É preciso deixar claro que a vacinação é uma questão econômica.
Editorial
Na segunda feira, dia 27.02.2023, o Brasil iniciou formalmente a vacinação da vacina bivalente contra a covid-19. Nada demais para um pais que é reconhecido internacionalmente pela sua expertise em imunização ou, pelo menos, que era até recentemente, não fossem as dificuldades observadas nos períodos mais críticos da pandemia da Covid-19.
Aqui não se trata de fazer defesa deste ou daquele governo ou mesmo de se fazer defesa apaixonada pela vacinação ou não. Aqui, o que se deseja é apresentar o que diz a literatura econômica a respeito dos benefícios da imunização de massa das populações, de maneira a refletir se essa é uma questão ideológica ou de bem-estar das sociedades.
Aqui também não se quer desconsiderar a difícil escolha que países em desenvolvimento como o Brasil tem que fazer entre as políticas de imunização e as demais políticas públicas, haja vista que os recursos orçamentários são limitados[1]. Não é por outro motivo que os gestores de orçamento e os tomadores de decisão responsáveis por adicionar programas de vacinação em países de renda alta, média e baixa estão solicitando análises econômicas de novos programas de vacinação para ajudar a alocar recursos escassos no contexto de restrições orçamentárias. Essas análises econômicas incluem não apenas impactos de custo, mas também benefícios diretos para a saúde e consequências mais amplas do sistema de saúde[2][3]. [Mauskopf et al (2018), pag. 1133]
O cobertor é curto!!! Ao cobrir a cabeça, os pés ficam de fora.
Afora a dificuldade orçamentária especificada anteriormente, muitos são os argumentos para um programa de vacinação amplo e universal, mas nenhum é tão forte quanto o argumento econômico de que o investimento em imunização mais que compensa os gastos do Estado com cuidados à saúde, tratamentos, medicamentos, internações, óbitos e queda de produtividade. Não é por outro motivo que a OMS afirma que o impacto da vacinação vai além da saúde, pois evita custos significativos e aumenta potencialmente a produtividade econômica em alguns dos países mais pobres do mundo[4].
A esse respeito vale mencionar um trabalho da OMS de 2018 realizado em 73 países em desenvolvimento com o objetivo de verificar o impacto econômico da vacinação contra 10 doenças no período entre 2001 e 2020[5].
Os resultados obtidos foram muito positivos a favor da vacinação, pois, no período estudado foram economizados 330 milhões de dólares em termos de perdas de produtividade por morte e foram economizados 9 milhões de dólares em termos de perda de produtividade por invalidez[6].
Portanto, que venha o Programa Nacional de Imunização com muita força!! A questão da vacinação é econômica e o bem-estar e a produtividade da sociedade brasileira dependem de uma imunização plena.
[1] WHO. Economics of immunization: a guide to the literature and other resources. World Health Organization. WHO/V&B/04.02. 2004. Disponível em: 4-bd769.p65 (who.int). Acesso em 27 de fevereiro de 2023.
[2] Tradução livre do trecho: Budget holders and decision makers responsible for adding or
changing vaccination programs in high-, middle-, and low- income countries are requesting economic analyses of new vaccination programs to help allocate scarce resources in the
context of budget constraints. These economic analyses should
include not only cost impacts but also direct health benefits and
broader health system consequences.
[3] Josephine Mauskopf, Baudouin Standaert, Mark P. Connolly,
Anthony J. Culyer, CBE, BA, DEcon, Louis P. Garrison, Raymond Hutubessy,
Mark Jit, Richard Pitman, Paul Revill, Johan L. Severens, PhD. Economic Analysis of Vaccination Programs: An ISPOR Good Practices for Outcomes Research Task Force Report. ISPOR TASK FORCE REPORT. Volume 21, Issue 10, P 1133-1149, outubro, 2018. Disponível em: Economic Analysis of Vaccination Programs_ An ISPOR Good Practices for Outcomes Research Task Force Report (valueinhealthjournal.com). Acesso em: 27 de fevereiro de 2023.
[4] Tradução livre do trecho: “l’impact de la vaccination dépasse le domaine de la santé, car il permet d’éviter d’importants coûts et une augmentation potentielle de la productivité économique de certains des pays les plus pauvres du monde.”
[5] Para fazer a comparação com os efeitos de não vacinação, os autores modelaram os custos dos tratamentos, os custos de transporte e as perdas de produtividade por invalidez ou por morte.
[6] Vaccination : l’impact économique d’une bonne couverture | Santé Magazine (santemagazine.fr)