Editorial

A discussão em torno das drogas tem ganhado destaque no Brasil e no mundo. No Brasil, a discussão se centra na criminalização ou não do porte de drogas e está acontecendo no Congresso Nacional e no Supremo Tribunal Federal.

No mundo também existem iniciativas importantes acontecendo e o caso da Alemanha é o mais recente. Naquele país, ficou decidido que é legal o porte de até 25 gramas de maconha, a manutenção de até 50 gramas da droga em casa e a existência de até três plantas da cannabis nas residências.

A controvérsia entre proibir e liberar o consumo de droga envolve uma série de argumentos, indo desde aspectos religiosos até saúde e segurança públicas. Os argumentos ligados a religião se centram, em geral, na dicotomia do bem contra o mal; os argumentos de saúde pública estão focados nos custos gerados pela droga à saúde do brasileiro; e os argumentos de segurança pública se centram na violência gerada pelo comércio da droga.

Todos os argumentos são válidos, encontram a sua verdade e tem em comum o prejuízo que a droga e o seu mercado trazem para as sociedades. Não há muita controvérsia sobre os efeitos negativos do consumo da droga sobre a saúde humana, da mesma forma que não há dúvidas de que o estágio atual do mercado de drogas é fonte inesgotável de violência, sobretudo nos grandes centros do país.

Algumas propostas de solução se apresentam. Em um extremo, temos a proibição completa do consumo e da produção da droga e, no outro extremo, temos a liberação total do consumo e de sua produção. Entre os dois extremos, existe a proposta de solução de proibição com liberação de consumo para alguns casos, como é o que acontece no Brasil atualmente.

Aí está um problema complexo para se resolver!!

O uso de drogas vicia as pessoas e uma das consequências é o aumento do consumo. Proibir tudo reduz o consumo? Liberar tudo aumenta o consumo? Os críticos de ambos os lados se alfinetam. Para os adeptos da proibição, a coerção reduz o consumo e a liberação amplia a demanda, ao passo que para os adeptos da liberação acontece o contrário.

Há um impasse sobre as consequências, mas não há impasse sobre uma parte da lei, a demanda. Para ambos os casos, o aspecto central é o comportamento do consumidor, pois os atos de proibir e liberar definem o aumento ou a redução de consumo.

No entanto, ao se pensar somente na demanda comete-se um erro clássico na teoria econômica, que é o de não considerar a simultaneidade em sua determinação e de oferta, pois consumidor e produtor estão intimamente relacionados.

Portanto, o problema das drogas não é apenas um problema de saúde pública e de segurança pública, mas também um problema econômico e, por isso, pode e deve também ser analisado com base na lei do mercado: demanda e oferta.

Proibir e liberar o consumo e a produção de drogas tem consequências sobre a demanda e a oferta. Ao reduzir a facilidade para a aquisição da droga, a solução proibir dá um choque na demanda. Esse choque, por seu turno, reduz a oferta da droga, e a política acredita atingir o objetivo. No entanto, essa é uma falácia, pois a redução da oferta aumenta os preços da droga e os locais de aquisição tornam-se mais obscuros e mais propícios a violência.

A solução liberar também tem problemas do lado econômico. Ao liberar o consumo objetiva-se tornar o mercado negro menos lucrativo e assim evitar que os consumidores sejam submetidos à arbitragem dos traficantes e que sejam submetidos aos seus métodos de violência. No entanto, ao fazer a referida liberação, amplia-se a oferta de drogas e, se acreditamos que a lei de Say[1] funciona, a oferta amplia a demanda e o ciclo do mercado se repete.

Portanto, entender que o problema da droga também é um problema de mercado já é um bom começo.


[1] A lei de Say refere-se a Jean-Baptiste Say. Em seu livro denominado “A treatise on political economy; or the production distribution and consumption of wealth”, Say assim se expressou:

É bom notar que um produto acabado oferece, a partir desse momento, saída para outros produtos pelo valor total do seu valor. Com efeito, quando o último produtor termina um produto, o seu maior desejo é vendê-lo, para que o valor desse produto não caia nas suas mãos. Mas ele não está menos ansioso para se desfazer do dinheiro que sua venda lhe traz, para que o valor do dinheiro também não diminua. No entanto, você só pode desembolsar seu dinheiro pedindo para comprar qualquer produto. Vemos, portanto, que o simples facto da formação de um produto abre, desde o momento, uma saída para outros produtos. (J. B. Say, 1803: pp.141–2).

Il est bon de remarquer qu’un produit terminé offre, dès cet instant un débouché à d’autres produits pour tout le montant de sa valeur. En effet, lorsque le dernier producteur a terminé un produit, son plus grand désir est de le vendre, pour que la valeur de ce produit ne chôme pas entre ses mains. Mais il n’est pas moins empressé de se défaire de Targent que lui procure sa vente, pour que la valeur de l’argent ne chôme pas non plus. Or, on ne peut se défaire de son argent qu’en demandant à acheter un produit quelconque. On voit donc que le fait seul delà forma tion d’un produit ouvre, dès l’instant môme, un débouché à d’autres pro duits.

SAY, Jean-Baptiste. Traité d’économie politique; ou, Simple exposition de la manière dont se forment, se distribuent et se consomment les richesses. Disponível em: traitdconomi00sayjuoft.pdf (archive.org). Acesso em: 23 de abril de 2024.

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