.
A aprovação do Digital Market Act – DMA pelo parlamento europeu em março de 2022 é uma iniciativa que vem de encontro a necessidade dos países europeus de se protegerem das transformações disruptivas causadas pela avalanche tecnológica. Em resumo, o DMA estabelece um conjunto de critérios objetivos claramente definidos para identificar os “Gatekeepers” que são grandes plataformas digitais que ofertam serviços de plataforma central, como, por exemplo, mecanismos de pesquisa online, lojas de aplicativos e serviços de mensagens.
As iniciativas para regular a economia digital não param!!! Recentemente, a autoridade britânica de defesa da concorrência (Competition Market Analysis – CMA) iniciou os estudos para rever os efeitos dos modelos de inteligência artificial no ambiente concorrencial e o ponto de partida do CMA está no estudo apresentado pelo governo britânico em março de 2023 denominado “A pro-innovation approach to AI regulation ”, que, em linhas gerais, aponta que embora desenvolvimentos recentes nas capacidades de modelos de IA generativos tenham criado oportunidades empolgantes, eles também geraram novos debates sobre riscos potenciais de IA. Como a pesquisa e o desenvolvimento de IA continuam em ritmo e escala, esperamos ver ainda mais impacto e conscientização pública sobre os riscos da IA .
O objeto de estudo da CMA está nos denominados “AI foundation models” , que são um tipo de tecnologia de IA treinada com grandes quantidades de dados que podem ser adaptadas a uma ampla gama de tarefas e operações. Os modelos de IA generativos têm muitas aplicações possíveis, incluindo chatbots, assistente de redação e redação de código e geração de imagens para fins artísticos ou objetivos comerciais. Embora possam ser usados diretamente pelos consumidores, novos produtos e serviços que utilizam a tecnologia já estão sendo desenvolvidos por negócios novos e existentes. Os modelos de IA generativos também podem ser usados por organizações para automatizar algumas partes de seus processos ou fluxo de trabalho . Os modelos mais conhecidos atualmente são o BARD do Google e o ChatGPT da empresa OpenAI.
São dois os principais objetivos relacionados com a concorrência: (i) explorar a existência de barreiras à entrada no desenvolvimento dos modelos de IA generativos; e (ii) avaliar o impacto que estes modelos poderão ter sobre outros mercados.
Sob o ponto de vista das barreiras à entrada, o estudo explorará como a concorrência funciona atualmente no desenvolvimento destes modelos e se isso pode ser melhorado à medida que o setor continua a crescer. Isso inclui o exame de possíveis barreiras à entrada, por ex. acessar os dados necessários, recursos computacionais, talento, financiamento e maneiras pelas quais os modelos de fundação podem interromper ou reforçar a posição das maiores empresas e a distribuição de valor nesses sistemas.[6]
Com relação aos efeitos dos modelos de IA generativos sobre outros setores, a preocupação está na necessidade de acesso a estes modelos. De acordo com a CMA, se o acesso a esses modelos e capacidades se tornar necessário para competirem efetivamente em determinados mercados, mas estes forem indevidamente restringidos ou controlados por algumas grandes empresas privadas que não atuam em ambiente concorrencial, isso pode frustrar a concorrência e a inovação que beneficia as pessoas, as empresas e a economia.[7]
Pois é!! A geopolítica da economia digital bate à porta da Europa. A reação de regulação e controle é a alternativa, pois quem não produz ou detém empresas tem que regular ou, como diz o ditado, “Quem não tem cão, caça com gato!!!”.
[1] A geopolítica na economia digital. EUA e China posicionados. Por onde anda a Europa? (webadvocacy.com.br)
[2] A pro-innovation approach to AI regulation – GOV.UK (www.gov.uk)
[3] Tradução livre do trecho:
…while recent developments in the capabilities of generative AI models have created exciting opportunities, they have also sparked new debates about potential AI risks.[footnote 39] As AI research and development continues at pace and scale, we expect to see even greater impact and public awareness of AI risks.[footnote 40]. [A pro-innovation approach to AI regulation – GOV.UK (www.gov.uk)]
[4] AI Foundation Models: Initial review (publishing.service.gov.uk)
[5] Tradução livre do trecho:
Foundation models are a type of AI technology that are trained on vast amounts of data that can be adapted to a wide range of tasks and operations.4 Foundation models have many possible applications including chatbots, writing assistant and code writing, and generation of images for artistic or commercial purposes. Whilst they can be used directly by consumers, new products and services that utilise the technology are already being developed by new and existing businesses. Foundation models may also be used by organisations to automate some parts of their processes or workflow. [AI Foundation Models: Initial review (publishing.service.gov.uk)]
[6] Tradução livro do trecho:
…will explore how competition currently works in the development of foundation models and whether this might be improved as the sector continues to grow. This includes examining potential barriers to entry e.g. accessing the requisite data, computational resources, talent, funding, and ways in which foundation models could disrupt or reinforce the position of the largest firms, and the distribution of value in these systems. In particular, we will consider the extent to which there are economies of scale and other characteristics of foundation model development and deployment that would tend towards centralisation, consolidation and integration. [AI Foundation Models: Initial review (publishing.service.gov.uk)].
[7] Tradução livre do trecho:
…if access to these models and capabilities become necessary to compete effectively in certain markets, but are restricted unduly or controlled by a few large private companies facing insufficient competitive constraint, this may frustrate competition and innovation that would benefit people, businesses and the economy.