Maio 16, 2025 07:22

Evolução do direito da concorrência

João Bosco Leopoldino da Fonseca (*)

INTRODUÇÃO

A Comissão de Estudos de Defesa da Concorrência da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Ceará – presidida pelo Dr. Leonardo Leal, realizou em Fortaleza, em 24-25 de setembro de 2020, o II Seminário de Direito da Concorrência. Tive a honra de participar daquele evento, pronunciando-me sobre o tema “A Evolução do Direito da Concorrência no Brasil”. De 2 a 4 de dezembro de 2021, realizou-se na cidade histórica de Ouro Preto o I Congresso das Comissões de Defesa da Concorrência da OAB, reunindo os Especialistas em Direito da Concorrência de vários Estados do Brasil, com a participação da WEB-Advocacy e com o apoio efetivo do Conselho Administrativo de Defesa da Economia – CADE. Este Congresso, que contou com o idealismo e a liderança do Dr. Paolo Zuppo Mazzucato e de colegas dos diversos Estados, é um marco significativo da Evolução do Direito da Concorrência no Brasil.

PLANO DO ARTIGO

O Direito da Concorrência é hoje resultado de uma evolução que vem já de séculos. O estudo que me proponho realizar tem por finalidade estudar este fenômeno da cultura humana. Pretendo focalizar três aspectos para, ao final, deixar uma conclusão que na verdade pretende ser uma provocação. Primeiramente, saliento que a evolução é inerente à história da humanidade. Em segundo lugar, procurarei mostrar como o fenômeno da concorrência econômica se manifestou na idade antiga, na idade moderna, e como se impõe o seu estudo à atualidade do Direito Econômico no século XXI. Em terceiro lugar, creio necessário mostrar a evolução legislativa e jurisprudencial no Brasil. A conclusão procura deixar evidente a necessidade de um diálogo de interpretação e aplicação em face do avanço fantástico da Economia de Mercado Globalizada.

FATOS E PENSAMENTO

Não se pode adentrar o tema sem uma incursão no domínio da Semântica, para explicar o conteúdo do significante “evolução” ([1]). O prefixo “ex” significa um movimento de um local anteriormente ocupado para um subsequente, de um tempo anterior para um posterior; “volvere” significa “rolar, trazer ou fazer chegar sucessivamente (com respeito a acontecimentos” ([2]). Daí porque não se pode falar do Direito da Concorrência atual sem “ex-volvere”, sem uma referência ao passado.

Os fatos estão na origem de nosso modo de pensar. A Filosofia nos ensina que “nihil in intellectu quod prius non fuerit in sensu”. Na versão prescritiva do Direito, “ex facto oritur jus”. Mas há uma interação, uma interinfluência. Os fatos provocam um repensar, daí  dizermos que a história da humanidade é um suceder de “crises” ([3]). A história nos mostra que a humanidade se encontra em constante evolução, como já assinalava Heráclito de Éfeso ao afirmar que “tudo corre como um rio” ([4]). Evolução e crise são seguros indicadores de vida. A convulsão e a propulsão fazem parte desse contínuo evoluir. A Covid19, com todas as agruras vivenciais por ela veiculadas, é um marco divisório da história da humanidade.

“Crise” é um fenômeno de mudança social e econômica, que pode ser evolutivo ou disruptivo, e que exige dos atores humanos uma reflexão, uma análise, uma decisão e uma ação ([5]). O processo disruptivo foi já assinalado por Schumpeter, ao se referir à destruição criadora ([6]).

Toda crise é sempre impregnada de fecundidade. Ela balança, quebra a ordem existente e constrange para produzir algo novo. Fazendo eco a Kant, Leonardo Boff afirma que “a paz é o equilíbrio do movimento e não a ausência do movimento. E o estado normal do universo é movimento, como também o da nossa vida. Nesse sentido, vejo que toda crise acrisola, purifica. A palavra crise é filologicamente muito fecunda, pois sua raiz, no sânscrito, significa limpar, purificar” ([7]).

A História revela e instrui esse caminhar da humanidade e também do discurso jurídico. Ao mesmo tempo em que dá testemunho do tempo passado, ela é luz que ilumina, é mestra da vida e anuncia a sabedoria ([8]). Ao falar da evolução do Direito nos colocamos do ponto de vista do historiador. Os eventos e os fatos necessitam de uma interpretação, para terem um significado para a humanidade. Busca-se, impregnado nos eventos sociais, um significado, que não é somente lógico, mas é sobretudo vivencial. Passado e presente se projetam na busca da construção de uma nova realidade ([9]).

A nova realidade, que assalta a humanidade do século 21, é objeto da conclusão humanística do livro “Platform Revolution”. Como enfatizam os autores, a história mostra que se passaram várias gerações para as sociedades ocidentais darem respostas efetivas aos deslocamentos e abusos decorrentes da Revolução Industrial de inícios dos séculos XVIII e XIX. Da mesma forma, as sociedades contemporâneas levarão tempo para imaginar o que terão que fazer para dar uma resposta adequada às mudanças econômicas, sociais e de poder político que estão sendo provocadas pela revolução das plataformas ([10]).

Tenhamos em mente a distinção entre evolução e revolução como sugerido por Shapiro e Varian. A evolução oferece um caminho de migração. “A estratégia da evolução, que oferece aos consumidores um caminho fácil de migração, centra-se na redução dos custos de mudança de tal forma que os consumidores podem gradualmente experimentar sua nova tecnologia” ([11]).

Já a revolução encerra a noção de uma conduta de ruptura, ou uma ruptura da cadeia comportamental e de pensamento. “A estratégia de revolução envolve uma força bruta: oferece um produto de tal forma melhor do que aquele que as pessoas estão usando de sorte que muitos usuários enfrentarão a dificuldade de se mudar para ele ([12]).

UM ESCORÇO HISTÓRICO.

O Direito da Concorrência, como manifestação da evolução no campo social e econômico, concretizou-se de formas diferentes em períodos históricos que vale a pena relembrar. A preocupação com o comportamento no mercado, com condutas abusivas, com monopólio, faz parte de análises que vêm sendo feitas desde Adam Smith e que vem recebendo hoje um tratamento mundial ([13]).

Não se pode falar, por exemplo, de monopólio ou de posição dominante, sem lembrar o primeiro caso conhecido. Aristóteles narra o episódio de TALES de Mileto, possivelmente com a finalidade de mostrar que a Filosofia não é uma ciência de pobres, mas que pode levar o seu cultor a ficar rico. O fato narrado é o da situação de monopólio de que se valeu Tales. Vale transcrever a narrativa de Aristóteles ([14]):

“…É atribuída a Tales de Mileto, pela sua grande sabedoria, uma especulação lucrativa, que, entretanto, nada apresenta de extraordinário. Censurava-se a sua vida, afirmando-lhe que a filosofia de nada serve. Ele previa, por seus conhecimentos astronômicos, uma grande colheita de azeitonas. Era ainda o tempo do inverno. Procurou Tales o dinheiro de que precisava, arrendou todas as prensas de óleo de Mileto e de Quios por preço bem em conta, visto que não tinha concorrentes. Na época da colheita, as prensas foram subitamente procuradas por uma infinidade de interessados. Fez o aluguel delas, então, pelo preço que entendeu e, alcançando deste modo grandes lucros, demonstrou que é fácil aos filósofos enriquecer quando o desejam, ainda que este não seja o objetivo de seus estudos.

Deste modo, conta-se que Tales demonstrou a sua habilidade; contudo, repito-o, esta especulação é acessível a todos os que podem criar um monopólio.  Muitos Estados têm recorrido a esse meio quando precisam de dinheiro, procedendo ao monopólio da venda de mercadorias ([15]).

Na sequência deste relato, acrescenta ainda Aristóteles o fato ocorrido em Siracusa, na Sicilia, onde um mercador “empregou uma soma de dinheiro, que se lhe havia confiado em depósito, para comprar todo o ferro de todas as fundições, e logo, quando vieram os mercadores do centro de comércio, ele era o único vendedor, e embora não tenha subido muito o preço, ao final conseguiu um benefício de cem talentos sobre seu capital de cinquenta. Quando isto chegou ao conhecimento de Dionísio, este lhe ordenou que tomasse consigo seu dinheiro, mas que fosse para um lugar fora de Siracusa, pois que estava inventando meios de beneficiar-se que eram nocivos aos próprios negócios da tirania. Contudo este sistema era o mesmo que Tales adotou…” ([16]).

A antiguidade grega nos traz também a lição dos “vendedores de grãos”, que se reuniram para elevar os preços dos cereais originados da região do Mar Negro, abusando da necessidade da população da Grécia. Afirma o orador grego Lísias:

Quando vocês se virem na maior necessidade de grãos, eles os retêm e recusam vender de forma que nós não podemos discutir o preço, mas podemos ter sorte se conseguimos comprar deles a qualquer preço. Assim embora estejamos em paz, somos assaltados por estes homens

Eu penso, senhores do júri, que está claro para todos, que os processos contra estes homens são do maior interesse para os desta cidade, de sorte que eles saibam que conceito vós tendes deles; pelo que eles pensem que, se vós os condenais, deverão ser mais cuidadosos no futuro, ao passo que se vós os perdoais vós tereis concedido a eles toda oportunidade para fazerem o que quiserem…

Lembrem-se de que muitos neste comércio foram condenados à pena capital. E tão grandes são os seus lucros desta atividade que eles preferem, cada dia, correr o risco da pena capital do que desistir de arrancar de vós um ganho ilegal. E se eles imploram de vós e vos suplicam, não deveis ter piedade deles, mas sim ter compaixão dos cidadãos que veem morrendo de fome por causa da vilania deles, e dos mercadores contra os quais eles se ajustaram… Se vós os condenais, fareis o que é justo, e fareis o cereal mais barato, se os absolveis, o tornareis mais caro ([17]).

O MONOPÓLIO NA IDADE MODERNA

Na era moderna, como nos relata DAVID HUME, a Rainha Elisabeth I, nos idos do século XVI (1558-1603) instituíra a concessão de patentes, com efeitos monopolísticos, como instrumento de dinamização das relações de mercado, e como forma para remunerar os serviços militares e civis ([18]). O vulto das patentes concedidas foi de tal magnitude que a lista foi submetida ao Parlamento:

“… Não havia senão uma pequena parte de produtos, que não tinha sido outorgada aos monopolistas. Quando a lista foi lida perante o Parlamento, um parlamentar gritou: Não está o pão incluído? Pão!!! gritaram todos com espanto. Sim, eu vos garanto, replicou o parlamentar, se os negócios prosseguirem nesse ritmo, teremos o pão contemplado como um monopólio, antes da próxima legislatura…” (tradução livre).

De forma semelhante, os reis de Portugal instituíram as capitanias hereditárias, com direitos de monopólio. As capitanias hereditárias foram criadas como forma de um melhor aproveitamento da administração do território colonial português na América e principalmente como meio de suprir a falta de recursos de Portugal em manter a sua colônia de além-mar. Os donatários tinham a posse das terras e a possibilidade de transferência hereditária ([19]).

Em artigo publicado em 1894, William F. Dana traça um relato histórico do monopólio, enfatizando que a Lei Sherman encontra sua fonte hermenêutica no Common Law ([20]). Salienta que os “monopólios” nada mais eram do que patentes reais, e as restrições de concorrência daí decorrentes não eram consequência de um ato individual, mas se explicavam como uma característica exclusiva da concessão. A primeira vez em que se declarou sua ilegalidade foi em 1602, no caso Darcy v. Allen, que ficou conhecido como “The case of Monopolies” ([21]).

O DIREITO DA CONCORRÊNCIA NO SÉCULO XXI

O relacionamento internacional impõe-se como uma realidade irrecusável e que exige do Poder Judiciário de todos os países uma atualização no campo econômico. Em um mundo globalizado, ao poder político se contrapõe hoje o poder econômico, haja vista o poder de que desfrutam GOOGLE, AMAZON, FACEBOOK, APPLE e MICROSOFT – GAFAM. O judiciário norte-americano e europeu vêm desde muito enfrentando os problemas na área do Direito da Concorrência criados por estes gigantes, e decidindo as questões fático-econômicas provocadas.

O Direito norte-americano herdou a preocupação com o “monopólio” e seus efeitos da história do Direito inglês. William F. Dana, no artigo acima citado, ressalta a herança norte-americana dos conceitos do common-law, em vários aspectos. Os tribunais, relativamente à Lei Sherman, basearam-se no common-law para a interpretação de palavras e frases, como “monopoly”, “contract”, “combinations”, “conspiracy”, “in restraint of trade” ([22]).

A lei antitruste se vale de expressões muito vagas, fixando como ilegal a conduta de “monopolizar” um mercado, proibir fusões que “diminuam substancialmente a concorrência”, ou regulação que se refira ao “interesse público”. Observam Shapiro e Varian que “para dar significado a estas normas, e às formas de sua aplicação, temos que considerar a filosofia que está por trás delas”, o que exige do Poder Judiciário ir além da literalidade da lei e efetuar uma análise econômica da realidade ([23]).

A referência à legislação e à doutrina dos Estados Unidos (1890), bem como (hoje) às lições da União Europeia se explica em face do disposto no artigo 386 do Decreto 848, de 11 de outubro de 1890, que criou a Justiça Federal:

Art. 386. Constituirão legislação subsidiaria em casos omissos as antigas leis do processo criminal, civil e commercial, não sendo contrarias ás disposições e espirito do presente decreto. Os estatutos dos povos cultos e especialmente os que regem as relações juridicas na Republica dos Estados Unidos da America do Norte, os casos de common law e equity, serão tambem subsidiarios da jurisprudencia e processo federal”([24]).

Ao falar da Lei Sherman, impõe-se sinalizar a razão crítica do seu surgimento. Será de extrema valia a indicação de leitura de um relato histórico feito pela jornalista IDA MINERVA TARBELL ([25]). Relata ela, como curiosidade, que a primeira utilização da substância extraída dos poços foi como produto medicinal: o “óleo Sêneca” ([26]). Nascido em 8 de julho de 1839, JOHN D. ROCCKEFELLER é levado pela família para Cleveland, onde andou pelas ruas para procurar trabalho. E o encontrou na nova riqueza que surgia.

A Lei Sherman encontrou na pujança da Jurisprudência norte-americana sua aplicação esclarecida e influenciadora.

Na Europa, o Tratado CECA institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, em 18 de abril de 1951, como um esforço doas países envolvidos no conflito de 1939-1945. O fundamento filosófico-econômico para sua criação se encontra na célebre Declaração Schuman ([27]). O Tratado de Roma, de 25 de março de 1957, e suas sucessivas atualizações, com a aplicação já reiterada são também um questionamento a ser levado em conta pela doutrina brasileira e pelo Poder Judiciário.

Ao estudar o Direito da Concorrência no século XXI, não se pode omitir o surgimento da China no cenário mundial. Obra recentemente publicada em homenagem à Professora WANG XIAOYE nos põe diante do confronto entre a doutrina de um País dominado pelo comunismo e o surgimento no cenário de uma concorrência irrefreável no mundo moderno. A promulgação da lei chinesa – Anti-Monopoly Law of the People’s Republic of China – em 30 de Agosto de 2007 – traz provocações interessantes. Vale repetir a reflexão de DAVID J. GERBER:

“… na atual prática da lei de concorrência na China, aqueles ‘princípios comunistas’ parecem desempenhar somente um papel marginal. Alguns destes princípios permanecem no vocabulário da lei, mas tipicamente eles têm impacto prático minimo sobre as decisões de direito concorrencial” ([28]).

Esta abertura ao mundo coloca os integrantes da Administração Pública e do Judiciário brasileiro diante de um desafio. A título de provocação, cito decisão recente da Comissão Europeia relativa a duas empresas gigantes do mundo moderno.

O CONFRONTO INTERNACIONAL DE EMPRESAS E ESTADOS

Os problemas jurídico-econômicos do século XXI desconhecem as fronteiras políticas dos Estados. Como exemplo, podemos lembrar caso recente na União Europeia, que vetou a aquisição da DAEWOO pela HYUNDAI, tendo em vista os efeitos potenciais na União.

Esta vertente internacional e globalizante do Direito da Concorrência pode ver-se, por exemplo em recente decisão da Comissão Europeia, que, em 13 de janeiro de 2022, proibiu a proposta de aquisição de DAEWOO Shipbuilding & Marine engineering pela HYUNDAI Heavy Industries Holdings. Vale citar a entrevista da Vice-Presidente da Comissão Europeia, Margreth Vestager:

“Hoje, a Comissão adotou uma decisão proibindo uma fusão que iria unir duas empresas líderes em construção naval.

A fusão se refere à aquisição pela Hyundai Heavy Industries Holding da Daewoo Shipbuilding and Marine Engineering. Estas duas empresas são muito fortes participantes no mercado de construção de grandes navios transportadores de gás natural liquefeito – o chamado LNG.  Estes são navios altamente sofisticados  para transporte de LNG a menos de 162 graus. Somente um pequeno número de construtores navais em redor do mundo têm poder para construir estes navios.

A fusão iria criar uma posição dominante no mercado para construção de grandes transportadores de LNG. Isto poderá levar a menor escolha, mais elevados preços e finalmente menor inovação para os clientes europeus. As empresas não apresentaram nenhum remédio formal para compensar os efeitos negativos da aquisição.

Como resultado, a fusão não pôde ser aprovada ([29]).

O Judiciário brasileiro já teve ocasião de analisar esse tipo de confronto, no processo BOEING – EMBRAER, em que os interesses de empresas de atuação internacional implicam a participação de interesses políticos dos Países envolvidos.

O DIREITO DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL

No Brasil, a preocupação com a concorrência, ainda que de forma conflitante (pois que sob o signo da Constituição intervencionista de 1937), surge a partir do Decreto-lei n° 7.666, de 22 de junho de 1945, por iniciativa de Agamenon Magalhães, então Ministro da Justiça. Naquele Decreto-lei se modifica o enfoque, adotado anteriormente pelo Decreto-lei nº 869 (de influência do Ministro Nelson Hungria), que tipificava as condutas como “crimes contra a economia popular”. O Decreto-lei nº 7.666/45 mudava a caracterização das condutas e já se referia a “atos contrários à ordem moral e econômica”, como detalhado exemplificativamente no artigo 1ª desse diploma legal.

Agamenon Magalhães foi certamente impulsionado pela lembrança do dinamismo de Delmiro Gouveia (1863-1917), que implantou a 300 quilômetros de Maceió a Companhia Agro Fabril Mercantil (fundada em 1914) a primeira indústria, na América do Sul, a fabricar linhas para costura e fios para malharia. Delmiro Gouveia foi assassinado em 1917. Posteriormente, um grupo escocês adquiriu a fábrica, e em abril de 1930 uma equipe de demolidores destruiu meticulosamente todo o maquinário de fabricação inglesa e lançou no local da Cachoeira de Paulo Afonso os destroços. Livravam-se, assim, da concorrência de um empreendimento que se agigantava promissoramente no interior do Nordeste ([30]).

Contribuição importante do Decreto-lei nº 7.666, de 1945 foi a criação de um órgão capaz de dar cumprimento às disposições nele estabelecidas: “A fim de dar cumprimento ao disposto neste decreto-lei, fica criada a Comissão Administrativa de Defesa Econômica (C.A.D.E.), órgão autônomo, com personalidade jurídica própria, diretamente subordinado ao Presidente da República”.

Foi atribuída àquela Comissão a competência para intervir em acordos efetivados com restrição da concorrência, como consta do artigo 11 daquele diploma, quando os atos, ajustes, acordos ou convenções entre empresas comerciais, industriais ou agrícolas, de qualquer natureza ou entre pessoas ou grupo de pessoas vinculadas a tais empresas ou interessadas no objeto de seus negócios viessem a ter por efeito adotar as condutas ali enumeradas em restrição da liberdade no mercado.

Com a queda do governo Vargas, no final de 1945, esse decreto-lei foi revogado, mas a semente estava lançada. Sua influência se fez sentir na elaboração da Constituição de 1946, condensando-se o pensamento ali vigorante no artigo 148:

Art. 148 – A lei reprimirá toda e qualquer forma de abuso do poder econômico inclusive as uniões ou agrupamentos de empresas individuais ou sociais, seja qual for a sua natureza, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros.

Em 15 de abril de 1948 Agamenon Magalhães encaminha o Projeto de Lei nº 122, que veio dar origem à Lei nº 4.137, de 10 de setembro de 1962 ([31]). Sustentando a adequação do seu projeto à realidade jurídica do momento, o seu autor proferiu palestra no Clube Militar do Distrito Federal em 22 de junho de 1949, quando salientou alguns pontos importantes, a saber:

– O projeto adota as diretrizes da legislação dos Estados Unidos com as modificações impostas pelas nossas condições econômicas e políticas.

– É a regulamentação do artigo 148 da Constituição, que manda reprimir toda e qualquer forma de abuso do poder econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de empresa, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros.

– No Título I se definem as formas de abuso.

– No Título II é proposta a criação da Comissão Administrativa de Defesa Econômica, com a competência para verificar os atos ou fatos que constituam as formas do abuso do poder econômico.

– No título terceiro é estabelecido o processo administrativo, para formalizar a atuação da Comissão na investigação e inquérito nos casos concretos.

– Em sequência, regula o processo judicial e o da intervenção do Estado, caso as empresas não se abstenham do exercício abusivo do poder econômico ([32]).

No período de 1950 a 1962 editaram-se normas destinadas à efetivação da intervenção do Estado no domínio econômico, com a criação da COFAP ([33]), substituída pela SUNAB ([34]), com a competência para controlar e fixar preços.

Donde se vê que esses diplomas legais, sob pretexto de trazer maior reforço para a legislação antitruste já existente, no que tange à definição e configuração das formas de abuso do poder econômico, trouxeram, na verdade, certa perplexidade, a impedir certamente a sua implementação no mundo dos fatos.

Em 10 de setembro de 1962 surge a Lei nº 4.137, que tem por finalidade regular a repressão ao abuso do poder econômico, nos termos estabelecidos pelo artigo 148 da Constituição de 1946. O artigo 2º dessa lei fixa a tipificação das condutas, criando uma definição estipulativa: “consideram-se formas de abuso do poder econômico” – I- dominar os mercados nacionais ou eliminar total ou parcialmente a concorrência…”  “provocar condições monopolísticas”. etc.

A Constituição Federal de 1988 trouxe uma mudança fundamental com a instituição de um regime de Economia de Mercado, com a eliminação da intervenção do Estado no domínio econômico, em decorrência dos dispositivos do artigo 170 e seguintes.

Dentro desse novo quadro é que surgiu o Projeto de Lei nº 3.712-E, de 1993, que “dispõe sobre a repressão ao abuso do poder econômico e a defesa da concorrência, autorizando a transformação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE em autarquia”, e que se transformou na Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994.

Depois de grandes esforços revisionais, tendo em vista a experiência acumulada pelo CADE, pela SEAE e pela SDE, com a provocação constante dos profissionais dedicados à área, quer juristas, quer economistas, surge a Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, com vigência prevista para cento e oitenta dias de sua publicação oficial. A elaboração da nova lei incorporou diversas sugestões vindas da OCDE e da experiência internacional.

EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL

A evolução legislativa nos coloca diante da pergunta sobre como o Poder Judiciário atuou e se posicionou relativamente à aplicação da legislação de comportamentos de mercado. É interessante observar que paralelamente ao esforço de aplicação da Lei 4.137/62, pelo CADE, há uma evolução do pensamento da jurisprudência. Vale a pena relembrar algumas decisões do Tribunal Federal de Recursos e da Justiça Federal.

Em 14 de outubro de 1986, prolatou-se voto no processo em que era apelada a KIBON S/A – Indústrias Alimentícias, cuja Ementa é a seguinte:

ADMINISTRATIVO – CADE – ABUSO DO PODER ECONÔMICO.

O fato de uma empresa ingressar em juízo para obstar a continuidade do uso, por concorrente, de marca capaz de determinar confusão com as próprias, anteriormente registradas, não constitui abuso do poder econômico, ensejador da instauração de processo administrativo perante o CADE, cuja atuação está vinculada à lei ([35]).

Em 29 de outubro do mesmo ano de 1986, foram julgados dois outros processos de interesse do CADE. Em ambos a EMENTA resume o pensamento do Tribunal Federal de Recursos, quanto à competência plena do Poder Judiciário para decidir as questões relativas ao comportamento de mercado. Vale conferir trecho do voto do Relator:

“Não procede a preliminar de que ao Poder Judiciário é vedado o reexame do ato administrativo nos seus fundamentos. Com exceção às condições de conveniência e oportunidade, que pertencem exclusivamente ao arbítrio do administrador, o ato administrativo pode ser revisto pelo Juiz, quer quanto à forma, quer quanto ao fundo, se dele resultou qualquer prejuízo ao jurisdicionado, uma vez que o exame da legalidade não é apreciação de superfície.

A legalidade alcança o mérito, de acordo com o que ficou decidido pelo Egrégio Tribunal Federal de Recursos: ‘Pode o Poder Judiciário examinar a fundamentação do ato administrativo e, diante da insubsistência dele, invalidá-lo. O Poder Judiciário não transborda de suas funções específicas quando confere a veracidade e a qualificação legal dos motivos do ato administrativo.  Apurado que os motivos não existem ou não se ajustam à lei, o ato não pode subsistir. (Revista do Tribunal Federal de Recursos, nº 46, Págs. 147/148)” ([36]).

A EMENTA deste acórdão merece referência, tendo em vista seu conteúdo:

“As decisões do CADE, embora tenham caráter parajudicial, não passam de ato administrativo, encontrando-se sujeitas, portanto, a controle judicial.

O Poder Judiciário não transborda de suas funções quando confere a veracidade e a qualificação legal dos motivos do ato administrativo.

Caso em que não se pode ter por configuradas as infrações enumeradas no aludido ato. ([37]).

O caminho jurisprudencial percorrido já na vigência da Lei nº 8.884, de 1994, revela uma mudança do pensamento. Em decisão proferida em 8 de janeiro de 1997, no caso GERDAU, o Juiz Federal Hamilton de Sá Dantas reconhece a novidade da matéria que lhe foi submetida a julgamento, bem como a contribuição doutrinária aportada pelos Advogados do processo.

Destaco um trecho do relatório apresentado, em que se percebe que o Magistrado reconhece estar diante de uma matéria jurídico-econômica nova e inovadora. Os negritos não constam do original, mas os acrescento para chamar a atenção sobre a percepção jurisprudencial de uma novidade no contexto jurídico. No relatório consta:

“A incorporação em tela, que no jargão técnico do CADE se denomina ATO DE CONCENTRAÇÃO, foi apurada, segundo ainda informa, em regular processo administrativo…

“Devo inicialmente registrar o valioso concurso dos representes judiciais da Procuradoria-Geral do CADE e da Procuradoria Regional da República, que, desde o ajuizamento desta ação diversa de obrigação de fazer até a última manifestação, contendo a ratificação da desistência deste feito, muito me transmitiram com os seus diligentes e inteligentes argumentos e ensinamentos, bem como com a literatura jurídica que aqui apresentaram. Revelaram-se verdadeiros cultores do Direito Público.

A matéria aqui tratada é nova e se originou de uma incorporação catalisadora de mercado, de natureza oligopólica, envolvendo um ato de concentração que redundou na alteração da estrutura do mercado na produção de aços longos comuns. É o noticiado nos autos.

…………………………

A interpretação da Lei nº 8.884/94 há que ser conduzida com uma certa elasticidade e adaptabilidade aos tempos atuais, abrindo-se o mercado nacional, mas ao mesmo tempo, também mantendo-se os seus instrumentos e mecanismos essenciais de defesa. O bom equilíbrio dessa política de convivência comercial e industrial é que representará um desafiante capítulo da história da humanidade no próximo milênio. A compatibilidade do direito comunitário com os sistemas jurídicos internos de cada nação, merecerá, igualmente, destacado papel nesse futuro de economia globalizada” ([38]).

A partir de 1994, com a promulgação da Lei nº 8.884 de 11 de junho daquele ano, o quadro do desenvolvimento econômico do Brasil se ampliou e se reforçou de forma pujante. A experiência judicante do CADE se projetou extraordinariamente. A legislação adotada passou a exigir uma reforma para adequação aos novos tempos. Surgiu, assim, após longo e frutífero período de discussão, a Lei 12.529, em 30 de novembro de 2011.

Paralelamente a esta projeção e repercussão das decisões proferidas pelo Tribunal do CADE, o Poder Judiciário passa a sentir a exigência de uma especialização. O Conselho da Justiça Federal, através da Resolução nº CJF-RES-2017/00445, de 7 de junho de 2017, reconhece a necessidade da criação de Varas Especializadas em matéria concorrencial. E recomenda que “os tribunais regionais federais, na área de sua jurisdição, especializem varas federais com competência concorrente para processar e julgar feitos que versem sobre Direito da Concorrência e Comércio Internacional”.

O ADVENTO DE UMA MAGISTRATURA ECONÔMICA

A exigência de uma magistratura econômica, sua incorporação nas decisões do CADE, provocaram um pronunciamento importante do Supremo Tribunal Federal.

O reconhecimento da impossibilidade de o Judiciário adentrar o mérito de decisões técnicas do CADE, veio através de decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com o voto do Juiz Federal (convocado) Marcelo Dolzany da Costa:

“A meu convencimento, ainda que a sentença invocasse o princípio da razoabilidade ou proporcionalidade como fundamento de análise dos motivos determinantes da sanção imposta às autoras-apeladas, tal premissa seria descabida aos moldes em que o legislador privativamente atribuiu ao CADE como órgão regulador e fiscalizador da atividade econômica (art . 7º, II, da Lei 8.884/94). Atribuir qualificação diversa a fatos incontroversos – no caso a atuação das autoras e de seu sindicato na repressão à entrada de novo distribuidor no mercado varejista de combustíveis com prejuízo à livre concorrência – é negar o juízo de valor que o legislador incumbiu a um órgão de composição plural e de conhecimentos técnicos sobre a matéria. Estivesse o juiz examinando a vulneração de qualquer outro requisito do ato (competência, finalidade, forma, objeto, motivação), certamente que admissível o controle judicial”.

Em 28 de maio de 2019, o Supremo Tribunal Federal, por voto do Ministro Luiz Fux, ratificou o entendimento do Tribunal Regional Federal, e contribuiu com uma mudança fundamental na jurisprudência, na importância do Direito da Concorrência e na relevância da atuação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE – para o ordenamento jurídico brasileiro.

EMENTA

“1. A capacidade institucional na seara regulatória, a qual atrai controvérsias de natureza acentuadamente complexa, que demandam tratamento especializado e qualificado, revela a reduzida expertise do Judiciário para o controle jurisdicional das escolhas políticas e técnicas subjacentes à regulação econômica, bem como de seus efeitos sistêmicos.

  1. O dever de deferência do Judiciário às decisões técnicas adotadas por entidades reguladoras repousa na (i) falta de expertise e capacidade institucional de tribunais para decidir sobre intervenções regulatórias, que envolvem questões policêntricas e prognósticos especializados e (ii) possibilidade de a revisão judicial ensejar efeitos sistêmicos nocivos à coerência e dinâmica regulatória administrativa.
  2. A natureza prospectiva e multipolar das questões regulatórias se diferencia das demandas comumente enfrentadas pelo Judiciário, mercê da própria lógica inerente ao processo judicial.
  3. A Administração Pública ostenta maior capacidade para avaliar elementos fáticos e econômicos ínsitos à regulação. Consoante o escólio doutrinário de Adrian Vermeule, o Judiciário não é a autoridade mais apta para decidir questões policêntricas de efeitos acentuadamente complexos (VERMEULE, Adrian. Judging under uncertainty: An institutional theory of legal interpretation. Cambridge: Harvard University Press, 2006, p. 248–251).
  4. A intervenção judicial desproporcional no âmbito regulatório pode ensejar consequências negativas às iniciativas da Administração Pública. Em perspectiva pragmática, a invasão judicial ao mérito administrativo pode comprometer a unidade e coerência da política regulatória, desaguando em uma paralisia de efeitos sistêmicos acentuadamente negativos.
  5. A expertise técnica e a capacidade institucional do CADE em questões de regulação econômica demanda uma postura deferente do Poder Judiciário ao mérito das decisões proferidas pela Autarquia. O controle jurisdicional deve cingir-se ao exame da legalidade ou abusividade dos atos administrativos, consoante a firme jurisprudência desta Suprema Corte. ([39]).

A esta atitude de descrença na capacidade do Poder Judiciário para enfrentar os problemas que a atualidade nos põe, num contexto de economia de mercado e de concorrência global, contraponho alguns argumentos que entendo válidos. Creio ser importante salientar o confronto entre a decisão do Supremo Tribunal Federal e a DIRETIVA 2019/1023 da União Europeia.

Em artigo publicado recentemente afirmei que “não creio seja razoável ver na figura do juiz-econômico um simples deferente ou admirador da expertise revelada pelas agências” ([40]). Sabemos que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica reúne especialistas na área de Direito da Concorrência, e que são detentores de uma expertise patente.

A Diretiva nº 2019/1023 da Comissão Europeia no “considerando” nº 85 preceitua:

“… Por último, atendendo aos mecanismos de cooperação reforçada entre os órgãos jurisdicionais e os profissionais nos processos transfronteiriços, criados ao abrigo do Regulamento (EU) 2015/848, o profissionalismo de todos os intervenientes tem de atingir níveis elevados e comparáveis em toda a União. Para realizar esses objetivos, os Estados-Membros deverão assegurar que os membros das autoridades judiciais e administrativas que tratam de processos relativos à reestruturação preventiva, à insolvência e ao perdão de dívidas tenham formação adequada e possuam os conhecimentos especializados necessários ao exercício das suas responsabilidades. Essa formação e esses conhecimentos especializados poderão igualmente ser adquiridos durante o exercício das funções enquanto membros das autoridades judiciais ou administrativas ou, antes da nomeação para o exercício dessas funções, durante o exercício de outras funções pertinentes”.

É importante salientar que “deferência” significa “atenção, respeito, consideração, condescendência”, mas nunca submissão, menos ainda renúncia ao dever constitucional de decidir todas as questões que forem submetidas ao Poder Judiciário em consonância com a ordem imposta pelo artigo 5°, inciso XXXV da Constituição Federal.

Em nenhum dispositivo constitucional está expresso que as decisões dos Entes de regulação transitem em julgado.

Aliás, este entendimento está em consonância com o disposto no § 2º do artigo 9º da Lei nº 12.529, de 2011, que diz:

  • 2º As decisões do Tribunal não comportam revisão no âmbito do Poder Executivo, promovendo-se, de imediato, sua execução e comunicando-se, em seguida, ao Ministério Público, para as demais medidas legais cabíveis no âmbito de suas atribuições.

Grifei o texto para salientar que o Legislador, se quisesse dar à decisão do CADE o efeito de trânsito em julgado, teria escrito: “as decisões do Tribunal não comportam revisão (sic et simpliciter). Mas o Legislador restringiu: “não comportam revisão no âmbito do Poder Executivo”. Fica claro que o legislador tinha em mente o teor o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal que estabelece:

“A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Este posicionamento do Supremo Tribunal Federal, que reconhece a “reduzida expertise do Judiciário”, deve ser entendido como uma homenagem e reconhecimento ao desempenho do CADE, mas também como um desafio, que incita seus integrantes ao dever constitucional de adquirir aquela expertise.

A Diretiva nº 2019/1023, acima citada, deixa evidente que a disruptiva evolução econômica exige dos cultores e dos aplicadores do Direito em todas as áreas uma constante atualização, para atender aos reclamos da realidade pós-moderna que tanto se impõe e se almeja. O item 85 da Diretiva exige que os membros da autoridade judicial tenham formação adequada, ou se não a têm, que a adquiram durante o exercício de suas funções.

A consequência desse entendimento é que todos temos o dever de nos atualizar e de compreender que vivemos o Direito Econômico do Século XXI. Em livro recente, editado pela Librairie Générale de Droit et Jurisprudence, sob a coordenação de Jean-Baptiste Racine, evidencia-se a necessidade de uma atualização constante na área do Direito, e principalmente do Direito da Concorrência ([41]).

Há que levar em conta a exigência constitucional de notável saber jurídico, constante do artigo 101 da Constituição Federal, e do artigo 2º da Lei Complementar nº 35, de 14 de março de 1979, que tem uma perspectiva dinâmica. E é também a própria Constituição Federal que inclui, desde 1988, esta exigência de atualização, verbis:

“Art. 93 – Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

IV – previsão de cursos oficiais de preparação e aperfeiçoamento de magistrados como requisitos para ingresso e promoção na carreira.”

Este texto da Lei Complementar evidencia que o notável saber jurídico exigido pela Constituição, tem duas perspectivas: uma relativa ao presente e outra ao futuro. O notável saber jurídico deve ser prospectivo e dinâmico.

Dando concretude a esta necessidade imperiosa de modernização, a Escola Nacional da Magistratura, sob coordenação do Desembargador Caetano Levi Lopes, realizou em 2021 dois Seminários sobre Análise Econômica do Direito.

A Escola Nacional da Magistratura (ENM) lançou o ciclo de palestras com Grandes Juristas Mundiais no dia 17 junho de 2021. Nesta ocasião, o Presidente do Supremo Tribunal de Federal (STF), Luiz Fux abordou o tema “A influência da análise econômica do Direito” nas decisões a serem proferidas pelos Magistrados.

Outros juristas renomados participaram do ciclo de palestras. Em 2 de julho de 2021, o ministro da Suprema Corte chilena, Justice Rodrigo Delaveau abordou o tema “Pragmatismo, Análise Econômica do Direito e Economia Comportamental na Jurisprudência da Corte Constitucional do Chile”.

Reforçando esta necessidade absoluta de atualização, o CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, com a Resolução nº 423, de 5 de outubro de 2021, dá um passo fundamental para a exigência de atualização dos Magistrados. Considerando a unicidade do Poder Judiciário, considerando a crescente interdisciplinaridade que é exigida dos magistrados na atuação jurisdicional e levando em conta a transformação pela qual passa a humanidade, dispõe a Resolução que passam a ser exigidas dos candidatos à Magistratura questões relativas ao Direito Digital, à Análise Econômica do Direito, à Racionalidade Econômica com sua repercussão na Eficiência processual. Passam a ser exigidas noções gerais de contratos inteligentes, de blockchain, de algoritmos. Exige-se o domínio da proteção de dados pessoais, com conhecimento específico da Lei Geral de Proteção de Dados.

Releva observar que o estudo destes novos temas exige um conhecimento atualizado do Direito norte-americano e do Direito europeu. A interdisciplinaridade no Direito tem forçosamente uma perspectiva de internacionalidade, de globalização e de inovação.

Ou seja, passa-se a exigir da Magistratura que se insira no contexto humanístico e substancial do Direito moderno, superando as meras preocupações processuais e formais.

Aliando-se a este pensamento, o IBRAC se lança nesta mesma linha de pensamento e ação: “… a tecnologia e os mercados digitais vêm remodelando a realidade há já algum tempo, e impondo questionamentos essenciais às autoridades de concorrência, às empresas, aos advogados e economistas, e para a Academia em todo o mundo…”([42]).

INDEPENDÊNCIA DO JUDICIÁRIO

Por outro lado, as garantias constitucionais da Magistratura (art. 95 C.F.) são de tal ordem a assegurar grau de independência que não é outorgado aos membros do Tribunal do CADE, especificamente a possibilidade de não ter a renovação de seu mandato. Como consta do § 1º do artigo 6º da Lei nº 12.529, de 2011:

“O mandato do Presidente e dos Conselheiros é de 4 (quatro) anos, não coincidentes, vedada a recondução”.

Chama a atenção o fato de a decisão do Supremo Tribunal Federal arrimar-se na jurisprudência e na doutrina dos Estados Unidos. A título de exemplo, para reforçar esta necessidade de o Judiciário adentrar o mérito das questões de concorrência no mercado, me permito citar decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos envolvendo três gigantes do mercado americano: Apple, Microsoft, American Express:

Apple Inc. v. Pepper et alii. Certiorari to the United States Court of Appeals for the Ninth circuit. – Nº 17-204. Argued Novembeer 26, 2018 – Decided May 13, 2019.

Ohio v. American Express Co. – 138 S. Ct. 22744 – argued February 26, 2018. Decided June 25, 2018.

United States of America (Plaintiff) v. Microsoft Corporation (Defendant). Civil Action Nº 98-1232(TPJ). November 1, 2002.

O fato de o Supremo Tribunal Federal invocar a doutrina e decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos deixa no ar a pergunta: por que será que a Suprema Corte dos Estados Unidos examina o mérito de questões de concorrência, sobrepondo-se às decisões proferidas pela Federal Trade Commission, e o Supremo Tribunal deve limitar seu pronunciamento à observância de formalidades legais?

No direito europeu, os tribunais vêm desde muito tempo pronunciando-se sobre o mérito das questões que envolvem o Direito da Concorrência, não se limitando à análise formal das decisões proferidas pela Comissão de Concorrência.

Menciono somente um caso recente, decidido pelo Tribunal Geral em 10 de novembro de 2021, e publicado em 2 de dezembro de 2021. Trata-se do Processo T-612/17, em que a Google LLC e Alphabet Inc. foram condenadas. Como se comprova pelo texto da  Ementa, o Tribunal adentrou todas as questões de mérito, não se limitando à análise de formalidades legais:

Na decisão desse processo o Tribunal europeu reconhece sua competência plena para apreciar questões de Direito da Concorrência, como se vê pelas afirmações contidas nos itens 605 e 658  da decisão proferida em 10 de novembro de 2021, e publicada em 2 de dezembro de 2021:

Apreciação do Tribunal

605 – A título liminar, convém lembrar que o Tribunal dispõe de uma competência de plena jurisdição tratando-se das sanções pecuniárias infligidas pela comissão por uma infração aos artigos 101 e 102 do TFUE, fundada, em aplicação do artigo 261 TFUE, sobre o artigo 31 do regulamento nº 1/2003. Para além do simples controle de legalidade, que não permite senão rejeitar o recursos em anulação ou anular o ato atacado, esta competência de plena jurisdição habilita o Tribunal a reformar o ato atacado, mesmo em ausência de anulação, levando em conta todas as circunstâncias de fato, a fim de, por exemplo, modificar o montante da penalidade, tanto para reduzir este montante como para aumentá-lo (decisão de 3 de setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Commission, C‑534/07 P, EU:C:2009:505, item 86; ver igualmente neste sentido, decisões de 3 de dezembro de 1957, ALMA/Haute Autorité, 8/56, EU:C:1957:12, p. 191, e de 8 de fevereiro de 2007, Groupe Danone/Commission, C‑3/06 P, EU:C:2007:88, itens 60 a 63). Nestas condições, o Tribunal pode, quando for o caso, sustentar apreciações diferentes daquelas adotadas pela Comissão na decisão atacada naquilo que concerna à sanção pecuniária infligida à Google.

E no item 658 o Tribunal reforça o seu entendimento sobre a plenitude de sua competência, quer quanto ao aspecto formal, quer quanto ao material:

“Antes de se pronunciar sobre os argumentos das partes, o Tribunal lembra que ele dispõe de uma competência de plena jurisdição nas condições expostas no item 605 acima”.

Ratificando este posicionamento, o Tribunal Geral da União Europeia, em decisão de 26 de janeiro de 2022, anula parcialmente decisão da Comissão Europeia, realizando, em seus 537 parágrafos, uma detalhada avaliação dos fatos e dos fundamentos legais que deveriam ter sido objeto de análise da decisão da Comissão ([43]).

NECESSIDADE DE UM DIÁLOGO

A vertiginosa evolução do mundo moderno, que chega a impedir-nos uma atualização, mas nos impõe uma corrida sem freios em busca de acompanhar a ruptura constante dos conceitos firmados, deixa-nos absolutamente convictos de que ninguém é detentor de uma expertise. Todos estamos firmemente convencidos de que temos que aprender quotidianamente. Como expus em artigo publicado em 2021, ouso fazer uma pergunta: não seria interessante dialogar, para comunicar expertises?

         Permito-me repetir o pensamento já exposto, e a proposta formulada no artigo Magistratura e Direito Econômico, referido acima ([44]). Ali afirmei que o Judiciário tem necessidade de ter a expertise que o mundo da tecnologia atual exige. Não basta dizer que não tem expertise. Creio ser interessante adotar uma postura prospectiva, mais consentânea com o Direito Econômico. O erudito acórdão do Ministro Fux me instigou a reler na íntegra o mencionado artigo do Professor Richard Allen POSNER, que em 11 de janeiro de 2022 completou 83 anos.

Permito-me, por isso mesmo, fazer algumas ponderações. A primeira observação é que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, não é uma agência, mas um Tribunal Administrativo, com uma expertise própria para apreciar os questionamentos propostos pela nova realidade mundial. A segunda se refere a um questionamento fundamental à atuação das agências reguladoras, no sentido de que elas estão vinculadas a interesses de grupos. É a questão da “captura”. Vamos às palavras de Posner:

“… As agências estão sujeitas a bem mais intensas pressões de interesse de grupo do que as cortes. Os dirigentes de agências são indicados políticos e seu trabalho é proximamente monitorado pelas comissões do Congresso. O fato de que os membros das agências são especializados, e de que eles são menos insulados do processo político do que os juízes, faz deles alvos para influência de grupos de interesse especial; daí o termo “captura regulatória…” ([45])

Este artigo foi publicado em 2010. O seu pensamento se mantém hoje, como o demonstra a 9ª edição de sua“Economic Analysis of Law”, de 2014, em que se desdobra ainda com maior profundidade sobre o tema, insistindo sobre a ideia de que agências e tribunais estão numa relação de complementaridade:

“… E também, um sistema puro de uma ou outra espécie (agência ou tribunal) sacrifica complementaridades, porque tribunais e agências são complementos bem como substitutos. A ação da agência sujeita à revisão judicial mistura perspectivas especialistas com generalistas e uma política direcionada pela missão com a sensitividade aos fatores da regra de direito. Um sistema misto, como acima mencionado, explora complementaridades entre agências e tribunais. Os juízes ao sentenciar afinam as decisões com as orientações (“guidelines”). Os juízes de antitruste afinam com o Departamento de Justiça (DOJ) ou com as orientações (“guidelines”) da FTC…” ([46]).

Esta ideia de uma atuação mista já foi objeto de estudo de dissertação de mestrado na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, defendida por Paulo Márcio Reis Santos:

“A atuação conjunta do Cade e do Judiciário integra a política pública de promoção da concorrência, contribuindo para a eficácia da legislação….Diante das especificidades das questões econômicas, que geralmente não têm sido objeto de estudo nas faculdades de Direito e não costumam ser relacionadas nos concursos públicos para ingresso na magistratura, é de suma importância que o judiciário tenha o auxílio de órgãos estruturados, que tenham o conhecimento da matéria econômica” ([47]).

Dizer que a atuação do Poder Judiciário deve cingir-se ao exame da legalidade ou abusividade dos atos administrativos, consoante a firme jurisprudência desta Suprema Corte” pode encerrar uma contradição. Cingir-se ao controle da legalidade seria limitar-se ao puro formalismo, que é justamente combatido por Posner em seu artigo. Por outro lado, examinar a “abusividade” já seria adentrar matéria relativa à conduta das partes e à realidade fática, ao mérito da questão decidida pelo CADE, o que estaria sendo obstaculizado pelo entendimento já sumulado pelo STF ([48])..

A sequência do artigo de Posner me provocou a curiosidade sobre a possibilidade de um “diálogo entre as Autoridades”. Embora reconhecendo pontos negativos numa complementaridade entre as Agências e os Magistrados, Posner acentua os efeitos de maior eficiência, de maior isenção e maior segurança jurídica nesse diálogo. É o que se deduz de suas próprias palavras:

“Um sistema misto, como mencionado, explora complementaridades entre agências e tribunais. Ao sentenciar, os juízes afinam suas sentenças com as orientações; os juízes de antitruste afinam com as orientações da FTC (Federal Trade Commission)… Um sistema misto é também (como sugeri) menos suscetível à captura por interesses de grupos porque em um sistema misto o interesse de grupo tem que “comprar” tanto a agência quanto os tribunais…. O sistema misto também proporciona um reforço ou uma potencialidade regulatória isenta de erro ([49]).

A turbulência gerada pelos fenômenos econômicos e jurídicos, a necessidade de tanto as agências quanto os tribunais adotarem novas posturas, me leva a um paralelo que, se não é sugestão, é pelo menos uma provocação. O teor das “Propostas de Lei” formuladas pela Comissão Europeia, em 15 de dezembro de 2020 sinaliza na direção de um “diálogo” entre as empresas digitais e a Comissão Europeia ([50]).

Na mesma direção está o pensamento de Marie Anne FRISON-ROCHE. A evolução econômica e jurídica do século XXI nos leva à necessidade de ver uma inter-regulação por parte das agências reguladoras, mas também a uma interpenetração entre a substância-realidade a ser decidida pelas agências reguladoras e pelos tribunais ([51]). Reforço, para concluir, o que acima afirmei, pois não creio seja razoável ver na figura do juiz-econômico um simples deferente ou admirador da expertise revelada pelas agências. Em lugar de os Poderes Públicos se encastelarem no isolamento de suas competências, não seria adequado atender às exigências de globalização, da era digital e de uma inovação constante, concretizando o requisito de eficiência que já consta do artigo 8º do Código de Processo Civil?

Belo Horizonte, 18 de fevereiro de 2022.

 

 

BIBLIOGRAFIA

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(*) Doutor em Direito Econômico pela Faculdade de Direito da UFMG. Licenciado em Letras Neolatinas e Filosofia pela Faculdade Dom Bosco de Filosofia Ciências e Letras de São João del Rei. Professor Titular de Direito Econômico da Faculdade de Direito da UFMG (aposentado). Juiz Federal aposentado. Ex-Juiz do Trabalho. Ex-Conselheiro do CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Professor Honoris Causa da Faculdade de Direito da Universidade de Uberaba – UNIUBE.

[1] A Linguística vem desde Saussure mostrando a diferença e interimplicação entre signo, significado e significante. Cfr. SAUSSURE, Ferdinand de. Cours de Linguistique Générale. Pag. 97-103. Paris, Payot, 2005.

[2] Os tempos primitivos do verbo latino são: “volvo, volvis, volvi, volutum, volvere”. Cf. Novissimo Diccionario Latino-Portuguez. 7ª edição. F. R. dos Santos Saraiva. Paris, H. Garnier,1910.

[3] Musti Domenico. La teoria delle età e i passaggi di status in Solone. Per un inquadramento socioantropologico della teoria dei settennii nel pensiero antico. In: Mélanges de l’Ecole française de Rome. Antiquité, tome 102, n°1. 1990. pp. 11-35.

[4] Πάντα ρει ως ποταμός. Em decisão proferida, em 7 de junho de 2018, no Processo nº TST-E-ED-RR-876-84.2011.5.01.0011, em matéria referente à terceirização no Direito do Trabalho, o Ministro Aloysio Correa da Veiga afirma: “Essa foi a odiosa experiência inicial de terceirização. No entanto, tudo mudou. A vida mudou. O tempo mudou. A tecnologia mudou. A realidade social mudou. O trabalho mudou. E é preciso que encaremos com profundidade esse tipo de relação jurídica”.

[5]  A etimologia nos proporciona um subsídio para melhor entendimento. O verbo grego κρίνω significa “eu julgo”. O substantivo correspondente “κρίσις” significa “julgamento”. A crise é justamente o trabalho intelectual que realizamos em decorrência da mudança disruptiva da realidade.

[6] “El capitalismo es, por naturaleza, una forma o método de transformación económica y no solamente no es jamás estacionario, sino que no puede serlo nunca…. Este proceso de destrucción creadora constituye el dato de hecho esencial del capitalismo (SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo y Democracia, p. 120-121. Trad. José Diaz Garcia, Madrid, Aguilar, 1971).

[7] “… a paz perpétua… não é, pois, uma quimera, mas um problema para o qual o tempo, provavelmente abreviado pela aceleração da marcha progressiva do espírito humano, nos promete a solução” KANT, Immanuel. Essai Philosophique sur la Paix Perpétuelle; Préface de Ch. Lemonnier. Paris, G. Fischbacher, 1880, p. 65. BOFF, Leonardo. Fundamentalismo: a globalização e o futuro da humanidade. Rio de Janeiro: Sextante, 2002. p. 89-90.

[8] Historia vero testis temporum, lux veritatis, vita memoriae, magistra vitae, nuntia vetustatis, qua voce alia nisi oratoris immortalitati commendatur? Tradução: “E a história, este testemunho dos tempos decorridos, esta luz da verdade, esta memória viva, esta mestra da vida, este intérprete do passado, não é a voz do orador que lhe dá a imortalidade? (Cicero, Marcus Tullius. De Oratore, Liv. II, n. IX. Delphi Complete Works of Cicero (Illustrated) (Delphi Ancient Classics Book 23) Delphi Classics. Edição do Kindle. Posição 142828-142830).

[9] The historian and the facts of history are necessary to one another. The historian without his facts is rootless and futile; the facts without their historian are dead and meaningless. My first answer therefore to the question’ What is history ?’ is that it is a continuous process of interaction between the historian and his facts, an unending dialogue between the present and the past (CARR E.H. What is History?, 2nd edition, Middlesex, Pengouin Books, 1987, p. 30). Cf. TOYNBEE, Arnold. Um Estudo da História. Brasília. Editora Universidade de Brasília. São Paulo, Martins Fontes,. 1987. Enfatizar a Décima Primeira Parte: Por que estudar história. p. 499-521.

[10] Tradução livre: “History shows that it took generations for Western societies to develop effective responses to the dislocations and abuses associated with the Industrial Revolution of the eighteenth and nineteenth centuries…. In the same way, it will trake time for contemporary societies to figure out what they need to do to respond appropriately to the shifts in economic, social, and political power being generated by the platform revolution…”  PARKER, Geoffrey G. et alii. Platform Revolution – How networked markets are transforming the economy and how to make them work for you. New York, W.W. Norton Company. KINDLE, pág. 287 de 336.

[11] “The evolution strategy, which offers consumers an easy migration path, centers on reducing switching costs so that consumers can gradually try your new technology…”SHAPIRO, Carl & VARIAN, Hal R. Information Rules: A Strategic Guide to the Network Economy. Kindle, pág 184.

[12] “The revolution strategy involves brute force: offer a product so much better than what people are using, that enough users will bear the pain of switching to it…” SHAPIRO, Carl & VARIAN, Hal R. Information Rules: A Strategic Guide to the Network Economy. Kindle. Pág. 188.

[13] Ver a exposição de Adam Smith enfatizando o “fair play” entre concorrentes. SMITH, Adam.The Theory o Moral Sentiments. P. 82-83. [1759]. O competidor que agride seu concorrente comete “a violation of fair play” que os expectadores não podem admitir. (The Theory of Moral Sentiments . Indianapolis, Edwards Brothers, 1982.

[14] Ressalvo que os grifos não estão no texto original, mas os aponho para salientar os conceitos de mercado.

[15] ARISTÓTELES, A Política. Livro I, Capítulo IV, §§ 5.º e 6º. Tradução de Torrireri Guimarães. São Paulo, Hemus Livraria Editora Ltda. 1966. 275p. Cf. também ARISTÓTELES, OBRAS, Política, Libro I, Capítulo IV, 1258b/1259a. Madrid, Aguilar, 1977. 1634p. O episódio histórico narrado por Aristóteles serviu de fundamento para a análise comparativa feita por NILS WAHL em seu Parecer no Processo C-177/ 16, em 6 de abril de 2017. O parecer foi transformado em artigo: NILS WAHL, From Greek Olive Oil to Latvian Music: Is There Any Such Thing as Unfair Prices? in DOUGLAS H. GINSBURG – An Antitrust Professor on the Bench – Liber Amicorum  – Volume I. P. 477-494. New York, Concurrences, 2018, 494p.

[16] Ibidem, 1259a

[17] TRADUÇÃO LIVRE: “… When you chance to be in the greatest need of corn they heap it up and refuse to sell that we may not dispute about the price, but may think ourselves lucky if we manage to buy from them at any price whatever. So although there is peace we are besieged by these men….I think, gentlemen of the jury, that it is plain to all, that cases against these men are of the most general interest to those in the city, so that they will learn what mind you have about them; for they will think if you condemn them that they must be more careful in future….. Remember that many in this business have been tried for their life. And so great are their profits from it that they prefer to run in danger of their life every day than to stop getting unlawful gain from you. If they beseech you and entreat you, you should not justly pity them, but rather have compassion on the citizens who have been dying with hunger on account of their knavery, and the merchants against whom they combined.   (…) But if not, what opinion do you think they will have when they learn that you let off the retail dealers who themselves confess to plotting against the merchants?  (…) If you condemn them you will do what is just and make corn cheaper; if you acquit them you make it dearer. (The Orations of Lysias. A public Domain Book., XXII. The Grain Dealers. Kindle).

[18] “The active reign of Elizabeth had enabled many persons to distinguish themselves in civil and military employments; and the queen, who was not able, from her revenue, to give them any rewards proportioned to their services, had made use of an expedient, which had been employed by her predecessors, but which had never been carried to show an extreme as under her administrations. She granted her servants and courtiers patents for monopolies; and these patents they sold to others, who were thereby enabled to raise commodities to what price they pleased, and who put invincible restraints upon all commerce, industry, and emulation in the arts. It is astonishing to consider the number and importance of those commodities, which were thus assigned over to patentees…. ….These are but a part of the commodities, which had been appropriated to monopolists. When this list was read in the house, a member cried, Is not bread in the number? Bread, said everyone with astonishment: Yes, I assure you, replied he, if affairs go on at this rate, we shall have bread reduced to a monopoly before next parliament…” (HUME, David. The History of England from the Invasion of Julius Caesar to The Revolution in 1688. Volume IV, p. 344-345. Based on the Edition of 1778, with the Author’s Last Corrections and Improvements. Indianapolis, Liberty Fund, 1983 (os grifos não estão no original).

[19]  ROCHA POMBO, José Francisco da. História do Brazil. (Ilustrada). P. 124-137, s/d.

[20] DANA, William F. “Monopoly” under the National Anti-Trust Act. Harvard Law Review, p. 341. Vol. 7. Nº 6 (Jan. 25, 1894), pp. 338-355.

[21] “The “monopolies ” here described were nothing more than royal patents; and restriction of competition under them was effected, not by the act of the individual, but by the exclusive character of the grant. The question of the legality of such licenses first arose, in 16o2, in the case of Darcy v. Allen, ii Co. 84; Noy, 173; Moore, 673; 8 Co. 125. The plaintiff in this case had received a patent which gave him the exclusive privilege for twenty-one years of manufacturing playing-cards. This right was infringed by the defendant, and the plaintiff brought a suit for damages. The defendant set up the illegality of the plaintiff’s patent. The grant was declared void for the following reasons: – ” (i) All trades, as well mechanical as others, which prevent idleness (the bane of the Commonwealth), and exercise men and youth in labor, for the maintenance of themselves and their families, and for the increase of their substance, to serve the queen when occasion shall require, are profitable for the Commonwealth; and therefore the grant to the plaintiff to have the sole making of them is against the common law, and the benefit and liberty of the subject. ” (2) The sole trade of any mechanical artifice, or any other monopoly, is not only a damage and prejudice to those who exercise the same trade, but also to all other subjects; for the end of all these monopolies is for the private gain of the patentees. ” (3) The queen was deceived in her grant; for the queen, as by the preamble appears, intended it to be for the weal public, and it will be employed for the private gain of the patentee, and for the prejudice of the weal public. “(4) This grant is primae impressionis, for no such was ever seen to pass by letters patents under the great seal before these days, and therefore it is a dangerous innovation, as well without any precedent or example as without authority of law or reason.(Id. Ibid., p. 341).

[22] DANA, William F. “Monopoly” under the National Anti-Trust Act, Harvard Law Review, Vol. 7, Nº 6 (Jan. 25, 1894), pp. 338-355.

[23] “Most competition laws are pretty vague. The Sherman Act (1890) makes it illegal to ‘monopolize’ a market. The Clayton Act (1914) prevents mergers likely to ‘substantially lessen competition’. FCC regulations refer to the ‘public interest’. To make sense of these laws, and the ways they are enforced, we need to consider the philosophy behind them” (SHAPIRO, Carl & VARIAN Hal R. Information Rules – A Strategic Guide to the Network Economy. Kindle, 1999. p. 284).

[24] Conservo a redação original do Decreto, acrescentando o negrito, com a finalidade de realçar mais uma vez a vinculação com o direito norte-americano.

[25] TARBELL, Ida M. The History of the Standard Oil Company. Briefer version edited by David M. Chalmers. Kindle edition. 2003.

[26] “Naturally the first use made of the oil obtained in quantities from the salt wells was medicinal. By the middle or the century it was without doubt the great American medicine. “Seneca Oil” seems to have been the earliest name under which petroleum appeared in the East.” (Ob. Cit., página 2 de 227).

[27] “Il n’est plus question de vaines paroles, mais d’un acte, d’un acte hardi, d’un acte constructif. … L’Europe naîtra de tout cela, une Europe solidement unie et fortement charpentée. Une Europe où le niveau de vie s’élèvera grâce au groupement des productions et à l’extension des marchés qui provoqueront l’abaissement des prix….. La paix mondiale ne saurait être sauvegardée sans des efforts créateurs à la mesure des dangers qui la menacent… (Fondation Robert Schuman, Journée de l’Europe. Question d’Europe, nº 204. 9 mai 2011).

[28]  GERBER, David J. Chinese Competition Law in the World. In Wang Xiaoye – The Pioneer of Competition Law in China – Liber Amicorum.  P. 255New York, Concurrences, 2019.

[29]  Today, the Commission has adopted a decision prohibiting a merger that would combine two leading global shipbuilding companies.The merger concerns the acquisition by Hyundai Heavy Industries Holding of Daewoo Shipbuilding and Marine Engineering. They are both very strong players in the market for the construction of large vessels transporting liquefied natural gas – so-called LNG. These are highly sophisticated vessels transporting LNG at minus 162 degrees. Only a handful of shipbuilders around the world are able to build these vessels.The merger would have created a dominant position in the market for the construction of large LNG carriers. This would have led to less choice, higher prices and ultimately less innovation for European customers. The companies did not submit any formal remedies to offset the negative effects of the acquisition As a result, the merger could not be approved.(European Commission – Speech (Check Against Delivery). Remarks by Executive Vice-President Vestager on the Commission decision to prohibit the proposed acquisition of Daewoo Shipbuilding & Marine Engineering by Hyundai Heavy Industries Holdings. Brussels, 13 January 2022).

[30] Ver “Delmiro Gouveia – Uma fábrica no sertão. https://www.brasiloeste.com.br/noticia/729/ acessado em 04/09/2006

[31]. Benjamin Shieber elabora um histórico bastante detalhado da tramitação desse projeto no Congresso. Cf. Abusos do Poder Econômico, 1966, pp. 9-19. Ver também Nelson de Azevedo Branco e Celso de Albuquerque Barreto, Repressão ao abuso do poder econômico – Lei antitruste, 1964, pp. 51-54. Cfr. BRANCO, Nelson de Azevedo & BARRETO, Celso de Albuquerrque. Abusos de Poder Econômico: Direito e Experiência Antitruste no Brasil e nos E.U.A.. São Paulo Atlas, 1964, 193p.

[32]. Abuso de Poder Econômico, Revista Forense, agosto de 1949, p. 604. O negrito não consta do texto original, mas é importante que desde o surgimento do Direito da Concorrência está presente a influência do direito norte-americano.

[33] Lei nº 1.522, de 26 de dezembro de 1951.

[34]  Lei Delegada nº 5, de 26 de setembro de 1962. A Medida Provisória nº 1.576, de 3 de julho de 1997, autorizava o Presidente da República a extinguir a SUNAB, o que se efetivou pelo Decreto nº 2.280, de 24 de julho de 1997, e definitivamente pela Lei 9.618, de 9 de abril de 1998. A Medida Provisória nº 881, de 30 de abril de 2019, e a Lei de Liberdade Econômica – Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, revogaram a Lei Delegada nº 4, e por via de consequência a Lei Delegada nº 5.

[35] Tribunal Federal de Recursos. Apelação em Mandado de Segurança nº 90565/RJ. Apelada: KIBON S/A. Indústria Alimentícias. Relator o Sr. Ministro Dias Trindade. Julgamento em 14 de outubro de 1986. DJU de 27.11.1986, p. 23.321. Devo consignar a valiosa colaboração do Dr. Edson Alves Lacerda, Chefe da Seção de Documentação Judiciária do Superior Tribunal de Justiça, que me propiciou acesso à íntegra dos acórdãos de que me valho.

[36]  O negrito não consta do texto original. Foi introduzido por mim com finalidade comparativa com a decisão do STF adiante referida.

[37] Apelação Cível nº 56.282/SP. Apelada, Cia. Goodyear do Brasil Produtos de Borracha.  Apelação Cível nº 56.338/SP. Apelada, Indústria de Pneumáticos Firestone S/A. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Ambos julgados em 29 de outubro de 1986.

[38] Justiça Federal. Seção Judiciária do Distrito Federal. Sentença nº 002/97. Processo nº 96.0020778-0. Classe 04400. Exequente: Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE. Executado: GERDAU Internacional Empreendimentos Ltda. E outros. Juiz Federal: Hamilton de Sá Dantas. Brasília, 08 de janeiro de 1997.

[39] RE 1083955 AgR-ED/DF. Cascol Combustíveis para Veículos Ltda. v. Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE. O negrito na citação DA Ementa não consta dos termos da decisão.

[40]  Magistratura e Direito Econômico, in Avanços do Sistema de Justiça: Os 5 Anos de Vigência do Novo Código de Processo Civil. P. 357-286.Brasília, OAB Editora e Conselho Nacional de Justiça, 2021. A DIRETIVA 2019/1023 se destina especificamente a estabelecer as medidas destinadas a aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas, mas, como já afirmado, o preceito contido no seu item 85 vai além daquele objetivo e pode ser aplicado às questões de Direito da Concorrência.

[41]  RACINE, Jean-Baptiste. “Le Droit Économique au XXIe. Siècle – Notions et Enjeux”. Paris, L.G.D.J., 2020.

[42] Tradução livre de parte do texto: “Technology and digital markets have been reshaping the reality for a while now, and posing essential questions to competition authorities, companies, private lawyers and economists, and the academia all over the world. Should the goals of antitrust be revisited? Should existing competition analysis, tests and tools be redesigned? What could be seized from existing laws, regulation, and precedents? Which mergers are most likely to be challenged in the future, which conducts are most likely to be investigated? What would be the priorities of competition authorities? Would judicial claims increase in Brazil? How would institutional coordination and international cooperation look like in the next years?” (GONÇALVES, Priscila Brolio coord. The Future of Antitrust.  São Paulo, IBRAC – Editora Singular, 2018)

[43] “It follows, therefore, from all of the foregoing considerations that the analysis carried out by the Commission is incomplete and, in any event, does not make it possible to establish to the requisite legal standard that the rebates at issue were capable of having, or were likely to have, anticompetitive effects, which is why the General Court annuls the decision, in so far as it finds that those practices constitute an abuse within the meaning of Article 102 TFEU” (Processo T-286/09 RENV – Intel Corporation v. Commission. General Court of thte European Union – Press Release nº 16/22. Luxembourg, 26 January 2022).

[44] Magistratura e Direito Econômico, in Avanços do Sistema de Justiça: Os 5 Anos de Vigência do Novo Código de Processo Civil. P. 357-286.Brasília, OAB Editora e Conselho Nacional de Justiça, 2021.

[45]. Tradução livre: “Agencies: cons. Agencies are subject to far more intense interest- group pressures than courts. The agency heads are political appointees and their work is closely monitored by congressional committees. The fact that agency members are specialized, and that they are less insulated from the political process than judges are, makes them targets for influence by special- interest groups; hence the term “regulatory capture.” (POSNER, R. A. Regulation (Agencies) versus Litigation (Courts) – An Analytical Framework, in KESSLER, Daniel p. Regulation vs. Litigation: Perspectives from Economics and Law. P. 10-26.Chicago, University of Chicago Press, 2010).

[46]. “… Also, a mixed system, as just mentioned, exploits complementarities between agencies and courts. Sentencing judges fine-tune sentencing guidelines; antitrust judges fine-tune Justice Department or FTC merger guidelines; antitrust judges fine-tune Justice Department or FTC merger guidelines: and judges reviews the rulings of administrative agencies for compliance with statutes and with principles of fair procedure, which are subjects that judges are more familiar with and more scrupulous in giving appropriate weight to than mission-oriented administrators are apt to be. … The mixed system also provides a back-up or fail-safe regulatory capability…” (POSNER, R.A. Economic Analysis of Law. Ninth edition. §24.5. p. 874. New York, Wolters Kluwer, 2014.

[47]. SANTOS, Paulo Márcio R. Direito Econômico Processual – Uma abordagem pela Análise Econômica do Direito. P. 195-196. Belo Horizonte, Universidade FUMEC, 2013.

[48]. Creio ser importante uma visão da etimologia da palavra “abuso”. O prefixo latino “ab” significa afastamento. O “ab-uso” é o afastamento do uso normal. A finalidade do Processo estaria sendo impedida, desviada por uma conduta anti-ética, atentatória das regras da boa-fé e da lealdade. A apuração do “ab-uso” se constitui em matéria fática, que refoge à competência dos Tribunais Superiores.

[49] “A mixed system, as just mentioned, exploits complementarities between agencies and courts. Sentencing judges fine- tune sentencing guidelines; antitrust judges fine- tune Justice Department or FTC merger guidelines; and judges review the rulings of administrative agencies for compliance with statutes and with principles of fair procedure, which are subjects that judges are more familiar with and more scrupulous in giving appropriate weight to than mission- oriented administrators are apt to be. A mixed system is also (as I have suggested) less susceptible to capture by interest groups because in a mixed system the interest group has to “buy” both the agency and the courts. (This is a traditional argument for trial by jury rather than trial by judge: it is harder to bribe twelve “judges” than one.) The mixed system also provides a back- up or fail- safe regulatory capability”.POSNER, R. A. Regulation (Agencies) versus Litigation (Courts) – An Analytical Framework, in KESSLER, Daniel p. Regulation vs. Litigation: Perspectives from Economics and Law. P. 23. Chicago, University of Chicago Press, 2010.

[50] Brussels, 15.12.2020 – COM(2020) 842 final – 2020/0374(COD) – Proposal for a REGULATION OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL on contestable and fair markets in the digital sector (Digital Markets Act) – Brussels, 15.12.2020 COM(2020) 825 final 2020/0361 (COD) Proposal for a REGULATION OF THE EUROPEAN PARLIAMENT AND OF THE COUNCIL on a Single Market For Digital Services (Digital Services Act) and amending Directive 2000/31/EC

[51]. “L’on pouvait précédemment s’en tenir au principe selon lequel la régulation était propre à un secteur, la dimension très technique des régulations conduisant à enfermer celles-ci dans les limites du secteur considéré. Ce confort est désormais interdit par l’entropie des systèmes de régulation, qui se croisent les uns les autres. Cette porosité des secteurs les uns par rapport aux autres, qui va conduire à construire une interrégulation, peut avoir plusieurs sources”.  (FRISON-ROCHE, Marie-Anne. Les nouveaux champs de la regulation, in Revue Française d’Administration Publique, 2004/1. (nº 109), pages 53-63)

 

* Doutor em Direito Econômico pela Faculdade de Direito da UFMG. Licenciado em Letras Neolatinas e Filosofia pela Faculdade Dom Bosco de Filosofia Ciências e Letras de São João del Rei. Professor Titular de Direito Econômico da Faculdade de Direito da UFMG (aposentado). Juiz Federal aposentado. Ex-Juiz do Trabalho. Ex-Conselheiro do CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Professor Honoris Causa da Faculdade de Direito da Universidade de Uberaba – UNIUBE.

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