Adriano Paranaíba

Introdução

A economia austríaca, assim como a economia mainstream (neoclássicos), vem discutindo monopólio há várias décadas, e muito tem sido feito sobre o assunto, principalmente se considerarmos a contribuição que Rothbard (1962) deu ao que Mises (1949) pensava sobre a percepção desta estrutura de mercado. É seguro dizer que, após alguma evolução nos estudos a esse respeito, na perspectiva austríaca, o monopólio é considerado ruim apenas quando concedido pelo governo. Ao mesmo tempo, na economia mainstream, muito se tem discutido sobre barreiras e poder de mercado, com a criação do termo Monopólio Natural como justificativa para o uso de ações de intervenção governamental em alguns mercados.

Monopólio à luz da Escola Austríaca de Economia

Conforme Block (1997) existem duas visões sobre monopólios na discussão acadêmica dentro do corpo de pesquisadores da Escola Austríaca: a visão Mises-Kirzner e a visão de Rothbard.

O expoente do pensamento da Escola Austríaca, Ludwig von Mises apontou que, a discussão sobre a existência de monopólios deveria ser entendida com uma existência temporal, não podendo ser interpretados como uma estrutura de mercado que se antagonizava à um mercado competitivo. Na verdade, o monopólio seria um estado relativo de um processo de mercado.

“The temporary coexistence of a plurality of prices for the same commodity is the outcome of the fact that the forces making for change are still operating and that a state of equilibrium has not yet been attained.” (MISES, 1998, p.3)

Para Mises (1949) o monopólio depende de três fatores: monopólio da oferta; inelasticidade de demanda do mercado, e; o monopolista conseguir descobrir os preços de monopólio. Partindo dessas premissas, seria equivocada a percepção da manutenção de um monopólio, pois não existe como os empresários serem oniscientes para praticar os preços que seriam superiores aos preços hipotéticos daquele mercado em estado de concorrência perfeita. Para sua existência efetiva, os preços praticados em monopólios devem ser vantajosos para aumentar sua receita líquida total, até o limite que o mercado permita (MISES, 1963), conceito esse sustentado por Kirzner (1973, p.110),

“The owner of the monopolized resource has withheld the use of some of his stock from the market, forcing up the price the market must pay for the smaller remaining quantity.”

Nessa perspectiva o proprietário único de recursos poderia ser capaz de promover os preços de monopólio, utilizando-se da escassez daquele produto – retirando parte do fornecimento deste bem do mercado, ou restringindo a produção (COSTEA, 2003). Contudo essa restrição de produção de determinados bens significa que capital e trabalho foram alocados para a produção de outros bens (MISES, 1936). Assim, a perspectiva de Mises e Kirzner apontam a possibilidade da existência de monopólios em um mercado competitivo (BLOCK, 1997). A competitividade de um mercado não depende do número de empresas, e Bastos (2016, p.381) aponta “para a possibilidade de um mercado com uma firma, mas ainda assim competitivo – pois sempre estaria à mercê de entrada de novos competidores”.

Armentano (1978) irá sinalizar que a obra de Rothbard (1964) irá refinar e corrigir a definição de monopólio dentro do contexto austríaco, definido que “monopoly is a grant of special privilegie by the State, serving a certain área of production too ne particular individual or group” (Rothbard, 1964, p.669). Neste sentido, a forma de manutenção dos monopólios se dá pelo poder de coerção estatal o que representa forte intervencionismo, concessão de privilégios, caracterizando assim, um cenário incompatível com o livre mercado (BLOCK, 1997). Com uma proteção estatal, o monopolista fica livre para praticar preços acima dos preços de mercado. Sem a proteção estatal, apenas se o monopolista produzisse em economia de escala, minimizando custos e consequentemente praticando preços de mercado, esse conseguiria se estabelecer.

Para Costea (2003, p.60) “Mises’s attempts to incorporate the neoclassical concept of monopoly price into the framework of the market process.” Embora Rothbard tenha formulado uma teoria bem aceita sobre o monopólio, existem campos que ainda não foram bem explorados. Um dos problemas que as pessoas encontram na perspectiva austríaca de monopólio é devido ao seguinte: alguns monopólios são ruins e resistem a longo prazo, mas não são concedidos pelo governo, pelo menos não diretamente.

Importante sinalizar que o monopólio, é recorrentemente tratado na literatura como uma falha de mercado, sendo necessária a intervenção estatal para corrigi-la. Contudo, é exatamente o oposto e “é absurdo que ele (o Estado) aplique políticas antimonopolísticas; na realidade, o que ele deve fazer é, simplesmente, abolir as leis – ou melhor, as legislações (Thesis) – que estabeleceram os monopólios” (IORIO, 2013, p. 421). Os erros cometidos na tentativa de regular mercados ‘monopolísticos’ transformam ‘falhas de mercado’ em ‘falhas de governo’ que podem ser definidas como: “Quando a tomada de decisão para aplicabilidade de soluções

normativas encontra limitações que incorrem à externalidades maiores que a falha de mercado

que se justificou a regulação econômica.” (BRASIL, 2020, p. 7)

A regulação ajuda ou piora?

Tanto para a economia mainstream (neoclássicos) quanto para economistas austríacos, a discussão sobre monopólios está estabelecida sobre o debate sobre o poder de monopólio, como um ‘tipo’ de falha de mercado. Também tratam o monopólio a partir de uma análise de pré-existência do monopólio como ponto de partida analítico.

Especificamente para os austríacos a existência de monopólios repousa na intervenção estatal que realiza concessões para o monopolista operar no mercado de forma deliberada, por meio de proibições e autorizações. Para Méra (2010) não existe uma preocupação entre os economistas austríacos sobre as despesas monetárias para os vendedores, especificamente sobre Rothbard e aponta que,

“Rothbard is not very explicit regarding factor pricing under monopolistic conditions. True, he stresses that monopoly price must be understood as a catallactic phenomenon and, as such, a phenomenon which is not independent from the general pricing and resource allocation process.” (MÉRA, 2010, p.54)

Desta forma, mais do que uma constatação de Rothbard, apontando o monopólio como uma concessão estatal, é possível construir uma hipótese de que, mais regras legais e infralegais, ou seja, regulatórias, possam impedir a entrada de novos concorrentes neste mercado, elevando os custos regulatórios para a participação neste mercado, contribuindo para o surgimento de monopólios ex-ante.

Partindo do princípio que toda regulamentação incorre em custos para os regulados, é possível uma leitura de que os custos regulatórios impactam os custos marginas e médios de longo prazo das empresas. O impacto destes custos pode ser observado nas mudanças dos custos de insumos de um mercado típico, sem ainda a existência do monopólio, observado na figura 1.

Figura 1 – Produção de equilíbrio de longo prazo com aumento de preço de insumos

Fonte: Adaptado de Nicholson, 2018, p. 290

A Figura 1 ilustra que o aumento de preços de insumos desloca tanto a curva de custo médio quanto a de custo marginal para cima. A magnitude deste deslocamento irá determinar se ocorrerá aumento ou não no nível ótimo de produção de uma empresa típica q*. Para NICHOLSON (2018, p.291) “se q*1 ≥ q*0 a diminuição na quantidade acarretada pelo aumento de preço do mercado diminuirá com certeza a quantidade de empresas.” Caso ocorra o contrário, ou seja  q*1≤ q*0 será indeterminado afirmar a redução da quantidade de empresas, pois dependemos da magnitude do deslocamento das curvas de custo marginal e custo médio de logo prazo podendo apenas afirmar que ocorrerá uma redução do tamanho ótimo da empresa. Porém, “provavelmente resultará na diminuição na quantidade de empresas quando um aumento no preço de insumo diminui a produção da indústria” (NICHOLSON, 2018, p.291).

Este fenômeno de redução do número de empresas causado pelo aumento de custos é também compartilhado por Bylund (2016) quando afirma que:

“Each investment, even those with anticipated very high profits, becomes riskier due to the added cost. As a consequence, the economy will develop at a much slower pace, and with less value creation there is a greater risk for distortive effects: the number of opportunities that will never be realized—the unrealized—increases with the artificial burdens on economic action.” (Bylund, 2016, p.155)

Caso ocorra de apenas uma empresa conseguir subsistir com o novo custo marginal exigido pelas regulações (Cmg1), esta se sentirá confortável para elevar seu preço de Pr para Pm, visto que a ação do órgão regulador eliminou a concorrência pré-existente.

“Mesmo aqueles mercados brasileiros em que não existem monopólios estatais, ou regulação direta das agências reguladoras que criam oligopólios, são alvos de intervenção pela tributação, burocracia e benefício fiscal, tornando-os obstaculizados para acessar e permanecer, e ineficientes no processo econômico.” (SCHOENHERR, 2021, p. 29)

Assim, podemos apontar que a proposição de Rothbard sobre a existência de monopólios está correta, mas pode ser complementada com uma análise de uma criação indireta e não intencional de monopólios por parte do Estado. 

Conclusão

Entre monopólios privados e estatais, muito ainda há para se discutir, mas o que fica evidente é que, monopólios privados são tão ruins quanto os estatais quando estes adquirem o poder de monopólio via concessão estatal, que lhe dá poder de manutenção sem a preocupação em atendimento os consumidores.

Mesmo que ocorreram avanços no arcabouço legal brasileiro na identificação de abusos do poder regulatório, entendemos que toda regulação propicia a elevação de custos das empresas convergindo para que o surgimento de monopólios possa ocorrer com a liberdade de prática de poder de monopólio, elevando preços e causando perda de bem-estar-social para os consumidores.

Referencias

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BLOCK, W. Austrian monopoly theory – A critique. The Journal of Libertarian Studies vol. I. n.4, pp. 271-279. Pergamon Press.1977

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