Adriana da Costa Fernandes

O noticiário setorial de telecomunicações é forte e completo. Desta forma, nem se pretende aqui competir ou criar um novo canal de acompanhamento diário detalhado similar. Este veículo, em verdade, possui um outro propósito. É formado por experts voluntários de diversas áreas, apaixonados pelo que sempre fizeram, e que mais do apenas interessados em fomentar o debate dos temas relevantes que acompanham, de fato, possuem verdadeiro amor pela literatura técnica e pelo contato com as matérias que estudam cotidianamente.  Assim sempre foi, igualmente, com esta autora, acerca do Direito Regulatório e do contexto de Telecomunicações Nacional e até Internacional, ainda que tenha seguido por outros mercados.

             O texto de hoje fala basicamente de concorrencial com impacto consumerista, com foco contributivo ao belo trabalho que o atual Conselho Diretor da Anatel vem realizando.

             A Agenda Regulatória 2024 da Anatel já foi montada e bem estruturada de forma aderente aos temas que vinham sendo tratados. Devidamente publicizada ao mercado, até mesmo por meio de 3 (três) ótimas reportagens da plataforma Teletime.[i]

             Dos necessários pontos elencados, destacando-se aqui como itens relevantes: (i) revisão do regulamento de segurança cibernética aplicada ao setor de telecomunicações, aprovado pela Resolução nº 740, de 21 de dezembro de 2020 (R-Ciber); (ii) análise da proposta de simplificação da regulamentação e dos serviços de telecomunicações; (iii) regulamentação da aplicação de ferramentas de IA no setor de telecomunicações; (iv) regulamentação do uso de postes – desdobramentos e (v) GAPE e conectividade nas escolas; ao certo que não poderia passar despercebido, o ponto (vi) propostas para se ampliar a competividade do mercado, após a saída da Oi do SMP (Serviço Móvel Pessoal).

             De fato, o consumidor questiona a pouca opção entre apenas, praticamente, 3 (três) grandes operadoras no mercado atualmente. Estas muitas vezes engessadas, com a mesma gama de serviços, preços, ofertas, padrão de atendimento, nível segurança, problemáticas mercadológicas e sistêmicas, qualidade técnica e o mesmo patamar de avanço tecnológico pari passu.

                O mercado esperava bem mais em inovação, disrupção e diferenças entre elas. A expectativa quando surgiram os ditos “combos”, a franquia ilimitada, a fibra, outros produtos e ideias era a de que uma espécie de mundo novo se abrisse em termos de consumo, oportunidades aos usuários e real competição.

             Entretanto, quem conhece um pouco do mercado concorrencial latu sensu e da economia brasileira, em verdade, entende que praticamente tudo o que se projeta para dado prazo, leva bem mais tempo do que o esperado. Os mercados precisam minimamente errar um tanto e amadurecer. Quem sabe seja esta a hora da virada e o Brasil finalmente venha a se projetar em efetivo na vanguarda? Sonhar não custa nada.

             Este texto busca trazer a recordação de tempos das equipes que festejavam grandes conquistas de metas arrojadas pós Reforma do Estado, dos primeiros anos das Concessões e  Autorizações, quando se vivia a divisão do país em 3 (três) regiões de STFC (Serviço de Telefonia Fixa Comutado), em reverência ao primeiro grande carro chefe das Teles e que hoje chega ao fim. Serviço à época instituído em regime de Concessão e, então, o primeiro modo de descentralização de serviços públicos estatais.

             Foi a mesma época da unificação das antigas outorgas estatais herdadas pelas empresas, em cada uma destas regiões e, a seguir, de mais metas ousadas, para que cada operadora pudesse atuar nacionalmente.

             Em paralelo, se firmava o SMP (Serviço Móvel Pessoal) que ainda era considerado para poucos, com seus aparelhos apelidados de “tijolões” e cujas baterias não duravam praticamente nada até o surgimento dos menores aparelhos utilizados no 2G, 3G e finalmente do 4G. A conversa sobre o 5G é outra. Fica para outro artigo.

             Entretanto, foi quando se travava a guerra entre SMP e SME (Serviço Móvel Especializado), o qual já mantinha um quiosque em cada shopping center de esquina, que, finalmente, o consumidor brasileiro começou a entender que poderia usufruir um pouco mais da telefonia do que imaginava, com o tanto que já pagava. E assim, também as empresas compreenderam que precisavam tratar este consumidor de uma forma diferenciada para fielmente mantê-lo. Tempo este onde, ainda, existiam as 7 (sete) operadoras móveis principais e alguns mercados regionais um tanto aquecidos, o que, de certa, se perdeu.

             Diante de todas estas memórias, o que se pretende ponderar é do eventual renascimento do interessante instituto constitucional, diga-se igualmente, administrativo-regulatório, da Permissão. Em verdade, reativando a figura das Permissionárias país afora. Das conhecidas empresas espelho ou “espelhinhos” do sistema STFC (fixa) daquele tempo. Um instituto idealizado justamente prevendo a viável oxigenação concorrencial mercadológica na área da Concessionária, onde aquelas empresas detinham menos obrigações que a principal e eram apresentadas como alternativas ao consumidor, fosse pontual, temporariamente ou não tanto.

             Em verdade, o legislador constituinte abordou o instituto da Permissão, tanto na tipificação dos serviços e bens, onde prestação e exploração são passíveis de delegação à iniciativa privada, quanto no art. 175 da Constituição Federal de 1988, definindo assim as diretrizes gerais do regime jurídico de concessões e permissões de serviços públicos.

             A Lei 8.987, 1995, anterior à de Telecomunicações, foi que estabeleceu propriamente o regime previsto no art. 175 da Constituição Federal de 1988, indicando, dentre outros aspectos, que a formalização deverá ocorrer mediante contrato de adesão, segundo as demais normas pertinentes e as do edital de licitação, inclusive quanto à precariedade e à revogabilidade unilateral do contrato pelo poder concedente. [ii]

             A Lei 9.472, 1997, em seu art. 118, conferiu ao instituto da Permissão contornos de ato administrativo, enquanto contrato em caráter transitório, para a prestação de serviço em regime público (serviço de interesse coletivo), e apenas em caso de situação excepcional comprometedora do funcionamento do serviço, e até sua normalização. Restringindo, em verdade, sua possibilidade de utilização. Ainda que, alguns doutrinadores, entendem que os efeitos da natureza jurídica da Permissão, genericamente possua, de fato, natureza contratual,[iii] conforme o ditame e previsão constitucional.

             Ou seja, em caso de suposto entendimento acerca de sua viabilidade de reutilização e interesse mercadológico, alguma previsão ou alteração há de ser viável por via legislativa. Sendo, inclusive, importante para o atendimento a determinadas regiões onde possam ocorrer ganhos de conectividade. Da mesma forma, mais à frente em tempos de 5G mais bem implantado e de IoT.

             Ao certo, ressalvas sejam feitas sobre a importância da proteção eficaz de dados e da atenção aos ditames da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD.

            De todo modo, cabe asseverar sobre o mercado SMP (móvel) que, assim como no caso de outros, os consumidores ainda esperam que muito seja feito diante da expectativa que era tão alta. Vale lembrar que telecom foi o case de sucesso nacional em privatizações, portanto, este consumidor não pode ser decepcionado jamais.

             Se aguardavam revoluções efetivas das outorgas por meio de seus parâmetros e de combinações realmente diferenciadas, unindo, por exemplo, a prestação do serviço entre 2 (duas) ou até mais empresas de serviços SMP, Banda Larga, TVs / Streaming e Satélites, inclusive com grupos internacionais que acabaram não chegando ou não ficaram. É fato, ainda não foi possível, de todo, chegar lá, mas a caminhada se faz.

             Noutra toada, surgiram as MVNOs (que, explicando de forma leiga, revendem o serviço das operadoras), nunca se imaginou que as OTTs tomassem o espaço que ao fim conseguiram e que os serviços de mensagens instantâneas ameaçassem tanto assim a voz sobre o IP.

             Por fim, não se vislumbrava na época que, diante de tantas promessas, atualmente seria o mercado de SMP (móvel) que estaria numa situação passível à adoção de algum tipo de mecanismo regulatório-concorrencial que venha novamente a fomentar uma temporada de quebra de silos e promover o impulsionamento da criatividade exponencial para além das “caixinhas já quadradas”, como aconteceu no tempo daquele executivo ex-aviação que rompeu os, então, paradigmas vigentes.

             Porém, a realidade dominante é que os antigos Presidentes e Diretores, em sua grande maioria se foram ou estão indo em breve. Os mais jovens, Ys e Zs estão chegando e quem já saiu do mercado observa com olhos atentos a nova configuração que vem se desenhando pelas mãos dessa geração que pensa completamente diferente da X anterior (ótimos consultores atuais) e dos boomers que, em sua maioria, comandavam o mercado na época em que tudo isto acontecia.

             E é isto… Tudo muda, o tempo todo, toda hora no mundo, no seu, no nosso. Sem muita previsão do que, de fato, acontecerá. O resiliente sobreviverá.


[i] https://teletime.com.br/01/02/2024/perspectivas-regulatorias-para-a-anatel-em-2024-parte-1/

[ii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8987cons.htm

[iii] https://www.migalhas.com.br/arquivos/2016/7/art20160715-08.pdf

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