Do contrário, viver será não mais gritar!!!

Esta semana em Brasília tivemos duas decisões que envolveram os três poderes da República. A primeira foi a votação da PEC que limita decisões individuais em Tribunais e a segunda diz respeito ao veto do Presidente da República ao PL, que trata da prorrogação do prazo para a desoneração da folha de pagamentos em 17 setores da economia brasileira.

Nada está decidido, a PEC ainda vai ser analisada pela Câmara dos Deputados e o veto ainda será apreciado em sessão conjunta pelo Congresso Nacional. Tudo pode acontecer, inclusive nada!!!

Afora a relevância das matérias, o que é interessante notar são as reações dos poderes às interferências dos demais poderes.

A derrubada de veto ao PL da desoneração da folha de pagamentos não significa definitivamente a mesma coisa que a aprovação de uma PEC que visa reduzir os poderes do Poder Judiciário. No primeiro caso, nem todos os parlamentares apoiam a derrubada do veto do Presidente da República (governistas versus não governistas), já no segundo caso não se pode dizer o mesmo.

Não por outro motivo, a reação do Poder Legislativo ao veto do Chefe do Poder Executivo foi política e ocorreu dentro do tão conhecido e desejado sistema de pesos e contrapesos, já a reação do Poder Judiciário nas palavras de alguns Ministros do Corte Suprema do Brasil, embora se refira ao mesmo sistema de pesos e contrapesos, não trata da mesma coisa.

No primeiro caso, tudo ocorre dentro status quo existente entre os Poderes, enquanto no segundo caso, tudo se dá dentro de um novo modus operandi para o sistema de pesos e contrapesos. No primeiro caso, a estrutura de divisão harmônica de Poderes da República   continua como dantes, no segundo caso, essa divisão é alterada.

Portanto, as reações dos atores envolvidos podem e devem ser desproporcionais!!

Ao contrário do que possa parecer, as desproporcionalidades das reações são proporcionais a profundidade da alteração no sistema de pesos e contrapesos existente. A grita parlamentar para a derrubada do veto do Presidente da República é proporcional ao atual sistema, da mesma forma que a grita do Poder Judiciário também deve ser proporcional ao que se espera do novo sistema de pesos e contrapesos.

A relação entre os Poderes da República define o que somos e o que queremos.

Assim como o General Pompeu no poema[1]  de Fernando Pessoa mencionou a frase “navegar é preciso, viver não é preciso” para motivar os seus marinheiros a enfrentar a tempestade e levar trigo para Roma, nos sistemas democráticos também deve-se mencionar “gritar é preciso, viver não é preciso”, pois, do contrário, viver será não mais gritar.


[1] Navegar é preciso, viver não é preciso

Fernando Pessoa

Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:

“Navegar é preciso; viver não é preciso”.

Quero para mim o espírito [d]esta frase,

transformada a forma para a casar como eu sou:

Viver não é necessário; o que é necessário é criar.

Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.

Só quero torná-la grande,

ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;

ainda que para isso tenha de a perder como minha.

Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue

o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir

para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça.

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