Eric Moura
A arbitragem no Brasil passou por um desenvolvimento significativo nas últimas décadas, consolidando-se como um mecanismo de resolução de disputas amplamente respeitado e eficaz. Essa transformação começou com a promulgação da Lei nº 9.307/96, em 23 de setembro de 1996, conhecida como a Lei de Arbitragem Brasileira. A legislação modernizou as práticas de arbitragem no país, alinhando-as aos padrões internacionais ao enfatizar a executabilidade de convenções e sentenças arbitrais, além de simplificar os requisitos processuais.[1]
O Brasil reforçou ainda mais seu compromisso com a arbitragem ao aderir à Convenção de Nova York em 7 de junho de 2002, obrigando-se a reconhecer e executar sentenças arbitrais estrangeiras. Este tratado histórico tranquilizou os investidores estrangeiros sobre o compromisso do Brasil com um sistema confiável de arbitragem, consolidando sua posição na comunidade global de arbitragem.[2]
Atualmente, o Brasil é considerado uma das jurisdições de arbitragem mais proeminentes do mundo, apoiado por um Judiciário que constantemente reforça os princípios da arbitragem. Um estudo de 2023 realizado pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem (“CBAr”) e pela Associação Brasileira de Jurimetria (“ABJ”) constatou que apenas 1,5% das sentenças arbitrais em São Paulo, o principal centro de arbitragem do país, são anuladas pelos tribunais. Essa baixa taxa de anulação destaca a postura pró-arbitragem do Judiciário.[3]
Instituições como a Câmara Internacional de Comércio – Brasil (“ICC”), o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”) e a Câmara de Arbitragem do Mercado (“CAM-B3”) desempenham papéis cruciais no avanço da arbitragem no Brasil. A CAM-B3, em particular, é especializada em disputas relacionadas a valores mobiliários, devido à exigência da B3 para que empresas listadas em segmentos premium, como o Novo Mercado, resolvam conflitos exclusivamente por arbitragem.[4] Esse mecanismo obrigatório de arbitragem melhora a governança e protege os direitos dos investidores.
Além dessas instituições, o Brasil abriga várias outras que contribuem significativamente para o ecossistema de arbitragem, incluindo a Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem de São Paulo (“CIESP/FIESP”), o Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (“CBMA”), o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (“AMCHAM”) e a Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial (“CAMARB”).[5]
Cada uma dessas instituições desempenha um papel vital no arcabouço de arbitragem do Brasil, oferecendo serviços especializados, regras reconhecidas internacionalmente e infraestrutura sofisticada. Juntas, fortalecem a capacidade do Brasil de lidar com disputas complexas, aprimorando ainda mais sua reputação como uma jurisdição de arbitragem confiável.
A combinação da legislação modernizada de arbitragem, da adesão à Convenção de Nova York e do robusto arcabouço institucional posicionou firmemente o Brasil como um líder global em arbitragem. O respeito consistente do Judiciário pela definitividade das sentenças arbitrais reforça esse status, garantindo que a arbitragem permaneça um método eficiente e confiável de resolução de disputas.
Resolução de Disputas de Valores Mobiliários por Arbitragem no Brasil
A CAM-B3, criada em 2001 pela B3 (antiga Bovespa), atua como um fórum crucial para a resolução de disputas relacionadas a valores mobiliários e governança corporativa no Brasil. Ela lida principalmente com casos envolvendo empresas listadas em segmentos premium de mercado, como o Novo Mercado, que exige cláusulas compromissórias nos seus estatutos. Essa arbitragem obrigatória assegura que disputas entre acionistas, gestores e empresas sejam resolvidas de forma eficiente e confidencial por árbitros especializados em direito societário e de valores mobiliários.[6]
A importância da CAM-B3 cresceu significativamente nos últimos anos, à medida que ela passou a lidar com um volume crescente de casos envolvendo disputas complexas. Essas disputas frequentemente giram em torno de direitos de acionistas, má gestão e violações de padrões de governança corporativa, refletindo a crescente demanda por responsabilidade nos mercados de capitais do Brasil. O modelo especializado da CAM-B3 oferece uma alternativa mais rápida e confidencial ao litígio comum, reduzindo incertezas e garantindo que as soluções sejam elaboradas por especialistas familiarizados com as complexidades do direito societário e de valores mobiliários.[7]
Nos últimos anos, a CAM-B3 teve um aumento em disputas decorrentes de controvérsias corporativas de grande visibilidade e reclamações de acionistas. Por exemplo, diversos casos trataram de conflitos relacionados a violações de deveres fiduciários, alegações de insuficiência de divulgação e disputas sobre acordos de acionistas. Esses casos destacam o papel da CAM-B3 em reforçar os padrões de governança corporativa e proteger os direitos dos investidores.
Em 2018, a CAM-B3 deu um passo significativo ao tornar-se uma das primeiras câmaras arbitrais brasileiras a publicar um compêndio de sentenças arbitrais. Essa iniciativa aumentou a transparência e forneceu insights valiosos sobre o raciocínio por trás das decisões arbitrais, fomentando a confiança entre os participantes do mercado. Essa transparência é particularmente importante em disputas de valores mobiliários, onde a confiança dos investidores depende da previsibilidade e equidade dos mecanismos de resolução de disputas.[8]
Combinando sua expertise, estrutura especializada e crescente volume de casos, a CAM-B3 se consolida como um pilar da arbitragem de valores mobiliários no Brasil, desempenhando um papel vital na garantia da responsabilidade, governança corporativa e proteção dos investidores nos mercados de capitais do país.
O Papel do Financiamento de Litígios no Mercado de Arbitragem de Valores Mobiliários no Brasil
O financiamento de litígios tem se tornado uma ferramenta transformadora no mercado de arbitragem de valores mobiliários no Brasil, ajudando a superar barreiras financeiras que muitas vezes impedem acionistas minoritários e pequenos investidores de buscar suas reivindicações. Os procedimentos arbitrais em instituições como a CAM-B3 são essenciais para a resolução de disputas de governança corporativa, mas seus altos custos, incluindo honorários advocatícios, despesas de árbitros e taxas administrativas, frequentemente se apresentam como obstáculos.[9]
Provedores de financiamento de litígios, como a Omni Bridgeway, oferecem soluções ao cobrir esses custos, permitindo que os demandantes busquem reivindicações legítimas sem riscos financeiros. Este modelo é particularmente valioso em disputas de valores mobiliários envolvendo violações de deveres fiduciários, má gestão ou divulgações inadequadas. Os financiadores assumem o ônus financeiro em troca de uma parte da recuperação eventual, nivelando o campo de jogo para investidores em disputas com grandes corporações.[10]
Ao preencher a lacuna financeira, o financiamento de litígios melhora o acesso à arbitragem e reforça a responsabilidade corporativa. Esse modelo de financiamento também está alinhado aos objetivos mais amplos do mercado de capitais brasileiro, promovendo transparência e fomentando a confiança dos investidores.
À medida que o financiamento de litígios se torna mais prevalente, espera-se que ele impulsione uma maior participação na arbitragem, fortalecendo o mercado de valores mobiliários no Brasil e posicionando o país como líder global em recuperações para investidores.
[1] www.cms.law/en/int/expert-guides/cms-expert-guide-to-international-arbitration/brazil
[2] www.newyorkconvention.org/contracting-states
[3] www.dailyjus.com/world/2024/08/2023-arbitration-year-in-review-brazil
[4] https://www.camaradomercado.com.br/pt-br/faq.html
[5] www.globalarbitrationreview.com/insight/know-how/commercial-arbitration/report/brazil
[6] www.camaradomercado.com.br/en-US/sobre-a-camara.html
[8] www.b3.com.br/pt_br/noticias/camara-de-arbitragem-do-mercado.htm
[9] https://aria.law.columbia.edu/overview-of-securities-arbitration-in-brazil-challenges-and-developments/
[10] www.omnibridgeway.com/litigation-funding/dispute-funding/investor-recoveries
Eric Moura. LLM in Global Business Law pela Columbia Law School. Consultor na Omni Bridgeway. E-mail: emoura@omnibridgeway.com