Leandro Oliveira Leite
O Banco Central do Brasil (BC) tem desempenhado um papel liderança nas discussões da Trilha de Finanças do G20[1], especialmente durante as reuniões realizadas no Rio de Janeiro entre 22 e 26 de julho de 2024[2]. Sob a presidência do Brasil no G20, o BC tem sido um ator importante na condução de debates sobre temas essenciais para o futuro econômico global, como mudanças climáticas, sustentabilidade, inclusão financeira e inovações no sistema financeiro.
A Trilha de Finanças, uma das principais vertentes do G20, concentra-se em assuntos macroeconômicos estratégicos, sendo liderada pelos ministros das Finanças e presidentes dos Bancos Centrais dos países-membros. A coordenação dessa trilha está sob a responsabilidade da Secretária de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda.
Um dos principais focos das discussões na Trilha de Finanças tem sido a sustentabilidade e os riscos climáticos. A presidência brasileira do G20, que adotou o lema “Construindo um mundo justo e um planeta sustentável”, colocou esses temas no topo da agenda, reconhecendo a urgência de enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas.
O BC tem enfatizado a importância de se considerar os impactos econômicos e sociais dos eventos climáticos extremos, cada vez mais frequentes. Além disso, o BC destaca a necessidade de investimentos significativos na transição energética, apesar dos custos adicionais que essa mudança pode acarretar. Esse enfoque reflete a crescente pressão global para integrar questões ambientais e de sustentabilidade nas políticas econômicas e financeiras.
No que diz respeito à mudança climática, a Força-Tarefa para Mobilização Global contra a Mudança do Clima está sendo estabelecida pela presidência brasileira do G20, com reuniões inaugurais ao longo de 2024. Concebida para promover o diálogo entre governos, instituições financeiras e organismos internacionais, a força-tarefa visa alinhar as políticas macroeconômicas e financeiras globais com os objetivos da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e do Acordo de Paris. Essa iniciativa integra um esforço maior de garantir que as ações climáticas estejam no centro das estratégias econômicas e financeiras globais.
Essa força-tarefa terá também a importante missão de consolidar os resultados dos grupos de trabalho e articular respostas coordenadas entre a Trilha de Sherpas[3] e a Trilha de Finanças do G20, reforçando o compromisso dos países-membros em restaurar a confiança na capacidade internacional de enfrentar a emergência climática. Será promovido um painel com economistas notáveis para examinar as plataformas nacionais de transformação ecológica e os arcabouços existentes de políticas públicas, apresentando recomendações que possam guiar os esforços globais nesta área.
Os debates organizados pela força-tarefa buscarão facilitar a troca de experiências entre os países-membros e identificar pontos de convergência na formulação e implementação de planos voltados para a transformação econômica e a sustentabilidade. Um ponto central será o alinhamento do setor financeiro às metas de longo prazo do Acordo de Paris, com a participação de governos, bancos centrais, reguladores financeiros, bancos comerciais e de desenvolvimento, instituições financeiras internacionais, investidores institucionais e outros atores do mercado financeiro. O objetivo é delinear estratégias colaborativas, que incluam abordagens regulatórias e compromissos voluntários, para acelerar a mobilização de recursos destinados ao desenvolvimento sustentável e ao combate às mudanças climáticas.
As reuniões da Trilha de Finanças estão programadas para acontecer em várias cidades brasileiras ao longo de 2024, incluindo Brasília e São Paulo, refletindo o compromisso do Brasil em sediar discussões de alto nível que impactam o sistema financeiro global. A culminação dessas discussões ocorrerá na Cúpula de Líderes do G20, marcada para novembro de 2024, no Rio de Janeiro, onde os avanços das iniciativas discutidas durante o ano serão apresentados, e novos rumos para a governança financeira global serão traçados.
Os demais grupos técnicos da Trilha de Finanças também desempenham papéis essenciais nas discussões. O grupo de Arquitetura Financeira Internacional, por exemplo, criado após a crise financeira global de 2008/2009, tem como foco a promoção de uma arquitetura financeira global mais estável e resiliente. Já o grupo de Economia Global monitora os riscos e incertezas que impactam o cenário econômico mundial, enquanto o grupo de Inclusão Financeira busca melhorar o acesso e a qualidade dos serviços financeiros formais em todo o mundo. Outros grupos discutem temas como Tributação Internacional, infraestrutura e inovação no sistema financeiro.
Essa articulação reflete o papel do BC na construção de um ambiente financeiro mais robusto e resiliente, capaz de lidar com os desafios impostos pelas mudanças climáticas, ao mesmo tempo em que promove o desenvolvimento sustentável. Com isso, o BC contribui para moldar as discussões globais e para garantir que as decisões tomadas no G20 estejam alinhadas com a necessidade de uma economia mais verde e inclusiva.
A atuação do BC no contexto do G20 demonstra um compromisso claro com a incorporação de questões ambientais nas diretrizes financeiras globais. Ao liderar essas discussões, o BC promove uma abordagem que considera os impactos econômicos das mudanças climáticas e busca formas de mitigar esses riscos, contribuindo para um futuro mais sustentável.
As discussões sobre sustentabilidade e mudanças climáticas, lideradas pelo BC no G20, têm implicações diretas para o mercado financeiro. A crescente ênfase em fatores ambientais, sociais e de governança (ESG) está moldando o futuro das finanças globais. Com o BC desempenhando um papel de liderança nessas discussões, o Brasil se posiciona como um líder na integração de práticas sustentáveis no sistema financeiro.
As possíveis mudanças regulatórias decorrentes dessas discussões podem impactar significativamente os mercados. Empresas que se adaptarem às novas exigências terão vantagens competitivas, enquanto aquelas que não se ajustarem poderão enfrentar desafios. Além disso, o foco do BC em práticas sustentáveis pode atrair mais investimentos estrangeiros, especialmente aqueles direcionados a projetos que promovem a transição para uma economia de baixo carbono.
Outro tema central abordado na Trilha de Finanças foi a inclusão financeira. O BC tem destacado que, para ser efetiva, a inclusão financeira deve ir além da simples abertura de contas bancárias. A qualidade da inclusão, que envolve o bem-estar financeiro dos indivíduos, é uma prioridade. Para isso, o BC tem investido em iniciativas de educação financeira e em programas que monitoram e medem os resultados das políticas de inclusão financeira.
Por meio do Programa Aprender Valor, por exemplo, o BC busca melhorar a educação financeira nas escolas, ajudando a formar uma população mais consciente financeiramente. Esse foco em educação financeira é visto como essencial para promover uma maior estabilidade econômica a longo prazo, já que indivíduos mais bem informados tendem a tomar decisões financeiras mais sólidas.
As inovações no sistema financeiro também foram um tópico de destaque nas discussões do G20. O BC está promovendo reformas estruturais importantes por meio de iniciativas como o Pix, o Open Finance[4] e o desenvolvimento da Drex, a moeda digital brasileira. Essas inovações visam aumentar a eficiência, a inclusão e a transparência no sistema financeiro do Brasil, posicionando o país como um líder em inovação financeira global.
Entretanto, desafios como a harmonização de regras internacionais e a governança dos sistemas de pagamento ainda precisam ser enfrentados. O G20 tem um papel fundamental na promoção de condições de concorrência equitativas e na criação de um conjunto mínimo de regras para os pagamentos transfronteiriços, essenciais para a integração dos sistemas de pagamento globais.
O Banco Central do Brasil, através de sua atuação nas discussões da Trilha de Finanças do G20, tem demonstrado um forte compromisso com a sustentabilidade, a inclusão financeira e a inovação. Ao liderar essas discussões, o BC reforça a importância desses temas no cenário global, ao mesmo tempo em que prepara o mercado financeiro brasileiro para um futuro mais sustentável e competitivo. As discussões continuarão até a Cúpula de Líderes do G20 em novembro de 2024, no Rio de Janeiro, onde os avanços alcançados ao longo do ano serão consolidados e novas direções serão definidas para o futuro da governança financeira global.
[1] https://mkt.comunicacao.bcb.gov.br/campaigns/xo592qsy7tb3c/track-url/cw44517kp7c2c/43fb59f8cdebbca0d9b96740ec845fb1912b76a0
[2] https://mkt.comunicacao.bcb.gov.br/campaigns/xo592qsy7tb3c/track-url/cw44517kp7c2c/2de8b85f5c46171afa950abf63859e1bdb34d4c7
[3] A trilha de Sherpas (comandada pelo Itamaraty, trata de temas como emprego, educação e saúde) tem uma atuação política, reunião dos emissários pessoais dos líderes do G20. Já a trilha de finanças trata de assuntos macroeconômicos e é liderada pelos ministros das finanças e presidentes dos bancos centrais dos países-membros.
[4] O Open Finance, ou sistema financeiro aberto, é a possibilidade de clientes de produtos e serviços financeiros permitirem o compartilhamento de suas informações entre diferentes instituições autorizadas pelo Banco Central e a movimentação de suas contas bancárias a partir de diferentes plataformas e não apenas pelo aplicativo ou site do banco, de forma segura, ágil e conveniente. https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/openfinance
Leandro Oliveira Leite. Servidor público federal, analista do Banco Central do Brasil (BCB), atualmente trabalhando no CADE na área de condutas unilaterais, possui graduações em Administração, Segurança Pública e Gestão do Agronegócio e especialização em Contabilidade Pública. Tem experiência na parte de supervisão do sistema financeiro e cooperativismo pelo BCB, bem como, já atuou com assessor técnico na Casa Civil.