Quinta-feira | 16 de junho de 2022
Nos últimos dias o Presidente da República e o Ministro da Economia fizeram apelo aos supermercados para não reajustarem os preços nos próximos meses. Os objetivos com esta medida não estão em questão neste editorial, apresentamos apenas o famoso serrote inflacionário estudado no âmbito no Plano Cruzado em 1986 e as consequências do congelamento de preços.
O processo inflacionário funciona como um serrote (figura 1). No tempo T1 é dado um reajuste e o preço real vai perdendo o valor até um novo reajuste (T2) e, assim, sucessivamente. Este serrote acontece para cada empresa individualmente.
A figura 2 apresenta os efeitos do congelamento de preços no serrote inflacionário.
O congelamento de preços sem que ocorra o reajuste pode pegar as empresas em diferentes pontos. Se o congelamento de preços coincidir com o reajuste no instante T1 (ponto A), a empresa atuará com o preço reajustado e o incentivo para o reajuste do preço aumentará a medida que o instante T2 for se aproximando.
No entanto, se o congelamento de preços acontecer quando o preço praticado pela empresa for correspondente ao ponto B, já haverá defasagem do preço e o período de reajuste já estará mais próximo, o que gerará pressão pelo ajuste do preço. Como o preço está congelado, o incentivo da empresa é o de não mais ofertar o produto ou de ofertá-lo no mercado negro.
O mencionado nos dois parágrafos anteriores foi o que aconteceu com o congelamento de preços praticado no Plano Cruzado do governo Sarney no ano de 1986. Como a medida foi tomada pelo governo sem que os agentes econômicos tivessem conhecimento, nenhuma empresa foi capaz de ajustar os seus preços e, muitas delas, tiveram seus preços congelados em pontos semelhantes ao ponto B da figura 2, o que gerou redução da oferta, ampliação do mercado negro e pressão inflacionária.
Obviamente que o pedido para que os supermercados não elevem os preços nos próximos meses feito pelas autoridades brasileiras é bastante distinto do que aconteceu no Plano Cruzado em 1986, pois não há no pedido qualquer pacote de medidas imposta pelo governo como foi o que se observou no mencionado Plano econômico. Na verdade, o episódio não passa de um apelo feito pelas autoridades para a contenção da inflação e o motivo deste pedido não é objeto deste editorial.
Conquanto as situações sejam distintas, o fato é que em ambos os casos se busca alterar a flutuação natural dos preços dos bens e serviços. Algumas das consequências já são conhecidas, sendo a principal e mais perversa delas a pressão pela elevação de preços advinda da redução da oferta.