Editorial
Aproveitamos a data de hoje, em que será lançado o novo Bolsa Família[1], para trocarmos em miúdos o que deve estar estipulado em um programa de transferência de renda para que ele seja exitoso e, principalmente, qual deve ser o objetivo de programas desta natureza para a sociedade.
Um programa de distribuição de renda bem desenhado deve possuir regras bem definidas tanto para entrar no programa quanto para sair dele. Para isso, o programa deve estar bem focado na classe social que objetiva atingir, deixando bem especificado os direitos e os deveres dos beneficiários (ex. manter os filhos regularmente matriculados e com a carteira de vacinação em dia), e deve apresentar portas de saída para o benefício (ex. renda familiar acima do patamar de renda usado no programa para incluir beneficiários).
Elaborar portas de saída não é algo trivial e, ao contrário do que se imagina pode ser um verdadeiro “tiro no pé”. No caso da renda familiar acima do patamar de renda do programa citado, por exemplo, Medeiros et alii (2007) apontam que, [a]o escolher entre aceitar ou não um novo trabalho, as pessoas levam em consideração, entre outras coisas, o risco de trocar as transferências estáveis do programa por rendas instáveis de um trabalho qualquer. Nessas situações também não seria desejável que ocorresse a cessação dos benefícios, uma vez que regras de interrupção desse tipo podem desestimular a inserção laboral. [Medeiros et ali (2007)].
Então, regras de entrada e portas de saída são condições si ne qua non para o sucesso de programas de transferência de renda. Mas, o que é sucesso nesse caso? O senso comum entende que “sucesso” é retirar as pessoas da miséria no curto prazo, o que não deixa de ser uma verdade nobre destes programas.
No entanto, o objetivo de um programa de transferência de renda é muito mais nobre que isso e o seu efeito é muito mais poderoso na segunda e terceira gerações do que na primeira que recebeu o benefício. A renda para a primeira geração significa alimentação, ensino e saúde para a segunda e terceira gerações. A oportunidade de se alimentar na idade correta da vida e de receber as vacinas para cada faixa etária possibilita a ampliação exponencial do aprendizado das novas gerações. Com mais aprendizado, maiores são as chances de se formar cidadãos qualificados e aptos para o trabalho. Além de melhorar a qualidade de vida das pessoas, cidadãos com mais estudo tem maiores possibilidade de dar produtividade para seu país.
Assim, programas de transferência de renda matam a fome da barriga e da esperança. Alimentam a primeira geração e salvam a segundo e terceiras gerações da pobreza.
[1] De acordo com Medeiros et alli (2007), [o] Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência mensal de renda que surgiu, no final de 2003, a partir da unificação de uma série de programas preexistentes, bastante inspirado pelo programa de renda mínima vinculado à educação, o Bolsa Escola. [Medeiros et alli (2007)].
MEDEIROS, Marcelo; BRITO, Tatiana; SOARES, Fábio. Transferência de Renda no Brasil. Novos estudos CEBRAP (79) • Nov 2007. Disponível em: SciELO – Brasil – Transferência de renda no Brasil Transferência de renda no Brasil. Acesso em 02 de março de 2023.